Categories: PONTOS DE VISTA

A Marcha da Liberdade e os Futuros Alternativos

No filme Minority Report, mutantes geniais,  sensitivos-sensoriais, alucinam o  futuro. Os PreCogs (criação de Philip K. Dick), considerados “idiotas”, “doentes’ e “drogados” pelo sistema, têm o poder  de premonição do futuro, vislumbram cenas, indícios,  fragmentos e sinais de possíveis crimes.

Uma premonição paradoxal que seria totalmente inútil se não existisse a possibilidade de alterar o futuro. Criar realidades alternativas.

Pois uma desses futuros múltiplos começou a se formar com uma inédita articulação entre os movimentos sociais, culturais, coletivos, redes, midialivristas, pontos de cultura, minorias e maiorias em torno da Marcha da Liberdade (#marchadaliberdade 28M) de São Paulo.

Estamos vendo se construir um movimento transversal conectado pelas lutas locais e globais, exigindo liberdade de expressão, cultura livre, combate ao preconceito. São os nossos PreCogs, uma nova “classe” transversal, o Precariado Cognitivo, precários sensitivos que alucinam/criam futuros.

Junta o precariado da cultura, camelôs, removidos, agentes da economia informal, os garotos de classe media diplomados autônomos desempregados, todos que tem que inventar seu próprio trabalho, os eco-ativistas, os militantes pela legalização das drogas, homoafetivos, os pretos, as periferias, os que andam por terreiros&quilombos ou por terras digitais. Todos os que couberem no vão do MASP. Uma espécie de Portal e plano piloto  para startar os movimentos transversais.

É que depois da repressão brutal, a marcha da maconha de São Paulo (nosso 21M) decolou e virou a marcha pela liberdade de expressão, a marcha dos diferenciados, dos insatisfeitos, juntando os indignados sensitivos que prevêem os crimes futuros em marcha, a intolerância e o retrocesso, se não alterarmos radicalmente o rumo dos últimos acontecimentos da MATRIX.

A Marcha da Liberdade é também o “relatório das minorias” (nosso minority report, numa tradução livre), dos que são atacados pela policia, pelos skinheads neo-nazistas (anti marcha e anti-gays), pelos ruralistas, monoteístas, monopolistas, pelos “monos”.

Sem um objetivo único, mas com várias reivindicações e questões amplas, a marcha vai colando no fluxo do desejo de mudança que varre o Acampamento Global e juntando movimentos os mais diversos.

É que a MATRIX, o Brasil hoje, é a mais completa e paradoxal tradução de um conto de Jorge Luis Borges: O Jardim dos Caminhos que Se Bifurcam.

Borges, cego-vidente, aponta os paradoxos do tempo e das realidades  que se acavalam. Os mundos “incompossíveis”, da teoria de Leibniz.

O país em que Dilma ganhou as eleições deveria ser “incompossível” com o Brasil fabulado por Serra, com o Brasil da bancada ruralista derrotando os povos da floresta, da Matrix religiosa derrotando a liberdade de expressão e as opções sexuais.

O governo Dilma (alavancado pela Multidão de singularidades) deveria ser “incompossível” com um Ministério da Cultura fraquejante, longe da potencia dos movimentos e do Brasil-mundo da cultura digital. O Brasil2.0 liberado por Lula-Macunaíma.

Das redes as ruas, das ruas as redes, vislumbram os PreCogs. Quando um futuro intolerante se precipita e parece inexorável é preciso reagir, deter, interceptar, barrar. Precognição  e intervenção para assegurar autonomia e liberdade, criando realidades alternativas. Liberar novos fluxos.

Os múltiplos futuros estão ai, dentro da Matrix. Nossas ficções se tornam História. De maio de 68 a Puerta del Sol, das revoltas árabes e descontentes globais a #marchadaliberdade,  neste exato momento mais de 700 mobilizações em prol da liberdade no mundo, trata-se de uma única linha subterrânea de guerrilhas reais e simbólicas que irrompe e se bifurca, ilimitada.

A  Marcha da Liberdade é a 1a. Marcha Transversal dos PreCogs: Precariado cognitivo, pós-partidos, pós- classe, pós-caretice. Ativismo, anti-preconceito, governança digital, Mídia Livre, Politica2.0, MinCSomoNos, Pontos de Cultura, MobilziaCultura, ForaDoEixo,  Coletivo DAR, Bicicletada, Desentorpecendo…

Cabem todos no vão do MASP, dia 28 de maio, sábado, 14h.

www.marchadaliberdade.org

Ivana Bentes

Pesquisadora e professora da Escola de Comunicação da UFRJ e coordenadora do Pontão de Cultura Digital da ECO-UFRJ.

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  • A face política da cannabisfobia

    O Supremo Tribunal Federal deve se posicionar em breve acerca da legalidade das Marchas da Maconha no país. A questão já deixou de envolver apenas a estupidez repressiva antidrogas. A tentativa de sabotar o debate chegou a níveis insuportáveis, que exigem uma mobilização imediata dos organismos representativos da sociedade.

    Já é absurdo que os organizadores da Marcha tenham de maquiar suas justas reivindicações com a defesa de preceitos constitucionais que protegem até os piores fascistas. Mas vê-los apanhar da polícia e ser arrastados a camburões mesmo quando apelam para as liberdades de expressão e reunião ultrapassa qualquer limite aceitável numa democracia.

    Agora a mídia liberal poderia comprovar sua aspiração republicana investigando a tropa de choque do autoritarismo que atua no Congresso, no Ministério Público e no Tribunal de Justiça com o evidente objetivo de criminalizar uma plataforma apoiada por especialistas de diversas áreas. Também a chamada blogosfera “progressista” faria justiça aos seus alegados princípios se rompesse o estranho silêncio que mantém diante do problema. E a esquerda precisa assumir uma posição inequívoca sobre o tema antes que oportunistas se apropriem da paternidade dessa evolução histórica inevitável.

    Há quem diga que tudo isso é irrelevante, coisa de maconheiro vagabundo. Pois então do que essas pessoas têm tanto medo? Que uma passeata boba e inofensiva chacoalhe os alicerces da tradição, da família e dos bons costumes? Que o exercício da liberdade contagie setores crescentes da população e inicie uma epidemia de civismo? Ou que todos caiam em si e finalmente repudiem a escalada conservadora em gestação?

    sss://guilhermescalzilli.blogspot.com/

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