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Artista ou foca amestrada?

Este ano houve uma liberação de verba significativa do MINC à produção cultural. Levando em conta a escassez de sempre, houve progresso no sentido material. Por outro lado não houve retorno, ao produtor cultural ou ao artista, que se traduza em transparência quanto as escolhas ‘cometidas’.

A definição de critério por parte da iniciativa pública orientada à cultura, é no mínimo suspeita de abuso de poder. Neste caso seria adequado uma discussão sobre concursos públicos que dão prêmios para artistas tão interessantes quanto outros tantos que ficam de fora. Prêmios nos moldes que circulam por intermédio da Funarte e do Sesc. Contra a natureza do artista, são segmentados e criteriosamente programados para atender a diretrizes de ordem política. Quando resistimos a um tal procedimento, somos apontados como românticos e fora da realidade. Uma intransigência ao ‘olhar’ do outro que chega a impressionar. Toma-se a realidade como um bem restrito, e quem pensa diferente está excluído. Que tipo de artista é esse que se submete ao enquadramento institucional? Não seria este condicionamento ao instituído o que tem esterilizado a capacidade criativa dos homens, e neurotizado a sociedade? Então como esperar que sob tais condições o artista provoque transformação?

Esses prêmios evocaram o ressurgimento em minha mente daquela música que diz: ‘Quer ver a foca bater palminha? É dar a ela uma sardinha’. E se repete, se repete.. Como se eu não tivesse mais nada com que me ocupar.

Ao invés de tratar o artista com o habitual extremismo – que ora o endeusa, ora o marginaliza, num infeliz e significativo movimento de distanciamento – deveríamos cuidar de valorizar o ser humano. O que existe de singular em cada um de nós. Do contrário como desenvolver a diversidade? Muito se fala e pouco se empreende a respeito. Salta aos olhos a quantidade ínfima de empreendimentos baseados na diversidade humana. Iniciativa que deveria ser incluída em toda política de ordem pública à fim de semear o respeito e a tolerância entre os ‘desiguais’. O homem tem-se esmagado por excesso de unilateralidade e progresso sem sentido,  uma filosofia de vida que agride a natureza humana, que não deveria ser diferenciada da artistica. Independente se uns façam disso profissão e outros simplesmente vivam a arte de Ser o que são.

Estamos ainda no velho mundo. A prova irrefutável da afirmativa está na estratégia pública do critério político destituído do espírito a que dedica investimentos. Uma maneira deslocada de se considerar o ser humano. Embora a vontade política pareça verdadeira, o despreparo quanto ao negócio cultural é grande. Boa parte dos referidos prêmios privilegiam medalhões ou panelinhas universitárias. Perspectiva viciada de um sistema retrógrado que promete acolher uma nova realidade. Retórica. Não há como fazer política em meio a arte. Não sob tais critérios.

Vamos ensaiar aqui um movimento de reorientação da filosofia: Se o critério fosse humano não haveria questão, apenas um mesmo caminho aberto à quem estivesse disposto e apto a trilhá-lo sob critério intrínsecos. Não promoveríamos premiações que alimentam o ideal de sucesso, contemplando alguns poucos, abrindo mão da maioria. Garantiríamos uma perspectiva de subvenção governamental direta que privilegiaria a diversidade de nossa manifestação expressiva. Além disso, ou seja o sucesso, dependeria do próprio caminhar.

Para desenvolver cultura à altura de nossas emergentes necessidades é preciso mudar de paradigma.  Novos meios de se fazer política e abordar questões culturais são necessários. A economia criativa nos oferece esse movimento transformador, especialmente na transição dos processos excessivamente unilaterais de motivações extrínsecas, aos processos criativos motivados intrínsecamente. Tudo que for possível fazer no sentido de instituir a economia criativa como estratégia, ou parte da mesma, é proposta de renovação cultural, social, econômica e política. Depois de tanto progresso funcional, seria saudável, por que compensatório, evoluir como seres humanos.

Afinal, podemos ser mais do que bons médicos, escritores, contadores, artistas, etc. Podemos ajustar a bipolaridade humana (termo junguiano) para sermos humanos na íntegra. De reprodução basta o que já passamos e teima em retornar.

Andreaha San

Artista multimeios e especialista em Psicologia Junguiana, Arte e Imaginário.

View Comments

  • Olá Andrea,
    Gostei muito do texto e da idéia exposta. Gostaria de saber mais sobre 'Economia Criativa'. Espero que em outros post você fale a respeito.
    Grande abraço!
    Wendell.

  • Olá Andréa,
    parabéns pelo texto. Acredito que ainda seja embrionário o movimento rumo à economia criativa, e como tudo que está nascendo, ainda não conheço suas facetas. Mas realmente nascer sob o que já presenciei na história de gestão cultural brasileira, é normal a apreensão. Talvez tal economia deva se desenvolver a partir de outras formas, sem a sombra da ordem política, ou quem sabe, através de um choque de "desordem" na gestão cultural de nosso país. Do jeito que está é que não dá mais.
    um abraço,
    Martha

  • Oi Wendell,
    Parece inevitável retornar ao assunto 'economia criativa'. Se hoje percebemos que deram um nome para aquilo que a gente fazia sozinho, ou melhor, faziamos sozinhos, é uma satisfação perceber que o movimento se ampliou. Conscientes, despertamos para uma realidade comum. O tema é apaixonante e tem ótimas discussões por aqui, sempre que possível vou contribuir. Abraço.

  • Oi Martha
    Pois é, embora eu não goste da ideia de misturar arte e política - no âmbito enquadrado da própria - por que nisso vai muito tempo, energia e burocratas no gogó. Acho que é o caminho, a grande chance que a política tem de ter princípios, fazer sentido.
    abr.

  • Gostei muito do texto e sinto que aos cinquenta e poucos ainda estou no jardim de infancia como produtor cultural - falta sustancia e informação.

  • Oi Anildo,
    Dei uma olhado no seu blog, curiosa por entender um pouco mais sobre este sujeito que aos 50 e poucos(como menciona), se diz no jardim de infância como produtor cultural. Esta sua disposição num momento em que o cidadão quer mais é sonhar com uma aposentadoria, me parece um bom exemplo de uma outra realidade que começa a se desenhar por aí. A realidade de vidas criativas, vidas que querem sempre mais e por isso avançam em busca de uma realização que é própria e intransferível. Uma realidade tão possível quanto aquela que está aí, instituída.

    Mas, como toda realidade que um dia foi 'apenas' imaginação, pra ‘vir a ser’ precisa da resistência e dedicação do sonhador. Precisa do seu investimento.

    O benefício da idade é o acúmulo da experiência - se usamos o conhecimento adquirido com sabedoria.
    Talvez, e aqui vai o pitaco de uma leiga-intuitiva. Talvez o que falte ao ‘tradicional’ mercado do samba e chorinho seja, ousadia criativa (cada um tem o poder de modular a sua).

    Pelo que vi no seu site você reune bastante informação sobre este universo do samba e choro, empreende, faz novas amizades, tem grande disposição empreendedora.

    Apesar de leiga quanto a matéria, nasci no Estácio, bairro carioca da boemia e do samba. Mas não me criei lá. A maior parte das pessoas gosta de música, é onde me encaixo. Não sou como você, um apaixonado. Prefiro, imagem e cheiro.

    Apenas ‘de fora’ posso sugerir, que o seu caminho já ultrapassou a fase do jardim de infância: informação você tem, espírito empreendedor idem. Então, que tal inovar e ampliar o mercado do chorinho? Eu particularmente agradereceria, pois prefiro ao samba. ;)

    'Brincadeira' a parte, é sempre muito inspirador ver quem busque empreender metendo a cara. Ainda que a quebre, é sempre mais digno do que aquele discurso muito comum da vítima que sai dando tiro pra todo lado. Uma pitada de consciência econômica e muita ousadia, podem dar em samba.

  • Andreaha San.

    O Choro tem mais que mercado, tem uma demanda extraordinária, o Samba então, nem se fala! É o maior de todos os mercados que envolvem o fazer cultural, tanto na forma direta como indireta.

    Um Choro, por exemplo, como o Carinhoso de Pixinguinha, durante sua longa história gerou uma receita inimaginável à industria fonográfica como leituras e releituras dentro e fora do país, além lógico de ser uma das obras mais executadas cotidianamente em espetáculos, casas noturnas, biroscas e becos. Todos devidamente aparelhados a servir alguma coisa que gere receita no momento da execução de Carinhoso e tantas outras maravilhas do repertório do choro, fora todo um universo que se move na indústria de instrumentos e acessórios.

    O Samba, esse então, é uma escola de economia cultural que ainda nos negamos reconhecer, preferindo buscar formas exóticas no exterior, ao invés de tentar entender todo um sistema econômico acionado com a batida dos nossos tambores.

    Fazer o quê? Queremos entender de economia cultural sem abandonar nossos preconceitos de classe social.

  • Pra fazer choro e samba no Brasil o incentivo tem que vir de dentro de cada um porque de fora o que temos? Pra começar choro e samba não dispõem do incentivo fiscal integral, só pela metade. Integral é pra música erudita....começamos bem?
    Depois, choro e samba a despeito de representar a música do país, tem o mesmo incentivo que qualquer música do mundo. Uma polca, um tango, jazz, um festival de rock internacional, o que seja, tem o mesmo incentivo fiscal para quem patrocinar.
    Será que nossos dirigentes estão tão entusiasmados assim com o choro e o samba? Não seria o caso de uma política cultural que realmente incentivasse essa nossa manifestação genuína de maneira diferenciada. O governo do PT não representa a chegada de uma nova perspectiva no Poder? Novos contingentes, novas políticas. Políticas de fomento para o samba e para o choro, de modo a multiplicar suas representações e ocupação no ambiente cultural. Política para deslanchar hegemonia, para competir, para sair dos guetos.

  • Carlos, sua colocação favorece à tantas variáveis.. Vou precisar me colocar, mas o foco é o Anildo.

    Claro, é indiscutível que o choro tem Mercado. Mas o atual Mercado não abrange o choro. Esta é a questão do Anildo, construir este Mercado mediante sua condição de pequeno produtor/prod. independente.

    O que é um produtor cultural fora da indústria? Quase nada. O produtor cultural independente é, em grande parte ainda, o próprio artista

    Conheço bem o percurso, apesar de atuarmos em áreas diferentes. Nós: Anildo, eu, e um mundo de gente que apenas, com dignidade deseja colocar o seu bloco na rua. E embora se possa reconsiderar posições, em princípio ninguém aqui quer fazer de seu bloco uma escola de samba, um mega-empreendimento. Que seja até grande se consistente, mas nunca global superficialmente.

    Como produzir cultura que não seja massiva e emplacar um grande negócio no sentido qualitativo? E ainda assim viável econômicamente. São questões para o Brasil se posicionar não apenas como nação defensora de sua cultura, mas como um espaço diferenciado, onde seja realmente possível a diversidade.

    Como sobreviver ao largo das políticas culturais cujo o histórico é de mediocridade? E que se hoje parecem melhoradas, apenas parecem. São rasteiras, enquanto poderiam revolucionar a educação se orientadas a refletir e trabalhar neste sentido.

    Há inconsistência numa filosofia que posiciona o artista ou o produtor cultural como pedinte. Pois são estes os agentes de transformação imprescindíveis à sociedade. Perde-se energia, tempo e vidas neste processo ainda aquém das possibilidades humanas. Não se compreende a função social dos agentes da cultura, a função social do artista, e isso é grave por que é a natureza do projeto assumido.

    O sistema deveria inverter-se. As empresas buscariam no banco de proposta do MInc projetos nos quais investir. Mas é necessária uma estratégia mais agressiva do nosso país pra fazer da produção cultural independente o movimento propício ao desenvolvimento humano que uma educação de massa ainda comprometida com o modelo progressista norte-americano, jamais poderia suprir (seu comprometimento não é segredo pra ninguém, não é com o ser humano, mas com a indústria).

    Assim uma sugestão seria que todo projeto apresentado, e credenciado pelo Governo, teria assegurada a subvenção. Difícil? Inviável? Absolutamente. Se conseguirem eliminar da cabeça o modelo atual. Se desta maneira começarmos a pensar, eliminando referências daninhas para que possamos construir sobre novas bases, rapidamente – com as mentes limpas – inúmeras possibilidades surgirão.

    Por que as novidades surgem dos jovens? Simplesmente por que eles possuem as cabeças frescas. Uma cabeça que se apega ao conhecimento que possui, entulha fácil o raciocío e começa a dar voltas, como se não tivesse mais opções. A juventude não é um mérito que se reduz a idade. A juventude é mérito do espírito, quanto mais aberto for, mais o conhecimento acumulado poderá fluir, contribuir e atuar no mundo. Afinal, este não pára.

    Um produtor cultural independente precisa ousar, ir além do lugar comum, das cercas que lhe impõe. Elas simplesmente não existem, são o lado negro de um imaginário infeliz.

    Assim, ele, produtor, se coloca como alguém que abre possibilidades culturais que significam verdadeiras clareiras na ‘mata fechada’ de mentes hereditariamente conduzidas. Mas sozinho não se faz nada. Por maior que seja a vontade que todos nós possuímos de produções dignas, há muita luta. Não é nada fácil ser diferente no sentido de promover esta realidade.

    São tempos para se refletir sobre novas filosofias não como quem sonha com utopias, mas como quem enfim tem consciência de que pode realizar seus sonhos. O mundo construído sobre valores desumanos está abalado, desnudo. Mas efetivamente ainda se move por intermédio das grandes corporações. O produtor cultural que faz e 'acontece' é produtor da grande indústria. De resto somos todos nós, pequenos produtores propensos ao ‘cercadinho’do imaginário infeliz, caso se abra mão das próprias realizações.

    Mas já se começa a enxergar a economia criativa, e um olhar apropriado sobre a mesma pode mudar a realidade. Um olhar como o de até então, que enxerga mais um ‘artigo de ocasião’, destitui da prática o sentido de uma economia realmente criativa. Assim se reproduzem os preconceitos e pouco se enxerga além do horizonte.

    Por isso penso que é preciso ousar ou ousar. Produzir cultura é um exercício que transcende a noção de indústria da produção de objetos. Seja o produto que for, inclusive gente. A verdadeira cultura resolveria o problema da educação, como sabemos.. E assim bela parte do problema existencial. Porém, o que temos ainda? O que mais se inventou no último século foram 'identidades' – inclusive a ausência das mesmas. Ora, identidade é uma invenção da sociedade! Ser humano de verdade é outra coisa. Mas num mundo de ‘perdição’ como o nosso, como identificar valores se não se pode reconhecer a si próprio?

    Produzir cultura de forma independente, hoje, significa trazer algo de novo, trazer de Si, como o Gil diz. De reproduções o mundo está cada vez mais farto. A consciência demora a emergir mas uma vez presente se estabelece. Não existe consciência retrógrada. Mas existe homem sem coragem, e pra este a sensação terrível de observar-se desperdiçando a própria existência.

  • Gil, você me perdoa mas ao responder ao Carlos fui mais fiel ao Anildo. Agora você me deu a oportunidade de, partindo da condição do produtor cultural, falar um pouco da natureza do artista. Acho que cabe, por que as nossas atuações se embrenham mas também por que é necessário falar de resistência.

    Eu pessoalmente já cansei de ser produtora e artista nessa infelicidade que é a – ainda – cegueira cultural de nosso país. Existe hoje um papo de que artista precisa ser de tudo um pouco. Desrespeito e ignorância em relação ao mesmo, ou ainda é aquele olhar típico de quem pegou o barco no meio da jornada, é jovem demais e pensa que o mundo se reduz a sua compreensão (não estou falando de faixa etária, o que mais adiante deve ficar claro). Compreender o próprio meio, agir por ele, eventualmente assumir atuações distintas, trocar com seus parceiros em função das diretrizes do negócio, é necessário, faz parte. Tocar o barco inteiro dividindo-se em várias funções é uma história infeliz sem cabimento. Nos primeiros anos pós faculdade ou de trabalho, é até mesmo aconselhável uma jornada como esta, onde se desenvolve a consciência macro do negócio. Mas é dedicar a vida à esta prática e o artista morre para dar espaço ao produtor, ao empresário.

    Produzi todos os meus projetos autorais na Europa, exceto o último, Eva Além Paraíso, que aconteceu ano passado em guadaloupe, caribe francês. Uma produção da associação cultural francesa para arte contemporânea, Artocarpe. Naturalmente foi o meu trabalho de maior produtividade.

    Gosto de viajar e de produzir fora. Mas sinto falta de desenvolver esta faceta autoral em meu país. Caso contrário não estaria mais aqui, não resistiria tanto. É cansativa esta nossa realidade. Enquanto lá fora tive, respeito, seriedade, consideração, admiração e subvenção que não existe por aqui - ainda que disputando com artistas locais. É um alívio existencial conviver com tal possibilidade.

    As associações culturais francesas existem aos montes, e qualquer francês pode abrir uma sem custos praticamente, e funcionar como empresa. A apartir do que aprendi lá fora nos últimos 8 anos, vislumbro alternativas para que possa desenvolver me aqui independente do atraso de nossas políticas.

    Acredito que os produtores culturais sejam fundamentais se forem além do conhecimento de sua especialidade, a produção em si. Se alinhavarem-se com os artistas através de ‘estratégias criativas’, com as quais se possa ampliar os espaços e meios de produzir e manifestar cultura. É um blábláblá próprio da econ. criativa, prática que em parte fiz uso no exterior. Aplicada aqui e agora, aproveitando-se de um momento propício de aparente ‘desejo de fazer’ diferenciado, mas uma realidade ainda sofrível, só vendo no que dá.

    Em 2004 recebi uma subvenção de uma instituição ligada a música, a Frank Ténot, com o apoio da Unesco, pra terminar de desenvolver , ‘Brinquedos’ na França. Um proj de pintura contemp. iniciado no Brasil, sobre o imaginário de minha infância. O comitê brasileiro do programa do ano do Brasil na frança ignorou o meu projeto. Eu e a ‘torcida do flamengo’(outros colegas mais talentosos do que eu ), mesmo tendo atuações despojadas sem qualquer vínculo institucional nacional (naquele momento eu tinha apenas o apoio da Unesco que levou a subv.), fomos sumariamente ignorados por este comitê.

    Eu precisava de outra subvenção pra expor o resultado de Brinquedos na França em 2005 e seguir também pra bienal de cerveira em Portugal e espanha. O projeto recusado pelo comitê brasileiro, o comitê francês lá na França não titubeou em assinar embaixo. E daí naturalmente as portas se abriram, a mídia se envolveu com o projeto que se espraiou por colégios através das oficinas que propus. A individual de Brinquedos foi produzida no sul da França. Um projeto Brasil-França em que o meu país não reconheceu o valor daquela manifestação. Das obras em si ao movimento cultural que rapidamente foi se constituindo a partir da mesma e efetivamente introduzia a arte na educação como agente de reflexão. A França arcou com 75% dos custos.

    Convidei um estudioso de chorinho na época fazendo mestrado, para que fizessem um duo com um pianista francês, na abertura de minha exposição. Primeiro por que adoro o som deles, segundo por que alinhavava toda a proposta. O que recebi através de apoio e subvenção pôde desta maneira ser compartihado.

    Gil, eu compreendo bem quando você menciona a questão do incentivo integral à música erudita e a falta do mesmo ao samba, é um disparate próprio da política deste país que ousa nos representar investindo no que não somos.

    Apesar de não ser vinculada a qualquer instituição(o que é fatal para um artista hoje em dia), levando em conta o parto que é sobreviver sem uma ‘grife institucional’, ainda assim prefiro autonomia e parcerias, desburocratização dos processos e fim de intermediações. Tratamento direto.

    Acredito que a reflexão sobre a função social do artista poderia esclarecer não apenas a sua natureza transformadora, mas especialmente a sua inerência humana. Sob um prisma humano, artista somos todos nós, mesmo. Ou alguém duvida que é o agente criador da própria vida? Não menciono técnica - técnica é prática orientada ao objeto. Criação artística vem antes de tudo, é a inspiração. Inspiração é prática orientada ao saber ser o que se é de fato. Enquanto artistas, menciono aquela faceta do espírito onde inspiração torna-se opção e modo de vida. É o que nos define e coloca o mundo em movimento.

    A importância da produção cultural independente está na promoção de outras realidades. A cultura artística promove reflexão enquanto instiga ao ‘diálogo interior’, provoca questionamento, atitude pouco usual a nível nacional. Prefere-se ‘adotar’ um formador de opinião qualquer e reproduzir palavras alheias aos próprios sentidos.

    Enfim, a cultura artística, por si só educa e fundamenta a consciência. Promove, ainda que inconscientemente, o espírito criador. Quando é que vamos deixar de apenas mencionar o valor da subjetividade, e partir para a sua aliança com a consciência?

    Não é de se estranhar que num mundo de condicionamentos, depressões que acusam uma vida sem sentido, a maior parte das pessoas (político também é pessoa) insiste em eliminar a arte que há em si, desconsiderando o artista no geral. Desconsiderando a arte que dá sentido à vida.

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