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Caminhos para a exportação da música

Qual a presença que a música brasileira tem no exterior hoje em dia? Qual a maior dificuldade que os músicos encontram para se apresentar fora do país? É melhor lançar um disco ou fazer show primeiro? Falta apoio, público e privado, para a internacionalização da música?

Essas foram algumas das questões que permearam o bate-papo promovido pela Casa do Núcleo, do músico e pesquisador Benjamim Taubkin, e o site Uia Diário, na última quarta-feira (25/6), em São Paulo. O encontro fez parte de uma série de conversas sobre música, que acontece mensalmente desde o ano passado.

Os convidados da vez foram David McLoughlin, consultor internacional da BM&A (Brasil Música e Artes) e do projeto BME (Brasil Music Exchange); Fernando Grecco, fundador e diretor da produtora e gravadora Borandá; e o guitarrista Douglas Lora, do Brasil Guitar Duo.

Para McLoughlin, a participação brasileira no exterior está cada vez menor, por dois motivos em especial: primeiro porque os músicos e produtores estão precisando sobreviver aqui mesmo no Brasil e precisam focar a energia; segundo, e também como uma consequência do anterior, os produtores e as rádios estrangeiras não estão recebendo o material brasileiro.

“Não existem mais as redes de contatos internacionais. Tem muito produtor independente lutando para pagar as contas aqui, então não tem tempo nem energia para pesquisar quem são os produtores e radialistas para quem possa entregar suas músicas lá fora.”

Segundo ele, em geral, o público internacional conhece muito pouco a música brasileira que está sendo feita hoje. “A namorada do Sheldon, em Big Bang Theory, toca Garota de Ipanema na harpa”, brincou ele, indicando que é preciso investir em divulgação, inclusive trazendo jornalistas para o Brasil.

Grecco acredita que a música brasileira já esteve mais em evidência. Do ponto de vista de mercado, a indústria da música, que funcionava até 15 anos atrás, acabava investindo mais na divulgação dos artistas. Hoje em dia o próprio artista é quem faz o seu marketing. “Nas feiras que participei, percebi que para conseguir fazer uma turnê internacional é preciso ter um agente, um booking agent. E para o agente se interessar pelo artista e fechar os shows, ele tem que conhecer a música, gostar e ver oportunidade”, afirmou.

Além de apresentar a música para os festivais, o agente, disse Grecco, traz uma certa confiança para quem está contratando. “Parece que tem muita música, mas não existem formadores de opinião que elegem os 50 ou 100 artistas que representam a música no Brasil hoje.”

Outra dificuldade é o fato de não existir um circuito de festivais organizado no Brasil, que sirva como vitrine para os nossos artistas. “Existem oportunidades, dá pra fazer coisas, mas ainda acho prematuro ver isso como negócio. Vi vários artistas tendo sucesso se a ideia era ter a experiência de tocar fora, e conseguindo bancar suas turnês ou apresentações em feiras.”

Douglas Lora contou da experiência de tocar em cidades do Texas (EUA), por exemplo, onde senhoras mecenas se organizam e bancam os shows. Foi assim que ele tocou muitas vezes lá e identificou um interesse pela cultura brasileira em geral, não por um artista em específico.

Para o guitarrista, a propaganda boca-a-boca ainda é o que mais funciona. Por isso é preciso ser profissional, fazer o trabalho direito e ter CD para vender, porque isso se espalha. “É possível fazer funcionar, a partir da meritocracia. Se fizer o trabalho direito, a coisa acontece.”

Desafios – Paciência e perseverança são os principais desafios a serem enfrentados por um músico que queira fazer carreira internacional, segundo Grecco. “Porque é uma escolha de vida. Não existe uma fórmula, mas é preciso conhecer as pessoas e apresentar a música ao vivo”, indicou o empresário.

Outra dificuldade é a logística. Muitas vezes a apresentação fica condicionada a sair ou não as passagens da equipe pelo edital do Ministério da Cultura. O ideal, segundo ele, seria conseguir fechar várias apresentações para aproveitar uma mesma viagem, por exemplo. “Mas brasileiro tem dificuldade de se planejar a médio e longo prazo e perde algumas oportunidades e experiências.”

Para McLoughlin, o principal problema é a falta de informação, sobre as casas e os jornalistas de outros países, que podem ajudar a fazer mais shows. A informação existe, como guia online de casas na França, por exemplo, ou guias sobre como planejar uma turnê, mas é tudo em inglês, e muitas vezes o brasileiro não consegue o acesso.

Na falta de organização, planejamento e presença, pouca gente consegue fazer uma carreira internacional de fato, como lembrou Benjamim Taubkin. “Às vezes o artista faz turnê fora, mas não consegue se consolidar nesse mercado, porque tem gente de todo o mundo concorrendo. Tem que ter talento para aguentar o que às vezes é disponibilizado, como hotéis ruins. Tem que ter bom humor.”

Apoio – Alguns países, como Austrália e Canadá, apoiam seus artistas para se apresentar em festivais e feiras internacionais, mas também para estruturar melhor suas carreiras, disse McLoughlin. Mais do que editais, disse ele, seria importante ter um agência brasileira em outros países.

Grecco concorda e citou agências da França e da Inglaterra que estão no Brasil e ajudam a trazer artistas de seus países. “Mas é uma estratégia, um projeto de país. O British Council começou há décadas, para difundir o ensino da língua inglesa, e hoje eles têm um escritório enorme aqui e fomentam o intercâmbio cultural”, exemplificou.”Entrar em circuito comercial, bombar em rádio, não é mais o caminho. É preciso pensar a longo prazo.”

Nesse sentido, Lora lembrou que nos EUA todo concerto tem uma atividade de educação musical relacionada que é apresentada à comunidade. “O governo e as empresas se interessam mais em desenvolver isso”, afirmou.

Para Taubkin, muitas vezes a solução é estar presente nos lugares, para identificar as oportunidades. “Por isso um escritório brasileiro em outros países ajudaria muito”, acredita ele. No entanto, para McLoughlin, o setor de música deve cuidar disso. “Nos outros países é assim. Não se pode depender do governo.”

Clique aqui para ver a íntegra do bate-papo.

*De 25 a 28 de agosto acontece no Cemec, em São Paulo, o curso Mercado Internacional da Música, apresentado por Cultura e Mercado, com coordenação da BM&A. Clique aqui para ver o programa.

Mônica Herculano

Jornalista, foi diretora de conteúdo e editora do Cultura e Mercado de 2011 a 2016.

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