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Coletivo cultural, economia criativa e rock independente

Quem faz cultura hoje no Brasil? Quem está produzindo? Como? Mecenato? Patrocínio? Como é que se vira o empreendedor cultural? Quais são as alternativas possíveis para sobreviver e fazer cultura?

São tantas perguntas, que nos fazem a criar uma série de matérias, traçando o perfil de dessas pessoas. E para começar, vamos contar a história de Letz, uma garota de 25 anos que faz cultura em Campo Grande, MS.

Bigornada toda noite

Campo Grande é a capital de Mato Grosso do Sul, estado do Pantanal da biodiversidade e terra de agronegócio (até parece texto de assessoria), onde existem mais cabeças de gados do que pessoas (é sério).

É uma terra fértil, em que as pessoas têm sede de produção cultural, apesar das políticas culturais locais não corresponderem. Nos últimos quatro anos, os festivais organizados pelo estado foram sucateados.

Lá o que não falta é balada de sertanejo “universitário”, mas em contraposição, faz um tempo que a cena rocker vem crescendo muito, com direito a bandas de verdade e shows quase todos os dias da semana. É uma cena efervescente que hoje encabeça a discussão dos rumos da cultura e formação de público no estado. E é daí que conhecemos esta garota.

Ela é Letícia Spindola, conhecida como Letz, tem 25 anos e trabalha desde os 15 anos com produção de shows de rock. Figura importante para esta cena. Carismática, tatuada e sempre na correria, começou produzindo a Sexta do barulho, onde bandas de punk rock, hard core e metal reuniam a gurizada, que pagava 3 reais para assistir.

Mas de onde veio isso Letícia?

“É mó papo jacaré falar que eu sempre senti que não ia fazer as coisas do jeito normal como todo mundo, mas é verdade. Até eu saber que produção cultural era uma segmento viável, eu queria ser jornalista musical, ou algo assim. Comecei sem compromisos, porque era legal fazer show para as bandas dos meus amigos tocar. Depois e a gente começou a fazer shows mariores, com bandas de fora”, conta.

Letícia sempre buscou uma alternativa para agitar a noite da cidade, criar público, trazer bandas de fora, pra isso não economizou esforços, “acreditamos muito nas leis de incentivo, mas ainda não nos utilizamos de nenhuma, mas a pegada é essa, esperamos conseguir nos apoiar nessas leis pra produzir nossas ações. Mas não ficamos esperando isso acontecer, a gente chama da geração chega de chororô. Ser independente é isso, muita gente critica quem se diz independente mas recebe patrocínio, mas essa visão está errada. Ser independente é fazer rolar independente de patrocínio, ajuda ou apoio.”

Um bar, um festival e um coletivo

Ela é a cabeça de um coletivo chamado Bigorna, que começou como uma produtora de eventos há quatro anos, “eu tinha um sócio que saiu da produtora pra trabalhar com teatro e meus amigos foram me ajudando, depois de muito pensar e muto papo com o Fora do Eixo, há dois anos nos tornamos um coletivo.”

O Fora do Eixo, que ela se refere, é uma rede integrada de coletivos, mais de 50 no Brasil. “Lá a gente trabalha em rede com ações nacionais. Utilizamos um jargão do software livre, quando dizemos que é tudo código aberto, porque é tudo compartilhado, tecnologia e conhecimento”, afirma.

Esta mudança de conceito fortaleceu o movimento do rock independente no Brasil. Com mais expressão conseguem emplacar algumas bandas no mainstream, mas principalmente, conseguem discutir e subverter a ordem.

Economia solidária

Antes levar uma banda de fora para Campo Grande era mais difícil. “Há oito anos, eram sempre os mesmos produtores, nas mesmas cidades, hoje a gente já tem uma outra pegada, conseguimos chegar em cidades que nunca imaginávamos, temos gente produzindo e banda legal tocando. Se antes as opções eram ir tocar em São Paulo, Goiânia e Cuiabá, hoje podemos tocar no Macapá em um final de semana, e no outro estar em Santa Maria”, afirma Letz.

Nessa relação, hoje os produtores de cultura de rock tem mais claro que uma banda não tocou ‘de graça’ em outra cidade. Aquele show que ela fez e tirou do bolso pra ir tocar, vale como serviço, “desta forma esta banda pode cobrar que a banda que produziu o show deles lá, venha tocar de graça aqui também. A troca de serviços que está na base dos trabalhos do fora do eixo com economia solidária. Nossa mão-de-obra, é uma moeda e que a gente troca o tempo todo.”

O palco

Em 2010, Letz montou um bar. O Voodoo é um bar, de paredes pretas, sofás vermelhos e cerveja barata. Tem o palco no canto direito, assim todos que estão no bar conseguem ver a banda que se apresenta. Toda noite tem um tipo de som, uma banda local, com músicas próprias tocando.

Ela considera o bar estratégico, pois viabiliza as produções da Bigorna e a movimentação cultural em Campo Grande, “se desamarrar da agenda e negociações de donos de bar já é um alivio, isso contou muito também”. Para investir no bar, Letz fez um empréstimo bancário, na coragem e as coisas têm dado certo “dentro do que a gente planejou tem sido bom, estamos tendo retorno do público.” Além disso, Bigorna também produz o festival Fogo no Cerrado, que discute políticas e rumos da produção local, que neste ano vai para a sua quarta edição.

“Conseguimos nos entender como agentes culturais, entender nosso papel dentro da sociedade e conseguir produzir independente de ajuda ou não. O trabalho nunca pára, mas vão chegando mais aliados e a prática também ajuda. Uma coisa que a gente sempre brinca é que rola um estereótipo de que quem trabalha com cultura é meio vagabundo é porque não gosta de trabalhar de verdade mas eu to pra conhecer negada que trampa mais do que a gente, é 24 horas por dia pensando cultura”, encerra a jovem produtora underground.

Para conhecer mais sobre o coletivo e a cena de Mato Grosso do Sul, acesse s://bigornaproducoes.com/ e s://bigornaproducoes.blogspot.com/

Letz Spindola faz cultura.

Luana Schabib

Repórter. Escreve sobre pessoas, convergência e cultura.

View Comments

  • Além de ser muito foda perceber a descentralização do cenário independente - que é o de qualidade hoje - a associação com economia solidária empolga muito por se dissociar desde a base dos grandes empresários!

    Foda, quero conhecer essa Leticia, to com um otimismo do caralho depois de ler essa

  • A letz sempre adicionou o que tinha para esta cena em que todos reclamam e não fazem nada.
    Eu tenho que tirar o chápeu para ela e tentar bater palmas ao mesmo tempo, pois ela merece.

    Ótima matéria :)

  • Esse é o caminho! De 2005 a 2010 passaram de 5 a 50 coletivos, já temos mais de 70 e aposto que em outros cinco anos não vão ser menos de 200. Povo tem muito a aprender com a lógica dessa galera aí.

  • Essa moça serve de parâmetro para aqueles que reclamam e dizem que é impossível o mercado cultural sobreviver sem lei de incentivo, em tudo o Estado tem que dar subsídios , ou seja, só sabem reclamar e criticar, que a lei precisa mudar, que o mecanismo não funciona, etc...
    O que dizer de alguém que faz o mercado cultural funcionar com capital de risco e nem grande empresário é ? (COMO DEVERIA SER)

    IMAGINA, SE UM EXEMPLO COMO ESSE MOSTRA ESSA POSSIBILIDADE , SE TIVÉSSEMOS UMA LEI DE INCENTIVO QUE DESSE APENAS RECURSOS PARA QUEM PRECISASSE DE VERDADE, GARANTINDO EFICIÊNCIA A MÉDIO PRAZO NO MERCADO.
    MAS TEM ESSES CHATOS E QUE QUEREM GANHAR SEM ARRISCAR...........

    "Para investir no bar, Letz fez um empréstimo bancário, na coragem e as coisas têm dado certo “dentro do que a gente planejou tem sido bom, estamos tendo retorno do público.” Além disso, Bigorna também produz o festival Fogo no Cerrado, que discute políticas e rumos da produção local, que neste ano vai para a sua quarta edição"

    PAREM DE RECLAMAR SEUS CHATOS...OU PELOS MENOS DÊEM SOLUÇÕES PARA O FINANCIAMENTO EM VEZ DE SÓ APONTAR AS FALHAS..

  • Ficou muito massa a reportagem! Deu pra sacar que é bem possível trabalhar com cultura autoral, independente, obviamente fazendo um planejamento a médio prazo.

    Parabéns!
    (adorei a foto)

  • Ótima reportagem!
    essas revistas e meios de comunicação em geral rotulados de 'cult' insistem tanto nesse assunto mas ficam sempre no mesmo eixo, com os mesmos entrevistados, mesmos artistas "alternativos" cheios de patrocínio e apoio.

    Uma pegada incrível da jornalista. Parabéns!

  • eae galéra blz?
    espéro que sim!!!
    venho por meio deste super veiculo de comunicação rockeira,deixar o link das minhas musicas próprias para vcs baixarem e ou ouvi-las
    em tempo real,Também é uma super oportunidade pra quem tem um som próprio e quer divulga-lo ao entrar no site é só se cadastrar e fazer um perfil de artista ou banda e divulgar seu som próprio em mp3 blz?
    grande abraço e obrigado aos organizadores deste super site pela oportunidade de poder comentar e divulgar o Rock n' Roll
    ai vai o link
    sss://bandasdegaragem.uol.com.br/banda/gesnerlascasas/musicas

  • Então está combinado, vamos para o Brasil...quer dizer, vamos para Mato Grosso, lá é o Brasil...fora de lá é melhor esquecer...Rio, São Paulo, BH, POA, que se danem, são inúteis, só servem aos estrangeiros, a cena é para importados...mas tem o Brasil e já podemos, vamos então...fazer as malas e ir onde há "cena"brasileira...Onde mais? Onde mais? nesse rincão, onde mais? Cadê? Cadê?...vamos então descobrir o Brasil porque onde moram metade da população é terra ocupada...

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