De um modo ou de outro sempre venho apontando questões como investimento na Cultura e Sustentabilidade Ambiental como prioridades e desafios econômicos do futuro Brasil (digamos futuro desta maneira, em minúsculas, para garantir que não estou falando do “país do futuro” ou de futuro como uma coisa tecnológica, robótica ou coisa parecida). Este futuro a que me refiro é o daqui a pouco, aquele que está ali na próxima curva da História, dependendo de nós mesmos a velocidade – a marcha engatada – com que entraremos nela. Mas, vejamos os dados e ponderações seguintes:
O artigo 6º da Constituição de 88, no que diz respeito aos Direitos Sociais tem a seguinte redação:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Esta redação assim foi expressa pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010 (incluiu alimentação).
A Educação por sua vez também figura como Direito Cultural (ver artigos de 205 a 214) sendo expressamente garantido o acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um o que significa a garantia de alfabetização para as artes e educação para a prática artística, que tenho citado como os principais entraves para o consumo da chamada Cultura erudita, somado à falta de acesso a programas específicos de formação.
Os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos. Estão indicados no artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), e nos artigos 13 e 15 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966).
Assim, todas as pessoas devem poder se exprimir, criar e difundir seus trabalhos no idioma de sua preferência e, em particular, na língua materna; todas as pessoas têm o direito a uma educação e uma formação de qualidade que respeitem plenamente a sua identidade cultural; todas as pessoas devem poder participar da vida cultural de sua escolha e exercer suas próprias práticas culturais, desfrutar o progresso científico e suas aplicações, beneficiar-se da proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de toda a produção científica, literária ou artística de que sejam autoras.
Em 1988, é assinado o protocolo de São Salvador (Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre os Direitos Humanos) sendo franqueados os Direitos Culturais. Em novembro de 2001, a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural é adotada pela UNESCO. Podemos lembrar ainda Genebra em 2003 e a Plataforma de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais de 2004, na cidade de Recife.
É recente, portanto, constar da agenda dos países desenvolvidos a proteção ao Meio Ambiente e a inserção dos Direitos Culturais como Direitos Humanos Universais.
Os Direitos Culturais relacionam-se à especificidades culturais de cada indivíduo ou comunidade, sendo-lhe (s) garantido o direito de manifestação plural dos seus interesses.
A abrangência deste tema relaciona-se diretamente com o que acabamos de presenciar no nosso cenário político. Até poucos dias, não se daria crédito a quem disse que Meio Ambiente seria um aspecto decisivo para a existência de um segundo turno nas eleições brasileiras. Mesmo porque, pesquisas (IBGE) indicam que Cultura, Meio Ambiente e Taxa de Juros estão entre os assuntos que menos interessam aos brasileiros.
No entanto, em linha com o que tenho escrito reiteradas vezes, Sustentabilidade Ambiental e Cultura são questões extremamente presentes na Sociedade Brasileira de um modo ou de outro.
Mesmo que muita gente insista em não considerá-las como necessidades primárias comparando Cultura e Sustentabilidade Ambiental às profundas desigualdades, ao perverso cenário de desenvolvimento com juros estratosféricos, à ainda má distribuição de renda, aos déficits em saúde, educação, habitação etc. na ponta, para o cidadão não é bem assim.
Considerando que os discursos comuns dos candidatos já asseguram uma razoável continuidade de melhorias, na medida em que o individuo se propõe a decidir caminhos, a fazer escolhas sobre o melhor cenário para sua sobrevivência e de seus filhos, Meio Ambiente e Cultura, quando apresentados com qualidade, são fortes fatores de motivação.
Exemplos disto são a forte presença de pessoas de todas as classes sociais nos concertos sinfônicos, a opção por espetáculos de boa qualidade e o consumo de bens culturais diversos quando lhes é dada a possibilidade de acesso.
A nítida força da candidata Marina Silva apareceu no que se chamou a onda verde, unindo o discurso da Sustentabilidade Ambiental e do Planejamento com visão de futuro. Duas questões intimamente ligadas.
Isto foi o suficiente para ajudar a mudar a realidade das eleições, ou pelo menos foi o diferencial sensível para a nova etapa.
Em minha opinião, é obrigatório que a Cultura componha a pauta para o segundo turno. Esta precisa se tornar uma questão de base, somando-se ao conjunto de idéias dos candidatos como o que de fato poderá indicar diferenças de posicionamento (e de resultados) nos próximos dias.
Com apenas avanços pontuais, a Cultura no Brasil tornou-se um buraco negro e exigirá soluções rápidas e objetivas do próximo Governo Federal. A produção cultural responde hoje por algo em torno de 6% do PIB. Visto desta maneira, estamos falando de um volume enorme de recursos. Este número torna-se conservador se lembramos que a atividade cultural no Brasil é esquálida, dependente de um sistema de financiamento sem nenhum aperfeiçoamento sensível nos últimos 8 anos, com problemas nas diversas áreas, sem políticas e, em decorrência, sem programas que contemplem a generalidade do fazer cultura. Para não ser injusto, onde há resultado é muito pouco e, na área das artes eruditas, em particular da música e da ópera, não houve avanços – nada de relevo que de fato se possa considerar como atividade estruturante e pensada para o futuro.
Repito. Aí está um bom mote para o segundo turno. Respostas nesta matéria podem auxiliar efetivamente a qualificar os programas de interesse público.
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Até o momento Cultura não foi objeto de discussão nos debates abertos nesta campanha eleitoral. E acredito que não dá para falar de cultura sem falar de educação e vice-e-versa. Uma está dentro da outra. Estamos no momento numa discussão sobre Cultura e incentivo cultural no Estado de SP por um grupo de produtores culturais do Estado.
O Estado por sua vez colabora e omite da mesma forma. A mobilização ainda é pequena, mas significativa. Queremos estabelecer melhores condições através da lei de incentivo estadual (SP) e a viabilização mais efetiva de uma quantidade maior de projetos.
Onde andam os governantes nessa hora?
Cabe-nos propor e cobrar.
Estamos tentando!
O manifesto dos intelectuais
Enviado por luisnassif, ter, 12/10/2010 - 10:02
'Artistas e intelectuais organizam manifesto pró-DilmaTexto assinado por Leonardo Boff e Chico Buarque convoca artistas 'a somarem forças para garantir os avanços' do governo Lula
Flavia Salme, iG Rio de Janeiro | 11/10/2010 21:21 - Atualizada às 21:30
À NAÇÃO
Em uma democracia nenhum poder é soberano.
Soberano é o povo.
É esse povo – o povo brasileiro – que irá expressar sua vontade soberana no próximo dia 3 de outubro, elegendo seu novo Presidente e 27 Governadores, renovando toda a Câmara de Deputados, Assembléias Legislativas e dois terços do Senado Federal.
Antevendo um desastre eleitoral, setores da oposição têm buscado minimizar sua derrota, desqualificando a vitória que se anuncia dos candidatos da coalizão Para o Brasil Seguir Mudando, encabeçada por Dilma Rousseff.
Em suas manifestações ecoam as campanhas dos anos 50 contra Getúlio Vargas e os argumentos que prepararam o Golpe de 1964. Não faltam críticas ao “populismo”, aos movimentos sociais, que apresentam como “aparelhados pelo Estado”, ou à ameaça de uma “República Sindicalista”, tantas vezes repetida em décadas passadas para justificar aventuras autoritárias.
O Presidente Lula e seu Governo beneficiam-se de ampla aprovação da sociedade brasileira. Inconformados com esse apoio, uma minoria com acesso aos meios, busca desqualificar esse povo, apresentando-o como “ignorante”, “anestesiado” ou “comprado pelas esmolas” dos programas sociais.
Desacostumados com uma sociedade de direitos, confunde-na sempre com uma sociedade de favores e prebendas.
O manto da democracia e do Estado de Direito com o qual pretendem encobrir seu conservadorismo não é capaz de ocultar a plumagem de uma Casa Grande inconformada com a emergência da Senzala na vida social e política do país nos últimos anos. A velha e reacionária UDN reaparece “sob nova direção”.
Em nome da liberdade de imprensa querem suprimir a liberdade de expressão. A imprensa pode criticar, mas não quer ser criticada.
É profundamente anti-democrático – totalitário mesmo – caracterizar qualquer crítica à imprensa como uma ameaça à liberdade de imprensa. Os meios de comunicação exerceram, nestes últimos oito anos, sua atividade sem nenhuma restrição por parte do Governo. Mesmo quando acusaram sem provas.
Ou quando enxovalharam homens e mulheres sem oferecer-lhes direito de resposta. Ou, ainda, quando invadiram a privacidade e a família do próprio Presidente da República.
A oposição está colhendo o que plantou nestes últimos anos. Sua inconformidade com o êxito do Governo Lula, levou-a à perplexidade. Sua incapacidade de oferecer à sociedade brasileira um projeto alternativo de Nação, confinou-a no gueto de um conservadorismo ressentido e arrogante. O Brasil passou por uma grande transformação.
Retomou o crescimento. Distribuiu renda. Conseguiu combinar esses dois processos com a estabilidade macroeconômica e com a redução da vulnerabilidade externa. E – o que é mais importante – fez tudo isso com expansão da democracia e com uma presença soberana no mundo.
Ninguém nos afastará desse caminho. Viva o povo brasileiro.
Caro Carlos Henrique
Não se trata mais de garantir os avanços do Governo Lula. Em menos de dois meses, acabou... No que avançou excelente, mas... acabou. O que devemos debater é como serão os avanços futuros, quais serão as frentes de diálogo e debate que enfrentaremos a partir de primeiro de janeiro. Qualquer indivíduo esclarecido e bem intencionado sabe que tanto com José Serra ou com Dilma Rousseff o pais continuará avançando por força da qualidade do seu povo, dos seus artistas, pensadores. A decisão sobre um ou outro é uma questão de afinidade pessoal ou partidária. Da mesma maneira que o Lula manteve políticas do Governo FHC inclusive as bases do bolsa família entre outros programas, certamente o próximo presidente (ou "a") manterá as coisas boas do governo passado (Lula) aperfeiçoando-as, substituindo por iniciativas de melhor porte e peso. A questão é apenas política e o entendimento de quem possui maior visão de longo prazo e quem terá melhores condições de conduzir estes rumos. No artigo em questão a discussão é sobre Cultura. Certamente há aqueles que se sentem mais à vontade neste ou naquele governo por afinidades inúmeras. Mas esta é uma questão, no meu modo de ver, prioritária uma vez que entendo ser a Cultura uma atividade acima de cores políticas. A Cultura não está a serviço da política, mas o inverso.
A questão cultural no Brasil se divide em duas frentes. A primeira trata de como a sociedade vai enfrentar a presença avassaladora do produto cultural estrangeiro que domina os meios e a expressão nos grandes centros e na grande midia. A segunda trata de que maneira vamos nos inserir na Nova Cultura e com isso viabilizar a produção de riqueza no novo meio de circulação da cultura decorrente do avanço tecnológico. Responder a essas questões é a prioridade nacional.
Caro Gil,
A seu comentário sugere outro artigo.
De fato, o produto cultural estrangeiro tem grande força na grande mídia, como você salienta. Por outro lado, as fronteiras da produção cultural extrapolam os limites físicos do país e precisamos - nós criadores - aprender a enxergar de forma abrangente os supostos "mercados". Há uma mudança em curso de inimagináveis perspectivas. Em minha opinião o Brasil está atrasado nesta matéria, entrando tarde na discussão, muito embora muita gente boa esteja conversando a respeito de forma intensa. O novo governo precisa criar mecanismos para apoiar estas iniciativas, ampliando o que vem sendo feito até aqui, aperfeiçoando os mecanismos de suporte.
A maior dificuldade da Cultura reside no seu financiamento. Pouco avançamos nestes ultimos anos. A Cultura erudita, especialmente a ópera - minha área de ação - padece da falta de programas estruturantes, de uma política clara com programas adequados para uma visão nacional. Isto acontece em outras áreas. Não devemos ser ingênuos e imaginar que o país está parado nesta área. Pelo contrário, principalmente nos últimos 2 anos, vimos um esforço enome para a apresentação de idéias, de projetos, propostas. Pouco se materializou. Melhor dizendo o que materializou é muito pouco para o potencial que poderíamos ter instalado. Mas esta é uma dinâmica natural de uma área como a nossa em constante vibração. Temos que buscar mecanismos urgentes para concretizar soluções.
"nunca imaginei que o Serra pudesse reunir em torno de sua candidatura tantas forças reacionárias"
(Ricardo Carneiro, economista e professor da Unicamp, à Carta Maior)
Lamento não ter entendido o seu interesse com a citação. Talvez possa possa expor melhor o que você pensa. A frase do professor Carneiro pode ser lida sob várias formas. O que você pensa a respeito? Como você percebe as perspectivas para a Cultura - e por ampliação - para as áreas criativas no Brasil? Considerando que no primeiro turno das eleições a maior parte da população através do voto, demonstrou sua insatisfação com o modelo de governo que aí está, uma vez que optou por outras vias que lhe pudessem satisfazer melhor, o que é natural no processo democrático, como você vê o modelo de governo que o país deseja? Que tipo de recado, na sua opinião as urnas deram aos candidatos no primeiro turno. Qualquer que seja a escolha agora, quais as necessidades, como o candidato eleito ´deverá aperfeiçoar os modelos existente? O que deverá ser novo?
Considerando as necessidades planetárias, de que maneira o Brasil deve se inserir nestes parâmetros à luz da Cultura?
Vamos lá. Ajude a ampliar este de debate com as suas próprias opiniões;
Considerando o primeiro turno a candidata do governo ganhou e com 47 milhões de votos. Foi isso? Agora, o que seriam as necessidades planetárias? Talvez o BOPE tenha utilizado esses argumentos para tomar o Macaco, será? O SWU teve mesmo a ver com essas tais necessidades planetárias? E o Tropa de Elite? Quando o papo fica muito planetário os patrícios deizem logo: ...bolinha rente a relva...é sabedoria...
Caro Gil,
Por um erro de postagem não enviei antes a resposta a seu comentário. Desculpas à parte, vamos lá.
Sempre procuro reconhecer as leituras possíveis de toda informação, uma vez que nossas fontes são as mais diversas possíveis. Da mesma maneira que o governo "ganhou" com 47 milhões, também "perdeu" com os mais de 50 milhões de eleitores que rejeitaram as propostas e o modelo proposto até aqui. Não é interessante olhar sob os dois pontos de vista? Derrotado o governo, temos um segundo turno onde os eleitores indicarão o novo presidente (o que poderia ser aclamação, agora é indicação do representante das forças sociais que melhor compõem o espelho da população). O recado está dado e o eleito (ou "a") terá que mudar os resultados. Vejamos na Cultura. As questões essenciais e aqui me refiro fundamentalmente às formas de financiamento da atividade cultural não tiveram avanço significativo nos últimos 8 anos. A indagação do texto proposto aqui é exatamente esta: o que o próximo presidente indicado pelas urnas fará nesta matéria, o que pretendemos? Na Cultura erudita - abandonada no governo que acabou, tem caráter estratégico na formação do cidadão e temos a obrigação de trabalhar para que seja favorecido o acesso através de políticas estruturantes do segmento e programas de longo alcance.
Quanto às tais necessidades planetárias, não podemos esquecer que há uma indústria cujo interesse é a repetição, a reprodução de modelos de fácil digestão e associados à velocidade exigida pelo consumo por impulso. O que é a compra de um DVD pirata se não isto? A ânsia de ter acesso ao produto da moda (ou "de acervo" no caso dos filmes raros por exemplo) a baixo preço, sem esforço, manda a ética pro brejo e dá ao cidadão a ilusão da individualidade no que deveria ser pensamento coletivo e a certeza de que unzinho não faz mal.
Você tem razão com a idéia da bolinha rente a relva... Vamos abaixar a bola?
1- Cultura não é cinema e música apenas. Sofremos com o teatro, com a ópera (Viva a ópera!), com o abandono sistemático das artes plásticas, o circo, a dança etc.
2- Nós não sabemos o que fazer com a internet - aqui me refiro aos da minha geração que não conseguem ainda enxergar possibilidades além do HD.
3- Governos, políticos e partidos não priorizam a Cultura porque ainda não perceberam vantagens nisto. Governos, políticos e partidos - assim generalizado pelo preponderância percentual, são superfície de água numa bacia: evaporam-se, somem no ar, deixando resíduos que em nada lembram o líquido original.
4-A população não é alfabetizada para as Artes e isto é o mais grave no processo.
5- Não sabemos cobrar e, quando temos oportunidade, calamos. De fato, perdeu-se força seja por medo de repressão, por autocensura, patrulhamento ideológico (a entrevista do Vargas Llosa na Veja) e outras cositas que só os botões das camisas e calças sabem.
Grave, não é?
Cleber Papa.
Minhas próprias opiniões estão fartamente colocadas em muitos artigos aqui mesmo no C&M. Quando coloquei a frase do professor Ricardo Carneiro...
“nunca imaginei que o Serra pudesse reunir em torno de sua candidatura tantas forças reacionárias”
(Ricardo Carneiro, economista e professor da Unicamp, à Carta Maior)
... Não estava me dirigindo exatamente a você, apesar de seu argumento romancear a plataforma política de Serra. Só utilizei esta frase porque expressa com bastante força o que representa a voz perigosa do grupo de Serra e as perspectivas autoritárias que ele representa, apenas isso.
Mas, como lhe disse, meus artigos estão aí e, a maioria deles, divergem dos neo-colonialistas da cultura.
O fato é que, como se chocolate fosse, o desvairado Serra deu uma de compulsivo papa-hóstia, mergulhando seus conceitos nos métodos inquisidores medievais. Agora que sentiu que a aventura de filho ilustre da religião está fabricando um processo inverso, sobretudo por um símbolo de dignidade representado pela nossa colega de profissão, Sheila Ribeiro que, ao denunciar a hipocrisia do casal Serra sobre o tema aborto/religião, dá uma aula de dignidade, principalmente no que se refere à ética como papel indissociável da arte. Sheila devolve a dignidade à mulher, além de fortalecer a cultura e a arte como instrumentos fundamentais para uma sociedade verdadeiramente civilizada.
Quero aqui parabenizar Sheila pela lisura de seu caráter.
Caro Carlos,
Não imaginei que vc se referisse a mim por razões obvias: não sou dado a colocar carapuças gratuitamente. Apenas não entendi o contexto a que vc se referiu, pois vc não entrou na discussão a respeito do artigo inicial deste nosso debate. A menos que vc faça parte de uma estratégia de dar pau no Serra onde quer que seja possível, continuo sem entender a razão dos seus comentários.
Quanto ao seu último comentário, respeito suas opiniões e acho que tratada assim, na superfície, com este tipo de contextualização, esta questão não me interessa. Meu objetivo aqui é falar de Cultura, de resultados, do que esperamos para o futuro, o que de fato nós desejamos como mecanismos de investimento na produção cultural.
Ok Cleber.
Vamos ao menos buscar naturalidade e comprovação empírica, já que a prática da gestão de Lula/Dilma, e é bom que se diga Dilma, porque cabe ressaltar que ela, como Ministra-Chefe da Casa Civil, fortaleceu muito, politicamente, a cultura. Podemos inclusive falar em números, pois tem questões fundamentais. Serra, o Ministro do Planejamento do governo FHC que planejou o apagão, a privataria, o que planejou para a cultura? Um resíduo que é 10% do valor que hoje se investe em cultura no Brasil? Serra e FHC não são os sabichões, os preparados? Mas podemos, através de ilustração, mostrar o projeto de Serra para a área da cultura, é só ver o novo gosto daquele ambiente familiar para os tucanos, a TV Cultura e no que ele transformou um dos melhores programas jornalísticos, o Roda Viva. Quem assessora Serra na cultura? Quem ele nos ofereceria para a pasta da cultura, o cúbico João Sayad? Seria Gabi Gabriela a Secretária Executiva desse prestimoso Ministro?
Sabemos perfeitamente bem que a cultura, sob a ótica de Serra, é outra, é a opressão, é a repressão, é a perseguição aos seus inimigos, caçando jornalistas e cabeças contrárias a ele. Serra é um atraso para este país, é uma volta às fogueiras inquisidoras. É o fim do mundo.
Ao contrário do que você diz no seu texto, existem fronteiras claras entre Lula/Dilma e FHC/Serra. Seu texto sugere que toda essa revolução que abarcou a cultura do Brasil no governo Lula, não potencializou uma extraordinária reflexão sobre o próprio Brasil. Você chama isso de buraco negro, eu chamo de Alvorada. Lula/Dilma, o Ministério da Cultura do Brasil hoje, os Ministros Gil e Juca, os secretários, os técnicos estão estimulando demandas culturais em cada lugar deste país. E são sim políticas concretas contra o pastiche globalizante que os neo-conservadores, com suas pautas helenistas, adoram importar.
A verdade é que Lula e Dilma juntos regeram uma grande ópera, mas falo daquela ópera tupi-guarani-africana-europeia que corre no sangue de todos nós. O Ministério da Cultura do governo Lula navegou com braçadas firmes contra essa corrente edificadora, submissa até a medula às estéticas europeias. Este pensamento é que souberam muito bem combater os nossos grandes pensadores, Monteiro Lobato, Mário de Andrade, Darcy Ribeiro, Sergio Buarque, Niemeyer, que esteve ontem ao lado de Dilma, e tantos outros.
Combato sim o cinismo de Serra e seu antropofascismo, pois ele não defende nada que não seja o jogo rasteiro de escandalização e mentira comandado, sobretudo pela Globo que aniquila a cultura deste país há muitas décadas.
É isso, Cleber, vamos continuar os nossos debates.
Um grande abraço.
Caro Carlos,
Por favor, leia as respostas enviadas ao Gil abaixo.
Abração.
Prezado Papa, onde vc vê derrota eu vejo vitória...começamos assim, nossas leituras são diferentes, até aí tudo bem, vamos combater a boa luta numa boa. Eu não sei o que é a sua ópera, me interessa a ópera do Brasil, carnavalesca, minha ópera acontece na avenida, é ali com meu povo cantando e dançando, suas fantasias e alegorias, que acontece a minha ópera. A outra, a sua, juro por Deus não me interessa, o gênero também não. Mas eu não quero edificar um muro que o proíba de aqui na sua terra vc ver o espetáculo que te interessa, de jeito nenhum. Mas combateremos companheiro, eu vou lutar pra trazer recursos para minha ópera, seja eles humanos, artísticos ou financeiros. Eu não acho justo usar incentivo fiscal para a sua ópera, que vem de fora, é importada. Estou como Obama que decretou impedimento ao incentivo fiscal do que não traz emprego ou riqueza dentro do terreno dele, mesmo feito por empresas americanas. Lá, incentivo só para o que for de lá de dentro. Estou como ele, pronto. Adoto o mesmo princípio pra cá. O Brasil é um gigante e portanto, pela geopolítica que o condiciona está condenado a hegemonia. Eu quero logo, quero conspirar pelo nosso destino entende? Me interessa a arte produzida aqui, por aqui e para aqui entende? Vivemos sob a dominação cultural que vem de fora, acho isso subversão, atenta contra nossos interesses e mais, sobre o nosso destino, é reacionário, anacrônico, leva pra trás. Temos milhões de bocas, somos um gigante. Na linha do desenvolvimentismo que interessa ao Brasil, acho que estaremos melhor com Dilma, levando pra frente o que começou, começou mesmo com Lula. Mas Papa, somos democratas, vamos defender nossas bandeiras garantindo que vc e sua turma tenham o legítimo direito de combater, numa boa. Podemos tomar um cafezinho, sentar lado a lado na arquibancada, sem troglodismos porque a gente já sabe muito bem de onde vem a baixaria no Brasil.
Caro Gil,Caro Gil,
Agradeço a você a oportunidade de lhe contar um pouco sobre ópera e o que é como forma de expressão (de certo modo aproveito para responder em parte ao Carlos Henrique). A culpa não é sua por não ter lhe sido dada a possibilidade de conhecer outras atividades artísticas de maneira mais abrangente e falo isto sem nenhuma pretensão de "superioridade" ou de "maior conhecimento" a respeito disto ou daquilo. Faço esta ressalva, porque, como você certamente, combato todo o caráter pernóstico e arrogante que pode haver em alguns grupos cultores das chamadas artes eruditas.
Antes de qualquer coisa, vamos localizar a atividade no Brasil.
A ABPO-Associação Brasileira dos Profissionais de Ópera estima algo entre 5.000 e 6.000 profissionais em atividade no país, sem levar em conta os grupos corais independentes. Estas são pessoas que regularmente participam de trabalhos relacionados ao canto lírico e à produção de espetáculos desta atividade. São membros da ABPO praticamente todos os regentes brasileiros em atividade (na música de concerto e na ópera), salvo uma ou duas exceções, além dos principais diretores cênicos, cenógrafos, técnicos, figurinistas, pianistas, cantores solistas e coralistas entre outros.
A maioria dos profissionais citados têm curso superior, tendo se dedicado pelo menos 8 anos de estudo específico para atingir graus de excelência.
Há um forte preconceito contra a ópera por desconhecimento do que se trata. Em primeiro lugar, a ópera é um gênero de formação por excelência, haja visto que um maquinista formado para a ópera pode atuar em qualquer outra atividade das artes cênicas. O mesmo acontece com iluminadores, cenógrafos, cenotécnicos, pintores, escultores, marceneiros, figurinistas, aderecistas, técnicos em efeitos especiais, camareiras, maquiadores, caracterizadores, coreógrafos, bailarinos, músicos de orquestra, pianistas, regentes, diretores de palco entre outros. Por se tratar de uma atividade artistica que se vale de todas as demais formas de expressão, e dado seu grau de complexidade regularmente envolvendo em torno de 300 proffssionais diretos para sua realização, é natural que a ópera tenha muito a contribuir para todas as demais artes. Por questões estruturais o inverso nem sempre é verdadeiro, já que a linguagem do espetáculo teatral de ópera possui especificidades e tem exigências muito complexas, a começar de uma partitura com algo em torno de 2 horas de música, envolvendo uma orquestra inteira, linhas de canto distribuidas para inúmeras vozes, entre outras "pegadinhas" digamos assim.
Muito embora se defina que a ópera começa na Itália no século XVII, suas origens remetem ao teatro grego, chegando inclusive à idade média com representações sacras cantadas nas igrejas. Aqui no Brasil tivemos e temos vários nomes importantes para a ópera. Se a história nos deixou Carlos Gomes, nossos contemporâneos como Ronaldo Miranda e André Mehmari (somente para ficar com os dois) só não produzem mais porque não têm estímulo para isto.
A ópera é um espetáculo de narrativa do comportamento humano, comédia ou tragédia, não importa, mas narrativa da maneira como somos, como vemos nossas questões sociopoliticas.
Em síntese, é um espetáculo de teatro musical ao vivo cuja narrativa se vale de todas as possibilidades técnicas e artísticas conhecidas para se concretizar. Dizer que ópera é dominação cultural ou estética européia é uma bobagem sem tamanho tão grande quanto dizer, enquanto se lambuza de molho de macarronada numa cantina italiana, que o jazz e dança contemporânea são fruto do imperialismo americano. Este raciocínio canhestro leva alguns agentes culturais a acharem que texto de dramaturgo francês não pode ser encenado, ou livro de escritor australiano é aborígene. Vamos lá, nossa cultura é o resultado descontrolado de todas estas influências, ou o Brasil aprendeu o chorinho sem qualquer informação estrangeira?
A capoeira nasceu aqui,sem nenhuma influência africana? O que são as festa do Divino? E a música gaucha? Não há nenhuma influência mexicana na música goiana? E a música armorial nordestina? O Brasil é mesmo um país recheado de principes e princesas? Não ficou nada dos holandeses no Recife? Nossos pintores ou escultores nada devem a Rembrant, Matisse, Kandisnky, Modigliani? E os nossos estudantes de música quando vão para a escola usam que métodos?
(continua)
(continuação)
Não gosto de rótulos e gavetas na Cultura. Nem desta coisa meio piegas (meio intelectual de boteco) de olhar o Brasil sob a ótica da escola de samba, da avenida, do povo dançando na rua, abraçados, último pierrot e colombina a cantar suas tristezas e alegrias... Isto é bucolismo oportunista e sátira de uma realidade mal desenhada em que o povo - o tal povo - tem a necessidade de uma catarse que só se dá na avenida e no carnaval. Ora, vamos lá... Pensemos de maneira universal e equanime. Prefiro sonhar com o povo tendo alternativas de escolha, com acesso facilitado ao teatro, cinema, ópera, dança, exposições, livros, fotografia e outras perspectivas tão satisfatórias quanto Os Filhos de Gandhi ser for esta sua o p ç ã o.
Esta é uma questão importante. Ao individuo sem alfabetizaçao para a arte não lhe sobra alternativa senão aquela que está à mão.
Explico.
Nosso problema mais grave é a falta de políticas públicas que favoreçam a alfabetização para as artes. Traduzindo, é preciso que as pessoas aprendam a ler os códigos que estão implícitos numa pintura, num espetáculo de dança, de ópera, de carnaval. Não se trata apenas de dizer vi, gostei, não gostei, cantei prá caramba, é tudo colorido, este é mais bonito, este é mais feio.
Esta é a questão principal no que tenho me proposto a discutir. Não se trata de Dilma ou de Serra, pois esta é uma questão que será decidida nas urnas e sob a batuta da média das expectativas da população brasileira que necessariamente não faz o mesmo juízo que nós - com graus diferentes de alfabetização - fazemos. Trata-se sim do que estamos dispostos a levar como bandeira - digamos - para a Cultura.
Como artista acompanho o que vem sendo realizado no Brasil na área Federal para a Cultura e, na medida do possível, participado de debates com foco específico na minha principal atividade, apesar da formação ser mais abrangente. Acho que tenho a contribuir para a ópera e precisamos desenvolver o gênero considerado o potencial instalado no país além das considerações já feitas e outras compatíveis.
Tenho uma relação cordial com o Ministro Juca Ferreira de quem reconheço a tenacidade e capacidade de articulação (aliás já mencionado nesta Cultura & Mercado em artigo anterior). Ele - e o Ministério - reconhecem que nada de relevante ou estruturante foi feito para a àrea da Música Erudita e em particular da Ópera. Não acredito - e não vi nas várias oportunidades e pessoas com quem conversei no MinC, qualquer ranço de descaso ou preconceito com a ópera, ou mesmo a leitura de que se trata uma atividade a ser alijada do cenário artístico. Isto sequer passaria pela cabeça de qualquer dos técnicos que lá estão, acredito.. Há sim um entendimento geral de que é necessário avançar nesta matéria e que se trata de uma atividade com características próprias de assimilação difícil por todas as razões já expostas aqui inclusive.
Também é preciso compreender que da mesma maneira que o Governo Lula antes de ser Lula/Dilma foi Lula/Zé Dirceu, antes de Juca, o MinC foi Gil. Ou seja, foram oito anos, com gestões diferentes, formas de pensar e maneiras de agir diferentes. O avanço se deu na estrutura do pensamento, na criação das bases para se discutir nossa identidade, um trabalho que está longe de ser concluído e será objeto de mais algumas gestões. Avançamos muito na quantificação da Cultura com as pesquisas realizadas para o Ministério e finalmente temos no Brasil alguns parâmetros numéricos para pensar de maneira articulada com a realidade. Gosto das idéias e do conceito dos pontos de cultura, acho muito importante o que se fez até aqui com a Rede Nacional de Música, por exemplo. Lamento não termos avançado - e perdemos muito tempo com isto - com as formas de financiamento à produção Cultural.
Caberá ao novo governante (ou à) resolver isto.
(Continua)