Vejam o perigo em que estamos nos jogando! Vejam o abismo em que a arte e a cultura brasileira estão sendo jogadas! O excesso de subjetividade sempre foi o argumento usado pelos neoliberais para usar e abusar de suas falácias rumo a um expansionismo descarado. Então, vamos ao seguinte: o Ministério da Cultura tem sim, autoridade para determinar o que é bom ou ruim para a cultura brasileira.
O Ministério da Cultura do Brasil é uma conquista da sociedade, criticá-lo, aplaudi-lo faz parte do jogo democrático, mas desautorizá-lo é golpear a instituição, mais que isso, é rasgar a constituição. Vamos devagar com este andor!
Há um cenário gritante, vergonhoso que desautoriza qualquer arte honesta em prol de toda forma de desonestidade no meio cultural. Corredores, panelas, verdadeiras arquiteturas de convenções e convênios entre pares políticos, sociais e empresariais, em muitos casos constituindo-se em “Empreiteiras Culturais”, entupidas até o pescoço dentro desse manancial de dinheiro fácil e farto que virou a Lei Rouanet. Gente que nunca teve ligação com arte e com a cultura, agora se apresenta como Midas para artistas e comunidades inteiras. Isso virou uma imoralidade escrachada, como tantas que o estupro neoliberal causou à arte brasileira.
Este profissionalismo propalado por muitos é uma mentira, não existe absolutamente nada estruturado em mercado cultural. Os neoliberais prometem o mercado de arte, de cultura, de entretenimento, mentira! Escolhe meia-dúzia para aperfeiçoar seus lucros. Esse é o jogo dos neoliberais, lucro e dominação.
Quando querem associar essa mistificação de que o mercado neoliberal está em prol do artista, digo com toda a certeza, nada pode ser mais usurpador, mitificador e indigno para o artista do que o conceito neoliberal em arte, pois, com a lei como estava transformaram-se em agiotas com o dinheiro público. Verdadeiros canastrões.
Quem me disse? A história recente das artes brasileiras. Somam-se pilhas e pilas de vidas trágicas de grandes talentos com relevância cultural sim, fundamentais ao país, e que levaram cusparada do mercado, foram surrados pela espoliação, pela ganância, pela arrogância, pelo interesse vil, tudo debaixo de nossas barbas. E, quando viram o manancial de recursos públicos saídos do suor de cada brasileiro, esses vampiros, com suas antigas presas secas e seus bons mocismos, beberam o sangue de toda a população.
Não aceito esse jogo. Querem que eu dê um bom motivo do que é relevante culturalmente? Pois bem, Cartola, um dos gênios da nossa música, marginalizado pelo mercado neoliberal estava na sarjeta como tantos outros fantásticos músicos no Brasil, ele se encontrava lavando carros e trabalhando como porteiro de prédio, quando alguém o encontrou e disse textualmente, que um artista com aquela RELEVANCIA CULTURAL não poderia estar naquelas condições. Então, a “Seguradora Marcus Pereira” decidiu gravar o seu disco, uma maravilha de relevância cultural, absolutamente explícita, transparente, incontestável e, mais do que isso, a obra de Cartola torna-se a cada dia mais relevante para o Brasil.
Se formos por esse perigoso caminho, já já tentaremos provar à sociedade que arte, cultura, expressões fundamentais não têm qualquer relevância. E podemos traçar um paralelo com a feliz frase de Ferreira Gullar “Se tudo é arte nada é arte”.
Esse leque propositadamente aberto que se joga no ar de que não há relevância em artes, interessa tão somente a uma visão mercadológica, pois ao mundo da arte não interessa, muito menos à cultura brasileira.
Toda crítica, se fundamentada, é muito bem-vinda. No entanto, jogar na fogueira da dúvida conceitual é jogar no perigoso caminho da desqualificação de todo o sentido da cultura. E, para que a cultura seja forte e representativa, o Ministério da Cultura do Brasil terá também que ser forte e representativo. E assim o será, cada vez mais, se a sociedade, de forma conseqüente, criticar concretamente os seus erros e apoiar, com a mesma intensidade, os seus acertos.
É transparente a boa intenção nesta proposta que tanto sonhamos de mudança das regras da Lei de Incentivo à Cultura Brasileira, a de caminhar para um sentido mais democrático e, consequentemente, infinitamente mais produtivo para todo o cenário da cultura.
Quando caímos na esparrela do questionamento sobre alguns aspectos como este, “relevância cultural”, na verdade, desautorizamos profissionais da arte, técnicos da cultura e, até mesmo, a tentativa de se construir alguma coisa solidificada, palpável, contínua.
Se desautorizarmos o Ministério da Cultura, se tirarmos dele o peso político das questões culturais do Brasil, cometeremos um suicídio. A crítica pontual, cirúrgica é bem-vinda, a generalização é uma mistificação perigosa. Não podemos agir como franco-atiradores a metralhar a instituição mais representativa da cultura brasileira.
Repito, estão aqui os meus textos pra quem quiser ler as inúmeras críticas que fiz à imobilidade do ministério na condução de políticas concretas tanto do ministro Gil, quanto de Juca, na mesma monta em que criticava todo esse sórdido jogo de confinamento em que a cultura brasileira foi jogada aos interesses do setor privado e seus irresponsáveis padrões de escolhas através de jogo político e interesses meramente publicitários.
Vamos caminhar com a responsabilidade crítica que é a nossa arma de construção do fortalecimento das instituições que efetivamente nos representam, pela força de nossas escolhas democraticamente constituídas pela sociedade.
Reforço aqui o meu aplauso ao Ministério da Cultura, na figura do ministro Juca Ferreira, a quem fiz inúmeras críticas exigindo mudanças, mas que agora tenho que apóia-lo por dar à sociedade respostas concretas, com a reforma da Lei Rouanet, tão desejada pela grande maioria das pessoas envolvidas com cultura em todo o Brasil.
A busca por qualquer construção deve obedecer a um mínimo de critério, pois do contrário, não sairá do lugar e tudo o que se fizer em torno da cultura não terá validade.
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Pois veja só que ironia. Na história que você contou sobre o Cartola, você atribui a culpa pela situação do artista ao demônio do mercado neoliberal que o abandonou. Mas me parece que ele também estava abandonado pelo Estado. Não dá para afirmar que o Estado tem melhores condições do que o mercado de julgar o que é relevante culturalmente. Esse é o maior absurdo que se pode falar. Uma discussão sem fim onde ninguém tem razão. Então é preciso deixar que convivam ambos os mecanismos, fortalecendo os dois. O mecanismo de financiamento direto pelo poder público e o mecanismos de financiamento pelo direcionamento de recursos públicos pelo mercado.
Sim Kluk, você está coberto de razão, o "Estado" o abandonou,Cartola como centenas de artistas brasileiros, só não disse que o momento que narro, vivíamos um Estado de Sítio, ou seja, a nossa constituição foi rasgada por aquele Estado ditatorial, não se esqueça! As decisões democráticas foram esmagadas pelo pelo golpe e depois pelos atos segudos e chegando ao AI5. Éramos comandados por uma junta militar, ditadura que trocou figurinhas, e carimbadas, com os nossos maiores empresários e banqueiros e que causaram um verdadeiro estrago na vida cultural do Brasil.
A relevância cultural existe dentro de um ambiente de liberdade e não neste ambiente da opinião publicada, dirigida, produzida por pesados grupos econômicos e seus interesses vís.
Não existem verdades absolutas em cultura, o que existe de verdade absoluta, é uma sociedade e a sua soberania que caminha dentro do sentimento comum e que elege com o voto individual os seus representantes, livremente, democraticamente.
Portanto, o Ministério da Cultura, pode sim, escolher em nome da sociedade que o elegeu, pessoas capazes de buscar o sentido de benefício comum à sociedade nas ações de politicas publicas de cultura.
Outro caminhó é seguir os conselhos de uma junta militar que rasga a constituição, o voto, a escolha da sociedade para seus acertos e erros como é comum em sociedades livres.
concordo com o carlos. mais ainda, acho que por detrás dessas críticas aparentemente conceituais ao projeto da nova lei de incentivo está o interesse descarado dos brants & cesniks & leivas & afifs etc. que, travestidos de baluartes da política cultural, NÃO PASSAM MESMO DE ATRAVESSADORES. conheço projetos deles em que conseguir patrocinio - E ELES CONSEGUEM!!! - CUSTA 10, 20% do valor do projeto... O SETOR CULTURAL BRASILEIRO VIVE DO TRÁFICO DE INFLUENCIA!!!!
a cultura brasileira ainda vive de velhas dicotomias. por um lado, o CULTURA & MERCADO demonizando o projeto, que - segundo Brant & Cia acaba com a renúncia fiscal; por outro, os idiotas do Movimento 27 de março - com o trouxa do Piacentini à frente - dizendo que a lei preserva a mesma renúncia que o brant diz que acaba! quanta leviandade...
O MOVIMENTO 27 DE MARÇO DEVIA MESMO É INVADIR O PORTO PENSARTE!!!!
Carlos, gostaria muito que vc desse uma lida minuciosa na proposta do ministério da cultura. Não acho conveniente para a cultura brasileira dar um cheque em branco para um governante decidir o que é e o que não é cultura em nosso país. Pelo contrário, uma das bases da Política Gil é a garantia de que o Estado não pode ser produtor de cultura. Relevância Cultural é fascismo! Assim como inclusão cultural. Não há nada que me prove que a Madonna seja menos cultural que o mais autêntico dos maracatus rurais. Se o mercado ou o capitalismo desenvolveram formas arbitrárias de sobrevalorizar uma cultura de consumo, cabe ao Estado assumir sua função constitucional de garantir a todos a livre expressão e o acesso. Mas isso deve ser feito com DEMOCRACIA e não com democratismo autoritário ou com um anacrônico populismo de boteco. O governo tem feito uma perseguição descabida, ilegal e desastrosa sobre a produção cultural e quer avançar nisso de maneira irreversível com o apoio de gente bem intencionada e lutadora como você. Você sabe muito bem que eu luto por melhores dias por uma lei mais justa, aberta e democrática. Sabemos que ela não é, mas tb sabemos que ela não é culpada pelo destino trágico do Cartola, nem de tantos outros artistas largados pela falta de política pública. Quero fundo, precisamos de dinheiro bem aplicado, bem gerido, transparente, com a participação da sociedade. Este ministério não sabe fazer isso. Pelo contrário, é um desastre na gestão do orçamento que possui, não tem prestígio para conseguir mais dinheiro e valorizar a cultura do país, então resolveu atacar aquilo que (todos sabemos) vai mal, mas funciona mesmo contra toda essa incompetência toda. Portanto meu querido Carlos, quem está dando o golpe aqui é o governo e não a sociedade, que luta por seus direitos constitucionais, cada vez mais cerceados. Vamos à luta que a discussão é boa! Abs, LB
Leonardo
Vamos, ponto por ponto, o que falou, da mesma forma, vou tentar explicar as minhas razões sob um outro ponto de vista, ok:
LB - "Não acho conveniente para a cultura brasileira dar um cheque em branco para um governante decidir o que é e o que não é cultura em nosso país".
Tenho que obedecer a constituição. Em toda e qualquer ação do governo o legislativo tem participação, além do quê, e a meu ver, o principal, o governo que aí está foi eleito e reeleito com o voto direto, ou seja, nada pode mais legítimo, mais constitucional.
LB - "Uma das bases da Política Gil é a garantia de que o Estado não pode ser produtor de cultura".
Se Gil falou isso, ele não cumpriu vírgula, e venho alertando sobre isso há muito, que toda estrutura cultural está nas mãos do Estado, escolas de arte, teatros, todas as autarquias, pior, o Estado trabalha com uma visão seletiva e controla de forma implacável o seu direcionamento. Este Estado que aí está, praticamente, não sofreu sequer um arranhão em seu pensamento, é preconceituoso com o próprio país, pois oficializa culturas alheias às nossas. As políticas de governo poderiam demandar os interesses mais urgentes da sociedade, pois os governos, as três esferas do executivo, são a única forma de diálogo com a sociedade.
LB - "Relevância Cultural é fascismo! Assim como inclusão cultural".
Temos várias formas de interpretar essa questão, mas digamos que você tenha razão, e vou me ater somente à questão cultural entre o setor público e o privado. Fui à página do Itaú Cultural - um dos maiores beneficiados com a Lei Rouanet - e observei, de imediato, o seguinte trecho de sua apresentação:
"O Observatório Itaú Cultural foi criado em 2006 com os objetivos de refletir sobre a cultura e subsidiar a elaboração de políticas plurais ao setor, por meio do diálogo entre especialistas brasileiros e estrangeiros. "(Observatório Itaú Cultural).
Pergunto, como se determina um especialista? Pela sua relevância? E quem determina esta relevância? Não seria ainda mais relevante? Essa fieira não tem fim, Leonardo. Na sociedade capitalista, principalmente, as patentes, as hierarquias, as relações de trabalho estão substanciadas em graduações, em critérios que a sociedade, de alguma forma estabeleceu. Certo ou errado é uma forma que ela encontrou de se organizar. No caso da cultura, para que este termo não seja anulado, todo e qualquer setor da vida brasileira tem fundamentos baseados em alguma forma de cultura. E, neste caso, se não houver o mínimo de critério, por exemplo: uma padaria para dar um curso de confeiteiro poderá se apresentar como proponente, assim como qualquer atividade comercial ou humana, pois em tudo há uma forma de cultura, em toda e qualquer relação humana a cultura estabelecerá este diálogo entre as partes. Aí voltamos à frase de Ferreira Gullar, "se tudo é arte, nada é arte".
Os critérios hoje adotados pelos departamentos de marketing tratam de alguma forma de relevância, eles têm comissões que trabalham com o sentido seletivo, comissão que também foi determinada também por um currículo seletivo. A diferença que se estabelece neste momento, é que a partir do momento em que toda a contribuição da sociedade migra para o setor privado, o aporte torna-se imediatamente privado, não cabendo à sociedade interferir ou mudar absolutamente nada. Este capital transforma-se num ativo com todas as garantias inerentes ao livre mercado e, consequentemente se incorpora como aquisição, somando-se a todos os outros ativos da empresa protegidos pelo direito absoluto e sagrado de propriedade. Neste caso, a sociedade que é na base do processo, o grande mecenas, passa a ser uma pedinte do que lhe é direito, sem a menor condição de mudar essa política. Pois, o setor privado, ao contrário do setor público, tem garantias imperialistas, seguindo a mesma lógica das dinastias, sem que haja interferência da sociedade na sua forma de administração.
Quando você estabelece uma relação entre os maracatus rurais e Madonna, em algum momento usará um dispositivo individual para exercer o seu conceito seletivo. E ele não está somente aí, ele está na roupa que vestimos e no alimento que comemos. Uma simples sintonia de uma determinada rádio para ouvirmos uma determinada música é um ato seletivo, não temos fugir. Isso é complexo, não nascerá e nem morrerá com esta forma que o Ministério da Cultura encontrou para selecionar projetos. Tratamos essa forma seletiva cotidianamente. A escolha de grupos dos quais faremos parte, como aqui fazemos. Em toda relação inter-pessoal, esse dispositivos, mesmo instintivamente, é companheiro inseparável.
A única forma que acredito ser a mais justa é obedecer a senhas ou a consórcios com direito á sorteios, um sistema automático, diferente disso, tudo terá sentido seletivo, não temos como negar.
LB - "O governo tem feito uma perseguição descabida, ilegal e desastrosa sobre a produção cultural e quer avançar nisso de maneira irreversível".
Respeito a sua opinião, Leonardo, e posso partilhar bastante na sua angústia e apoiá-lo nas críticas, no entanto, elas não deixarão de ser subjetivas, porque com certeza imaginamos, e de forma seletiva, que as prioridades do governo deveriam ser outras, e isto é o mais claro exercício da lógica seletiva e, portanto, relevante para alguns, para outros, não.
Você defende mais investimento, mais fundo. Eu não tenho a mesma crença que você, eu, ao contrário, defendo uma profunda reflexão e que o dinheiro que, compulsoriamente, é tirado do contribuinte deve ser aplicado em benefício público com a transparência. Se público é o recurso, público terá que se manter. Certo ou errado, a instituição mais representativa da sociedade no campo da cultura, é o Ministério que está sob a administração do governo democraticamente eleito. E, se o Ministério da Cultura não pode ser o gestor, como você propõe, quem tem esta autoridade? Como será a participação da sociedade? Qual o sentido da existência do Ministério da Cultura? Como seria o mecanismo e qual a justificativa de buscar na sociedade recursos para políticas públicas de cultura, se não há comando público? Podemos sim, criticar a administração do Ministério, mas desautorizá-lo.
LB - "Não acho conveniente para a cultura brasileira dar um cheque em branco para um governante decidir o que é e o que não é cultura em nosso país."
Qual a solução então, manter os nossos destinos, na área cultural, como estão, nas mãos de banqueiros e empresários?
Todas as minhas críticas foram direcionadas a este absurdo e, como já disse, não percebia que os empresários estavam cobertos pela lei para fazerem o que bem entendessem com os recursos provindos da sociedade. Se agora, temos a oportunidade de mudar este absurdo, essa gritante usurpação com a sociedade, por que não apoiar a mudança da Lei Rouanet? Eu tenho uma opinião muito clara sobre esta questão. Mesmo se o governo, sob a orientação do Ministério da Cultura não apresentasse qualquer alternativa, ainda assim faria campanha para fazer desaparecer a Lei Rouanet, que tenho em conta que ela foi o instrumento muito mais de segregação, de concentração, de ampliação e sustentação de privilégios das classes dominantes do que os poucos, os parcos, os minguados benefícios que ela trouxe à sociedade. A Lei Rouanet (Collor), em sua essência, foi um mal para a cultura brasileira. A forma com que foram efetivamente aplicados os recursos da sociedade é o retrato de um escândalo da era Collor.
Leonardo
Vamos, ponto por ponto, o que falou, da mesma forma, vou tentar explicar as minhas razões sob um outro ponto de vista, ok:
LB - "Não acho conveniente para a cultura brasileira dar um cheque em branco para um governante decidir o que é e o que não é cultura em nosso país".
Tenho que obedecer a constituição. Em toda e qualquer ação do governo o legislativo tem participação, além do quê, e a meu ver, o principal, o governo que aí está foi eleito e reeleito com o voto direto, ou seja, nada pode mais legítimo, mais constitucional.
LB - "Uma das bases da Política Gil é a garantia de que o Estado não pode ser produtor de cultura".
Se Gil falou isso, ele não cumpriu vírgula, e venho alertando sobre isso há muito, que toda estrutura cultural está nas mãos do Estado, escolas de arte, teatros, todas as autarquias, pior, o Estado trabalha com uma visão seletiva e controla de forma implacável o seu direcionamento. Este Estado que aí está, praticamente, não sofreu sequer um arranhão em seu pensamento, é preconceituoso com o próprio país, pois oficializa culturas alheias às nossas. As políticas de governo poderiam demandar os interesses mais urgentes da sociedade, pois os governos, as três esferas do executivo, são a única forma de diálogo com a sociedade.
LB - "Relevância Cultural é fascismo! Assim como inclusão cultural".
Temos várias formas de interpretar essa questão, mas digamos que você tenha razão, e vou me ater somente à questão cultural entre o setor público e o privado. Fui à página do Itaú Cultural - um dos maiores beneficiados com a Lei Rouanet - e observei, de imediato, o seguinte trecho de sua apresentação:
"O Observatório Itaú Cultural foi criado em 2006 com os objetivos de refletir sobre a cultura e subsidiar a elaboração de políticas plurais ao setor, por meio do diálogo entre especialistas brasileiros e estrangeiros. "(Observatório Itaú Cultural).
Pergunto, como se determina um especialista? Pela sua relevância? E quem determina esta relevância? Não seria ainda mais relevante? Essa fieira não tem fim, Leonardo. Na sociedade capitalista, principalmente, as patentes, as hierarquias, as relações de trabalho estão substanciadas em graduações, em critérios que a sociedade, de alguma forma estabeleceu. Certo ou errado é uma forma que ela encontrou de se organizar. No caso da cultura, para que este termo não seja anulado, todo e qualquer setor da vida brasileira tem fundamentos baseados em alguma forma de cultura. E, neste caso, se não houver o mínimo de critério, por exemplo: uma padaria para dar um curso de confeiteiro poderá se apresentar como proponente, assim como qualquer atividade comercial ou humana, pois em tudo há uma forma de cultura, em toda e qualquer relação humana a cultura estabelecerá este diálogo entre as partes. Aí voltamos à frase de Ferreira Gullar, "se tudo é arte, nada é arte".
Os critérios hoje adotados pelos departamentos de marketing tratam de alguma forma de relevância, eles têm comissões que trabalham com o sentido seletivo, comissão que também foi determinada também por um currículo seletivo. A diferença que se estabelece neste momento, é que a partir do momento em que toda a contribuição da sociedade migra para o setor privado, o aporte torna-se imediatamente privado, não cabendo à sociedade interferir ou mudar absolutamente nada. Este capital transforma-se num ativo com todas as garantias inerentes ao livre mercado e, consequentemente se incorpora como aquisição, somando-se a todos os outros ativos da empresa protegidos pelo direito absoluto e sagrado de propriedade. Neste caso, a sociedade que é na base do processo, o grande mecenas, passa a ser uma pedinte do que lhe é direito, sem a menor condição de mudar essa política. Pois, o setor privado, ao contrário do setor público, tem garantias imperialistas, seguindo a mesma lógica das dinastias, sem que haja interferência da sociedade na sua forma de administração.
Quando você estabelece uma relação entre os maracatus rurais e Madonna, em algum momento usará um dispositivo individual para exercer o seu conceito seletivo. E ele não está somente aí, ele está na roupa que vestimos e no alimento que comemos. Uma simples sintonia de uma determinada rádio para ouvirmos uma determinada música é um ato seletivo, não temos fugir. Isso é complexo, não nascerá e nem morrerá com esta forma que o Ministério da Cultura encontrou para selecionar projetos. Tratamos essa forma seletiva cotidianamente. A escolha de grupos dos quais faremos parte, como aqui fazemos. Em toda relação inter-pessoal, esse dispositivos, mesmo instintivamente, é companheiro inseparável.
A única forma que acredito ser a mais justa é obedecer a senhas ou a consórcios com direito á sorteios, um sistema automático, diferente disso, tudo terá sentido seletivo, não temos como negar.
LB - "O governo tem feito uma perseguição descabida, ilegal e desastrosa sobre a produção cultural e quer avançar nisso de maneira irreversível".
Respeito a sua opinião, Leonardo, e posso partilhar bastante na sua angústia e apoiá-lo nas críticas, no entanto, elas não deixarão de ser subjetivas, porque com certeza imaginamos, e de forma seletiva, que as prioridades do governo deveriam ser outras, e isto é o mais claro exercício da lógica seletiva e, portanto, relevante para alguns, para outros, não.
Você defende mais investimento, mais fundo. Eu não tenho a mesma crença que você, eu, ao contrário, defendo uma profunda reflexão e que o dinheiro que, compulsoriamente, é tirado do contribuinte deve ser aplicado em benefício público com a transparência. Se público é o recurso, público terá que se manter. Certo ou errado, a instituição mais representativa da sociedade no campo da cultura, é o Ministério que está sob a administração do governo democraticamente eleito. E, se o Ministério da Cultura não pode ser o gestor, como você propõe, quem tem esta autoridade? Como será a participação da sociedade? Qual o sentido da existência do Ministério da Cultura? Como seria o mecanismo e qual a justificativa de buscar na sociedade recursos para políticas públicas de cultura, se não há comando público? Podemos sim, criticar a administração do Ministério, mas desautorizá-lo.
LB - "Não acho conveniente para a cultura brasileira dar um cheque em branco para um governante decidir o que é e o que não é cultura em nosso país."
Qual a solução então, manter os nossos destinos, na área cultural, como estão, nas mãos de banqueiros e empresários?
Todas as minhas críticas foram direcionadas a este absurdo e, como já disse, não percebia que os empresários estavam cobertos pela lei para fazerem o que bem entendessem com os recursos provindos da sociedade. Se agora, temos a oportunidade de mudar este absurdo, essa gritante usurpação com a sociedade, por que não apoiar a mudança da Lei Rouanet? Eu tenho uma opinião muito clara sobre esta questão. Mesmo se o governo, sob a orientação do Ministério da Cultura não apresentasse qualquer alternativa, ainda assim faria campanha para fazer desaparecer a Lei Rouanet, que tenho em conta que ela foi o instrumento muito mais de segregação, de concentração, de ampliação e sustentação de privilégios das classes dominantes do que os poucos, os parcos, os minguados benefícios que ela trouxe à sociedade. A Lei Rouanet (Collor), em sua essência, foi um mal para a cultura brasileira. A forma com que foram efetivamente aplicados os recursos da sociedade é o retrato de um escândalo da era Collor.
Carlos, nossos diálogos tem me enriquecido muito. Espero que os leitores não se cansem com os nossos comentários gigantes. Acho até que poderíamos tentar fazê-los de maneira mais ágil, para ampliar a discussão a todos. Proponho isso para os próximos, pois este ainda será longo:
O fato de ter a legitimidade do voto, o governo não pode rasgar a constituição. E a constituição diz, logo no artigo quinto, que o Estado garantirá a livre expressão. Garante os direitos culturais e o acesso à cultura a todos. Há uma quebra desse preceito qdo se exime de fomentar a cultura, jogando essa responsabilidade nas mãos das empresas. Até aí concordamos. Posso parecer contraditório ao reconhecer o mecenato como garantia do setor cultural, já que não concordo com ele. Mas não. Nós votamos no Collor tanto quanto no LUla. E ele arrendou o Estado para as grandes corporações, numa política de Estado mínimo compactuada por FHC e pelo próprio Lula. Fomos obrigados a conviver e sobreviver diante dessa situação.
Enxergo uma confusão em sua análise sobre a ação das organizações privadas. Elas não são Estado, tampouco o dinheiro que elas utilizam pra isso. A iniciativa é privada, livre, aberta. É claro que conta com isenção de impostos, assim como o aparelho de som da sua casa. O Estado não tem o direito de interferir nos critérios de uma empresas eletroeletrônica para definir se ela vai produzir um aparelho de um tipo ou de outro. Pode estimular determinados parâmetros, com diálogo. Sinceramente acho bom que empresas invistam em cultura. Há um perigo inerente da utilização das dinâmicas culturais em benefício próprio, mas para isso temos os artistas. E temos que ter outras fontes públicas, é claro. Quanto mais fontes públicas, abertas, transparentes.
Não há nada de subjetivo na minha análise. Cultura e Mercado fará ainda nesta semana uma matéria em que mostra a perseguição concreta que o MinC tem feito a empresas. Tem uma empresa conhecida que teve arbitrariamente todos os seus projetos recusados pelo MinC, mesmo com projetos similares de outras empresas sendo aprovados. Não vem ao caso que empresa é essa e quais os projetos que ela desenvolve. Quem faz isso com uma pode fazer com todas. E projeto do MinC é o cheque em branco da sociedade para que se faça isso ao bel prazer do gestor de plantão. Por mais que sejam suas boas intenções, e realmente acredito nas boas intenções do ministro, não posso concordar com isso.
O mecenato não coloca a cultura nas mãos de banqueiros e empresários. Isso é um equívoco. Para se produzir cultura é preciso dos cidadãos, dos artistas. Concordo que na situação atual há um desiquilíbrio enorme da função pública da cultura. Mas a solução está no Estado e não nas empresas. Quando o ministro diz que as empresas tem que investir dinheiro próprio na cultura, me dá vontade, como empresário que sou, de desafiar o governo: quando o Estado fizer sua parte, o mínimo, farei a minha. Acontece que as empresas privadas hoje investem mais em cultura que o próprio Estado. Tem interesses privados, é claro. Artistas têm, produtores têm, até ministros têm, por que as empresas não podem ter? É uma hipocrisia sem tamanho.
Por que o MinC não mostra como ele investe o FNC? Tive acesso a dados que mostram que o MinC concentra mais recursos via FNC que o próprio mecenato em estados como o Rio de Janeiro, por exemplo. E concentra em outros, não por acaso a Bahia.
Não concordo que a Lei Rouanet tenha feito mal à cultura. Fez bem e fez mal. O certo é que com este novo projeto fará muito pior que melhor. Essa é a minha modesta opinião.
Abraço carinhoso, LB
Querido Leonardo
Diante de uma questão séria como a cultura, a meu ver, a nova lei de incentivo traz profundas transformações à vida brasileira, tema que inclusive será objeto do meu próximo texto. Ainda sinto a necessidade de ser um pouco extenso, mesmo tendo que me desculpar com os leitores pelo cansaço que um texto longo pode trazer. Acho que neste momento o meu doentio pragmatismo se faz necessário, até para abrir frentes de debates a partir de cada observação colocada aqui. Ainda assim, acho importante a extensão desta nossa peleja que, não tenho dúvidas, seja de que parte for, minha ou sua, é para o bem da sociedade brasileira.
Sigo com o mesmo formato que propus no meu último comentário sobre as suas pertinentes colocações e, em seguida, as minhas. Até porque me sinto, por ser do interior, na obrigação de me explicitar para não dar munição ao pensamento apressado como o de PX Silveira que, irmanado com o ator Cláudio Fontana e com o, então presidente da Philips, Paulo Zottolo classifica de forma provinciana no exercício do seu preconceito, o homem brasileiro sob o ponto de vista geográfico, mais ou menos dotado de inteligência e preparo técnico e consequentemente importância. Já ouvi falar que uma cartilha, ali na região da antiga Prússia, defendia esses mesmos ideais dos três , mas deixa quieto. Temos uma defasagem educacional no Brasil que permite aos mortais, brasileiros, lógico, algumas gafes intelectuais por mero desconhecimento e notório despreparo. Este é um assunto que deve ser mais bem digerido através dos conceitos do saudoso Barão de Itararé.
LB – “O fato de ter a legitimidade do voto, o governo não pode rasgar a constituição”.
Não consigo enxergar esta sua afirmação com a mudança da lei, ao contrário, acho que ela segue uma orientação absolutamente transparente no sentido do avanço participativo da sociedade civil, certificando e legitimando a sua soberania.
LB – “E a constituição diz, logo no artigo quinto, que o Estado garantirá a livre expressão”.
Acho que o Brasil vive hoje, como bem disse ontem Luciano do Vale, após dez anos que a TV Bandeirante ficou impedida de transmitir os jogos da seleção brasileira devido ao lobie da Rede Globo, um momento histórico na vida democrática brasileira, justamente pela absoluta liberdade de expressão, mesmo que tenhamos alguns pequenos e desagradáveis incidentes na tentativa de reeditar conceitos ditatoriais, como no caso de Gilmar Mendes, quando exigiu que a TV Câmara tirasse do ar a entrevista com o jornalista da Carta Capital. Este Senhor, Gilmar Mendes que Fernando Henrique Cardoso classifica como “corajoso” por soltar o famoso banqueiro Daniel Dantas, tem de alguma forma arranhado um pouco a imagem democrática brasileira. Mas, indiscutivelmente fizemos grandes avanços no executivo e legislativo, a tribuna Cultura e Mercado é um claro exemplo da liberdade de idéias e expressões disponível hoje para milhares de brasileiros. Isto é um exemplo de respeito absoluto a este artigo citado por você.
LN – “Garante os direitos culturais e o acesso à cultura a todos”.
Pois é Leonardo, como já disse, este é o ponto onde fundamentei as minhas críticas, pois até então, como você bem disse, a cultura brasileira estava entregue nas mãos de grandes corporações, o que provocava cólera em muitos que ansiavam por uma mudança significativa, mesmo os mais, digamos, equilibrados críticos à Lei Rouanet (Collor). Por isso estou agora nesta defesa férrea da nova lei proposta pelo MinC, muito mais comemorando a destruição de boa parte dos ativos contingenciados pelo setor privado que, além de não cumprir o papel do Estado como o alarido da publicidade tenta nos fazer crer, este mesmo setor privado produziu uma avalanche de preconceitos e descorçoes, que se revelou num exercício diário da fragmentação social e geográfica do Brasil, tal a sua capacidade vilipendiadora das normas minimamente humanas da relação entre os homens. Vou um pouco mais longe, até porque não temos como mensurar este estrago, mergulho de ponta à cabeça no discurso que, mesmo que o setor privado tire “um qualquer do bolso” para financiar a produção artística e, duvidando que isso aconteça, ainda assim acho desastroso este tipo de financiamento para a cultura brasileira. Com a mão na consciência de estar sendo pleno de liberdade crítica de não cair na tentação de produzir máculas artísticas, mas tendo a convicção de que a cultura da sociedade é a base de todo o seu desenvolvimento, acho um suicídio qualquer forma de contato com o setor privado e suas “boas intenções”, principalmente num momento em que as idéias e as práticas da comunidade, através da sua forma de expressão, estão em efervescência. E se a defesa for o restrito mercado cultural como justificativa dessa injeção do setor privado, replico que isto, ao contrário de avanço, significa um estrondoso retrocesso, pois joga a cultura num universo limitado, num produtivismo mínimo diante do papel fundamental que a cultura de um povo tem sobre todo o conjunto de ações de uma sociedade. Este apelo, infelizmente comprado pelo Ministério da Cultura foi um dos maiores erros do governo federal. Cultura não tem que ser geradora de empregos, mas de idéias. Seu lugar está reservado ao estímulo ao exercício do pensamento crítico. Por isso defendo que o Estado, através do governo federal, proteja esta liberdade que só é possível, se protegida pela própria sociedade.
LB – “Enxergo uma confusão em sua análise sobre a ação das organizações privadas. Elas não são Estado, tampouco o dinheiro que elas utilizam pra isso. A iniciativa é privada, livre, aberta. É claro que conta com isenção de impostos”.
Desculpe se em algum momento não me fiz entender, a ponto de parecer não saber o papel, em nossa sociedade, do governo, do Estado e do setor privado. E prezo insistentemente para que eles não se misturem, para que não haja reproduções em escala industrial de atos gritantes do avanço arbitral de um governo sobre o Estado, pior, a serviço da política eleitoreira no ato absolutamente transparente de inquisição em que o governador Serra exerceu com mão pesada e o polegar para baixo a ordem para que Fernando Henrique Cardoso decepasse o direito de expressão de um artista e que, com certeza, atingiu toda a classe, parecendo que um artista é apenas uma peça de uma engrenagem político eleitoral, e que se não funcionar de acordo com o comando, ela deve ser imediatamente retirada do corpo do Estado.
Quanto ao imposto contingenciado pelo setor privado que se transforma em ativos para a sua liberdade conceitual, para discricionariamente exercer o direito sagrado da livre iniciativa como rezam as nossas regras de mercado, tenho que discordar. A produção de um aparelho de som tem em sua fonte de investimento o setor privado,seguindo até a sua forma de escoamento.
Já no caso da cultura, esses recursos têm origem na fonte, no setor público, pois este imposto devido foi pago pela sociedade e o dispositivo da lei permite a ela lançar mão desse recurso público e torna-lo privado, pior, a partir daí seguir as normas fundamentadas nos mesmos padrões de mercado.
A questão está justamente nessas duas questões, na fonte e no destino. A meu ver, um procedimento republicano é: se pública é a sua fonte, público deverá ser o desenvolvimento e seus conseqüentes destino.
O mesmo no procedimento privado, se privada é a fonte, privado deverá ser o desenvolvimento e seus conseqüentes resultados.
O que não se pode admitir é essa mudança de destino do que inicia público e termina entregue nas mãos da vedação do setor privado que, para mim, é uma bomba atômica que explode no colo da sociedade.
Por hora Leonardo, é isso. Acho que este enriquecedor debate merece todo o cuidado pela sua indiscutível relevância.
Um grande e afetuoso abraço.
Carlos Henrique
Querido Leonardo
Diante de uma questão séria como a cultura, a meu ver, a nova lei de incentivo traz profundas transformações à vida brasileira, tema que inclusive será objeto do meu próximo texto. Ainda sinto a necessidade de ser um pouco extenso, mesmo tendo que me desculpar com os leitores pelo cansaço que um texto longo pode trazer. Acho que neste momento o meu doentio pragmatismo se faz necessário, até para abrir frentes de debates a partir de cada observação colocada aqui. Ainda assim, acho importante a extensão desta nossa peleja que, não tenho dúvidas, seja de que parte for, minha ou sua, é para o bem da sociedade brasileira.
Sigo com o mesmo formato que propus no meu último comentário sobre as suas pertinentes colocações e, em seguida, as minhas. Até porque me sinto, por ser do interior, na obrigação de me explicitar para não dar munição ao pensamento apressado como o de PX Silveira que, irmanado com o ator Cláudio Fontana e com o, então presidente da Philips, Paulo Zottolo classifica de forma provinciana no exercício do seu preconceito, o homem brasileiro sob o ponto de vista geográfico, mais ou menos dotado de inteligência e preparo técnico e consequentemente importância. Já ouvi falar que uma cartilha, ali na região da antiga Prússia, defendia esses mesmos ideais dos três , mas deixa quieto. Temos uma defasagem educacional no Brasil que permite aos mortais, brasileiros, lógico, algumas gafes intelectuais por mero desconhecimento e notório despreparo. Este é um assunto que deve ser mais bem digerido através dos conceitos do saudoso Barão de Itararé.
LB – “O fato de ter a legitimidade do voto, o governo não pode rasgar a constituição”.
Não consigo enxergar esta sua afirmação com a mudança da lei, ao contrário, acho que ela segue uma orientação absolutamente transparente no sentido do avanço participativo da sociedade civil, certificando e legitimando a sua soberania.
LB – “E a constituição diz, logo no artigo quinto, que o Estado garantirá a livre expressão”.
Acho que o Brasil vive hoje, como bem disse ontem Luciano do Vale, após dez anos que a TV Bandeirante ficou impedida de transmitir os jogos da seleção brasileira devido ao lobie da Rede Globo, um momento histórico na vida democrática brasileira, justamente pela absoluta liberdade de expressão, mesmo que tenhamos alguns pequenos e desagradáveis incidentes na tentativa de reeditar conceitos ditatoriais, como no caso de Gilmar Mendes, quando exigiu que a TV Câmara tirasse do ar a entrevista com o jornalista da Carta Capital. Este Senhor, Gilmar Mendes que Fernando Henrique Cardoso classifica como “corajoso” por soltar o famoso banqueiro Daniel Dantas, tem de alguma forma arranhado um pouco a imagem democrática brasileira. Mas, indiscutivelmente fizemos grandes avanços no executivo e legislativo, a tribuna Cultura e Mercado é um claro exemplo da liberdade de idéias e expressões disponível hoje para milhares de brasileiros. Isto é um exemplo de respeito absoluto a este artigo citado por você.
LN – “Garante os direitos culturais e o acesso à cultura a todos”.
Pois é Leonardo, como já disse, este é o ponto onde fundamentei as minhas críticas, pois até então, como você bem disse, a cultura brasileira estava entregue nas mãos de grandes corporações, o que provocava cólera em muitos que ansiavam por uma mudança significativa, mesmo os mais, digamos, equilibrados críticos à Lei Rouanet (Collor). Por isso estou agora nesta defesa férrea da nova lei proposta pelo MinC, muito mais comemorando a destruição de boa parte dos ativos contingenciados pelo setor privado que, além de não cumprir o papel do Estado como o alarido da publicidade tenta nos fazer crer, este mesmo setor privado produziu uma avalanche de preconceitos e descorçoes, que se revelou num exercício diário da fragmentação social e geográfica do Brasil, tal a sua capacidade vilipendiadora das normas minimamente humanas da relação entre os homens. Vou um pouco mais longe, até porque não temos como mensurar este estrago, mergulho de ponta à cabeça no discurso que, mesmo que o setor privado tire “um qualquer do bolso” para financiar a produção artística e, duvidando que isso aconteça, ainda assim acho desastroso este tipo de financiamento para a cultura brasileira. Com a mão na consciência de estar sendo pleno de liberdade crítica de não cair na tentação de produzir máculas artísticas, mas tendo a convicção de que a cultura da sociedade é a base de todo o seu desenvolvimento, acho um suicídio qualquer forma de contato com o setor privado e suas “boas intenções”, principalmente num momento em que as idéias e as práticas da comunidade, através da sua forma de expressão, estão em efervescência. E se a defesa for o restrito mercado cultural como justificativa dessa injeção do setor privado, replico que isto, ao contrário de avanço, significa um estrondoso retrocesso, pois joga a cultura num universo limitado, num produtivismo mínimo diante do papel fundamental que a cultura de um povo tem sobre todo o conjunto de ações de uma sociedade. Este apelo, infelizmente comprado pelo Ministério da Cultura foi um dos maiores erros do governo federal. Cultura não tem que ser geradora de empregos, mas de idéias. Seu lugar está reservado ao estímulo ao exercício do pensamento crítico. Por isso defendo que o Estado, através do governo federal, proteja esta liberdade que só é possível, se protegida pela própria sociedade.
LB – “Enxergo uma confusão em sua análise sobre a ação das organizações privadas. Elas não são Estado, tampouco o dinheiro que elas utilizam pra isso. A iniciativa é privada, livre, aberta. É claro que conta com isenção de impostos”.
Desculpe se em algum momento não me fiz entender, a ponto de parecer não saber o papel, em nossa sociedade, do governo, do Estado e do setor privado. E prezo insistentemente para que eles não se misturem, para que não haja reproduções em escala industrial de atos gritantes do avanço arbitral de um governo sobre o Estado, pior, a serviço da política eleitoreira no ato absolutamente transparente de inquisição em que o governador Serra exerceu com mão pesada e o polegar para baixo a ordem para que Fernando Henrique Cardoso decepasse o direito de expressão de um artista e que, com certeza, atingiu toda a classe, parecendo que um artista é apenas uma peça de uma engrenagem político eleitoral, e que se não funcionar de acordo com o comando, ela deve ser imediatamente retirada do corpo do Estado.
Quanto ao imposto contingenciado pelo setor privado que se transforma em ativos para a sua liberdade conceitual, para discricionariamente exercer o direito sagrado da livre iniciativa como rezam as nossas regras de mercado, tenho que discordar. A produção de um aparelho de som tem em sua fonte de investimento o setor privado,seguindo até a sua forma de escoamento.
Já no caso da cultura, esses recursos têm origem na fonte, no setor público, pois este imposto devido foi pago pela sociedade e o dispositivo da lei permite a ela lançar mão desse recurso público e torna-lo privado, pior, a partir daí seguir as normas fundamentadas nos mesmos padrões de mercado.
A questão está justamente nessas duas questões, na fonte e no destino. A meu ver, um procedimento republicano é: se pública é a sua fonte, público deverá ser o desenvolvimento e seus conseqüentes destino.
O mesmo no procedimento privado, se privada é a fonte, privado deverá ser o desenvolvimento e seus conseqüentes resultados.
O que não se pode admitir é essa mudança de destino do que inicia público e termina entregue nas mãos da vedação do setor privado que, para mim, é uma bomba atômica que explode no colo da sociedade.
Por hora Leonardo, é isso. Acho que este enriquecedor debate merece todo o cuidado pela sua indiscutível relevância.
Um grande e afetuoso abraço.
Já que você Citou o GRANDE CARTOLA COMO RELEVANCIA CULTURAL GOSTARIA DE CITAR LIA DE ITAMARACA.