Ministro da Cultura lança manifesto em busca de uma solução que leve em conta a dimensão cultural do ato de pixação ao prédio da Fundação Bienal, durante a “Bienal do Vazio”.
O Ministério da Cultura vem a público a fim de que se busque uma saída na esfera cultural para o impasse decorrente do ato e da prisão da jovem Caroline Piveta da Mota, de 23 anos de idade. Ela integrava o grupo que pintou com tinta spray o edifício da Bienal de São Paulo, no local onde os curadores da 28 mostra estabeleceram um espaço vazio de interação com o público. Cremos ser legítima a preocupação, manifestada por muitos artistas e agentes culturais do país, com os desdobramentos que podem criminalizar uma atitude que tem características culturais, muito embora não concordemos com a agressão simbólica proposta e nem tampouco com os textos divulgados como de autoria do grupo.
Temos buscado o diálogo constante com grupos jovens dos centros urbanos e das periferias das grandes cidades por acreditar que esta é a forma mais eficaz e duradoura de combater os impulsos violentos que são gerados em meio a desagregação reinante em tais ambientes de fragilidade sociocultural nos quais vivem estes indivíduos. Contudo, cremos que a agressividade simbólica ainda aparece como “alternativa”, de forma ilusória, a estes jovens submetidos a um cotidiano de violência, e passa a ser a “compensação cultural” por vezes a seu alcance para fugir do crime ou da marginalidade de fato. Devemos recordar que, desde muito, essas populações tem suas formas de expressão e de linguagem enquadradas como atos de violência e desrespeito social, como foram as rodas de capoeira no passado, os bailes funks nos dias correntes. O que não podemos esquecer é que a cultura toma caminhos que fogem do padrão estabelecido para expressar conteúdos latentes nas formações sociais emergentes. Não desconhecemos que estas situações podem, vez ou outra, superar o âmbito criativo, mas devemos ainda lembrar que isso ocorre também pela falta de comunicação social e pela pouca acessibilidade destes cidadãos aos bens diversificados de nossa cultura e de nossa arte. Temos certeza que tais conflitos precisam ser trabalhados pelas políticas públicas e pelas instituições de modo a evitar uma maior desagregação do tecido de nossa sociedade.
Acreditamos que os mais de 40 dias de prisão guardam desproporção com o ato da jovem, porque tal medida pode gerar uma intensificação dos conflitos que buscamos combater, uma vez que se tornaram um problema real. O ato dos jovens, por mais que discordemos dele, não deve ser criminalizado como se ocorresse uma pixação e depredação do patrimônio cultural ali protegido por lei. Ele aconteceu num espaço específico em que era permitido a todo visitante exercer seu livre e vivo contato com o lugar simbólico da Bienal, uma mostra de arte na qual, segundo a imprensa, muitos outros grupos e indivíduos manifestaram-se da mesma forma, protestando contra ou aderindo ao conceito curatorial, com ações diferentes. O grupo de jovens reivindica o estatuto artístico e cultural ao seu ato. Quem deve julgar e avaliar tal mérito são as instituições culturais, os críticos e historiadores da arte, através dos recursos da reflexão e do debate público. Cremos que o papel do estado é garantir esse espaço público de discussão e apreciação dos valores contemporâneos, evitando que o poder público decida em favor de nenhuma parte e em prejuízo ao todo que forma a cultura. Peço encarecidamente que as instituições culturais e os poderes públicos do país cuidem para que possa ser mantido o ambiente democrático de diálogo e o direito de todos à diversidade de suas manifestações culturais.
Juca Ferreira, Ministro da Cultura
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Belíssima intervenção do Ministro da Cultura!
Atitudes como esta auxiliam no entendimento da dimensão da arte e da cultura em nossa sociedade.
Parabéns Juca Ferreira!
CARTA ABERTA SOBRE ESCLARECIMENTOS A RESPEITO DA PRISÃO DE CAROLINE
À Fundação Bienal
Aos Srs. Diretores, Conselheiros,
A nota de esclarecimento emitida pela Fundação Bienal nos informou que não é de responsabilidade da Fundação o destino da jovem. E que a Bienal agiu em defesa do patrimônio público, o que é sua obrigação. Mas não esclarece se a Bienal, eximindo-se dessa responsabilidade ao cumprir com a sua, concorda ou não com o destino da jovem. Destino que agora se entrelaça com o da Fundação e marca para sempre com um drama humano o percurso de uma instituição bastante importante na cena cultural.
Muitos de nós sonham com uma arte que brote da vida e para a vida, para a liberdade, para a emancipação e o crescimento humano. Isso não inclui danos ou violência de qualquer tipo, e bem sabemos que a arte, para a qual se pensou inicialmente a Bienal, é em sua origem questionadora. Talvez ainda pensemos possível uma arte que não seja apenas para ornar paredes, livros e conversas. Qual o papel da Fundação hoje, talvez ainda herdeira, como fazem crer seus catálogos, de uma tradição crítica e artística que bebeu nessas fontes, quando não eram ainda vistas como arte, mas como insubordinação e até incapacidade.
Não nossa intenção discutir neste momento a validade artística, ou não, da ação de Caroline. Muito menos do enorme vazio que ficou. Mas parece necessário pensar se tão longa permanência numa penitenciária é troca humana justa para o delito que a jovem teria cometido, pensando talvez apenas participar e tornar pública a existência de outras realidades. Se não há rigor desigual e desmedido, e nada construtivo. Se em resposta a uma situação potencial de risco institucional, não se estabeleceu de fato uma situação que coloca em risco desnecessariamente o destino de uma pessoa. Se a uma situação de possível ameaça, não se estabeleceu uma situação arbitrária porque injusta e efetiva de violência ainda maior.
Preferiu-se interpretar o ato de Caroline não como expressão consoante com um espaço que poderia ser de livre manifestação, mas como dano. Ao ser assim classificado, gerou-se a atual situação. Trata-se sim, e inequivocamente, de decisões. Situação que nos parece muito injusta, absurda. Além disso, o "dano" causado pela jovem poderia ter sido corrigido, inclusive com a participação dela. E corrigido facilmente, como de fato foi, demonstrando não ser ato permanente. A correção, ao que sabemos, resumiu-se a uma atividade que deve ser até rotineira, antecedendo e sucedendo exposições, expressando o zelo da Fundação pelo espaço arquitetônico que a abriga. A esta altura não temos simpatia alguma pela ação da Bienal, nem tampouco pela polarização discursiva de segmentos do chamado "meio cultural" em torno da ação da Fundação. O que está em jogo é a liberdade de uma pessoa e os valores que de fato praticamos ao representar as instituições das quais participamos.
Assim, já que a Fundação Bienal entende que a prisão da jovem não atende a uma intenção ou razão sua, convido-a a colaborar a uma ação restaurativa, não só dos edifícios, mas da liberdade, e manifestar-se e contribuir publicamente pela libertação de Caroline. Convidamos a Fundação a somar-se, de modo que faça algum sentido, no esclarecimento e na restauração de um patrimônio maior, que é o significado possível da arte e, acima disso, do sentido humanitário da nossa vivência comum. A abrir-se a um debate mais amplo da instituição e da produção cultural, que já é inevitável. Do sentido humano que deve animar a arte e as instituições, porque se estas adquirirem identidade e ânimo autônomos, se deixarem de ser ferramentas e instrumentos de nossa criação, os processos de decisão facilmente se tornarão cativos de um anonimato que de fato não existe, e nossos monumentos, de patrimônio público, passarão a uma carcaça daquilo que sonhamos possível construir ao instituí-los.
Procuramos ainda, em meio à necessária decepção e indignação com a situação que se criou, convidar a um tom de razão, a retomar a valorização da liberdade, da expressão e da vida humana, sem o que as discussões sobre arte e cultura, e nossas belas criações, como os salões elegantes e alvos que as abrigam, são apenas o verniz da barbárie que construímos com nossa indiferença.
Esta é uma carta aberta. Se concordar com seus termos fique livre para assiná-la e distribuí-la.
Se quiser entrar nesta lista de assinaturas envie um email para manifestacao.livre@gmail.com .
Se quiser uma versão digital solicite pelo mesmo email.
Subscrevem:
Cristiane Arenas - Artista
Euler Sandeville (FAUUSP/ PROCAM.USP, Aion, Espiral)
Jaime Lauriano (estudante e pesquisador em Cinema FEBASP)
Izabel Franco -Arquiteta
Clevane Pessoa de Araújo Lopes
Psicóloga,Artista plástica, poetisa e Embaixadora Universal da Paz (Cercle de Les Ambassadeurs Univ. de La paiz-Genebra, Suiça)
André Luiz Mesquita - Jornalista
Gisella Hiche – Artista
Milena Durante - Artista
Vanessa Jesus - Estudante
Julia Cseko - Escultora
Joana Cseko - Artista
Fernanda cobra - Artista
Rodrigo Lourenço - Gravador
Giana Paris - Artista
Marina Ronco - Produtora
Rodrigo z. Lopez - Relações públicas
Thiago Rolands - Editor
Lucas Barboza Villar - Monitor cultural
Floria Breyer - Artista
Gerorge Sander - Artista
Ferreia??? Parabéns Juca Ferreia... Ferreia esse hômi aí da cadeia....
beijos
Este espaço é democrático?
Fico a pensar, cadê o nosso paladino-mor que anda a correr para soltar o banqueiro DD em tempo record? O mesmo constrói personagens de um tal "Estado Policial", pede cabeças de juizes e delegados em nome da legalidade, da moral e da ética.
Por que Gilmar Mendes, a grande mídia e seus afins, não têm a mesma indignação com a prisão desta jovem?
Eu também me solidarizo e aplaudo o manifesto do Ministro Juca Ferreira.
Por um erro de digitação escrevemos Juca Ferreia e não Ferreira. Já corrigimos a falha e pedimos desculpas aos leitores. Abs, LB
Pixaçao de parede nao e arte. Eh apenas falta de educaçao.
Quem pensar que e arte estara incorrendo em equivoco irremediavel...
Pixaçao de parede e expressao da falta de educaçao dos jovens, revolta mal direcionada, agressao, desejo de sujar e quebrar tudo. Mas e sobretudo falta de educaçao. Sao os pixadores de outra camada socio'cultural, e muitos descendem de familias imensas e de
origem rural, e desejam de repente uma rapida promoçao social, acreditam no direito a participar do consumismo, e esquecerem a propria rica e espontanea cultura regional. Querem conquistar de repente o que normalmente leva geraçoes. Mas nao conseguem, nem conseguirao, e entao pinta revolta pela impotencia de enriquecer, virr gente bonita, os sonhos viram pesadelos na megalopolis... Entao saem pixando, para tapear o fim da ilusao.
A sujeira da srta Pivetta da Mota na Bienal nao a faz merecer cadeia, no entanto. Ela eh apenas mal educada, inculta, primitiva, agressiva, como outros tantos milhares de pixadores que se creem artistas...
guida
Sim,
a pixação é uma forma de manifestar desagrado, tipo:
"estou c..... para essa tal de Bienal, porque nada disso serve para eu ganhar dinheiro, vamos pixar esta casa de "ricos", vamos pixar o predio que os ricos moram,, vou deixar minha marca, quero mais é que tudo se acabe, porque nada dessa bobajada serve para ganhar dinheiro. Quero tudo feio mesmo, sujo e quebrado, riscado, que nem minha vida"
E como está no comentario acima, a falta de educação dos que perderam, as esperanças de se tornarem "consumistas" ou "enrricar" de repente na cidade grande. Esses pobres pixadores alem da falta de educação nada tem na cabeça, nada recebem que os faça gente com melhor contato com a realidade.
Fiquei deveras bem impressionada com a carta do ministro da cultura em favor da libertação de Caroline ” muito embora não concordemos com a agressão simbólica proposta e nem tampouco com os textos divulgados como de autoria do grupo.”. Eu não concordo também com a falsa teoria que tematizou a Bienal. O vazio da Bienal não é artístico e se deu num processo galopante de descredito da instituição e não da Arte ,desde as operações de lavagem de dinheiro e uso da Bienal para construção da imagem pessoal do Edmar Cid Ferreira . O outro Ferreira que agora preside a Bienal foi acusado de roubo mas foi reeleito por um conselho ao qual só interessa sair na revista Caras. Sem credibilidade a Bienal não tem como captar recursos dos empresários sérios.
A ditadura do mercado é menos danosa para as Artes Visuais que a ditadura da elite capitalista.
Sou mesmo um sortudo! Estava na semana passada em Brasília e vi uma foto linda, bem emblemática e que pode servir para uma reflexão sobre essa discussão. Na foto, Niemeyer aparece no hotel projetado e onde se hospedou, detalhe, ele fez questão de aparecer na foto, em sua homenagem, ao lado de funcionários do hotel, camareiras, cozinheiras, garçons, porteiros e etc., ou seja, o lado humano do hotel, o funcionamento do hotel que depende de gente que, infelizmente, não tem a menor condição de dar suporte educacional de igual monta a um menino de classe média. Acho que podemos transferir essa imagem à questão dos pixadores, não necessariamente a essa menina presa, mas sim do universo dinâmico que envolve a questão dessa expressão. Como bem disse Claudio Lembo, durante a histeria que tomou conta da elite paulista, quando dos ataques do PCC em que ele apontou que culpa pela explosão daquela panela de pressão era da elite branca, a mesma que está dando petís em programas colunáveis, aquela turminha do "Cansei", que usou todo o seu conceito de desumanidade para fazer política golpista com as famílias das vítimas da tragédia do com o avião da TAM.
Pois bem, antes de pensarmos dessa forma tão proprietária desse espaço público que, já já, copiará os condomínios luxuosos do Brasil zona sul e o envolverá com uma cerca elétrica com aquelas múltiplas caveirinhas iguais as dos caveirões que invadem as favelas no Rio e que contam com o aval cinematográfico do jornal nacional, com direito até a premiação de jornalismo. Antes, porém, é bom que se lembrem, que aquele espaço, assim como toda São Paulo, foi feito por mãos humanas, não pelo bradado capital de Febraban ou Fiesp. Carrinho por carrinho, tijolo por tijolo, cimento asfáltico com pixe fervendo e derretido de bóias-frias operários mal remunerados que sequer podem dar moradias dignas a seus filhos, que a São Paulo da grana da avenida Paulista, do centro financeiro não quer falar da grandiosidade dessa mão-de-obra, a mesma que ergueu o prédio das muitas bienais vazias ou cheias, não importa, o que importa é que o filho daqueles operários que ergueram o monumento artístico jamais farão parte do universo social dos frequentadores do, agredido, "patrimônio público", público de quem? De quem se acha dono ou de quem o ergueu? Ou será que se jogarmos dinheiro no chão ele terá efeito de semente? Acordemos para a nossa realidade!