Mergulhada nas trevas percentuais, a Lei Rouanet perdeu a luz. Seqüestrada pelo pensamento miúdo da metafísica, seu caráter de sustentação se diluiu em meio a números e planilhas atadas à teia burocrática e empresarial, desautorizando a arte como elemento de caráter político-social.
Hoje, a lei encontra-se vulgarizada e jogada meio a ações de sacrifício comercial, chamado “terceiro setor”, comandado pelo esoterismo sociocultural dos nossos Lobsang Rampas da terceira visão econômica, que andam a levantar pirâmides do Egito para se eternizarem como múmias faraônicas nessa babilônia suspensa nos jardins da Lei Rouanet.
Se, em seu caráter primário, a Lei, tem legitimidade por ser sustentada pela sociedade, por outro lado, a mesma sociedade não a reconhece mais como mecanismo de suporte de uma arte livre que reproduza as demandas críticas à mesma.
A sociedade não enxerga mais a lei como uma mola propulsora de um sistema cooperativado, suas ações não se encontram mais no terreno comum e atendem tão somente demandas institucionais de empresas e seus lógicos cartéis que a emolduraram em um anti-sistêmico neo-aristocratismo.
O MinC não sabe mais como caminhar nesse terreno espinhoso entre as duas velas que acendeu, pois, ao mesmo tempo em que discursava para os “Planilheiros Reducionistas” com promessas meramente corporativas e cantava em coro para os descontentes das correntes sintéticas, a música “No woman, no cry”, por outro lado a sociedade, pacientemente esperava a quebra de paradigmas tão anunciada que não veio. E aí, o Povo, fez linha de impedimento adiantando a defesa.
Hoje podemos identificar as politicas culturais do MinC como “o voo da galinha dos ovos de ouro” e, por conseguinte, os filhos dessa chocadeira do Estado, como os “pintos de ouro” o Jetset do pensamento superior. Essa gente, assim tão culta produz centenas projetos que não duram mais do que um final de semana em alguma paradisíaca estância turistica e não passam de um grand slam do carnaval cultural fora de época. Gente que tenta provar, por A mais B, que ovo tem pelo, ao menos o de Colombo. E ainda dá o nome de “responsabilidade social”. E tome nomenclatura!
Esses furos n’água são feitos por empresas produtoras e capatadoras de recursos que vendem grilo manco como se fosse Saci e adaptam pedalinhos em vitória-régia para vendê-la como atrativo turístico na lagoa Rodrigo de Freitas ou na baía da Guanabara “amazônica”. Como trilha sonora, o som de uma rumba. E, servida em bandeja de prata para o turista “neoingles’, não poderíamos esquecer da, quase reedição do pequeno jornaleiro em projetos de inclusão social.
Isso é o retrato de uma política de cultura temperada com pimenta do reino, no passinho manso de um bem comportado corredor cultural que faz a sua seleção, antes pelos corredores das empresas e, ao restante que não segue a “Teoria do Medalão”, um corredor polonês.
O que mais se parece com o MinC? Não são as fundações, as ongs, as entidades corporativas, as produtoras, as patrocinadoras e seus derivados?
Por que, então apedrejam o MinC, se tais instituições são filhas legítimas desse pensamento constituido e gerado no ventre do próprio, onde se jogou numa mesma assadeira uma massa que, na imensa maioria dos casos, sola diante do calor da fornalha da sociedade, num choque térmico?
Os neocons da “cultura de murici” estão empregnados no Estado, no governo e na estrutura privada que, por sua vez, abraça a grande massa de recursos provenientes da leis de incentivo.
Em nenhum desses ambientes em torno da cultura brasileira há qualquer sentido de pacto federativo, há sim uma busca por metas que fazem da arte um broche qualquer pendurado em taiês e blazers presentes em jantares, reuniões e coquetéis.
Essas políticas de cultura, em síntese, vivem de um “Labirinto da saudade”, dos Poseidon’s de Abrantes da década de 60, forjada pelo ambiente de patota que nega o passado e o futuro e abre campo para um “gran-finale pós-moderno”. Um produto que praticamente engloba todos os sentidos de plasmados projetos culturais do terceiro setor que se esbalda no beco das garrafas com rótulo de “Um bancão e um violão”, num colorido desbotado sem as curvas do nosso tempo, um tropicabossalismo boçal e cizudo, que vive de pijama e que hoje é síndico da Duvivier.
Não há nada de cientifico neste ambiente, nada que transcenda os limites da vulgaridade, do empacotamento reciclado da memória induzida. Esse embute mecanicista achou mesmo que, vencendo seu adversário, levaria o campeonato e fundaria uma torcida e que, na base do WO, venceria a própria sociedade.
A Mediocridade de sucesso passa léguas do magnético e conteporâneo samba de roda, esses que convocaram os tambores brasileiros para um revolução no Cacique de Ramos, os mesmos tambores que Mário de Andrade, com muita propriedade citou em seu livro, “Música de feitiçaria no Brasil”, e aconselhou nossos doutores a ouvirem a genialidade de Mano Elói em seu disco “Cantos de Macumba”. Uma estética erudita de um Brasil africa- ameríndio e mestiçado em sua arte. Na realidade, Mário de Andrade trabalhou para que incorporássemos na leitura orquestral um desenho contextualizado, com frações e texturas melódicas, harmônicas e ritmicas, já que as amarras da liturgia de leitura gringa, fardada de verde oliva, não tinham mecanismos para tal.
Esse extra-sensorial de almeida, primo-irmão do sobrenatural de Nelson Rodrigues, não detctável pelos cabeças de planilha da MBA cultural é mesmo uma teoria bronca para quem trata as questões culturais do Brasil com o limite de suas apostilas. Na arte eles são os eternos teóricos da lei de Darwin que devem estar se olhando demasiadamente em espelhos e vendo refletidos os seus macaqueamentos cotidianos se despentearem ante as nossas realidades.
Eles gostam de inventar o inventado do imprevisivel combinado no ringue do telequete cultural, no eterno improviso de escalas combinadas de Berkeley’s, distante da métrica cadenciada do bailado das gafieiras.
A imagem da Lei Rouanet hoje para os milhares de artistas não cooptados e que usam a arte e não a chalaça para se expressar, é de uma máquina de moer sonhos, um brochante chá das cortes dos amantes do universalismo de transatlântico que evocam a literatura de outras causas numa liberdade de portos seguros, do turismo vigiado pela milícia das ilhas gregas brasileiras, com seus manuais de proprietários debaixo do braço.
Estas causas poucas de si mesmo, que mapeam seus universalismos com seu descricionário e diletante sentido de universal, pois nunca quiseram universalizar a miséria e a fome. Delas, como não podem extrair a carne gorda, arrancam o couro para servir de tapete em seus ranchos abduzidos na grilagem pela lei da selva capitalista.
A lei hoje é este apanhado de interesses escusos de nobreza requentada pelos aportes do mecenato. Um turfe de burros empacados e touros sentados em penicos de ouro. Um mar de inércia e hiprocrizia democrática.
A Lei Rouanet agora vai entrar na faca e com risco de virar um Frankenstein pelo MinC, pior, na hora de remontar a lei, vai sobrar parafuso pra todo lado. Acho mais prudente um spá e todas as técnicas de lipo, pois sabemos que este “fenômeno” de financiamento de cultura, gordo como está, serve apenas para levar chapéu de francês em orquestras em Sao Paulo e em cursos de verão na Bahia e ainda sair vaiado pela própria torcida depois de uma chinelada histórica.
Estás com sono?
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Carlos Henrique, você como sempre com suas críticas contundentes, muito bem apropriadas em suas metáforas. Devo coincidir na reflexão que se fez de uma lei que nasceu da urgência da Cultura e não apenas como mera responsabilidade dos governos em crise de identidade cultural. Hoje essa lei Rouanet não se faz em condições mínimas de probidade. A partir de sua leitura eu concluo que ela sobreviveu alheia, durante muitos anos, à identidade dos recursos dos mecenas que mantiveram-na. Na década de 70 era tão mais simples, desde essa época institucionalizou-se a mediocridade.
Alexandre!
O povo brasileiro tem como uma marca inconfundível, a sua independência cultural. O nosso ambiente institucional, neste mesmo quesito, é que é uma lambança histórica desde a chegada de um Rei muquirana e seu navio carregado de bugingangas e, posteriormente, aquele projeto de aleijar as nossas naturais escolhas, a malfadada missão francesa. Por isso, há ainda neste país no meio institucional, pessoas, e não são poucas, que confundem diálogo multilateral e culturas de vários países, com plágio. E o que assistimos é a oficialização da xenofobia ao contrário.
Nas nossas principais crises institucionais, foi a cultura do povo que reacendeu o país, mais que isso, essa cultura que, diante do Estado, sempre foi periférica. Na história recente da ditadura militar, o que se ouviu como símbolo de resistência, foi a "Opinião" de Zé Keti e "Carcará" de João do Vale, negros, simbolizavam uma cultura segregada racial e socialmente que, no momento vital, foram poetas fundamentais que trouxeram de seus universos periféricos as palavras que se tornaram símbolos de resistência contra a ditadura.
É essa investigação que o nosso ambiente institucional de cultura não quer fazer, prefere trabalhar com a lógica do ícone, então, insistem nessa balela de que Pixinguinha é o nosso Bach, que Cartola ouvia Strawinski, sem querer discutir a massa social que dá aos nossos ícones essa matéria-prima crítica de qualidade indiscutível. A negação às coisas do Brasil é, sem dúvida, o nosso grande equívoco institucional. Qualquer projeto neste país que tenha força simbólica, será sempre um projeto vitorioso, diferente disso, acumularemos onerosos fracassos para toda a sociedade brasileira. A independência é uma necessidade muito mais latente do que se imagina.
Alexandre!
O povo brasileiro tem como uma marca inconfundível, a sua independência cultural. O nosso ambiente institucional, neste mesmo quesito, é que é uma lambança histórica desde a chegada de um Rei muquirana e seu navio carregado de bugingangas e, posteriormente, aquele projeto de aleijar as nossas naturais escolhas, a malfadada missão francesa. Por isso, há ainda neste país no meio institucional, pessoas, e não são poucas, que confundem diálogo multilateral e culturas de vários países, com plágio. E o que assistimos é a oficialização da xenofobia ao contrário.
Nas nossas principais crises institucionais, foi a cultura do povo que reacendeu o país, mais que isso, essa cultura que, diante do Estado, sempre foi periférica. Na história recente da ditadura militar, o que se ouviu como símbolo de resistência, foi a "Opinião" de Zé Keti e "Carcará" de João do Vale, negros, simbolizavam uma cultura segregada racial e socialmente que, no momento vital, foram poetas fundamentais que trouxeram de seus universos periféricos as palavras que se tornaram símbolos de resistência contra a ditadura.
É essa investigação que o nosso ambiente institucional de cultura não quer fazer, prefere trabalhar com a lógica do ícone, então, insistem nessa balela de que Pixinguinha é o nosso Bach, que Cartola ouvia Stravinsky, sem querer discutir a massa social que dá aos nossos ícones essa matéria-prima crítica de qualidade indiscutível. A negação às coisas do Brasil é, sem dúvida, o nosso grande equívoco institucional. Qualquer projeto neste país que tenha força simbólica, será sempre um projeto vitorioso, diferente disso, acumularemos onerosos fracassos para toda a sociedade brasileira. A independência é uma necessidade muito mais latente do que se imagina.
E, se os nossos doutores não querem saber de Brasil, que fará empresas "patrocinadoras"! Já o ilustre Ministro cultura, dá uma entrevista no jornal O Dia com aquela sua habitual seia de comida a kilo, um espetáculo de frações adjetivas, no velho ditado, "Pato novo não mergulha fundo".