Nesta semana publicamos aqui no Cultura e Mercado uma matéria sobre a situação pela qual passa Portugal, com o corte de gastos públicos para a área cultural. Infelizmente, a história se repete em diversos países da Europa.
Mas outros países, cujos governos são liderados por conservadores ou tecnocratas — como a Itália, a Hungria, a Holanda e o Reino Unido — tiveram seus orçamentos culturais cortados. A mesma coisa aconteceu com Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda, que estão sendo forçados a reduzir seus gastos públicos para permanecerem na zona do euro.
Algumas instituições de arte europeias começaram a procurar apoio financeiro nos Estados Unidos, cortejando empresas americanas ou indivíduos americanos ricos que tenham laços emocionais com os países de seus antepassados. Mas, como reconheceu Andreas Stadler, diretor do Fórum Cultural Austríaco em Nova York e presidente da filial na cidade dos Institutos Nacionais de Cultura da União Europeia, isso significa “que estamos competindo com instituições americanas, que também foram duramente atingidas”.
Conversei com alguns dos professores do curso Mercado Cultural, que o Cemec promove a partir da próxima semana, em São Paulo, para saber quais as principais diferenças do mercado cultural brasileiro com relação aos outros países hoje.
Para Ronaldo Bianchi, originalmente, as diferenças são importantes. “No Brasil não chegamos a 1% do orçamento público, na Europa supera, perto de 2%. Nos países europeus a cultura é assunto do Estado, não se pratica renúncia fiscal. São investimentos orçamentários praticados pela burocracia pública. Nos EUA, a proposta é mista, preponderando a renúncia fiscal na sua maioria. Porém, é comum os municípios e estados contribuírem com dotações orçamentárias, programas públicos e entidades que atraiam receitas de turismo.”
A valorização da cultura de forma geral e a noção clara de que os bens culturais têm um papel importantíssimo no comércio mundial são alguns dos fatores que Erick Krulikowski destaca como diferenciais entre os mercados europeu e americano e o brasileiro. “Como a crise na Europa envolve diretamente os governos, seria lógico supor que haveriam cortes – e não somente na cultura: em salários, previdência, saúde, etc. E é por isso que os europeus estão buscando mais do que fontes de recursos, mas também verificar novas formas para diversificar suas receitas. Eles terão que se reinventar, não tem jeito”, acredita Krulikowski.
No Brasil, diz ele, a economia é enorme, mas a parcela destinada à cultura ainda é pequena. Além disso, apesar de termos melhorado muito, a cultura é um item pouco valorizado pelos governos e pelas pessoas e o ambiente de negócios ainda é um desafio para os empreendedores, por conta da legislação arcaica, poucos recursos para pesquisa e experimentação e deficiências graves de tecnologia e infraestrutura.
Rodrigo Salinas completa que, na Europa, existe grande utilização de subsídios diretos públicos, não necessariamente na mesma forma de incentivos tributários ao patrocínio de empresas privadas, mas de apoios diretos. “Em todos os países europeus existe uma grande preocupação com a preservação da cultura regional, não é à toa que eles impulsionaram a adoção da Convenção para a Diversidade Cultural”, conta.
Nos Estados Unidos, por outro lado, provavelmente por sua força e pujança, o mercado em geral tem um papel muito maior no fomento às artes do que os subsídios públicos. “Eu destacaria o mecanismo de benefícios fiscais para todos aqueles que fazem doações para sociedades civis sem fins lucrativos, independentemente do objeto dessas instituições. Além disso, os Estados Unidos tem uma antiga e sólida tradição de apoio dos capitalistas ao desenvolvimento da educação e cultura. Basta uma visita aos principais museus americanos para constatar isso: confira a placa de agradecimentos aos doadores desses museus e você verá uma extensa lista de nomes, desde pessoas físicas até empresas – e alguns poucos ilustres brasileiros. Talvez a interação do setor privado no fomento às artes e educação nos Estados Unidos seja inigualável”, explica Salinas.
Adequação – Ana Carla Fonseca Reis afirma que, tomando alguns extremos como parâmetro, países como a França têm uma política cultural estruturada e norteadora do espaço que cabe ao mercado, utilizando-o inclusive a favor dela. Outros, como os Estados Unidos, não têm uma política cultural complexa ou incisiva como a francesa, mas traçam objetivos muito claros, como a associação com conglomerados de entretenimento. “No caso do Brasil, parece-me que falta acima de tudo essa política norteadora do que o país espera ou não que seja o papel do mercado e como pode usá-lo como ferramenta para tingir esses objetivos”, afirma.
Para ela, a adequação ou não de políticas e programas sempre deve ser analisada à luz de um contexto. “Entendo que nossos programas mais emblemáticos em termos de visibilidade internaciona, como os Pontos de Cultura, não têm por foco o mercado ou o equilíbrio entre produção, distribuição e demanda. Damos grande foco à produção, não trabalhamos a distribuição como seria desejável e muito menos a demanda, que é o que sustenta um mercado. Demanda governamental e demanda de empresas privadas deveriam ser acessórias à demanda da sociedade civil, ou seja, à prioridade que as pessoas atribuem à cultura, a ponto de estarem dispostas a pagar por bens e serviços culturais. Esse é um ponto crucial, que de modo geral ainda não foi incorporado nas discussões em nosso país.”
Claudia Taddei lembra que o modelo norte-americano advém historicamente de um Estado menos intervencionista, o que naturalmente tende a criar políticas que fortaleçam o mercado e suas múltiplas possibilidades de atuação. “Lá o incentivo é tratado de forma natural e institucionalizado. Umas das diferenças com o nosso modelo é que as empresas patrocinadoras dão seu quinhão de fato ao projeto, por acreditarem nos projetos como uma oportunidade não apenas de visibilidade de marca, mas – de um modo bem mais amplo – pelas oportunidades que o ‘empreendimento cultural’ gera”, explica.
Mas ela alerta para o fato de que esse modelo é restritivo, na medida em que vale para iniciativas que conseguem extrair do modelo mercadológico uma forma saudável e sustentável de se desenvolver e se realizar. “Há uma grande parcela de iniciativas, ações, criações que não tem condições de se sustentar no padrão mercadológico e carecem de uma presença maior do Estado e de políticas de fomento cultural eficientes e realmente estruturantes. Neste ponto, o modelo europeu e seu Estado de Bem-Estar são um bom exemplo de como criar instituições que deem conta de preservar e difundir sua cultura de modo amplo e irrestrito.”
Claudia acredita que, embora o mercado cultural brasileiro venha ampliando as possibilidades de participação da sociedade civil, é preciso desenhar formas de viabilizar toda a cadeia da produção. “Tanto países europeus quanto os EUA há muito enxergam o papel fundamental da cultura para o seu desenvolvimento e o fortalecimento de sua economia, além de sua função estratégica nas relações internacionais. Temos hoje umas das riquezas mais cobiçadas por qualquer país de primeiro mundo, uma cultura referência de diversidade, hibrida de uma série de povos. Um universo cultural e simbólico manifesto de forma espontânea e genuína que abriga uma enormidade de talentos. O mundo está ansioso por conhecer nossa cultura e, no entanto, nós mesmos estamos cegos a ela”, afirma.
Para Krulikowski, a diversidade cultural no Brasil é uma característica fundamental no cenário futuro. “Nossa produção é extremamente dinâmica, o que é muito diferente do cenário na Europa, por exemplo. Temos uma capacidade incrível de produzir novidades no campo da cultura e da criatividade e, com o crescimento sustentado do país nos últimos anos, o cenário torna-se muito promissor. Cabe ao gestor cultural compreender seu papel nesse contexto para aproveitar esse momento e não ficar esperando o bom momento passar.”
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