A Revista Cult (Editora Bregantini) realizou entre os dias 3 e 6 de maio o II Congresso de Jornalismo Cultural, em São Paulo. O evento contou com a participação de jornalistas, artistas, produtores, sociólogos, editores e pensadores dos processos da cultura e dos meios de comunicação.
Palestras e debates ocuparam bem o tempo de quem pagou para ver em período integral quatro dias de intensa reflexão – em alguns discursos repetição – entre os mais de 65 convidados que compareceram no Teatro da Universidade Católica – Tuca.
Algumas ideias para além da agenda e da crítica ganham fôlego. A concepção de mercado de uma indústria de massas e o pragmatismo da retórica civilizatória em desconstrução. Beatriz Sarlo, crítica literária argentina, na conferência realizada no dia 3 de maio, resgatou a história das tradições das artes a partir dos grande centros, das metrópoles culturais. Segundo ela, a primeira grande referência que atraia os olhos do mundo inteiro foi Paris, capital francesa, entre o século XIX e o XX. Mas já a partir de 1890, Buenos Aires destacou-se também como um pólo, especialmente no período do modernismo argentino. Para ela, Havana tabém chegou a forjar um novo latino americanismo.
Segundo Beatriz, Barcelona foi fundamental para o reconhecimento dessa identidade. Muitas obras foram reeditadas na Espanha. Mas ela lembra que Buenos Aires continuava a ser a referência principalmente na América Latina. Cien Años de Soledad, do nobel colombiano Gabriel Garcia Maquez, teria sido lançado primeiramente na capital argentina. Mas o mercado foi perdendo espaço. As pequenas editoras acabaram sendo compradas pelo mercado internacional espanhol. Para a crítica literária, onde a obra foi traduzida é mais importante do que onde ela foi publicada
O que ela chama de espanholização dos centros culturais teve por muito tempo como contra ponto, na Argentina, publicações de revistas independentes, nas universidades e a partir de movimentos culturais. De acordo com Beatriz Sarlo, este ciclo já foi fechado. Hoje as publicações seriam menos acadêmicas: “Há ausência de debates fortes”. Os jornais perdiam leitores e novas estratégias para conquistar novos mercados eram necessárias. Nascem os suplementos de rock. “Tornaram-se obrigação quase canônica”, pontuou.
Por essa e outras, a crítica literária acredita que jornais (feito em papel de imprensa) não são mais o melhor espaço para o debate: “A extensão é uma forma e condiciona o texto. O jornalista é o padre do século XIX, é um mediador entre editoras e leitores. Antes os livros eram distribuídos nas redações, sem press releases ou assessores. os jornalistas recebiam o livro em mãos, liam e escreviam suas resenhas e críticas”.
As superproduções de assessorias de comunicação são fenômenos de uma nova rede de produção cultural. “Não existe salto tecnológico que não exija uma reflexão cultural, já disse (Martin) Heidegger. Assim, as questões tecnológicas obrigam a pensar a cultura. Foi assim quando aumentamos a capacidade de impressão com velocidade. Assim acontece com a digitalização”, pontuou a argentina.
Essa relação entre o funcionamento das engrenagens da comunicação de massa com o fazer artístico também estabeleceu expressões mais distantes do que Beatriz Sarlo considera “pensante”. Segundo ela, Depois de Cidadão Kane, o público ficou desunido, segmentou-se. Com Fellini, as vanguardas terminam por dividir o público. Na música, também aconteceu essa fratura. “A lógica do jornal em instalar uma notícia é a lógica progressista. Se morreram 100 hoje, a manchete de amanhã precisa que morram mil. Isso não combina com a lógica cultural”, pontou a crítica literária argentina.
Questão Cultural
Em conferência também no dia 3 de maio, o filósofo e professor da USP Paulo Arantes fez uma analogia entre a metamorfose da questão social e a cultural. Ele lembra que a questão social surge no início do século IXX, a partir das discussões sobre acidentes de trabalho. Já o termo cultura é um termo conservador inventado na Inglaterra, a partir da reflexão sobre cultura e sociedade. “As desigualdades são inventadas. Primeiro vem a interpretação da sociedade e depois vem a idéia. A crítica cultural vem contra a barbárie. É o conceito civilizatório de cultura”, aponta o professor.
Paulo Arantes acredita que a pré-história da ideia de direito social só existe a partir da luta social, do reconhecimento de conflitos de classes. Contudo, no Brasil, o filósofo afirma que começamos pelos direitos sociais, sem luta. “Os estivadores inspiravam medo. Imaginava-se que a revolução viria dali. O populismo de (Getúlio) Vargas observou esses fenômenos e os direitos sociais chegaram ao Brasil de cima para baixo, precedendo os demais direitos. Isso se repete no regime militar. Para a classe dominante, se impunha o dever de civilizar o próprio povo. Assim, o Brasil foi povoado de trabalhadores que não eram cidadãos”, pensa.
De acordo com Arantes, apenas o modernismo descobriu expressões na “ralé”: “um tesouro, que o mercado sempre tratou com descaso”. Já o tropicalismo, “é apenas a versão comercial disso tudo”. Resultado da lógica do capitalismo de imprensa: “na ditadura, a TV apenas aprofundou o processo de reprudutibiliadade e a espropriação social”.
O debate com a questão cultural no Brasil surge apenas nos primeiros documentos do Partido dos Trabalhadores, nos anos 80. Segundo o filósofo, ali surge a preocupação quanto aos meios de comunicação e a necessidade de políticas culturais. Mas o PT previa uma política de enfrentamento social que não era apenas uma visão de democratizar, é preciso repensar radicalmente esses processos. “Propomos isso no início dos anos 80. Depois o PT foi esquecendo tudo e hoje nomeiam globais para o Ministério das Comunicações”, enfatizou o professor da USP.
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Paulo Arantes entende que há boa fé por parte dos jornalistas, contudo ele afirma que, “no Brasil e no mundo, o jornalista só tem a função de embalar produtos culturais. Estão condenados a danação do luxo e do patrocínio”. Há uma saída? “Um jornalista cultural deve tomar posição. É um intelectual precário. Por que não se juntam aos gráficos, aos diagramadores, aos distruibuidores?”, concluiu o filósofo.
Romper com o ciclo
O jornalista e professor Eugênio Bucci participou de uma mesa de debate sobre políticas públicas culturais no dia 5 de maio destaca, para além da cobertura da agenda e da crítica artística, o jornalismo cultural tem o papel de reconhecer a complexidade do que tange a cultura. Conforme Bucci, há um problema de órbita no entendimento de quem faz política cultural no Brasil. Ele lembra que 60% da produção editorial é adquirido pelo Ministério da Educação (MEC).
Além da inter relação da cultura com a educação, avaliando a atuação do governo federal, Eugênio Bucci ressalta o papel do Ministério das Comunicações (MiniCom) para as políticas culturais: “É preciso que o estado acorde para o fenômeno que a cultura caminha e conflui com a educação e a comunicação. Isso precisa interferir na organização do estado”. As contradições são ainda maiores, segundo ele. A verba publicitaria do governo federal passou de R$ 2 bilhões em 2008. Só ficou atrás das Casas Bahia que bateu R$ 3 bilhões. “Há uma estatização expressiva do mercado publicitário. Está ética avança o horário eleitoral e deságua nas campanhas”, destaca Bucci.
Bibliografia obrigatória nas escolas de jornalismo, Carlos Heitor Cony revelou não lê mais jornais. “São muito redundantes”, afirma Cony. No debate Jornalismo literário: a narração da realidade com informações adicionais que fogem à imposição do lead, Cony dividiu espaço com o jornalista Paulo Markun, que acredita que bons repórteres podem romper com esse ciclo.
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Sou estudante de Jornalismo e acredito na importância de se discutir a maneira como a cultura e a educação são midiatizadas. O Jornalismo por si só é um campo que interage com diversas áreas, tanto para transmitir uma informção, quanto apresentar um outro olhar sobre a realidade. É preciso, então, enxergar a profissão como uma aliada a cultura.
E seria ótimo (e indispensável) acontecer um Congresso como esse em Belo Horizonte, que é também um grande pólo cultural. =)
Abraços