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O amanhã da televisão

No mês passado, Luiz Alberto de Oliveira, físico, doutor em cosmologia e curador do Museu do Amanhã, me contou sobre duas recentes descobertas, monumentais, no mundo da astronomia:

1) Uma massa gigantesca é quem segura a gravitação das estrelas nas galáxias, impedindo que essas estrelas se soltem de sua órbita. À essa massa, deram o nome de Massa Escura.  Ela responde por 20% do universo conhecido, até então. Nada sabemos dessa massa.
2) Percebeu-se, também, que o universo está se expandindo aceleradamente. O que poderia ser esta “força da gravidade ao contrário”? Algo fortíssimo, que Einstein detectou, considerou como um erro de cálculo e cuja existência, no entanto, foi comprovada. À essa força, deram o nome de Força Escura. Essa tal força responde por 75% de todo o universo! Nada sabemos desta força, o que é igual a dizer que em 15 anos passamos a desconhecer 95% do universo, ou seja,  95% da nossa casa!

É mais ou menos assim que imagino a nossa situação no mundo da Televisão, hoje. Pouco sabemos, muito especulamos.

A velha TV da sala, com sua centena de canais, agigantou-se e está sendo transmitida para táxis em movimento, celulares no metro e, no futuro próximo, em HD e quem sabe 3D, para qualquer tela que exista. Acabou a Televisão que conhecíamos até há pouco! E com essas e outras mudanças de tecnologia, mudam os modos de produção, os modos de distribuição e assim mudarão os conteúdos deste planeta chamado Audiovisual.

No futuro, eu imagino que Tudo Será Tela. Deixo aqui algumas questões para que possamos refletir sobre esta inevitável Televisão do Futuro.

O que é televisão além de sua definição de visão à distância feita pelo dicionário, ou eletrodoméstico como querem alguns cineastas, ou ainda uma máquina de produção de cultura popular, feita por acadêmicos?  TV vista no computador é o que? A internet vai matar a TV? Ou a internet vai, entre tantas coisas mais, alavancar a televisão com suas redes sociais repercutindo o que se passa na telinha?

Se no Natal de 2013 o grande presente será um tablet (como já foi um celular ou uma câmera digital) , vamos ter então a famosa segunda tela em nossas mãos ligada nas redes sociais, enquanto assistimos à novela das 9 comentando as cenas com os nossos amigos da web?

Ou a própria tela da sala vai crescer e se dividir em metade TV e metade internet num espetáculo de interatividade jamais visto? E ainda, se já sabemos que vamos controlar esta tela através de comando de voz e até mesmo de um comando de gestos, vamos então falar com amigos, ver um filme e comprar o que é exibido ali, quase como uma coreografia sonora na nossa sala de estar e  “tudo isso, ao mesmo tempo, agora”?

E a regulamentação de faixa etária? Como se comportará, se as telas tendem para a vida sem fronteiras?  Como ficarão as crianças neste processo? Poderemos resguardá-las dos conteúdos impróprios ou mesmo das propagandas abusivas? Mas o que é um “conteúdo impróprio” para uma era onde se nasce no Youtube? O governo regula a TV mas e se a transmissão em primeira janela for através de IP (Internet Protocol, ou seja pela web)?

E a programação regional de uma TV? Isso existirá? Em que medida? Quem contará o que acontece no meu bairro? Como produzir regionalmente, com qualidade técnica, artística e qualidade de reprodução/exibição, para as telas  que se multiplicam mundialmente e demandam conteúdos com custos cada vez mais baixos?

Os programas ao vivo serão o coração da TV do Futuro, como diz Boni?

E as histórias encantadas em novelas, filmes e minisséries? Devem continuar, claro, afinal uma boa história é o começo e o fim de tudo. Mas, as obras de ficção deverão ser fortes On Demand. Em 2013, com a chegada do 4G,  garçons e guardas noturnos assistirão ao capítulo da novela  de ontem, no seu ônibus de hoje. E aí como fica a publicidade de trinta segundos que é o que ainda sustenta a TV? Vai virar product placement? Branded content? Todo o comércio audiovisual tende para o merchandising?

Se caminhamos para a interatividade e conteúdo transmídia, como ficarão as narrativas? Programas de ficção permitirão que a gente se aprofunde na vida de um ou outro personagem? Os jogos de futebol devem nos deixar selecionar uma ou outra câmera de nossa preferência ao mesmo tempo em que vendem as camisas dos clubes? Os diálogos com o público através de votação ao vivo e online vão assolar os programas de auditório, Big Brothers, Miss Universo e afins? E falando em futebol, a Copa do Mundo de 2018 vai ser transmitida pela Apple? Faz sentido, certo?

E a sustentabilidade de tantas fontes de informação e entretenimento? Quem assistirá tanta notícia? Essa conta vai fechar?  Como ficarão os direitos autorais de quem cria, se temos tudo tão fácil para download gratuito? Novas formas de encriptar o conteúdo surgirão? Ou a invenção pirata será sempre mais rápida?

O Mercado será o dono do conteúdo? As Marcas terão canais próprios com conteúdos significativos? Estas Big Brands andam apavoradas com a porosidade da crítica nas mídias sociais e deverão produzir “conteúdo de defesa de si mesmas”? O governo vai assumir sua responsabilidade sobre as concessões públicas que são as TVs e, por exemplo, obrigar as emissoras a doar um minuto por hora para campanhas de educação, saúde e tantas outras campanhas sociais? O Desejo de Mercado pode se unir ao Objetivo Social? Quem pressionará por isso? O público? O Estado conseguirá mediar isso? O governo terá que atuar para fomentar o início desta nova era? De que maneira? Durante quanto tempo?

Educar? Como estas novas tecnologias podem se acoplar à TV e trazer informações que inspirem, excitem e transformem o telespectador? Será que um aluno do Acre assistirá uma aula em Stanford, ao vivo, podendo opinar? Isso não é TV. Ou é? Ou, no mínimo, “compete com”?

Como ficará a medição de audiência de um programa que pode ser exibido em tantas telas em tempos diferentes? É isso o que o Mercado e a torcida do Flamengo querem saber. Rápido!

Qual é a função e o alcance dos canais estatais neste universo de multiplayers cada vez mais agressivos? A chamada TV Brasileira deve representar a sociedade Brasileira? Hoje já é possível ver na tela, ou nas telas, um pouco da TV dos sonhos de alguém? Como a sociedade pode mobilizar-se para construir uma televisão melhor? O que vai sobrar desta televisão atual, na TV do futuro? Por que não vemos a TV correr riscos? Será que as agências de publicidade, aliadas às emissoras tradicionais de TV, conseguirão atrasar a Revolução Audiovisual por muito mais tempo? As empresas de telefonia virão destoar o coro dos contentes produzindo conteúdo interativo em escala industrial? A TV continuará sendo a detentora da maior fatia de publicidade por quanto tempo? A internet já está em segundo. E crescendo.

Enfim, onde está a inovação?

Depois do Youtube, do Twitter e do Facebook vem o quê? Os 100 Hangouts On Air do Google já rolou…, enfim, sabemos que virá algo que caberá na tela da sua TV em casa, com certeza, e em todas as outras telas móveis. E vai nos levar para mundos jamais sonhados. Estamos como dinossauros estupefatos diante da certeza da queda de um asteróide em nosso planeta de áudio e vídeo.

No começo da década 80, o então ainda não-presidente FHC dizia que quem detivesse a Informação deteria o Poder. Hoje a Informação caminha para as mãos do Indivíduo… mas, e o Poder? Irá para Ele mesmo como sugere Gilberto Gil? Como ficará a Política e a representatividade cidadã com tantas telas transparentes? Revelar-se-á de quem são as Mãos Sujas da Corrupção? A Punição Online é iminente?

A Rio+20 discutiu como a raça humana poderá lutar por sua própria sobrevivência (note-se que não do Planeta Terra, que, como sempre, sobreviverá a qualquer descalabro no desenvolvimento in-sustentável) quando deveria ter percebido que sem o tripé “Solidariedade, Educação e Cultura” vamos ser mais uma espécie extinta que habitou o planeta Terra.  Simples assim, alertam as antenas do ambientalismo.  Como este Trio de Desejos vai impactar esta TV do Futuro?

O meu amigo Luiz, doutor em física, também me contou que num horizonte de 10 ou 15 anos a ciência vai conseguir unir moléculas de silício com moléculas de carbono, ou seja vai unir o inanimado com a vida, (“afinal as moléculas não sabem o que são”, diz ele) e assim teremos, em breve, aparelhos que possuem um “sistema nervoso”! Ciborgues, para ser mais pop. E isso sem falar nos avanços da neurociência, com seres humanos vendo e “tocando” a superfície de Marte sem sair de casa, com nos conta Miguel Nicolelis.

Caraca! Onde estamos e para onde estamos indo?

Note-se que eu acredito na manutenção de uma tela gigante na nossa sala de estar. Afinal, creio que continuaremos trabalhando o leite das crianças durante o dia e precisaremos de companhia soporífera para nos fazer derreter um pouco no sofá. Mesmo que sejamos interrompidos por nossa sogra numa chamada quase presencial na mesma tela… ou que passemos a viajar numa infinidade de Jogos Maravilhosos que estarão a nosso dispor, competindo online com um “amigo chinês”.

A TV, ou seja lá como se chame esta coisa que se move nas telas com imagem e som, tem um papel fundamental na formação cultural do ser humano, na democratização do conhecimento, da educação, e na divulgação de tudo isso, e para todos nós.  E espero que com muito entretenimento, esporte, jornalismo e ficção, pois afinal somos os únicos na Terra que podemos sonhar. Está claro que se não focarmos no Desenvolvimento Social Inspirador e Solidário, teremos apenas Tecnologia e Mercado. Não haverá Sonho. Seja lá o que isso for. Mas, sem isso, pra que então?

Ah! Neste domingo vou me casar. Será uma pequena celebração em família e não será transmitida para lugar nenhum.

*Com a colaboração de João Ramirez, CEO da produtora Colmeia.

Tadeu Jungle

Diretor de cinema e TV, artista multimeios e sócio do Grupo Ink, produtor de audiovisual.

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