Com o crescimento da importância dos museus no mundo contemporâneo, fala-se até em reserva de mercado para os especialistas de museu. Um artista falar de museu, hoje em dia, pode fazê-lo parecer um intruso, transformado em agente do espetáculo. Ele foi excluído do processo de formatação de uma política para a instituição. Mediante a autorização de um terceiro, o curador, ele tem permissão para mostrar seu trabalho no espaço museológico. Diferente da década de 1970, no auge da arte conceitual, quando o artista pensava em ocupá-lo como um lugar estratégico.
Os anos de 1960 e 1970, em decorrência do regime militar no Brasil, foram agitados no campo cultural: censura, perseguição a manifestações artísticas interpretadas como subversão. Os artistas, que viviam a passagem da modernidade para contemporaneidade, eram obrigados a inventar estratégias simbólicas e metafóricas para romper o cerco à liberdade de expressão. A consciência do sistema da arte (público, artista, obra e instituição) fez com que o artista percebesse o museu como uma instituição de legitimação da obra de arte, alvo de intervenções para desarticular suas inscrições e provocar o espectador.
Com a “Arte Conceitual”, a obra passou a ser de ordem mental e reflexiva, disponibilizando inúmeras formas de expressão artísticas possíveis para o desenvolvimento do trabalho do artista plástico contemporâneo. O público deixou de ser um observador passivo, ele foi obrigado a refletir sobre a obra de arte e o seu discutível entendimento não era mais direto. Mas a Bahia, por exemplo, com sua produção defasada, ainda era provinciana e hostil a qualquer manifestação que não correspondesse às linguagens bem comportadas das “Belas Artes”.
Nas últimas décadas, o museu com sua arquitetura imponente – cujo investimento tecnológico para a sua modernização não é um diferencial, mas uma necessidade de cumprir as funções de preservar, investigar e comunicar – ganhou uma dimensão pública. Por outro lado, o mercado cresceu e concentrou o foco do artista, afinal ele precisa viver de seu trabalho e o museu de arte passou a ser o lugar que recebe sua produção e faz o reconhecimento. Muitas vezes, confundido com playground para atrações em nome da uma “contemporaneidade” a serviço do entretenimento, os museus de arte têm suas programações pressionadas pela democracia dos editais e as leis de incentivo, comprometendo sua missão sociocultural.
A minha vivência no campo específico dos museus teve início de uma forma menos convencional, em meados da década de 1970, como artista plástico agindo nos limites da Arte Conceitual. A arte pensada como uma intervenção num espaço institucional específico, em particular o museu, esse lugar privilegiado para a produção, reprodução e divulgação do conhecimento. Para exposição e acondicionamento de um acervo. Conhecer seus mecanismos e sua arquitetura era requisito indispensável para o artista que buscava um olhar complexo, um olhar crítico do todo, uma relação e articulação mais profícua, entre diversos saberes que repercutiam na produção e na leitura da obra de arte.
Romper com os conceitos tradicionais da arte era uma preocupação do artista que se posicionava como um guerrilheiro no circuito de arte:
“O que me interessa em arte é criar linguagens ou propor novos sistemas de codificação. A linguagem nunca foi fixa, está sempre em mudança, quando a tecnologia avança surgem novas linguagens, novas formas de arte, novas atitudes, novos comportamentos” (Almandrade – 1975)
“No mundo dos signos o artista é um operário ou guerrilheiro da linguagem armado com a teoria da informação e a semiótica, a todo o momento ele está preparado para lutar contra as linguagens acadêmicas propondo novas codificações e envolvendo o público no processo criativo” (Almandrade – 1976)
Instituição paradigmática para a arte contemporânea, conhecer seu espaço físico e a ideologia que a envolve era uma necessidade do artista experimental. Realizei algumas exposições que tinham entre os seus objetivos discutir o museu: O Sacrifício do Sentido, no Museu de Arte Moderna da Bahia, em 1980, a primeira exposição individual de arte contemporânea na Bahia e a instalação “Público/Privado”, montada no Museu de Arte Moderna da Bahia e no Museu de Arte moderna do Rio de Janeiro, em 1982.
As dificuldades eram muitas, fui recusado nos salões locais por fazer uma opção pelo “contemporâneo”. A exposição do “O Sacrifício do Sentido” não foi bem vista pela crítica provinciana e pelo público baiano. Paguei caro. Hoje a coisa está inversa, a arte contemporânea está em todos os lugares, se exige muito pouco do artista. O que mais interessa é o turismo e o lazer, estimular o consumo disponibilizando produtos com prazos de validade, para acelerar o vetor da economia.
Nesse contexto, as iniciativas dos museus dependem do tráfego de influência e da inteligência de quem está à frente da instituição. Entre a burocracia excludente dos editais, as leis de incentivo e a superioridade do mercado, os museus encontram-se sem os recursos necessários para realizar seus projetos e manter uma programação livre de pressões externas que comprometem seus compromissos culturais. Depois da censura, da repressão, do “milagre econômico”, a indústria cultural e de entretenimento ocupa o centro da decisão.
Há urgência por parte do mercado de uma demanda de novidades que resultam em mostrar o que ainda não nasceu. Para o artista consciente do seu papel, o museu é uma oportunidade de mostrar de maneira crítica uma produção de arte e contribuir para a formação e a informação do circuito artístico. Por isso mesmo ele deve opinar na sua política cultural, não só expor, pensar, discutir e participar da produção curatorial.
Pensar sobre a natureza do museu de arte e o trabalho do artista é um desafio da prática museológica, principalmente com a desmaterialização do objeto de arte que implica em transformações e atualizações na forma de mostrar, documentar e armazenar. Há uma dependência recíproca entre museu e artista. O lugar onde está o suposto objeto de arte imprime uma marca ou explicita leituras. A instituição museológica com sua dimensão reflexiva tem o papel legitimador e mediador.
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