Arrisco-me a explorar uma outra dimensão que a cultura pode assumir a partir de uma visão mais ampla e contemporânea deste conceito. Refiro-me às dinâmicas de sociabilidade, às tecnologias de convivência, ao diálogo, às conversações em redes. Sistemas de intercâmbio e interrelação reforçados pelo surgimento das novas tecnologias, mas não exclusivos aos territórios virtuais.
Imaginar e expressar o futuro. Pensar cultura como um farol voltado para as novas formas de expressão e convivência que podemos construir a partir do conhecimento disponível. A ética como princípio norteador. A consolidação da economia como ciência dominante em nosso tempo fez com que lhe subordinássemos todas as outras formas de manifestação humana como fenômenos derivativos, seguindo uma lógica e uma codificação próprias. E com a cultura não foi diferente.
E daí vem a tentação de transformar ricas manifestações culturais em commodities baratas, manuseadas de maneira rasteira e linear por profissionais reprodutores de um conjunto de regras e tecnologias que só interessam à manutenção de um perverso sistema de poder, que se sustenta sobretudo pelo domínio dos meios de produção e distribuição de conteúdos culturais.
Mas o que é a economia senão um fenômeno cultural? O que são o dinheiro, o market share, a pontuação da bolsa de valores, senão valores simbólicos desprovidos de sentido fora de um conjunto de códigos rigorosos chamado “mercado”. Mergulhados nesse contexto, corremos o risco de perder a capacidade de desvendá-los e tornamo-nos apenas agentes de manutenção e disseminação de um sistema de valores linear, unilateral e desumano.
Nessa condição, o consumo consolida-se como a forma de expressão mais forte e presente, sobretudo nos grandes centros urbanos. A própria arte passa a ser ressignificada e vista como meio de produção e objeto de consumo. Corre, assim, o risco de perder a condição e a capacidade de revelar e traduzir a alma humana, suas contradições e riscos. De sua condição única e insubstituível de dar forma à utopia, passa a mera reprodutora de um sistema que o incapacita para o exercício desse olhar mais agudo e sensível.
O Brasil vivenciou na última década um grande salto quantitativo e qualitativo nas relações de trabalho na área cultural. Cultura, como atividade econômica, saiu do confinamento, ultrapassou fronteiras, mas ainda mantém vícios e dependências de uma atividade ligada aos poderes político e econômico.
O país entrou de forma definitiva no cardápio do entretenimento global. Um dos principais mercados das chamadas majors do cinema e da indústria fonográfica, o país vivencia a efervescência de uma nova Broadway tupiniquim, que já demonstra sinais de vitalidade. Do ponto de vista da exportação das artes e da cultura local, o momento atual nunca foi tão profícuo. Desde Paulo Coelho, um dos autores mais lidos da atualidade, até o futebol e a música, o Brasil nunca esteve tão em voga no cenário global.
O gestor cultural precisa estar atendo para valer-se dessas oportunidades. Participar ativamente do mercado da cultura sem estar a ele subordinado é uma das questões éticas mais difíceis ligadas ao cotidiano do gestor cultural. Por isso a necessidade de investir em um conjunto de ferramentas adequadas para lidar com a administração e o marketing, por exemplo, mas não sem fazer uma incursão mais profunda na questão ética.
Não há nada que influencie mais a conformação de um produto cultural do que o seu sistema de financiamento. Presume-se, por exemplo, que um filme distribuído por uma major norte-americana teve menos liberdade artística do que um filme independente. Este, por sua vez, terá mais dificuldades de conquistar público, justamente porque as salas comerciais pertencem às grandes distribuidoras. Um bom gestor cultural precisa saber manejar essas variáveis, que são inúmeras e complexas, a ponto de arquitetar novas dinâmicas que invertam a lógica do domínio e o aprisionamento da criação pelo capital.
Atuar na atividade cultural é algo que exige conhecimento genérico e específico, ao mesmo tempo. Saber balancear uma formação humanística ampla e consistente, capaz de apreender e decodificar nuanças, especificidades e contextos, necessários para compreender melhor a teia de relações e interesses onde está inserido, em especial os políticos e econômicos, com o conhecimento técnico, que o habilite e dialogar com todas as instâncias da sociedade.
É preciso buscar meios de destrinchar conceitos ligados ao manejo da questão simbólica e apresentar cenários capazes de representar realidades complexas e diversas, em detrimento das cartilhas de formação técnica e linear.
A atividade cultural exige agentes preparados e dispostos a pensar e atuar com base em novas possibilidades, mais complexas, múltiplas e coerentes com as questões colocadas pela sociedade contemporânea. Capazes de pensar
uma nova agenda política para lidar com os desafios do mundo atual, articular setores governamentais, sociedade e mercado para atuarem alinhados em torno dessa agenda, além de desvendar a cultura como ponto de partida, como
meio de construção dessa agenda e como eixo central dos novos paradigmas de desenvolvimento.
O segredo para sair da linearidade do mercado, talvez esteja no exercício de uma abordagem multidimensional para a atividade cultural. Ao implementar um processo de natureza cultural, o gestor deve estar apto a lidar com inúmeras vertentes que, juntas, conferem ao processo a riqueza necessária para desviar-se dessas armadilhas.
Qualquer atividade cultural, do Cirque du Soleil ao maracatu rural de Pernambuco, é parte integrante deste “conjunto distintivo de atributos materiais, espirituais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou grupo” definido pela UNESCO. Cuidar dessa dimensão é essencial para que não perca sentido dentro do próprio contexto social onde foi gerada.
Cuidar da dimensão econômica, por exemplo, já exige um outro olhar, mais voltado para os processos de produção, distribuição, troca, uso ou consumo dos bens simbólicos.Que pode ser complementado com um conjunto de
instrumentos de apropriação desses bens.
Essa dimensão é complementar ao desenvolvimento artístico, à pesquisa de linguagem e à proposta estética que a atividade propõe. Que por sua vez não está desvinculada de valores éticos e morais, tampouco à sua dimensão cidadã. É preciso, sobretudo, entender esse ambiente da economia da cultura como algo em pleno processo de transformação e desenvolvimento.
Um mercado promissor, mas ainda incipiente, o que exige uma intensa articulação entre os membros dessa cadeia produtiva para a conquista de um olhar mais apurado da sociedade em relação à sua importância estratégica.
* trecho do livro O Poder da Cultura.
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Desculpe colega mas uma política cultural tem que ter prioridades. Tudo é tudo, a gente sabe, mas tem o que a gente faz e isso deve ter prioridade. Essa história de que agora a gente está incluído na rota internacional é fruto o complexo de capacho tupiniquim e provinciano, o que estamos assistindo e uma festa globalizada no nosso terreiro e a gente só entra pagando o ingresso ou pagando a importação de figurinos, que tal? Vamos ser um pouquinho mais rigorosos. Talvez o sonho paulista de virar Nova York um dia passe e a gente possa olhar de frente para nós mesmos, o Ibira não é Central park. Nossa questão é como vamos responder a hegemonia, de que maneira vamos lidar com ela, regozijar que o mundo é redondo é coisa do tempo de Galileu, convenhamos.
E essa moda Brasil lá fora é xoxa, é mais conversa do que moda. A música não tem meios nem elementos para sua projeção, é objeto de extravagantes, tem reprodução residual. Tem prestígio mas não mais do que isso. Paulo Coelho, bem...Paulo Coelho é Paulo Coelho, não tem nada a ver com nossa Literatura e tem muito pouco a ver com moda Brasil, seus leitores não ditam moda, e mais, receio que já foi, passou. Nosso futebol tem prestígio, moda? Nunca...é preciso ter mais cuidado nessas coisas, ficam repetindo uma coisa que francamente...não corresponde. O que tem empolgado o mundo vindo do Brasil é o Lula! Ponto. É o crescimento e a situação econômica, é a percepção do gigante e sua capacidade econômica...isso sim. Do ponto de vista cultural estamos na idade da pedra, não temos projeto para a Nova Cultura e estamos solapados pela presença estrangeira. Ponto....oi skindô, oi skindô.
Irritando os nacionais. Braço do Grupo Tom Brasil, o Instituto Brasilis foi autorizado pelo Ministério da Cultura a captar recursos incentivados para patrocinar a vinda de bandas e cantores internacionais. Nomes como Chuck Berry, Madeleine Peyroux e Jon Secada, que passarão neste ano por Vivo Rio e HSBC Basil, casas pertencentes ao grupo, serão utilizados para obter recursos com investidores. Ao todo, a instituição poderá levantar até R$ 5,3 milhões. A receita de bilheteria prevista com as 26 apresentações previstas é de R$ 374 mi...será?
Caro Gil, não é bem verdade. Até mesmo impulsionado pelos fenômenos Com Lula e, pq não, Gilberto Gil, o país está sim inserido na cena contemporânea cultural mundial. A música, as artes, os modos de vida, a diversidade e a economia brasileira estão em voga. Mas é mais do que isso. O mercado cultural brasileiro está em alta. O ingresso da Madona aqui é o mais caro do mundo. O país está na rota dos megaeventos, de primeira à última linha, do supremo ao café requentado, como o Guns'n Roses e o Aha! A Time For Fun, empresa de entretenimento tupiniquim, está entre as 10 maiores empresas do mundo no setor. Temos uma Broadway de altos e baixos. Estamos, sim, alimentando o nosso sonho novaiorquino.
Isso não quer dizer que eu concorde com isso, que considere o máximo, que esteja comemorando. Mas que existe, existe. É só sair do país para ver. E eu tenho saído um bocado nos últimos anos.
Abs, LB
Olhe, Brant e Gil, não discordo de nenhum dos dois, apesar de alguns pontos de vista diferenciados os dois tem razão em tudo. A área cultural com a sua nova visão de economia da cultura ainda não oficializada pelo IBGE, que pela enorme diversidade e capilaridade dessa economia, o referido órgão ainda não conseguiu fechar as contas, é no mínimo o dobro da parte do PIB produzido pela indústria automobilística, mas a maior parte é produzida pelo audiovisual, o resto da cultura são zeros vírgula alguma coisa que somados ao audiovisual chegam a esse número fantástico ainda não definido.
Quanto a prioridades o atual Governo foi exatamente contra esse desejo provinciano de querer fazer da São Paulo uma "Nova Iorque", foi linha desde Gil a interiorização da cultura, uma visão voltada para as manifestações culturais populares, o que tem gerado algumas distorções como a submissão das manifestações aos interesses mercadológicos do turismo cultural, não dá para botar um "tambor-de-crioula" em cima de um palco italiano para gringo ver. É o turismo que tem de se submeter às expressões culturais e não o contrário.
As tradições culturais populares vivem se renovando endogenamente, mas a mudança exógena deve ser evitada e até reprimida legalmente.
Na II Conferência Nacional de Cultura, e em suas diversas
pré-conferências, a presença do interior foi fortíssima, a Amazônia e o Nordeste estavam em peso, não só cobrando o seu espaço, como o conquistando e, principalmente, contribuindo com propostas sérias e profundas, deram um banho no Sudeste, que com algumas exceções, apresentou delegados ligados a grupinhos e panelinhas todos cheios de picuinhas e mesquinharias, eu,carioca,delegado mais votado para representar os artistas visuais fluminenses tive vergonha pela região Sudeste, e confesso que até fiquei nauseado fisicamente com o comportamento de alguns companheiros dessa região.
Houve uma denúncia que a representação de São Paulo foi descaracterizada e diminuída pela falta de apoio do Governo estadual, é bem possível, pois a cidade do Rio de Janeiro também sofreu esse tipo sabotagem quando da I CNC, pois o prefeito da época não só detesta artista, como sempre se manteve como uma oposição imbecil ao Governo Federal.
Problemas, eles são muitos, as variantes também são muitas,mas as soluções talvez sejam em um número bem menor, creio que é só ter peito de encarar certos fatos, vendo onde estão os gargalos e os nós,nós desfeitos, gargalos abertos e/ou alargados, o resto o povo e os artistas fazem.
Alexandre Lambert
Sem dúvida que sempre que seguimos um blog ou somos seguidos, formamos uma verdadeira teia, capaz de ter um alcance quantitativo e qualitativo para matérias formativas e informativas, que mídia alguma consegue ter. POR ISSO PARABÉNS PELO BLOG.
Doutra feita, CONVIDO VOCÊ, seus seguidores e quem você segue, para lerem matéria sobre o espetáculo SAGRADO E PROFANO, que ocorrerá na cidade de Senador Pompeu, interior do Ceará, no pequeno Distrito de Engenheiro José Lopes. Experiência artística que mobiliza toda a população, que além de encenar a Paixão de Cristo ainda tem os caretas, que há cerca de 70 anos, saem pelas ruas. Experiência artística, social, política, folclórica, econômica..... que merece ser relatada, imitada e, sendo possível, vista e visitada ao vivo. Boa leitura em:
http://www.valdecyalves.blogspot.com
Gilberto Gil? Música Brasileira, Artes, modos de vida!!!...mas onde é que vc tem andado companheiro? Isso não existe. Fora Lula, nada, somos os caipiras que Fernando falou, somos bons de pagar ingresso, estamos importando que é uma coisa...nossa balança já acusou...mas pior, na área cultural estamos na lona, na lona! Não adianta ficar repetindo um sonho anacrônico que ele não se realiza, é nossa psicose...pura psicose. Estamos na lona, não há o mais remoto vestígio de "moda"brasileira pelo mundo, era só o que faltava...o mundo é protecionista pra começar, pra continuar, o mundo é ocupado pelos americanos, na música, no modo de vida, no cinema, na cultura, em tudo companheiro...que mané moda brasil....de onde saiu isso? Gilberto Gil tadinho, faz sua tournezinha por aí catando os caraminguás, quem fatura é a Madonna, O Guns e o diabo a quatro...e' só abrir os jornais, daqui e de lá, seja onde for nesse mundo. A nossa caipiragem acha que quando sai uma matéria no Economist isso quer dizer que estamos mandando...francamente...menos, menos, bem menos...enquanto a gente não perceber o fracasso que estamos metido no âmbito cultural a gente não sai do lugar.
Qual é o nosso projeto para o meio digital? Comprar, comprar, comprar importados...que mais? Onde anda nossa música? Quanto vende? Só compramos. Nosso modo de vida?????Qual?
Somos o país da Noviça Rebelde...que tal?
É verdade. Estamos na fila, pagando a conta. Mas podemos vender também. E temos vendido, aqui e acolá, de maneira frágil, mas com potencial, como diz o artigo. Aliás, ele traz coisas mais importantes, mas o seu negócio não é debater, é emparedar, xingar, assediar, com seus mil comentários. Isso nós dispensamos, pois temos mais o que fazer. Abs, LB
ok Leo, só valem os seus mil comentários, o dos outros não. E só valem as suas verdades e dicas importantes...lamento.
Pô, está escrito aí "Seja gentil. Jogue Limpo. Fique no assunto. Sem Spam". E aí, Sr Brant? O Gil Lopes joga limpo, é gentil (não sei como consegue), e está estritamnte no assunto que o SENHOR puxou com seu artigo. Mas eis que bastou ser questondo umpouco e SENHOR age exatamnte igual o qu julga combater. Intolerante, arrogante, excludente, prepotente, autoritário, limitado, e burro, como todo estalinista quese preze. Lamentável, caro Brant, mas, bom ter caídoa máscara e mostrado para qum mesmo foram colocads aí esses avisos. O SENHOR foi muito mimado,é óbvio, a "bola" é sua, e qualquercoiinha o SENHOR leva para casa e ninguém joga mais, tadinho, só que já passou da hora de sair do colo absoluto e vir para a vida real que nem sempre faz todas as suas vontades ou é exatamente como o SENHOR quer. Direito ao contraditório pode lhe contrariar, SENHOR, mas é muito saudável por ser democrático. E se quiser pode censurar também o meu comentário, esse sim, vai justificar a sua prepotência e confirmar a minha impaciência para com esse tipo de comportamento pusilâneme e hipócrita.
Tenha um dia à altura de sua baixaria.
Com carnho,
Geraldo Maia
Poeta