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Os cinco maiores captadores de recursos (2)

Acredita-se que existem proponentes que conseguem captar mais recursos para seus projetos culturais do que outros, por constituírem redes sociais de contatos com empresas incentivadoras. Eventualmente, as conexões nessas redes sociais de contatos fazem algumas empresas assumirem posições nas quais podem se privilegiar por intermediar realizadores culturais que não teriam contato entre si senão por meio delas, bem como com outras empresas que também possuem ações de cidadania empresarial na área da cultura. Portanto, se busca responder a seguinte pergunta: como está estruturada a rede entre as empresas incentivadoras e os maiores captadores de recursos para projetos culturais quanto ao poder de intermediação destes atores? Assim, este estudo parte das hipóteses de que existe uma rede social entre os realizadores de projetos culturais e as empresas incentivadoras de seus projetos e de que esses relacionamentos colocam alguns atores em posição privilegiada em relação aos outros.

Para estudar as redes sociais constituídas pelos maiores captadores de recursos e as empresas incentivadoras, foram utilizados dados secundários, disponíveis no banco de dados na página eletrônica do Ministério da Cultura.

Uma vez caracterizados os cinco proponentes que captam o maior volume de recursos por meio do mecanismo de incentivos fiscais para realizar projetos culturais, é possível perceber que algumas empresas aparecem como incentivadoras em projetos de proponentes diferentes. Desta forma, é aceitável a ideia de que existe uma rede social que conecta os diversos realizadores de projetos culturais e as empresas incentivadoras. Existem conexões entre 4 proponentes captadores por meio das empresas incentivadoras (AATMRJ, Fundação Bienal de São Paulo, Instituto Itaú Cultural e MASP) e 1 está isolado captando recursos com empresas que nenhum dos outros tem contato (H Melillo). Existe uma alta heterogeneidade de poder de intermediação entre os proponentes, ou seja, alguns atores são mais intermediadores do que outros de maneira considerável.

O poder de intermediação pode ser um atributo tanto dos atores sociais como dos laços que conectam os atores. O ator com maior poder de intermediação é a Fundação Bienal de São Paulo. Esta organização possui contato com 43 empresas incentivadoras, das quais 34 não possuem contato com nenhum dos outros 4 proponentes captadores, fazendo desta organização um grande intermediador entre estas 34 organizações e os demais atores da rede.

Além da Fundação Bienal de São Paulo (65,3%), outros atores parecem como importantes intermediadores. Em ordem de maior poder de intermediação, aparecem o MASP (26,5%), o Instituto Itaú Cultural (12%), a AATMRJ (10%), o Itaú Vida e Previdência (8,9%) e a Petrobrás (8,4%). Os números em percentagem entre parênteses representam o número de intermediações efetivas que cada ator realiza em relação ao total possível. Os demais atores da rede possuem um índice inferior a 3,5%. É possível perceber que quatro dos cinco casos analisados aparecem como fortes intermediadores, à exceção da H.Melillo que busca captar recursos com empresas que não tem contato com os outros quatro proponentes, não havendo conexões entre eles desta forma. Também é importante notar a presença de duas empresas com índices de intermediação que se destacam na totalidade analisada. O Itaú Vida e Previdência se destaca por ser a única empresa incentivadora que aparece apoiando 3 dos 5 proponentes analisados. Já a Petrobrás se destaca por sua posição. Assim como outras empresas também fazem, a Petrobrás apóia 2 dos 5 proponente, porém é a única empresa que intermédia de maneira exclusiva uma dupla de proponentes.

O mesmo cálculo que é feito para a centralidade de intermediação dos atores também pode ser feito para identificar os laços com maior poder de intermediação entre os atores, ou seja, as pontes. O laço com maior poder de intermediação, sendo portanto a ponte com maior importância é o laço estabelecido entre a Petrobrás e a Fundação Bienal de São Paulo. Outro laço que também aparece como uma importante ponte é o estabelecido entre a Petrobrás e a AATMRJ. Desta forma, a Petrobrás se torna um ator chave neste processo, uma vez que estabelece os laços com maior poder de intermediação na rede. Este caso é útil para demonstrar que em vez do número dos laços que um ator possui, as escolhas de com quem se conectar é que o faz ter uma posição privilegiada em uma estrutura social. Apesar de o Itaú Vida e Previdência conectar um número maior de atores e também estabelecer importantes pontes, é a Petrobrás que constrói as pontes mais importantes desta configuração.

Os resultados deste estudo confirmam a hipótese de que existe uma rede social constituída pelos proponentes de projetos culturais ao mecanismo de captação por mecanismos fiscais e as empresas incentivadoras destes projetos. Assim, ao contrário do que possa ser percebido no cotidiano, as relações entre os realizadores culturais e as empresas incentivadoras não são diádicas, mas são partes de uma rede de relações maior onde cada ator estabelece múltiplos laços.

Nesta rede de relações, os proponentes buscam recursos em várias fontes diversas para seus projetos. Portanto, o papel de articulador institucional é essencial para o gestor cultural ter sucesso na captação de recursos para seus projetos. Assim, o gestor cultural deve ser capaz de se com os executivos que tomam as decisões com relação a incentivar ou não os projetos. este ponto é particularmente importante por se tratarem de dois profissionais que atuam em atividades e ambientes culturais muito distintos. Os gestores culturais muitas vezes são os próprios artistas que desenvolvem os projetos e enxergam o mundo de maneira subjetiva, se preocupando com a estética artística e com a contribuição cultural de seus projetos. Por outro lado, os executivos enxergam o mundo de maneira objetiva e se preocupam com os retornos de publicidade e desenvolvimento local dos projetos que incentivam. Por isso, os proponentes de projetos culturais que buscam recursos com empresas pelo mecanismo de incentivo fiscal devem ter em suas equipes pessoas com habilidade para se comunicar com as empresas nas formas delas.

Uma forma de facilitar a comunicação com as empresas, é se concentrar em um determinado setor de atividade, como é o caso da H.Melillo que tem como foco as geradoras e distribuidoras de energia elétrica, bem como a Fundação Bienal de São Paulo tem como foco os laboratórios de analise e diagnóstico. Entretanto, é evidente que em alguns casos, os proponentes são organizações adjacentes às empresas incentivadoras, como é o caso do Instituto Itaú Cultural. As instituições financeiras merecem destaque por serem as empresas que aparecem com maior predominância no incentivo aos projetos culturais.

Também é importante ressaltar que as organizações proponentes analisadas são todas bem consolidadas e reconhecida na sociedade pelos projetos que elas desenvolvem, facilitando de certa forma o interesse das empresas associarem a sua marca aos projetos desenvolvidos por organizações que já desfrutam credibilidade na sociedade. Desta forma, é importante para os proponentes de projetos culturais construir uma história de credibilidade junto à sociedade para atrair as empresas incentivadoras. Superar o desafio de ter uma boa reputação e credibilidade na sociedade não depende de realizar projetos milionários com abrangência nacional. Para os realizadores culturais, é importante manter relações honestas com a comunidade e ser reconhecido como alguém que está sempre buscando melhorias para a população. Para as empresas incentivadoras, vale mais apoiar um pequeno projeto de alguém que é reconhecido na comunidade, do que apoiar um grande projeto de alguém que nunca se ouviu falar antes.

Os resultados deste artigo também confirmam a hipótese de que existem atores que podem ser destacados com relação aos seus poderes de intermediação na rede social. Neste ponto, a Petrobrás merece destaque por ter aparecido nos resultados como uma importante intermediadora e responsável pelos laços ponte mais importantes. Esta posição pode ser conferida à Petrobrás por ser a empresa que mais incentivou projetos culturais no ano de 2010 com o valor de 112,4 milhões de reais no total. A posição de intermediação e os laços pontos são úteis para controlar as informações e recursos que são transacionados na rede, bem como para gerar inovação a partir do intercâmbio destas informações e recursos entre ambientes diferentes.

Contudo, mais pesquisas precisam ser realizadas para analisar se os atores apontados neste estudo utilizam as suas posições privilegiadas, seja para o controle ou para gerar inovação. Também é preciso mais pesquisa para ampliar o estudo, analisando um número maior de proponentes na rede. E por último, é sugerido que os laços entre os proponentes e as empresas incentivadoras sejam avaliadas em profundidade na sua qualidade para identificar a presença e as características de relações positivas ou negativas, sejam do tipo de dominação ou oportunismo, sejam do tipo de confiança ou amizade.

Paulo Thiago N B de Melo

Coordenador do Cineclube Pajeú vinculado ao Centro Dramático Pajeú (Serra Talhada-PE) e doutorando em Administração na Universidade Federal de Santa Catarina.

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