Em entrevista ao Cultura e Mercado, Fernanda Martins, presidente do Divercult, organização internacional com sede em Barcelona, analisa o papel da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, seus avanços, obstáculos e desafios, no âmbito internacional. Ela também detalha as ações do Divercult e do projeto Conversas Diversas, plataforma de pesquisa e ação com foco na busca de alternativas para o desenvolvimento de políticas e práticas culturais.
CeM – Qual a sua avaliação em relação à Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, promovida pela Unesco?
FM – A convenção adotada em outubro de 2005 pela Conferência Geral da Unesco, em Paris, em vigor desde 18 de março de 2007, prevê estímulo a estratégias independentes para o setor cultural reafirmando o direito soberano dos estados de definir as políticas públicas para a cultura. Parte da necessidade de defesa dos mercados à distribuição hegemônica de bens e serviços culturais, diferenciados pela natureza de perpetuação de valores locais. Reconhece a importância da prática de cooperação cultural e do diálogo como vetores fundamentais para salvaguardar as identidades plurais e os direitos culturais.
CeM – E quais os avanços alcançados?
FM – Dois anos depois, a chamada Convenção da Diversidade Cultural passou por revisões em plano internacional para aprimorar sua aplicação. Em julho de 2007, em Madrid, ocorreu a primeira Reunião de especialistas em Cooperação Internacional para avaliar os artigos 12 e 16 que tratam das propostas para políticas e medidas de cooperação, reforço das capacidades individuais e definição de perfis dos diferentes atores que trabalham pela convenção. Em dezembro do mesmo ano acontece em Otawa a primeira reunião do Comitê Intergovernamental, formado por 18 países membros. Além de estabelecer as bases operacionais de ações, o encontro sugeriu mecanismos para a utilização do Fundo Internacional da Diversidade Cultural, interpretado por alguns como subsídio aos países em desenvolvimento. Na ocasião, o atual presidente do Comitê, o embaixador do Canadá, Gilbert Laurin destacou: “Agora conseguimos entrar em um acordo que servirá para a proteção e promoção das expressões culturais, como de fato está previsto na Convenção”. Em junho de 2008, antes da sessão extraordinária do Comitê, as partes se reuniram em Paris junto a organizações não governamentais para discutir o papel e a participação da sociedade civil na implementação da convenção. A preocupação era viabilizar a contribuição ativa da sociedade civil definindo funções, contribuições e coordenações; abrir propostas para a participação pública e determinar as prioridades para o acesso ao Fundo Internacional da Diversidade Cultural.
CeM – Quais são hoje os principais desafios, no âmbito internacional, em relação à Convenção?
FM – As ações em âmbito internacional visam estreitar as diretrizes da Convenção à sua aplicação prática. Entretanto, o desafio atual está relacionado à capacitação de recursos econômicos para implementar essas medidas. O desempenho do Fundo Internacional para a Diversidade deve estar claramente posicionado como colaborador, doador ou auxílio para práticas. O setor privado precisa ser envolvido identificando as vantagens ao reconhecer os princípios do documento.
CeM – Como o Divercult atua diante desse cenário?
FM – A partir das discussões que antecederam a Convenção da Diversidade Cultural foram criadas diversas redes culturais com o objetivo de promover as variadas expressões da cultura e colaborar com a distribuição de bens e serviços culturais por múltiplos meios. Nesse sentido, destaca-se a Aliança Global para a Diversidade Cultural criada em 2002 pela Unesco, a qual prevê parcerias públicas e privadas entre seus membros favorecendo políticas setoriais para atender às indústrias culturais. No mesmo período surge a Rede Internacional para a Diversidade Cultural (INCD) composta por artistas e profissionais da cultura de mais de 50 países. Em 2003 a Rede se associa a Brant Associados e cria o Instituto Diversidade Cultural com a missão de desenvolver, propor e defender políticas de preservação, investigação e promoção cultural no Brasil e no mundo. Com a entrada em vigor da Convenção o Instituto Diversidade Cultural evoluiu e se consolidou como Divercult, hoje uma organização internacional com sede em Barcelona que trabalha a partir de três pilares estratégicos: investigação de praticas, políticas, programas, projetos e atores que contribuam ao diálogo entre culturas; articulação entre representantes destas atividades, em dimensão pública e privada, a fim de elaborar uma agenda participativa para a diversidade cultural e difusão de métodos e conteúdos em favor da diversidade consolidando um centro de referencia sobre os movimentos que tangem o tema composto por notícias, artigos, publicações, eventos e acordos internacionais.
CeM – Pode falar um pouco mais sobre a atuação do Divercult?
FM – O Divercult atua prioritariamente em âmbito ibero-americano e na relação com os países de língua portuguesa. Um dos projetos é o Conversas Diversas, uma plataforma de pesquisa-ação com foco na busca de alternativas para o desenvolvimento de políticas e práticas culturais. Neste caso, o objetivo é identificar novas formas de fazer, financiar e promover o audiovisual nos países ibero-americanos não apenas como fim, mas como meio de autorrepresentação. A rede articulará agentes envolvidos em atividades que contribuam na transformação sociocultural de seu entorno através da ampliação do acesso a conteúdos audiovisuais.
A partir dos debates facilitados pela rede será produzido coletivamente o documentário “Te Están Grabando” retratando efeitos da industria cinematográfica hollyoodiana sobre as culturas locais, inclusive com depoimentos dos principais especialistas do setor. Para ampliar a participação pública foi criado o Videolog dedicado ao estudo e discussão sobre o tema. A busca de ações independentes da indústria audiovisual constitui uma ação imprescindível. As obras audiovisuais, a pesquisa de iniciativas e o exercício de intercâmbio permitem conhecer este espaço compartilhado por histórias, sistemas políticos e processos de sociabilidade diversos.
CeM – Projetos brasileiros podem fazer parceria com o DiverCult?
FM – O Divercult desenvolve projetos próprios e em colaboração com parceiros. A página disponibiliza informações atualizadas sobre eventos e fundos que podem atender a diversos projetos desenvolvidos no Brasil, especialmente aqueles que apresentam métodos consolidados para a promoção da diversidade. O país é reconhecido internacionalmente por essa capacidade e se posicionou à frente das discussões sobre o tema. O Divercult oferece parcerias locais para efetivar processos que demandem articulações em âmbito europeu, seja com gestores de fundos ou com outras organizações internacionais. Estamos comprometidos com o estímulo à produção de conhecimento conectando poder público, sociedade civil e mercado em uma agenda progressista.
CeM – Qual sua avaliação sobre o setor audiovisual na Espanha?
FM – Minha avaliação pessoal é que a Europa, de modo geral, sofre menos os impactos proporcionados pela industria audiovisual norte-americana por estarem mais preparados apresentando estruturas internas mais consolidadas no setor, como o exemplo o caso da França. Nas principais capitais é possível encontrar um maior cardápio de produções, especialmente da Índia. Existem salas que exibem somente produção nacional, geralmente gratuitas ou a preços baixos. Outro ponto importante é a freqüência das mostras e festivais. Muitos acontecem em diversas capitais levando conteúdo diferenciado por toda a Europa. É também uma das estratégias para lidar com a imigração, cada vez mais presente em todos os países europeus devido a abertura a novos países membros nos últimos anos. A maior parte dos projetos audiovisuais são financiados com verba pública, principalmente local, por meio das prefeituras. É fácil encontrar mostras gratuitas e cinema ao ar livre com milhares de pessoas, o que contribui muito para que a decisão de “ir ao cinema” permaneça no habito dos espectadores.
CeM – A presença das majors é o principal entrave para o desenvolvimento das produções audiovisuais nos países ibero-americanos?
FM – Acredito que seja o principal entrave para que as produções ibero-americanas sejam sustentáveis. O monopólio da distribuição de um lado inibe o escoamento das produções nesses países. Porém, o que se nota é que os produtores têm encontrado alternativas para distribuir suas obras, especialmente através dos novos meios. Entretanto, o modelo ainda não oferece retorno aos criadores. Por isso existe a preocupação internacional em regularizar o mercado, para que os registros de qualquer comunidade possam chegar aos olhos de expectadores de todo o mundo, sem depender exclusivamente da indústria audiovisual como está estabelecida.
CeM – O monopólio das majors também é responsável pela carente integração entre as produções cinematográficas nesses países?
FM – Acredito que neste aspecto se está avançando. O número de co-produções vem aumentado. Iniciativas como a TAL (Televisión América Latina) é um exemplo de integração na área. A Rede Mercosul Cultural foi criada em 1998 também para integrar artistas e produtores e facilitar o compartilhamento de experiências. A OEI (organização dos Estados Ibero-americanos) e a Aecid (Agencia Española de Cooperación Internacional para el Desarrollo) colaboram com oportunidades para formação e intercâmbio. O programa Ibermedia, criado em 1997 é o principal fundo para a criação de um espaço audiovisual ibero-americano. Porém, a presença das majors acaba por comprometer a distribuição das obras em condições equitativas.
Fonte: Ministério da Cultura* O Ministério da Cultura atingiu 100% de transparência ativa de acordo…
Até o dia 10 de fevereiro, a sociedade terá a oportunidade de participar da escolha…
O Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic) estará aberto a partir…
O Instituto Cultural Sicoob UniCentro Br está com inscrições abertas em seu edital de seleção…
Estão abertas, até 04 de fevereiro, as inscrições para o Edital Elisabete Anderle de Estímulo…
Estão abertas, até 10 de fevereiro, as inscrições para o Edital Prêmio Cidade da Música,…