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Política e Cultura


Neste ano eleitoral faz-se necessário enfatizar que as artes e a cultura são fatores de aprimoramento econômico e social e refletem, sobretudo, o universo simbólico de um povo. Não são um luxo, um resíduo, mas o suporte para a conquista da soberania e da liberdade.

O Estado do Espírito Santo tem uma riqueza étnica ímpar, decorrente dos inúmeros imigrantes que aqui aportaram e mesclaram suas culturas de origem com os habitantes locais, resultando numa pluralidade de ritmos, timbres, danças e elementos visuais expressos em folguedos originários e releituras de manifestações artísticas similares. Há um sentido místico religioso, de louvor, de sentimento coletivo na música, na coreografia e nas letras dos cantos. As criações contemporâneas, por sua vez, retrabalham o passado e nos projetam para o futuro através da assimilação de novas linguagens e novas modalidades de expressão. Incentivar esta diversidade criativa é, portanto, dever da política pública na área da cultura.

A cultura tem assim um papel estratégico na construção de um Estado socialmente mais justo e igualitário. Não é algo meramente decorativo, ornamental, mas a base da elaboração e da revalorização da identidade, fundamental para o desenvolvimento socioeconômico, e capaz de gerar trabalho, redistribuir renda e de atrair divisas para o Estado.

Uma política cultural democrática almeja sempre atingir o maior número de pessoas e não ficar restrita a elites privilegiadas, nem ser um balcão de serviços. Pressupõe ampliar o acesso aos bens culturais e planejar a boa gestão dos recursos públicos garantindo qualidade e abrangência.

Pressupõe também o fomento a novas linguagens artísticas, através de ações inovadoras, apoiando e incentivando trabalhos de experimentação e pesquisa. É, pois, na interação entre memória e inovação, imaginação e técnica, tradição e tecnologia, e na necessidade de se produzir reflexões críticas, que se fundamenta o aperfeiçoamento sociocultural.

Hoje, quando se busca refazer conceitos e metodologias, e a pluralidade de matrizes culturais abrem novas formas de investigação e atuação política, a cultura se mostra um eficiente campo transdisciplinar. Assim sendo, ela faz convergir metas e métodos comuns, o que a capacita para interagir com fenômenos e relações sociais diversas.

O conceito contemporâneo de cultura abrange a cidadania, a convivência democrática, a diversidade de expressões, as novas tecnologias e a ética.  A cultura é livre, aberta, plural e, se há um caminho que ressignifique as conquistas da civilização, valores como justiça, liberdade e paz, ele passa pelo entendimento do papel da cultura no processo de transformação social. Nesse sentido, ela se articula com o conjunto de políticas públicas, prioritariamente com as de educação, turismo, ação social e desenvolvimento econômico.

Que os debates, que em breve se iniciam, sobre programas eleitorais em importantes esferas do poder público dêem a devida relevância à cultura e aos seus desdobramentos.

Erlon José Paschoal

Gestor Cultural, diretor de teatro, dramaturgo e tradutor. Foi gerente na Secretaria de Políticas Culturais do MinC e é sub-secretário da cultura do Espírito Santo.

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  • De acordo, totalmente, com o Erion. E ainda nesse sentido e fazendo uma ponte com o teatro, que é uma das grandes formas da manifestação cultural, cito Walter Benjamin, que reflete sobre o Teatro Narrativo e a partir desse ponto podemos extrapolar para todo o universo cultural, e entender um pouco mais esse papel da cultura nas sociedades.
    “No interior de um corpo social, estabelece-se um imaginário comum de mitos, crenças, histórias e memórias que vão sendo transmitidas das experiências individuais para o repertório coletivo. Cabe ao artista/narrador perceber, espelhar e criar novas imagens, histórias e crenças que vão integrar o imaginário de sua época.”(Trecho de “O Narrdor” de W.Benjamin)
    Acompanhando o pensamento de Walter Benjamin em seu ensaio “O Narrador”, vemos que o processo histórico levou as sociedades contemporâneas a um distanciamento da experiência do viver em coletivo, da noção de corpo social. Acarretando um individualismo exacerbado que acabou empobrecendo o fazer teatral e a sua via de comunicação com o público. O reflexo a esse individualismo crescente no Teatro é o seu afastamento cada vez maior de um Teatro Épico/Narrativo, que discorra sobre personagens e situações que dizem respeito a um coletivo, se tornando um Teatro Melodramático trabalhado sobre questões que dizem respeito a trajetórias individuais.
    Partindo do princípio que o Teatro é sempre uma experiência coletiva de identificação e reflexão de uma sociedade a respeito de si mesma, uma sociedade individualista produz um Teatro distante da sua função primeira, de: Espelhamento > Reflexão > Transformação Coletivo Social.
    Compartilhando ainda do pensamento de Walter Benjamin, a Narração (e a cultura no seu âmbito geral) é uma das grandes formas de se transmitir o conhecimento e dividir uma experiência. E através da transmissão de conhecimento e sabedoria dos Narradores (e da cultura), que uma sociedade passa a se conhecer, se fortalecer, criar uma memória e uma identidade.

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