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Professores, a Teia e o secretário

Diferentes coberturas na grande mídia abrem espaço para a discussão da ideologia presente no Jornalismo Cultural e na cobertura de Políticas Pública

Matéria de capa da Folha do último domingo se colocou contra os direitos trabalhistas dos professores, que a seu ver, ou sob a ótica da equipe editorial, abusam de folgas, abonadas, licenças e faltas descontadas, compreensão semelhante à de seu concorrente direto, O Estado de São Paulo, que em reportagens recentes expôs resultados, e não causas, da gestão do sistema escolar público, como a falta de professores não permitindo o atendimento universal ou de qualidade, mas não o fato das salas estarem superlotadas ser um agravante para a saúde dos mestres.

O caos no sistema público, por lógica cartesiana e considerando como certa a afirmativa do matutino paulistano remete à brilhante solução apontada pela personagem de Suzana Vieira na principal novela da Globo, a Duas Caras – educação séria no Brasil, só se for privatizada, ou seja, ou com o Estado bancando Organizações Sociais (OSs), e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips) para realizar as atividades que têm realizado até então, como a contratação de professores, com uma licença pública, à exemplo da gestão do lixo e dos transportes públicos e das telecomunicações e de estradas e de tantas coisas mais, ou você simplesmente tira o setor público de certos setores, como o universitário, e quem quiser, e puder, que pague pela educação. Mas que, pasmem, será uma educação de primeiro mundo!

Na entrega do Prêmio Escola Viva, o secretário Célio Turino, responsável direto pelo programa Cultura Viva no MinC, comentou sobre a postura de uma repórter da Folha de São Paulo. Antes do mais, um elogio. A Folha se preocupou em escalar uma repórter para cobrir o evento. Foi uma cobertura personalista, focada sobretudo na figura de Gilberto Gil e em sua saída do MinC depois de cinco anos de gestão, mas levou a público debates como o da TV Pública e a importância estratégica do Cultura Viva e dos Pontos de Cultura. Fecha parentesis: justamente estes pontos específicos da cobertura é que chamaram a atenção do secretário, em especial as críticas à presença extrema e sufocante do MinC nos Pontos. Turino aproveitou o mote para abusar da poesia, e declarou que “este é um programa que se sustenta nos sonhos, na idéia de fazer um Brasil melhor”.

Cobertura semelhante à da Folha repetiu-se ainda no Estadão, sem enviados, e nas mídias regionais, focadas nos Pontos que foram para BH. E, como era de se esperar, nas mídias de Belo Horizonte, embora em boa parte focando os shows e apresentações que ocorreram de 7 a 11 de novembro. Buscou, o núcleo 100 Canais, realizar uma cobertura focada na discussão das políticas públicas e em alternativas, inclusive para melhorar o espaçoescolar e a pedagogia aplicada hoje (como, esperamos, seja possível de se perceber na cobertura presente na AgênciaTeia e nas matérias desta edição). Mas qual o papel, e o alcance, dessa mídia? Ao mesmo tempo que ela não é lida por mais de 20% da população, chutando muito alto, pois os grandes veículos não chegam à 1%, segundo levantamento recente sobre consumo cultural do IBGE, a falta de uma discussão nos meios de comunicação por radiodifusão deixa de fora desta discussão grande parte da população.

Muito mais presente tem sido o contínuo bombardeio de todos os setores da mídia sobre a TV Pública, presente inclusive na entrevista que Gil deu à Folha. Enquanto a mídia discute a TV Brasil a partir de seus pontos negativos – possibilidade de aparelhamento pelo Governo, desperdício de recursos, politicagem para sua aprovação, composição de seu conselho – não se discutem questões que pareciam razoavelmente claras na fala de alguns dos Pontos de Cultura, durante a Teia: a TV Brasil realiza um papel deveras particular e necessário, o de ser uma TV pública nacional, inclusive contando com a participação dos Pontos de Cultura, e por isso mesmo botando em discussão as questões que os compõe, com todas as suas contradições e também com os avanços de seus processos de formação. Talvez assim se discuta políticas públicas. Ou nos restará somente o lema anarquista do CMI, com seu “seja a mídia”?

Guilherme Jeronymo

Morador do Campo Limpo (Zona Sul de São Paulo), é jornalista e mestre em comunicação, além de pesquisador no núcleo Alterjor, da ECA/USP.

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