No último dia 14 de junho, a Folha de São Paulo publicou no Caderno Ilustrada que o Museu da Casa Brasileira (MCB) passará ao comando da Fundação Padre Anchieta (FPA), fundação de direito privado responsável pela TV Cultura e que, sendo a proprietária do Solar Fábio Prado (casarão que abriga o museu), solicitou ao estado a sua devolução.
A bem do interesse público e considerando a reconhecida qualidade das ações que vêm sendo desenvolvidas nesse edifício, por meio da parceria entre a Secretaria da Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo (SEC) e a organização social A CASA, é fundamental que qualquer alteração de destinação do imóvel esclareça previamente:
Num momento de recursos escassos, cultura sob ataque e sem espaço para sofrer (mais) efeitos de decisões mal-fundamentadas, essas são apenas algumas primeiras e singelas questões, para contribuir ao necessário e ampliado debate.
O momento pede foco na superação dos imensos desafios pandêmicos e pós-pandêmicos. E é justamente quando há tantos problemas a solucionar, que o que funciona bem não pode ser perdido ou prejudicado. Mesmo que todas as atenções estejam voltadas para as dificuldades, é necessário reconhecer que temos sim iniciativas públicas com bom desempenho, apesar dos percalços e que elas vêm contribuindo para que ultrapassemos a tormenta. No caso do setor cultural, ainda que a Secretaria da Cultura seja alvo de críticas por questões variadas, é inegável que a gestão dos museus estaduais tem se esmerado para garantir a preservação do patrimônio e a retomada das ações presenciais, mesmo com todos os cortes de recursos e as limitações sanitárias.
O planejamento de médio prazo e a transparente execução dos recursos orçamentários sob modelo OS na cultura paulista alcançou um nível de acompanhamento, monitoramento e avaliação rigoroso e transparente, sobretudo na área de museus – fruto da dedicação incansável das equipes da pasta e do empenho das organizações sociais parceiras. As parcerias com OS de museus são cuidadosamente planejadas e acompanhadas por uma pequena, qualificada e comprometida equipe de servidoras e servidores públicos. Há um esforço de envolvimento de todo setor museológico paulista na definição das políticas públicas para os museus do estado. O planejamento dos museus da SEC é integrado ao planejamento do Sistema de Museus do Estado, observa a Política Nacional de Museus e as principais recomendações das entidades internacionais do setor. As ações previstas são executadas por organizações sociais especializadas, experientes e vocacionadas aos temas museais com que atuam. Esse trabalho e monitorado e avaliado tanto pelo controle interno da Secretaria (Unidade de Monitoramento) quanto pelos órgãos de controle do poder executivo (Secretaria da Fazenda) e do poder legislativo (Tribunal de Contas do Estado).
Historicamente, a Unidade de Museus da SEC tem o maior número de contratos de gestão com organizações sociais e as melhores avaliações internas e externas, praticamente desde o início do modelo OS. Tudo isso é fruto de um trabalho de enorme dedicação, competência técnica e persistência no registro, pesquisa e análise dos dados, visando melhorias constantes nos processos e resultados.
É um compromisso que tem se mantido tanto na Secretaria quanto nas OSs parceiras e é a razão pela qual, apesar de todas as dificuldades da pandemia, os museus da SEC conseguiram receber 1.046.129 pessoas presencialmente em 2020 (26% do público total de 2019) e alcançar a marca de 12.904.452 de visitas no formato online – dado inédito e bastante expressivo quando se considera o contexto de isolamento, ausência de preparo, recursos técnicos e know how para a atuação virtual, ausência de tradição do próprio público para acesso a essas iniciativas e todos os cortes de recursos e de pessoal.
Esse registro é importante porque, ao mesmo tempo em que o modelo OS contribuiu para manter e aprimorar as ações dos museus ao longo dos últimos anos em SP, ele também criou uma sistemática de trabalho que se pauta por uma política de estado. Isso quer dizer que as ações têm consequências. Não se pode planejar algo e depois mudar de ideia; pactuar uma meta ou verba e depois não cumprir, porque fica tudo registrado e disponível para qualquer pessoa, com destaque para todas as pessoas envolvidas no processo de fiscalização. Isso não quer dizer que seja tudo enrigecido, como acontecia com convênios e licitações. Pelo contrário: há grande flexibilidade e espaço para a criatividade dentro do compromisso público assumido, e até margem para mudar ações e previsões orçamentárias. Entretanto, tudo precisa ser sempre claramente justificado antes e detalhadamente comprovado depois. Nesse sentido, não há “margem de manobra” ou de “encaixe” de nada que não possa ser republicanamente respondido e publicizado. Essa grande vantagem do modelo OS – que é a flexibilidade na execução associada ao rigor e transparência no planejamento e prestação de contas – tem funcionado muito bem na área paulista de museus. Não sem defeitos e contínua necessidade de correção e aprimoramento, mas indiscutivelmente sem nenhuma outra opção anterior ou paralela em uso no país que comprove resultados iguais ou melhores. Alterações nessa dinâmica de gestão precisam ser justificadas e, no mínimo, demonstrar que os potenciais benefícios previstos não acontecerão em detrimento da qualidade, do controle social e da transparência que têm sido assegurados.
A Fundação Padre Anchieta tem um respeitável histórico de realizações no campo da comunicação, da educação e da cultura, que incluiu, mais de uma vez, a gestão temporária de espaços e grupos artísticos do estado. Foram momentos difíceis, em que o recurso à FPA foi decisivo para evitar a paralisação ou mesmo encerramento de atividades de instituições históricas como a OSESP e a Jazz Sinfônica. Ainda que tenham sido efeito de conjunturas bastante complexas e adversas, os relevantes serviços prestados pela Fundação nesses períodos não podem ser esquecidos. Todavia, também é importante observar que essa instituição já tem imensos desafios e responsabilidades relacionados à sua finalidade de promover atividades educativas e culturais por meio do rádio, da televisão, da internet e de outras mídias que se revelem adequadas ao cumprimento de sua missão institucional, consubstanciada na produção e emissão de programação de caráter educativo, informativo e cultural. Ainda que a gestão de bens e equipamentos culturais possa integrar o rol de ações da FPA para alcançar esses objetivos, é essencial entender porque razão ela deveria fazer isso agora, assumindo a gestão do Museu da Casa Brasileira, que é um dos poucos museus brasileiros que conta com gestão eficiente e bons resultados há anos, apesar de todas as instabilidades tão conhecidas. Mais que isso, é vital compreender de que forma se garantirá que essa mudança em período tão delicado representará benefícios para o museu, para a própria Fundação e para o interesse público.
Isso tudo, claro, desde que a intenção real por detrás dessa solicitação de devolução do Solar Fábio Prado não represente a intenção de ocupá-lo de maneira diversa, retirando dali o Museu da Casa Brasileira. Se assim for, torna-se ainda mais urgente conhecer os planos da atual gestão pública estadual para assegurar que o patrimônio museológico da casa brasileira seja adequadamente transferido, com todos os recursos e requisitos necessários para garantir no mínimo, e logo, equivalente qualidade dos serviços culturais prestados.
Sem essas respostas, o que se vislumbra, infelizmente, é mais risco ao patrimônio histórico e cultural paulista e brasileiro. É necessário que o governo paulista, que tanto empenho tem dedicado a distanciar suas ações do danoso governo federal na gestão da saúde, também no campo da cultura reassuma um papel de liderança, responsabilidade e compromisso público.
Estão abertas, até 26 de maio, as inscrições para o Edital de Patrocínio CCBB 2026-2027.…
A Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo abriu uma…
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) lançou a página Aldir Blanc Patrimônio,…
Estão abertas, até 5 de maio, as inscrições para a Seleção TV Brasil. A iniciativa…
Estão abertas, até 30 de abril, as inscrições para o edital edital Transformando Energia em Cultura,…
Na noite de ontem (20), em votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) no Congresso…