Qual seria o futuro dos pontos de cultura? O que eles decidirem ser. Por quê? Porque a cultura viva não depende de Programa para existir.

Apesar da ascensão da formulação de políticas culturais no Brasil, o setor ainda vive cenário de terra arrasada. A recente pesquisa divulgada pelo IBGE aponta os desafios do reconhecimento das expressões culturais como fundamentais à sociedade. A cultura ainda não faz parte do desenho de políticas públicas em 42,1% dos municípios e apenas 4,2% dos municípios contam com secretarias exclusivas de cultura. Os números sobre o despreparo da gestão de políticas públicas são assustadores, porém mais assustador ainda é lembrar que até pouquíssimo tempo atrás essas pesquisas nem sequer existiam.

A anunciada massagem dos pontos veio até agora para quase setecentas expressões comunitárias articuladas em uma rede pública em construção. O baixo orçamento do Ministério da Cultura ainda não condiz com a proposta de considerar que todos são pontos, e o financiamento público da cultura permanece refém da Lei Rouanet.

No governo federal, Gilberto Gil e sua equipe experimentam essa política tropicalista de estado sem apoio do próprio governo. Ao que todos indicam, o ministro deixará o cargo em janeiro de 2008 e os ministeriáveis substitutos (de Frank Aguiar à Roseane Sarney) estão longe de serem os gestores entusiastas dessa política.

Qual seria o futuro, portanto, dos pontos de cultura? O que eles decidirem ser. Por que? Porque a cultura viva não depende de Programa para existir. A base dos pontos são ações que já existiam antes de um convênio com a União, e continuaram a existir com um eventual distanciamento de propostas de governos. Os pontos não são pontos deste ou de qualquer outro governo.

Ao estado cabe mediar as relações da sociedade, e a plataforma pública da diversidade cultural brasileira está em desenvolvimento. Muitas são as questões que se inter-relacionam, como a regulação dos gargalos produtivos dos meios de comunicação ou flexibilização dos direitos autorais neste ambiente de convergência tecnológica. Em quase seis anos de governo Lula, é mais que evidente o desinteresse de Lula pela diversidade cultural, seja por estar assessorado de ministro preocupado em defender os radiodifusores, seja pelo pífio orçamento do MinC.

É papel da sociedade continuar essa salada tropicalista da cultura na formulação de políticas que preservem e protejam a diversidade das expressões artísticas. A Teia – enquanto processo político de empoderamento, protagonismo e autonomia, tenta devolver à sociedade tudo de todos. Um processo que exige o reconhecimento e a resignificação de sentidos sobre o que a cultura representa na vida das pessoas e a gestão dos saberes de uma sociedade baseada no conhecimento livre. E a sociedade precisa estar preparada e articulada para isso. Ou esperaremos todos um biquinho na teta da vez?

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4Comentários

  • Marcos Moraes, 25 de setembro de 2007 @ 10:50 Reply

    Muito oportuno o artigo. Mas é fato que a sociedade se articula melhor quando encontra o interlocutor (gestor público) atento e aberto à conversa. Quando se encontra com a resistência e a hipocrisia habitual dos gestores da coisa pública ela tende a se retrair e engrossar o coro dos que não creem em nenhum diálogo com “governo”. Por tanto, articulações pela continuidade das políticas ‘boas’ desta administração deve ocorrer agora. Por outro lado há pontos que não foram bem respondidos nesta administração. Além da Lei de Renúncia Fiscal (ainda erroneamente chamada Rouanet) e do baixíssimo orçamento, a questão da DESBUROCRATIZAÇÁO da maquina pública me parece ser chave para qualquer avanço e está na ordem do dia. Burrice do tempo colonial + corrupção= burocracia estatal.

  • F.C.B., 26 de setembro de 2007 @ 13:50 Reply

    Como é que é? O Gil vai sair? Pare o Brasil que eu quero descer.

  • Nina Fola, 26 de setembro de 2007 @ 22:44 Reply

    Adorei o artigo, mas tive arrepios quando li os nomes dos indicados à vaga. Não sabia deste planejamento de saída do Ministro.
    Mas o que mais me incomoda nisso tudo é o silencio frente à greve dos funcionários do Ministério!! É preocupante, no mínimo!!!

  • Carlos Henrique Machado, 27 de setembro de 2007 @ 10:57 Reply

    Vejo com certa tristeza a saída do Ministro Gil. O Minc da era Gil avançou bastante em alguns setores, mas temos que admitir que foi de forma periférica e ainda embrionária. Alguns pontos como a própria lei Rouanet, seu formato, sua inacessibilidade para a maioria dos artistas brasileiros e a própria responsabilidade da escolha do projeto a ser patrocinado por empresas que, na grande maioria, não tem responsabilidade com a cultura de fato, foram pontos cinzentos na administração Gil. A Funarte continuou sendo o que sempre foi, um elefante branco, mórbido, acabrunhado, palaciano. Um edifício central que corresponde a quase zero as ações do estado em seu entorno.

    A música, segundo o IBGE, é a principal referência da nossa cultura diante do povo, apontada pelos brasileiros como a sua legítima imagem, mais até que o futebol, continuou sendo vista pelo Minc com descaso, que não lhe deu, até hoje, um assento institucional. Continuamos nas mãos da OMB, sindicato e Ecad. O que frustrou muitos músicos neste país. O áudio-visual roubou bastante o espaço nas ações do Minc na atual gestão. O tropicalismo não foi uma marca fundamental da administração Gil, até porque o tropicalismo tinha como locomotiva, fundamentalmente, a música, num claro respeito às opiniões e paixões do povo brasileiro, pois foi por ali que caminhou a tropicália, onde o povo mais se identificou pelo chamado da arte tropicalista. Mas o fato de maior ineficiência da administração atual do Minc, foi a falta de uma política desburocratizante que pudesse criar um canal direto com o sanfoneiro, o violeiro, o contador de histórias, ou seja, o homem simples.

    A discussão dos gestores atuais do Minc errou a mão na questão do mercado. Deu-se excessivo foco à questão da inclusão em novos mercados. Na grande maioria das ações, o mercado não veio, a não ser para alguns interlocutores, o que podemos chamar sim, sem medo de “elite branca da cultura”, porque essa elite é que pode montar escritórios, transitar e explorar os mundos espontâneos da nossa cultura frente ao Minc. Não houve uma política libertária, a burocracia não deixou. No entanto, a mesma burocracia beneficiou marketeiros, intelectuais de ocasião e gestores privados de um manancial rico que, sutilmente, foi explorado por esse misto de empresário, acadêmico e marketeiro. Não é difícil constatar o que estou dizendo. Em alguns pontos de cultura, por exemplo, as bandeiras do Minc foram fincadas com alarido, mas concretamente, pouco ou nenhum benefício trouxe se comparado às expectativas criadas nessas comunidades. Enfim, mesmo ácidas as minhas visões da realidade da atual gestão, aplaudo o esforço do Ministro Gilberto Gil. As demandas são grandes mesmo. O colonialismo social, cultural, mental, intelectual, ainda é o grande chiclete agarrado ao calcanhar do estado brasileiro. E, na área da cultura, mesmo disfarçados de alternativos, são tão sordidamente elitistas quanto o grupo engravatado do PSDB e seus antecessores. Nesse caso, nessa monta toda, a questão mudou só de trajes e costumes cotidianos do corpo que envolve todo extenso mecanismo. Os fins que seria a elevação da auto-estima através da cultura do povo brasileiro, foram filtrados por grupos lenientes e acomodados mas beneficiados com a idéia de superioridade de um ser frente a outro, ou seja, a questão central ficou de fora na administração Gil. O colonialismo continua nos salões comemorando os feitos nos coquetéis e o cortejo segue lá fora com um copo de Q-suco e um pão com mortadela.

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