Reescrever sempre e supervisão artística

A primeira inovação é o próprio formato dos seriados. A qualidade e o imenso sucesso da telenovela brasileira criou hábitos de linguagem que precisam ser superados para a criação de seriados inovadores.

São inúmeras questões de narrativa que costumam ser pouco trabalhadas nas telenovelas e nos seriados brasileiros atuais. Não temos espaço aqui para dar um curso completo de roteiros de seriados, mas vamos nos ater a alguns aspectos.

O principal problema dos roteiros brasileiros tem um nome: estrutura dramática. A escola da telenovela treinou os autores a escrever a obra em processo, sem saber o desfecho, uma cena após a outra e com imensa rapidez.

Nunca sobra tempo para muitas reescritas, nem para análise da estrutura. E para a novela isso nem é necessário. A telenovela é baseada em um bom drama, muito diálogo e bons personagens. Mas é muito difícil criar estruturas complexas escrevendo um capítulo por dia. Alguns autores têm conseguido, mas são maravilhosas exceções.

Esse modelo de criação impede as telenovelas de terem uma série de características narrativas comuns aos seriados, como por exemplo: a manipulação do ponto de vista, o jogo de reviravoltas que engana o público criando suspense e surpresa, as elipses dentro das cenas, as cenas mais curtas, as cenas dramáticas aonde o silêncio é tão importante quanto o diálogo, entre outras.

O modelo de produção também criou uma série de limitações de linguagem que, com o passar do tempo, viraram regras para quem escreve novelas, mas que podem e devem ser quebradas na escritas de seriados.

Resumindo a diferença entre seriados e telenovelas, o autor David Chase (criador do Sopranos, marco do seriado americano) afirmou em sua palestra no Brasil: “Na soap opera nós falamos que vai acontecer alguma coisa, ela acontece, e nós contamos que ela aconteceu. Em seriado, a coisa apenas acontece”(citação não literal). Essa característica da telenovela foi necessária e ainda é necessária ao gênero, que dialoga com um público que pede repetições. Mas em seriados é diferente.

Outra coisa importante é que os seriados contemporâneos (ao contrário das séries clássicas) são criados para ter curvas longas, pequenos detalhes que são plantados em um episódio e que podem repercutir em outros episódios. Isso é interessante pois fideliza a audiência ao enredo e premia os espectadores que assistiram a todos os capítulos.

Essa técnica exige grande controle da estrutura dramática que em roteiro chamamos escaleta. O exemplo mais simples: o autor precisa saber o desfecho da série antes de criar a primeira cena. Como diz o roteirista Billy Wilder: “Se você tem problemas no final de seu roteiro fica um conselho: volte para começo” (citação não literal).

Os problemas são todos de início. Mas fora a relação entre desfecho e inicio da série, existe uma série de construções que perpassam episódios de forma sutil e constroem uma verdadeira teia narrativa. Essa capacidade de analisar as estruturas e criar estruturas mais complexas e ambíguas é fundamental para a criação de seriados.

E, por fim, os personagens não são planos e não são definidos logo de cara. É muito comum personagens que vão se revelando durante o enredo, revertendo as expectativas do público. Surpreender o público é o grande objetivo. E para isso só existe duas regras: conhecer as regras do gênero e saber quebrá-las na hora certa.

*Continua na próxima semana
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