Para um público treinado na lida com a cultura e seus meandros, como é o caso dos leitores e colunistas deste espaço, com certeza não passou despercebido à ninguém a polêmica que envolve a mais tradicional orquestra brasileira desde o início do ano.
Início do Problemas
Após uma temporada 2010 repleta de sucessos, aplaudida e comemorada inclusive pela FOSB ( Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira) e pelo regente Roberto Minczuk (que ocupa simultâneamente os postos de diretor artístico e regente titular, situação mundialmente criticada, já que tais cargos tem a função de gerar, quando assumidas por pessoas diferentes, o contrapeso em decisões artísticas e de gestão!), no início das merecidas férias, todo o corpo orquestral recebeu, por carta, a convocação para “ avaliações de desempenho”, a serem realizadas no retorno das atividades e que configurariam-se em apresentações individuais de 30 minutos para cada músico.
Já aqui podemos questionar dois pontos, quais sejam:
– Se todo o Corpo Orquestral faria a prova, porque também não o Regente, ou ele não faz parte da Orquestra?
– Em qualquer área de trabalho – que não a cultura, sempre tratada como algo alheio às regras que regem o entendimento das leis do Trabalho – este tipo de convocação em período de férias seria tratado como Assédio Moral!
A comissão dos músicos, junto com o Sindicato dos Músicos, tentaram sem sucesso a anulação da convocação junto à Justiça do Trabalho, porém esta entendeu que por ser a FOSB uma fundação privada regida pela CLT, a aplicação de tal avaliação seria possível e legal. Mais uma vez as questões da cultura são julgadas tendo-se como norma outras áreas e sem a análise de seus próprios paradigmas. Entre as questões não entendidas pela Justiça Trabalhista é que um artista após seu teste de admissão, seja em um corpo orquestral, de dança ou teatro, já não precisa de avaliações individuais de desempenho, haja visto que seu desempenho é medido cotidianamente em ensaios e apresentações! E o mínimo que espera-se de um bom diretor de teatro, dança ou de orquestra é que seja capaz de avaliar no cotidiano se um artista lhe apresenta desempenho satisfatório ou não! E a não capacidade sobre tal, geraria (como gerou!) uma desconfiança então sobre a real capacidade de discernimento técnico e artístico de tal diretor! Afinal, se ele não consegue no todo ver o desempenho individual de seus artistas, como poderá ele garantir ser capaz de interpretar e garantir o nível de seu trabalho, já que ele é baseado no resultado da “ manipulação” artística do coletivo, o mesmo “todo” que ele não sente-se capaz de julgar nos ensaios?
Qual um técnico de futebol que não conseguisse analisar a performance dos jogadores em campo e delimitar a qualidade de cada jogador naquela configuração de time e acreditando que ter os melhores jogadores “audicionados” individualmente lhe proporcionaria um time “ dos sonhos”… Sabemos por experiência que nem sempre esta equação mostra-se verdadeira!!!
Como mostrou-se improdutiva a ação via Justiça do Trabalho, assim como com a repetida ausência da FOSB nas audiências marcadas no Ministério do Trabalho, em assembléia os músicos decidiram boicotar as avaliações, tais como seriam realizadas.
Medo de Avaliações ou Simplesmente desejo por Regras Claras?
Antes de continuar, e para evitar discussões já exauridas pelas redes sociais, os músicos nunca foram, não são e continuarão não sendo, contra a idéia de avaliação em si, mas sim contra a configuração adotada. Entre críticas recebidas pela Comissão de Músicos, havia a que a mobilização seria por temor pela não aprovação, o que pode ser verdade em alguns casos, porém, entre os músicos “ amotinados” e “ insubordinados” (palavras usadas pela FOSB em entrevistas) estão também alguns, brasileiros e estrangeiros, considerados de “ alta performance e excelência artística” ( não somente em nossas paragens tupiniquins mas também pela crítica internacional), e que não teriam porque temer tais audições. Um exemplo é Nigel Shore, que já integrou a Filarmônica de Berlim, e publicou uma carta aberta em que não só repudiava as audições, como pedia demissão da OSB, não sem antes criticar o processo e questionar porque um músico convidado para vir ao Brasil por sua excelência artística pelo atual regente, precisaria agora provar a mesma capacidade que originou sua contratação.
O desejo dos músicos era, antes de tudo por regras mais claras quanto ao modo como seriam avaliados, já que temiam que o pano de fundo de tal evento fosse tão somente justificar a demissão de músicos que desde sempre geraram resistência ao Diretor Artístico em questões que acreditavam ser necessárias mais envolvimento do corpo orquestral.
Como resultado do não comparecimento 41 músicos tiveram a demissão por JUSTA CAUSA decretadas pela FOSB.
Simples demissão de uma entidade privada?
A princípio parece um fato corriqueiro de uma empresa que decide dispor de parte de seus funcionários de forma legal e (bem) amparada juridicamente. Porém, como sempre se faz necessário em nossa área de atuação, um olhar mais cuidadoso demonstra certos vícios, e intenções não muito claras nas ações da FOSB.
Primeiro o método em si, pois se a meta é alcançar a “ excelência artística” internacional, nada mais justo do que equiparar as formas de avaliação com as existentes nas mesmas orquestras internacionais usadas como parâmetro de qualidade. E irônicamente, centenas de moções de repúdio chegaram ao Brasil, remetidas por tais orquestras e por associações de músicos do mundo inteiro, que não só questionavam o método como afirmavam que tal procedimento jamais seria sequer cogitado em seus países. O próprio Minczuk ao ser questionado por jornal canadense se aplicaria tais avaliações na orquestra de Calgary, onde também é regente titular, afirmou, categoricamente que não, por possuírem legislação distinta!
Outra questão do método foi a formação de um juri internacional para gerar o resultado da avaliação. O problema não está diretamente relacionada ao juri escolhido, mas à afirmação de um dos convocados (pode ser lido aqui neste fórum internacional) de que o contato entre a FOSB e eles dizia ser uma avaliação para a montagem de uma nova orquestra, e que para tal alguns músicos de uma orquestra “não-fixa” precisariam ser audicionados! A OSB possui mais de 70 anos de existência, e alguns destes músicos demitidos possuíam mais de 20, 30, 40 anos de luta pela manutenção desta instituição!
Em segundo lugar a FOSB vinha declarando que não possuía a intenção de demissão, mas paralelamente institui um Plano de Demissão Voluntária para quem não tivesse interesse em aderir às audições. Se não havia interesse em demissão para que serviria o PDV, senão para pressionar à saída, por meios amigáveis, evitando o posterior desgaste pela já de antemão certeza de demissão de fato?
Outra questão, e amplamente discutida, foi a sucessiva sequência de declarações da FOSB e seu diretor artístico, que não só demonstraram um desrespeito à cultura brasileira, como mostraram-se extremamente incoerentes. FOSB e regente declararam a necessidade de audições estrangeiras para prenchimento de vagas, haja visto o Brasil não ser capaz de formar um artista ao ponto de alcançar a tão propagada “ excelência internacional”. Tal situação por si já geraria (como gerou!) grande mobilização de professores, artistas, escolas, universidades, que inundaram a discussão com mais uma enorme quantidade de cartas abertas e moções de repúdio! O incoerente é, que se o Brasil não possui capacidade técnico-artística para suprir as necessidades de uma temporada orquestral, e por isso alguns de nossos melhores músicos seriam substituídos por estrangeiros, como aceitar que a temporada 2011 da OSB fosse realizada com a substituição da Orquestra profissional pela OSB Jovem, orquestra formada por alunos dos mesmos músicos demitidos ou com a qualidade posta em prova? A FOSB de todas as formas tentou tranquilizar seus assinantes, com declarações de que confiava na manutenção da qualidade artística deste primeiro semestre, apesar da utilização da OSBJovem, não conseguindo porém, por razões óbvias transmitir confiança para o público!
A situação da OSBJovem merece também um olhar apurado!
Por definição, uma orquestra jovem é um espaço de formação didática, e podendo ou não oferecer o auxílio de uma bolsa, no caso da OSBJovem no valor de mil reais.
Acontece que ao colocar a OSBJovem como substituta da Profissional na temporada 2011, a FOSB comete mais imoralidades (não sou advogado e não posso afirmar a ilegalidade, como muitos afirmam), já que pelo preço de um músico jovem, irão manter toda uma série de eventos profissionais, com uma carga de trabalho, ensaios e estudos não condizentes com o atual estágio musical e com uma série de assédios e pressões sobre tais jovens. Isso culminou com o pedido de desligamento de alguns jovens talentos (cujas cartas foram divulgadas inclusive fora do país, como pode ser visto aqui), que não aceitaram ocupar o espaço de seus professores nem tampouco poderiam compactuar e auxiliar a FOSB nesta tão mal-planejada ação.
Como resultado disso tudo, grandes nomes da música nacional e internacional cancelaram seus concertos e apresentações com a Orquestra, como manifestação pró-músicos.
Entre eles estão Cristina Ortiz, Roberto Tibiriçá, Nelson Freire (que diz ter ficado “ extremamente chocado” com tal situação), Luis Gustavo Petri, Ana Botafogo, Alex Neoral e Simone Lamsma.
Além da repercussão em importantes fóruns de discussão e crítica musical, como o blog do renomado crítico Norman Lebrecht, que desde o início vem reproduzindo todas as notícias sobre a orquestra carioca, e que por fim expõe suas opiniões na postagem “ A word in the ear of my pals in the Phil” , em que sugere aos músicos da filarmônica de Liverpool que se posicionem sobre o assunto por ocasião do concerto que realizarão sob regência de Minczuk.
Também o Ministério da Cultura aprovou, na última reunião do CNPC, uma moção de repúdio e junto com o Ministério do Trabalho prometeu acompanhar de perto o desenrolar dos acontecimentos.
Pressionados pela opinião pública, mídia internacional, crítica especializada e músicos, a FOSB marcou para esta sexta-feira (8 de abril) uma reunião com os músicos demitidos.
Considerações Pessoais:
Apesar de Privada, a Fundação OSB é de Direito Público, o que permite certos controles regulatórios por parte do Estado. Além disso, a manutenção de seus projetos e ações é em sua quase totalidade bancada por Leis de Renúncia Fiscal, e acredito que compete sim ao Ministério da Cultura, e ao Ministério Público exigir certas respostas e de acordo com o resultado uma readequação de postura, principalmente no que tange ao tratamento digno e ético para com o artista.
A iniciativa equivocada da FOSB, demonstra claramente a necessidade de um acompanhamento mais sério do Minc junto aos projetos apoiados e mantidos com recursos diretos ou pela Rouanet, afinal, apesar de uma Prestação de Contas permitir avaliar gastos e emprego direto dos valores atribuídos à um projeto, é necessário acompanhar à que implicações e custo social tais projetos também estão vinculados. Pois não creio ser intenção da Rouanet e Minc, bem como dos patrocinadores, estarem vinculados à demissão em massa de artistas com décadas de serviços prestados à cultura brasileira, inclusive em períodos nebulosos em que meses de atraso de salário não impediram que a orquestra se mantivesse ativa e atuante.
Projetos com resultados alcançados à qualquer custo, mesmo que seja o da deterioração do principal protagonista que é o artista?
Tal situação nos incita também à reflexão sobre o que significa excelência em Cultura, e como evitar que conceitos e medidas de valores tão enraigados na sociedade contemporânea passem a ditar as regras para aceitação ou não da legitimidade de expressão e da capacidade técnico-artística.
Gostaria também de frisar que compreendo, que talvez alguns já não pudessem exercer as funções para as quais foram contratados, mas que a demissão por justa causa e a tentativa de selar carreiras de décadas de dedicação com o selo da Incapacidade e da Incompetência é por demais constrangedor e terrível.
Grande parte dos músicos postos em prova deveriam terminar suas carreiras com os aplausos de gratidão frente à uma vida de luta em um país que ainda precisa crescer muito na valorização de seus artistas e agentes de cultura! Pensamentos como os da FOSB têm permeado políticas públicas e gestão de fundações, disfarçados nos conceitos de “ Excelência” e de “ Economia Criativa”, porém sem entender que gerar um mercado para a cultura não significa implementar no meio artístico-cultural medidas de valores estranhos e nocivos, e quase em sua totalidade ligados à cultura de entretenimento e de massa (que possuem seu valor, mas não podem tornar-se o fiél da balança nas discussões e valorações!!!).
Por fim gostaria de agradecer ao Leonardo Brant pelo convite, e aos leitores que tiveram paciência para acompanhar estas reflexões, e fazendo votos para que a OSB possa encontrar uma saída mais digna para esta situação, e que nossos já parcos recursos para Cultura sejam usados em ações que valorizem os artistas (sem os quais não existem os projetos, eventos, e afins), e os proteja de forma ética e digna!
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Bravissimo! Concordo com 100% do que voce falou! Nada a acrescentar!
Salve Cassiano!
Um belíssimo e irretocável texto! No entanto, gostaria de também voltar os olhos para além desse espetáculo de soberba e especulação geral com que o Maestro Minczuk, em grosso modo, nos brinda.
Esse cenário geral que tem o Maestro Minczuk como símbolo de um neocolonialismo tem essência numa certa indústria moderna de técnicas, cuja máquica única que nos promete a música do futuro, vem de uma execrável especulação que jamais será compreendida por ninguém. O Maestro Minczuk quando esteve apresentando a sua inteligência saturada no programa "Conexão Roberto D'Ávila, entre terríveis exemplos de desconhecimento sobre o fenômeno da música brasileira, suas linguagens musicais, tipos de música, para quem gosta de falar em arte sofisticada, mostrou-se um absoluto leigo. Ou seja, no geral, suas informações não tiveram qualquer valor. Ele que posa de um universal símbolo importante, não tem compreensão dos capítulos da histórica música de sua própria terra.
Minczuk coloca-se como entendedor de música universal. No entanto, dentro do sensaciolismo barato onde ele insiste em marginalizar a escola brasileira como arte e ofício, sua agressão não consegue esconder a falta de sinceridade e conhecimento com que ele soberbamente gosta de especular.
Esta é a dura realidade. Se o maestro da Orquestra Sinfônica Brasileira, Minczuk, fosse arguido sobre a música do Brasil, ele fatalmente seria reprovado tanto aqui quanto no exterior. Se ele se acha grande o suficiente para seguir suas divagações superficiais sobre técnicas universais saidas da escola europeia, percebemos que, se ele não consegue dar conta dos seus próprios caminhos, o que seria natural, como quer beber a água de outros países?
Por isso venho, há muito tempo, discutindo os méritos não só dele, mas também de Neschling, tentando entender qual a função desse pensamento exclusivista, pessoal e socialmente improdutivo. Que fenômeno de cultura é esse que eles representam? Mas não é só isso, nesse episódio propriamente dito, há ainda algumas questões que no conjunto nos revela que determinada forma de agir institucionalmente hoje, no universo da cultura do Brasil vem sendo reproduzida em escala.
Uma instituição tão amada pelo brasileiro por sua história tão bem sucedida, convenceu aos "patrocinadores", via Lei Rouanet, sobreuto, um investimento público para que todos aqueles músicos, pelos seus méritos, fossem naturalmente valorizados por toda a sociedade brasileira. Seria uma grande oportunidade de mostrar o respeito que esse conjunto extraordinário de músicos merece do seu povo.
Aí entra o maestro querendo dar voz própria e única a todo o cruzamento histórico entre a sociedade brasileira e a OSB e decide bancar o agenciador internacional para a contratação de músicos em substituição aos músicos que valorizaram e, portanto, fizeram o mérito da orquestra para conseguir patrocínios.
Minczuk, com sua mecanização mental, passa então a pensar em arte em termos econômicos e trapacear com um jogo onde os elementos profundos da arte são deliberadamente jogados na lata do lixo. E essa sua maneira extrovertida de marginalizar o Brasil expôs uma personalidade tirânica sustentada tão somente por seu provincianismo. Agora que enfrentou protestos a granel, o maestro não consegue encontrar razões óbvias para justificar com argumentos esse cenário que ele criou de tensão e tentativa de coação dos músicos da orquestra Sinfônica Brasileira.
Na verdade, toda essa crise da OSB nos servirá como alerta sobre o quanto deformante e destruidora é uma atitude de inadvertência ou ignorância e pode comprometer o destino da nossa música. E o quanto isso, no futuro, poderá trazer graves e inaceitáveis prejuízos ao desenvolvimento da música nacional do Brasil.
Esse tipo de charlatanismo que usa o artifício celebralista, anti-nacional levado ao extremo pela falaciosa e deformadora tendência que os métodos antiartísticos de Minczuk quer impor a partir de um caráter pessoal, tem que ter um fim e, se possível, com a retirada do sabido maestro e sua falsificação que desfigura inteiramente a ideia de talento, de cultura e de realização de uma obra de arte verdadeira.
Excelente texto. Abordou os aspectos éticos e morais de um assunto que só quer ser visto pela fundação OSB em suas implicações jurídicas, legais mas não aplicáveis a um caso cultural e social. Parabéns.
Excelente Texto. A atitude dos músicos da OSB Jovem ontem foi perfeita. O dirigente não teve o mínimo respeito com os músicos, e principalmente aos jovens, que estariam ali supostamente para subistituir os seus mestres. Nos quais o ajudam nessa longa trajtória. Hoje, graças a deus, muitos que estão ali, são de classes humildes, que com suor, com muito ônibus lotado, trem lotado, dinheiro do lanche economizado estão ali. Certas coisas que tal Maestro nunca deve ter passado. Outro ponto, pare de encher a Orquestra de estrangeiro, de oportunidade aos músicos do seu país, se esse o for. Porque o senhor com a Orquestra do Municipal, foi chamado a atenção por não ter regido a orquestra no hino nacional. E lá o buraco é mais embaixo, e ele abaixou a orelha dele.
Carlos Henrique, perfeito o seu comentário!
Parabéns Cassiano, os diferentes aspectos da situação estão muito bem colocados. Eu apenas acrescentaria que esse não é um fato isolado. A atitude de Minczuck é fruto de uma "escola", aprendeu com outros maestros e diretores artísticos. O que o grande público não sabe, é que muitos maestros (há honrosas e felizes excessões), endeuzados pela mídia, são muito arrogantes e nos ensaios se dão o direito de gritar e desrespeitar muitos músicos, que só aceitam a situação para não perderem o emprego. É conhecido o fato de que, atualmente, grande parte dos integrantes da OSESP tomam regularmente medicamentos calmantes para conseguir suportar o estressante ambiente de trabalho.
Costuma-se dizer que o músico de orquestra é "o último que fala e é o primeiro que apanha". No entanto é ele que "faz o som, não é? Muitas vezes os regentes se atrapalham, "atravessam" e é a orquestra que "segura" e não deixa a música parar. Numa dessas ocasiões, creio que na mesma OSB, após o concerto, o conhecido percussionista Wilson das Neves disse a um dos mais famosos regentes brasileiros: maestro, a sua sorte é que batuta não tem som...
Não é de hoje que as orquestras sinfônicas brasileiras são dirigidas de forma autoritária e desrespeitosa. Isso quando não são dissolvidas de forma completamente arbitrária, como aconteceu recentemente com a Sinfonia Cultura, de São Paulo. Apesar de ter um projeto da maior importância (tocar a música de compositores brasileiros), contar com a solidariedade de toda a classe artística brasileira e com um público expressivo e fiel, essa orquestra foi extinta com uma "penada" do então diretor da Fundação Padre Anchieta. Me pergunto, como alguém que sequer foi eleito,tem o direito de calar uma voz que representa um povo, uma cultura ?
No atual caso da Orquestra Sinfônica Brasileira há que se louvar e parabenizar o espírito de luta e organização dos integrantes e ex integrantes da orquestra, que se posicionaram e escreveram textos claros, inteligentes e emocionados, divulgando prontamente o que estava acontecendo, gerando toda uma rede de solidariedade.Isso é muito bonito e fortalecedor.
Considero essa mobilização em prol do respeito pela música e pelo trabalho de quem a faz, absolutamente auspiciosa. Penso que ela é um fato histórico da maior importância. Deve ter consequências, de forma que a partir de agora a música e os músicos brasileiros sejam tratados com o devido cuidado e respeito.
Abordagem impecável de uma situaçao execrável.O nível internacional tão almejado foi enfim alcançado, infelizmente negativamente.
Antes de impunes, muitos se acham imunes. Fica a pergunta, até onde estão dispostos os que não são "demissíveis" a empocalhar a cultura brasileira e daqueles que exercem através da arte uma nobre maneira de imprimir soberania através desta (pilar essencial para a construção da identidade de um povo)por conta de caprichos baseados em fundamentos de eternos reus do colonialismo?
Foi esse texto mesmo que eu li esses dias, cheguei a comentar com você sobre ele no facebook, mas acho que você estava ocupado.
Gostei dele, pois esclareceu algumas coisas que eu ainda não tinha conhecimento.
Fiquei feliz pelo protesto todo que aconteceu no RJ e que mobilizou, por meio de assinaturas, pessoas de todo o Brasil. E mais ainda comove o fato de estrangeiros apoiarem tal ação.
Desde que haja aglomerações haverão sempre conflitos de interesses.O poder é algo pegajosamente social, entranhado nas relações humanas. Em se tratando dos grandes líderes, estes conflitos estarão, em sua grande parte, ligados a questões do Ego.
Claro que há também o interesse econômico, mas isso já é tão óbvio que nem é preciso comentar.
E o poder nunca veio de cima, nunca virá de cima... O poder sempre surge das profundezas. E é exatamente por este motivo que se um líder é ruim, o poder que o revestiu de 'liderança' deverá agir para desvestí-lo!
Um único líder pode destruir várias pessoas, a nível histórico isso é fato. Mas também é fato que uma multidão pode arrastar um líder para onde ela desejar.
O poder está nas relações, sem relações ele não existe, é abstrato, torna-se impessoal, metafísico... religioso! Nossos problemas não são abstratos, são concretos.
Às vezes é necessário que algo de péssimo aconteça para que as relações de poder se reestabeleçam.
Que bom que os músicos resolveram se unir no RJ. Mas eu me entristeço ainda pelo corpo imenso de músicos que existe no Brasil, que está fatiado, separado e sem resquício qualquer de poder para agir!
Olá, Carlos Costa. Não há problema em trazer músicos de fora para tocar nas orquestras. Conheço muitos músicos que vieram da Europa e até dos Estados Unidos e que enriqueceram em muito a nossa cultura. E não só na música sinfônica. oOo
É preciso renovar. É preciso renovar com arte e sensibilidade. Não dá para fazer isso numa tarde, ao ritmo de 30 minutos para cada instrumentista. oOo
É preocupante o que isso pode acarretar para o futuro das orquestras sinfônicas no país. Ela é um brinquedo muito caro, se me desculpam a expressão. Muita gente vai começar e questionar se vale mesmo a pena ter uma orquestra sinfônica, ainda que de qualidade, se com o dinheiro dela é possível abrir duas mil classes de capoeira no Rio de Janeiro. oOo.
A propósito, O Roberto foi sim músico numa orquestra jovem. E andou de ônibus. E ganhava um dinheirinho mirrado. Foi há muito tempo, eu sei. E digo isso não por ter ouvido falar, ou por ter ligo em algum lugar. Digo isso porque eu estava lá, tocando com ele.
Parabéns, amigo Cassiano!
Estamos vivendo tempos confusos e difíceis, onde muitas vezes a clareza e a verdade se fazem ocultos em virtude de uns e outros que tendem a fazer a balança dos fatos pesar usando dinheiro. É fantástico ver, no entanto, textos como o seu e como muitos outros que tem lutado para estabelecer a verdade e a honra.
Como tenho dito enfaticamente por aí, músico não é palhaço. Não somos palhaços, (com todo respeito ao profissional comediante, mas me refiro ao caráter pejorativo que o termo pode assumir em determinadas ocasiões) e não queremos ser tratados como tal.
E tenho dito.
Excelente texto Cassiano. Trata-se de um artigo extremamente bem fundamentado, que pode ser considerado como referência para um estudo mais acurado dessa crise, que abala e envergonha o meio musical carioca.