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Representantes de cultura popular debatem reforma da Lei Rouanet

A reforma da Lei Rouanet, em fase de consulta pública até 6 de maio, foi tema de debate pela internet na última quarta-feira, 15, com o ministro Juca Ferreira (Cultura) e os secretários Célio Turino (Programas e Projetos Culturais) e Américo Córdula (Identidade e Diversidade Cultural).

Promovido pelo MinC (Ministério da Cultura), a conferência na rede teve o objetivo de aproximar da discussão, representantes da cultura popular, comunidades e lideranças afrobrasileiras, indígenas, ciganas, além de membros do movimento GLBTS e de pontos de cultura de diferentes regiões do país, integrantes do programa Cultura Viva, do MinC.

O formato adotado simplificou o processo de interação com os participantes. Encaminhadas por meio de um chat a um moderador, as perguntas eram selecionadas e repassadas aos debatedores, o que não impediu, entretanto, que inúmeras questões apresentadas ficassem sem respostas, caso, por exemplo, de algumas indagações deste repórter.
Antes de atender as dúvidas dos participantes, Ferreira defendeu a necessidade de reforma da Lei Rouanet, principal fonte de financiamento do setor cultural. Segundo o ministro, cerca de 80% de todos os recursos destinados pelo MinC ao setor chegam por meio do mecanismo de renúncia fiscal. “Se não funciona bem, não temos como prover outras demandas”. Em 2008, a lei de incentivo movimentou aproximadamente R$ 1, 2 bilhão.
 
Outra crítica do ministro é de que, atualmente, “apenas 20% do total de projetos aprovados pelo ministério conseguem captar os recursos. Na maior parte são espetáculos localizados na região Sudeste e invariavelmente com artistas consagrados”. A complexidade e a diversidade cultural precisam ser levadas em conta, avalia Ferreira.
Para o ministro, se trata de uma distorção que coloca na mão dos departamentos de marketing a decisão sobre quais projetos são meritórios ou não de incentivo, deixando sem acesso aos recursos uma quantidade relevante de produtores e artistas de outras regiões do país, principalmente do Norte e do Nordeste. “Boa parte do que foi patrocinado está em dois Estados apenas e 3% dos proponentes aprovaram mais da metade dos projetos aprovados, isso é um escândalo”, diz.

Controle público
 “A lei não contempla exclusões, ao contrário, as facilita”, dispara Ferreira. Mas, qual seria a saída? Para ele, o caminho é o do controle público, como forma de garantir a prioridade da democratização do acesso à cultura. Não será um processo simples. Entre os obstáculos, a batalha acirrada pelo montante bilionário, neste ano a estimativa é de que os recursos da lei sejam de R$ 1,3 bilhão. “É muito dinheiro envolvido, ninguém perde uma mamata desta de maneira passiva, depois de um tempo vira direito adquirido”, observa o ministro.

Quando enfim começa o diálogo com os participantes, a primeira pergunta selecionada é de um participante do Rio de Janeiro para o secretario Célio Turino. Em questão, como será feito o repasse dos recursos do FNC (Fundo Nacional de Cultura), que na proposta de mudança da Lei Roaunet, passa a receber 20% dos patrocínios recebidos por fundações e institutos que tenham vínculos com patrocinadores. “As prefeituras terão a possibilidade de fazer um convênio com o ministério para que recebam os recursos”, observa Turino. Para o secretário, o fortalecimento do FNC é uma das grandes conquistas da nova Lei de Fomento e Incentivo à Cultura. 

O FNC, na proposta do MinC, passa a ser setorizado por áreas artísticas associadas ao Fundo Setorial do Audiovisual, que já existe. Também está previsto uma maior participação social por meio da criação de conselhos. Outros avanços para o FNC destacados pelo MinC, são a diversificação nas formas de apoio, caso por exemplo de co-parcerias em projetos onde o proponente apresente uma contrapartida, a criação de financiamentos a projetos culturais e a participação em parcerias público-privadas. Uma loteria federal para o setor cultural em negociação com a Caixa Econômica Federal também deverá turbinar os recursos do FNC, segundo informa o MinC.

As contrapartidas para o FNC e a diferenciação por regiões e tipos de entidade foram questões levantadas por um representante de ponto de cultura do Pará. “Para prefeituras, há contrapartidas sim, e se espera que isso agregue recursos”, salienta Turino. Entretanto, ele observa que no caso de entidades agora há uma clausula que libera essa contrapartida. “Quem acompanhou os primeiros convênios de pontos de cultura conhece as dificuldades para viabilizar o convênio”, acrescenta. 

Questionado sobre doações individuais e de empresas com menos recursos, o ministro Juca Ferreira garantiu que todos terão mais facilidades na nova lei. Só faltou explicar como. “É um processo em discussão”, esquivou-se. Ferreira aproveitou o gancho para falar sobre a ausência de um mecenato de fato. A ideia, segundo ele, é ampliar as parcerias público-privadas. “Em dezoito anos de Lei Rouanet, 90% do incentivo foi com dinheiro público”.
A questão da formação para a área cultural também foi lembrada por uma estudante que acompanhava o debate. Para ela, o ministério deveria criar um canal direto com estudantes e lembrou que no país existem apenas três faculdades de produção cultural. Ferreira ressaltou a importância da participação de estudantes e produtores no diálogo. “O processo de discussão é tão importante quanto o resultado, esse momento é uma oportunidade inédita para produtores, artistas e estudantes amadurecerem seus conhecimentos”.

Emaranhado burocrático
E os pequenos projetos, de proponentes de cidades também pequenas, que nem sempre estão preparados para os malabarismos exigidos pela burocracia? O que esperar da tal reforma? Na opinião do ministro, mais uma justificativa para mudar a lei: parar com o desperdício de dinheiro público e qualificar o uso dos recursos de modo que pequenos projetos sejam contemplados. Segundo informações do MinC, na reforma da lei estão previstas facilidades para pequenos projetos por meio da criação dos fundos setoriais de cultura.
 
Ferreira, no entanto, advertiu que se trata de uma questão complexa para a qual não há solução em curto prazo. “A legislação que rege o Estado brasileiro é um emaranhado burocrático que não impede que se roube, mas que dificulta dar acesso a recursos para quem precisa”. O que é possível, segundo o ministro, é melhorar a gestão e simplificar o processo.
 
Durante o debate na internet, o ministro confirmou ainda a criação de mais 100 pontos de cultura em Minas Gerais e voltou a citar a meta de chegar a 20 mil pontos em todo o Brasil. Sobre o suposto fim da renuncia fiscal, Ferreira reiterou que a renúncia fiscal não será extinta, mas vai obedecer a critérios bem definidos e em consenso com a classe artística. Depois da fase de consulta pública, o projeto permanecerá em análise durante um período de 45 dias, em seguida deve ser encaminhado para o congresso.

Carlos Minuano

Repórter de cultura. Além dos trabalhos em reportagem, dedica-se atualmente à produção de dois livros: Memórias Psicodélicas e a ficção Cigarro Barato.

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  • É bom o pessoal ligado à cultura brasileira, porque popular toda ela é, ser mais crítico e atento à questões fundamentais. Tem que se discutir, e com coragem, a apropriação de bens comuns por empresas privadas que podem perfeitamente repassarem estes direitos para grandes corporações nacionais e internacionais. Sabemos que isso foi feito por muitos produtores, alheios a este universo, e que hoje detêm os direitos sobre grandes obras feitas por grupos como Folias de Reis, comunidades jongueiras e etc. Essa questão precisa ser melhor analisada, vigiada e controlada.

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