?O centro cultural abre outra perspectiva que implica no inconformismo, na permanente disponibilidade de transformação, rejeitando toda e qualquer forma de atrelamento?A necessidade de qualificação mais específica no contexto do manejo das manifestações culturais é um dos grandes desafios para a área cultural. É claro que tratar a cultura é uma proposta muito vasta. É como a comunicação, uma área amplamente estudada e definida. O momento atual exige que atendamos a outros diversos desafios que se colocam aos profissionais na sociedade contemporânea. A complexidade do nosso tempo, marcado por avançadas descobertas tecnológicas e científicas responsáveis por grandes avanços da humanidade, curiosamente, compõe um abismo de realidades distintas. Acredito que um dos caminhos que poderá ser de grande auxílio a esta perspectiva é desenvolver uma visão de totalidade dos processos da comunicação e da cultura, e não de fragmentação.
Isto porque sabemos que as manifestações artísticas e culturais constituem um caráter de testemunho na trajetória humana de composição da história das expressões sociais. Desta forma, considero e reconheço nas expressões culturais uma alternativa, uma das respostas que podem contribuir na valorização da cidadania.
Mas partimos de pontos mais singulares e focamos nossa lente nas relações que se dão entre os eventos promovidos pela entidade cultural e a participação da comunidade local nos eventos culturais promovidos por elas. Percebemos que o desenvolvimento cultural direciona novas experimentações artísticas. Além disso, as expressões culturais motivam a elaboração de pesquisas mais significativas, originais, com retornos práticos e plausíveis à sociedade. Deste modo, os centros fomentadores desta dinâmica se integram na busca artística e cultural da comunidade onde estão inseridos.
O fato é que, na história do ser humano, sempre houve um espaço para armazenar as idéias, quer registradas em argila, papiro, pergaminho, papel ou discos óticos. Desta forma, o homem nunca deixou de reservar espaços para trocar idéias, estimulando também a construção de novos saberes.
Agora, as bibliotecas, os livros, não mais sustentam, com exclusividade, o nível cultural de uma sociedade. O dinamismo da vida contemporânea exige novidades constantes e a construção de centros de cultura é a propagação de uma necessidade que, na verdade, ganha espaço reforçado, devendo ser uma área alternativa. Neste espaço nada deverá ser recebido como quem assiste passivamente a um programa de televisão. O centro cultural não é, pois, um local onde os indivíduos se ajustam a determinadas formas e se apaziguam, se conformando, evadindo-se do mundo, acomodando a personalidade e as emoções. O centro cultural, portanto, abre outra perspectiva, que implica no inconformismo, na permanente disponibilidade de transformação, rejeitando toda e qualquer forma de atrelamento.
Além disto, sugiro uma outra questão reflexiva: um centro de cultura para quem? Em vista da fragmentação da sociedade brasileira, refletida em suas regiões tão diferenciadas, retratada claramente nas cidades com as profundas divisões entre centro e periferia, e dividida em classes sociais, a questão do público passa a significar o próprio perfil do espaço cultural e o contorno das ações que nele vão se desenvolver. Seja qual for a escolha, o que deve ser cuidadosamente estudado para qualquer tipo de público é tudo o que se refere ao lugar onde será construído e suas características físicas.
Afinal, a existência de um centro cultural, segundo Luiz Milanesi, nada mais é que ?informar, ?discutir?, e ?criar? um universo democrático a fim de contribuir para que, por meio da arte, a comunicação com o outro e com o mundo aconteça mais facilmente. As manifestações artísticas atravessam todas as fases da história e se apresentam em nosso tempo de maneira e formato diferentes. Portanto, é atribuída a elas a expressão dos nossos sentidos compartilhados, compondo de forma fundamental a estrutura do pensamento imaginário do ser humano.
Ao se pensar um centro cultural, há de se pensar em um espaço para olhar e refletir o mundo na construção deste espaço. O pensar e viver artístico deverá ser identificado como o ponto que nos aproxima do mundo e de nós mesmos.
Márcia Perígolo é gestora dos processos da comunicação e cultura.
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Márcia Perígolo