Se sua irmã mais nova, sobrinha, ou filha está usando saia curta, bota preta de cano alto e uma estranha gravata vermelha, pode ter certeza que ela se transformou em numa adolescente “Rebelde”.
Se sua irmã mais nova, sobrinha, ou filha está usando saia curta, bota preta de cano alto e uma estranha gravata vermelha, pode ter certeza que ela se transformou em numa adolescente “Rebelde”. Mas calma, que os tempos são outros e até o termo rebelde perdeu o seu significado após o surgimento da dinastia “Rebelde”. Agora só falta saber qual efeito é mais devastador, se a rebeldia pregada em outras décadas ou os anti- “Rebeldes” do SBT.
O sucesso desenfreado da novela e da Banda Rebelde, RBD, originaram a análise do impacto deste produto midiático na sociedade durante o Intercom 2007. “Tudo neste grupo é produzido para vender”, diz a comunicadora Gisela Castro da ESPM. Prova disso foi a criação da Banda RBD, além da novela, criando assim um novo mercado a ser explorado pelos empresários, o que funcionou muito bem, pois mesmo a novela tendo acabado a banda continuou fazendo sucesso.
A banda RBD é formada pelos atores da novela, que mesmo durante os shows, continuam interpretando os personagens. “Não se sabe se o nome é do personagem ou do ator, eles simulam namoros, poses. Não dá para saber onde termina a novela e onde começa o real”, diz Castro. Em Rebelde, tudo é estrategicamente pensado para abduzir a mente deste público.
Outro fator estudado pelos comunicadores que analisam o “efeito RBD” é essa tendência atual da grande mídia com as demandas de BBB, FAMA e novelas em que se destacam mais a vida pessoal do artista do que a própria trama, para transformar tudo num grande mercado rentável. E daí surgem os “seres grifes”.
E como ficam os jovens em meio a essa pressão capitalista de consumo? Eles consomem! É o que retrata a pesquisa da comunicadora Fernanda Budag, realizada com jovens de 9 a 15 anos em duas escolas de São Paulo. Os produtos comprados, no entanto, diferem de acordo com a classe social do aluno. Nas escolas pagas, o consumo de DVDs e CDs aparecem em primeiro lugar, enquanto nas escolas públicas os produtos mais comprados são as figurinhas e pôsteres.
As discrepâncias vão também para o campo da identificação. Enquanto Miguel (personagem bolsista no drama) aparece com 41% de preferência entre os alunos das escolas públicas, contra 20% dos de escolas particulares, Mia, que é a personagem rica e popular, aparece como uma das preferidas dos estudantes das escolas pagas. “Isso revela uma identificação com o personagem, já que Miguel é pobre e bolsista ”, diz Budag.
A pesquisa aponta que 70% dos jovens dizem que os pais e professores têm uma visão negativa sobre os Rebeldes. Mas, que mesmo os pais sendo contra eles, acabam assistindo o programa e comprando os desejos fabricados das crianças. Para Isaira Oliveira, que prepara tese sobre relações entre artistas, fãs e casas de espetáculos, essa insatisfação permanente dos admiradores por adquirirem cada vez mais produtos relacionados aos seus ídolos, irá gerar futuros “neuróticos”, pois, a possibilidade de compra não atende a frenética demanda de vendas.
Paira no ar do Intercom, a questão Brasil e Argentina e em meio a toda essa latinidade surge a pergunta: É esta a integração cultural latino americana? É essa a troca de informações culturais que continuares a produzir? É este tipo de programa que continuaremos comprando de “nuestros hermanos”? Pena, tanto Brasil como Argentina e México são riquíssimos em expressões e semelhanças de suas realidades esquecidas.
Contudo, o que compramos destes países e enfiamos cérebro adentro dos nossos jovens é essa anti-rebeldia Rebelde. E até quando? Até o cérebro juvenil ser corroído com tanta superficialidade industrial?
A Mídia sob o olhar juvenil
A instrutora da oficina de comunicação do centro da juventude de Santos, Maria Fernanda Bombonatti, diz sentir diretamente os efeitos que a mídia exerce sobre os jovens. “É complicado, porque eles não têm essa noção de que a mídia tem um poder manipulador, que muitas vezes uma matéria é cortada por causa do anunciante. E se eles não sabem é porque o pai, a mãe os avós também não sabem”.
Para Fernanda, um fator que dificulta a discussão sobre mídia com os alunos é o fato deles enxergarem os grandes veículos de comunicação como um órgão que transmite plena credibilidade em seu conteúdo. “Eles têm esses ícones muito fortes, Jornal Nacional, e outros veículos renomados são sinônimos de verdades absolutas. Às vezes eles até entendem, mas sem perceberem eles já estão pregando de novo o que a mídia colocou”.
A instrutora diz que a maior dificuldade é fazer com que eles associem os problemas com quem os provoca. “Muitas vezes eles percebem o que há de errado, criticam, mas não assimilam o porquê isso acontece, não fazem essa ligação”. Ao conversar com os jovens, desta oficina, ficou claro esse problema de “ligação” o qual Fernanda se refiriu.
Um deles diz que a política está em tudo, mas não sabe dizer como e quando ela afeta o seu dia a dia. Já Alessandro da Silva, de 18 anos, associa política à corrupção, assunto que ele já não agüenta mais ouvir.“É sempre a mesma coisa”, justifica o desinteresse.
Questionados se deveria haver uma proibição de certos comercias voltados para o público infantil, eles disseram ser contra, pois, “como diz aquele comercial, toda censura é burra” (slogan da campanha contra a Classificação Indicativa). Para Solariti Siqueira, 18 anos, a proibição de nada adiantaria já que a criança mesmo não vendo os comerciais, iria querer comprar o produto ao vê-lo em algum “amiguinho”. Para ela, mesmo que os comerciais criem uma necessidade supérflua nas crianças, a culpa não seria da empresa: “eles estão lá para vender, se nós estivéssemos no lugar deles a gente ia fazer o mesmo. O pai e a mãe é quem devem alertar e não deixar o filho assistir a televisão, ou não comprar o que o filho quer”.
No entanto, muitas vezes esses pais e mães ou por falta de tempo ou por não perceberem que muitos comerciais exercem um grande poder de influência nas cabeças das crianças, acabam deixando os seus filhos aos cuidados da famosa “babá eletrônica”. Além do mais, a lógica do quanto menos se anuncia menos se vende, atingiriam também aos “amiguinhos”.
Para a estagiária de pedagogia Flávia Rodrigues a influência de certos comercias é “horrível”, pois já torna a criança um ser consumidor desde a sua primeira infância. “Na creche onde trabalho, tem uma menina de dois anos que eu tenho que prometer que vou colocar a roupa da boneca Polly, senão ela não me deixa dar banho nela”.
Com quem fica a responsabilidade do consumo juvenil? Será que devemos confiá-lo aos critérios da boa fé de publicitários? Para o estudante de publicidade Thiago Videira, premiado na categoria vídeo no Expocom,, deveria haver uma ética na produção dos comerciais para jovens e crianças. Contudo, ele crê que essa ética funcione muito mais individualmente do que como um consenso da profissão: “Eu particularmente faria, sim, uma campanha para adolescentes, numa boa. Mas a diferença começa aí, faria o trabalho, mas dentro dos meus princípios e do que eu acredito ser certo, tendo limites”.
Diana Gonzalez *
* reportagem experimental produzida na I Oficina Itinerante de Jornalismo Cultural, promovido pelo 100canais.
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