Projeto segue para última etapa antes de ser votado no Congresso; pelo menos dezesseis estados seriam afetados diretamentePor Israel do Vale*
04/06/2003

As leis estaduais de incentivo podem estar com os dias contados. Seria o fim de um sistema que, no quadro atual, tem potencial para irrigar a produção cultural com até R$ 166 milhões ao ano _dinheiro que nem o MinC nem uma estatal do porte da Petrobras têm na mão. É, por exemplo, três vezes o que a BR Distribuidora aplicou em projetos culturais no ano passado (R$ 56,1 mi). Ou mais que o dobro do que a Eletrobrás investiu na área de 1997 a 2002 (R$ 75,8 mi).

O abalo sísmico tem origem na reforma tributária que tramita no Congresso. Se for mantido nos termos atuais, o projeto apresentado pelo executivo (leia-se Lula e Palocci) e aprovado semana passada pela Comissão de Constituição e Justiça aniquila com qualquer tipo de benefício fiscal associado ao ICMS. Não há menção específica à área cultural no projeto. Mas os efeitos sobre ela são devastadores. A informação foi confirmada pelo coordenador do Confaz, Albérico Mascarenhas, também secretário da Fazenda da Bahia. (Confaz é o Conselho Nacional de Política Fazendária, formado pelo conjunto dos secretários da fazenda. Ele existe para assinar embaixo ou não de certas medidas de impacto geral na área. Toda decisão dentro do Confaz é tomada consensualmente. Uma única palavra contrária é o bastante para vetar a aprovação do que seja. Neste caso, a situação seria favorável à manutenção das leis. Todos os secretários, sem exceção, são unânimes em defender a permanência. O único problema é que o Confaz não é uma instância com poder nesta questão. O que ele pode fazer _e, segundo Mascarenhas, fará_ é sugerir. É evidente que, em se tratando de uma reforma fiscal, a opinião em bloco dos secretários tem seu peso. Mas não assegura nada.)

R$ 166 milhões é a soma do teto de renúncia previsto para este ano nos 13 estados com legislação ativa, baseada na renúncia de ICMS. Outros seis vivem um momento de transitoriedade em relação a suas leis _que, ou não foram regulamentadas, ou passam por revisões e/ou questionamentos jurídicos.No quadro (distorcido) da produção atual, em que as leis de incentivo são de longe o principal combustível que gira a roda da cultura, o impedimento legal de existência do mecanismo, da noite para o dia, teria efeitos traumáticos.Para os defensores do atual sistema, nem tudo está perdido. Antes de seguir para votação na Câmara e no Senado, o projeto será submetido ainda à comissão especial, cujo relator será o deputado federal Virgílio Guimarães, do PT mineiro.É nela que se dará, por exemplo, a atuação dos secretários de Fazenda _que já encomendaram estudo a sua equipe técnica para propor uma alternativa. Ou a pressão de parte da comunidade artística (solenemente ausente de discussões estéticas, mas cada vez mais ativa quando o assunto é dinheiro).

A pressa do governo em aprovar as reformas fiscal e previdenciária para deslanchar seus projetos sociais pode conspirar contra o bom senso. A previsão é de que a reforma tributária seja sacramentada, no mais tardar, em agosto. Mas há um recesso do Congresso pela frente, mês que vem.Trocando em miúdos, se há algo a propor ou questionar, a hora é agora. E está tudo na estaca zero. Tanto políticos (dentro e fora do governo) como produtores estão alheios às implicações culturais da reforma. Nesta toada, como reza o dito popular, só vai restar chorar na cama _se serve como consolo, é mais quentinho.


* Colaborou Deborah Rocha

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