“A produção e comercialização de bens e serviços culturais pode ser uma alternativa consistente de reposicionamento de um país em meio a um momento de crise”, afirma o professor de Economia da Cultura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Leandro Valiati. Coordenador do Observatório de Economia Criativa e do Grupo de Trabalho Economia Criativa, Cultura e Desenvolvimento (CEGOV/UFRGS), ele completa que não só para sobreviver aos momentos de dificuldades financeiras, como também para consolidar uma estratégia de desenvolvimento com base em novos ativos econômicos.
“No caso do Brasil, temos muitos insumos para isso, pela nossa enorme diversidade cultural e ambiental”, diz o professor, lembrando ainda que as indústrias criativas estão no centro da transformação do capitalismo contemporâneo, com a maior parte da renda sendo formada por bens e serviços ligados às novas tecnologias da informação e comunicação, além de novas estratégias de comunicação.
Nesse contexto, a arte torna-se um elemento notável, pois gera heterogeneidades em bens e serviços que são responsáveis pela diferenciação e formação do valor agregado. ”Isso aparece, por exemplo, na diferente relação de valor entre uma camiseta branca (têxtil) e a mesma camiseta acrescida de uma intervenção artística (moda); ou ainda nos casos da face industrial da produção de um smartphone (relegada a países periféricos, na maior parte dos casos) e em relação ao que remunera o projeto e o licenciamento de marca por Apple ou Samsung” explica Valiati.
Existe todo um contingente de indústrias culturais que catalisam esse processo e podem ter forte espaço nos mercados mundiais. No entanto, há também determinantes geopolíticos nisso, com países líderes se especializando na fase de projeto e comercialização e países secundários na de produção manufatureira industrial. “O capitalismo precisa disso para o modelo funcionar. Entender esse processo e incorporá-lo às nossas estratégias para as indústrias criativas é chave para que possamos ter efeitos positivos”, afirma o especialista.
O ministro da Cultura, Juca Ferreira, tem falado sobre a importância da economia da cultura para o desenvolvimento do país, mas admite que ainda não falta uma visão estratégica nesse sentido. “Para que tenhamos uma política arrojada neste segmento, precisamos compreender suas leis de funcionamento. Sem isso não temos como gerar indicadores mais precisos, nem como medir a eficiência das ações de fomento. Muito menos como fomentar iniciativas”, disse em maio durante o XXVII Fórum Nacional do Instituto Nacional de Altos Estudos (clique aqui para ler o discurso na íntegra).
Na última semana, Juca encontrou-se com o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Armando Monteiro, com o intuito de iniciar um diálogo organizado sobre o tema. ”Faremos com nossos secretários uma força tarefa e, a partir dos interlocutores designados pelo ministro Juca, organizaremos visitas exploratórias ao MinC e, a partir delas, estabeleceremos uma agenda de trabalho em que sistematizaremos o que podemos e devemos fazer no curto e no médio prazo”, afirmou Monteiro.
Desde 2006, com a criação de um Departamento de Economia da Cultura no âmbito da área industrial, o BNDES tem ampliado seu apoio às empresas desses setores. Em 2005, o total de desembolsos foi de R$ 43 milhões; no ano passado, foram R$ 509 milhões. As principais empresas beneficiadas estão nos setores editorial, audiovisual, patrimônio cultural, artes e espetáculos e fonográfico. Os números abrangem o apoio por meio de linhas de financiamento e também o apoio não reembolsável a projetos sem fins lucrativos. “Esta expansão se baseia tanto no dinamismo e nas oportunidades apresentadas pelos setores criativos, quanto em uma política ativa do BNDES que elegeu a economia criativa como estratégica para o desenvolvimento do país”, conta Luciane Gorgulho, chefe do departamento dedicado à cultura.
Para ela, o principal desafio dessas empresas na busca pela sustentabilidade econômica é uma maior profissionalização e governança corporativa, a introdução da lógica de mercado, o compromisso de rentabilidade e a construção de uma visão empresarial de longo prazo, evitando a lógica do foco no projeto e não na empresa. “Ademais é necessário estimular e valorizar nas empresas a inovação e a geração de propriedade intelectual própria. Acreditamos que estes elementos são importantes para que as empresas persigam e conquistem a sustentabilidade econômica”, completa. Já nas instituições sem fins lucrativos, diz Luciane, o desafio é o incremento da gestão e a diversificação das fontes de recursos, evitando a dependência excessiva da Lei Rouanet. “A criação de novos modelos financeiros como os fundos de investimento e os endowments (fundos patrimoniais) é uma necessidade urgente na agenda do setor.”
Incubadoras – A sustentabilidade foi o tema do 2º Encontro da Rede Incubadoras Brasil Criativo, que aconteceu na última semana, em Brasília (DF). Coordenado pelo MinC, o Programa Incubadoras Brasil Criativo foi criado em 2013 e tem o objetivo de fortalecer a economia da cultura a partir das vocações de cada território, por meio da promoção e do fomento ao empreendedorismo e à inovação. A rede é composta por equipamentos públicos, implementados por convênios com governos estaduais e por parcerias com instituições como o Sebrae.
Por meio das incubadoras, propõe-se um processo de qualificação para fortalecer os negócios que são, essencialmente, de pequeno porte e não dispõem dos mesmos recursos de capacitação que as grandes empresas. Também busca-se a promoção do intercâmbio entre as incubadoras dos 14 estados que participam do programa. Foram investidos, até o momento, R$ 21.250.000,00. E segundo Georgia Nicolau, diretora de Empreendedorismo, Gestão e Inovação da Secretaria de Políticas Culturais do Ministério da Cultura, neste ano deve haver um novo aporte de recursos, em torno de R$ 3.500.000, para as incubadoras que desenvolvam ações que visem, principalmente, a um plano de sustentabilidade que passe pelo fortalecimento não só do equipamento como da própria rede.
Inspiração para o programa do MinC, a Incubadora Rio Criativo foi a primeira do Brasil focada exclusivamente nos setores da economia criativa. Por seu pioneirismo, foi citada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2010, como uma das experiências mundiais mais relevantes de fomento a essa área. O faturamento total da primeira geração de empresas incubadas foi de R$ 1 milhão para R$ 10 milhões nos primeiros 12 meses da incubação – em agosto, tem início a nova turma. São três modalidades: incubação de empreendimentos, incubação de redes e incubação de agentes culturais.
Marcos André Carvalho, assessor especial da Incubadora Rio Criativo, diz que as principais dificuldades das empresas que lá estão são: aprender a equilibrar o tempo investido entre o trabalho criativo e a gestão da empresa, a falta de acesso a fontes variadas de financiamento e a falta de planejamento e estratégia. Além disso, há o excesso de carga tributária brasileira. “Outro gargalo sério é que parte dos agentes dessas cadeias produtivas ficou viciada em mobilizar recursos exclusivamente por meio de editais de fomento público e leis de incentivo. Isso não é saudável. Temos que variar as fontes de financiamento introduzindo a prática do crédito, dos fundos de investimentos, do crowdfunding e até mesmo das moedas solidárias”, explica.
Georgia conta que, normalmente, as demandas dos empreendedores atendidos pela Rede Brasil Criativo dizem respeito à carência de conhecimento sobre a gestão, em questões como desenvolvimento de modelos de negócios adequados, planejamento estratégico, acesso a mercados, o papel do design nas embalagens, a importância da inovação, marketing e aspectos legais que podem afetar suas empresas, como alvará de funcionamento. “Por mais que o artista tenha um grande talento para criar, hoje ele precisa dispor dessas ferramentas para que seu trabalho atinja o mercado e se mantenha de forma sustentável”, afirma.
Maria Eduarda Belém, gerente de Economia Criativa do Porto Digital, de Recife (PE), acredita que ainda estamos passando por um processo de amadurecimento, que envolve desde o desenvolvimento de modelos de negócios que se adequem à natureza das atividades até o entendimento do produto cultural como bem monetizável. “Mas claro, há estratégias de suporte que podem fortalecer e acelerar esse processo”, diz. O próprio Porto Digital é um “ecossistema” de inovação e empreendedorismo urbano, com várias formas de acesso para empresas em diferentes estágios de maturidade e porte.
Gargalos – Inaugurado em 2013, o Centro de Empreendedorismo e Tecnologias da Economia Criativa do Porto Digital surgiu com o objetivo de dar suporte ao mercado local, apoiando a estruturação de seis cadeias de negócio sustentáveis nas áreas de design, audiovisual, multimídia, games, fotografia e música. “Após quase dois anos de funcionamento, o suporte da sua infraestrutura, bem como as ações e capacitações promovidas pelo Portomídia foram de fundamental importância para o mercado local de economia criativa, em diversas instâncias – desde o apoio à pós-produção de obras audiovisuais até o suporte a empresas através dos seus programas de incubação”, conta Maria Eduarda.
Segundo ela, existem diferentes níveis de demandas entre as empresas. Em relação àquelas embarcadas, existe em geral um gargalo relativo à qualificação dos profissionais formados e os demandados pelas empresas, em pontos como conhecimento da língua inglesa, certificações em linguagens e ferramentas e noções de empreendedorismo inovador e gestão de projetos. Já no caso das empresas aceleradas, a conexão com investidores é uma das principais dificuldades, bem como a formatação e execução de uma estratégia de vendas, dado que a maioria das startups de tecnologia e economia criativa não têm empreendedores com perfil de vendedor.
Para Valiati, a sustentabilidade econômica dos empreendimentos culturais e criativos depende fundamentalmente de eliminar gargalos nas cadeias produtivas e escala no consumo. No que diz respeito aos gargalos, explica, é necessário resolver o sistema regulatório da maior parte dos setores e também o sistema nacional e regional de subsídios. ”Há que se pensar em quais são os entraves da atividade, que não permitem a sobrevivência sem o apoio de recursos públicos e utilizar tais recursos para tentar resolvê-los. Há vários gargalos. No cinema, por exemplo, distribuição e exibição (então, qual o sentido de sobreinvestir recursos públicos na produção?); na indústria de games e software, por exemplo, tributação e financiamentos de startups; na indústria do livro, preço final e entrada em novas plataformas digitais. E são muitos outros que precisam ser conhecidos e atendidos pela política pública”, pontua. Já no que toca à escala, é fundamental ampliar o capacidade da sociedade em fazer escolhas diversificadas em consumo cultural (via formação) e dar acesso amplo ao mercado (via políticas de renda diretas e indiretas).
Assista: Em hangout, a especialista Ana Carla Fonseca Reis explica a diferença entre economia da cultura e economia criativa, e apresenta exemplos de países que estão desenvolvendo bem suas indústrias criativas. Clique aqui para ver.
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