Editores analisam momento atual de crescimento e falam sobre cenário para autores nacionais. Além de comemorarem aumento nas vendas, produção chama a atenção para o crescimento na diversidade das publicações.
Viver de quadrinhos não é para muitos. Ou melhor, não era. Indícios apontam que o cenário está mudando. No livro Reading Comics, lançado recentemente nos EUA, o autor Douglas Wolk, colaborador de publicações como The New York Times, Roling Stone e Washington Post, afirma que os quadrinhos vivem hoje sua era de ouro. Mas será que isso vale também para o Brasil? O diretor da editora Conrad, Rogério de Campos, acredita que sim. “Os quadrinhos vivem o melhor momento de sua história, os números de venda, no mundo todo, nunca foram tão grandes”.
Além de comemorar o aumento nas vendas, ele chama a atenção para o crescimento na diversidade das publicações. “Nunca houve tamanha variedade, o público está cada vez mais diverso”. Ele cita como exemplo a cartunista argentina Maitena, que tem seu público formado por mulheres adultas. Seus livros, publicados pela editora Rocco, permaneceram durante vários meses nas listas dos mais vendidos. “O Brasil está começando a sentir os efeitos da onda internacional”, diz.
Douglas Quinta Reis, diretor da editora Devir, concorda que o mercado vive um bom momento. Apesar do volume de vendas continuar semelhante, ele informa que a quantidade de lançamentos registra um ligeiro aumento de 15%. O número de editoras publicando quadrinhos e a multiplicidade de títulos e gêneros oferecidos representa também mais espaço para o autor nacional publicar seu trabalho. Mas ele faz uma ressalva: “O mercado vive de picos e vales. Em 1998, quando começamos levar HQ’s às livrarias, o mercado vivia um momento de vale, ou seja, pouca gente se interessava”. Ele adverte ainda que o aumento da oferta de títulos também apresenta um aspecto negativo, a venda média por título diminui: “Pode ser o começo de outro período de vale”.
Outra questão paira no ar. Para o autor brasileiro, há anos sufocado pela produção estrangeira que ocupa praticamente todos os espaços, a situação também melhorou? Na opinião do cartunista Paulo Stocker, a realidade hoje é bem pior. “O Brasil é um país tosco em matéria de quadrinhos, as editoras pagam pouco porque existe muita oferta”, critica. Ele acredita ser possível o artista viver de seu trabalho, mas os caminhos para que isso ocorra ainda são incertos: “Cada um precisa descobrir suas soluções, alguns publicam fora do país, outros fazem parcerias de todo tipo. Eu virei editor do meu próprio trabalho”.
Talento nacional
Stocker trabalha atualmente com a revista O Tulípio, parceria com o publicitário Eduardo Rodrigues, distribuída gratuitamente em bares no Rio, São Paulo, e em Belém do Pará. A publicação conta com colaboradores como Aldir Blanc, Jaguar, Paulo Caruso, Glauco, Ignácio de Loyola Brandão, Fausto Wolff, Xico Sá, Mário Prata, Fernando Gonzáles. “Acabamos de ser selecionados para o Salão Internacional de humor de Piracicaba, na categoria Tiras”, comemora o cartunista. A situação econômica, no entanto, ainda não dá para festejar. “Trabalho como ilustrador e faço caricaturas em eventos para pagar as contas”, reclama.
Um longo trabalho ainda precisa ser feito para que o mercado melhore para o autor nacional. De acordo com Reis, diretor da Devir, “é preciso mostrar para quem gosta de ler que existe vida inteligente nos quadrinhos, semelhante ao que aconteceu com os mangás no mundo todo”. Ele conta que grande parte desse público não era leitor habitual de HQ’s. “Não adianta disputar os leitores que já existem. Precisamos criar um mercado nosso”, ressalta.
Desde 1998, a Devir tem investido no talento nacional publicando trabalhos de Lourenço Mutarelli, Adão Iturrusgarai, Angeli, Laerte, entre outros. “No início, publicávamos apenas autores brasileiros, depois, aos poucos, fomos introduzindo os autores estrangeiros”. Reis explica que vender livro é um ofício intrincado. “É preciso informar o leitor em potencial de que aquele livro que lhe interessa existe e pode ser encontrado em determinado lugar. Isso é muito mais complicado do que produzir o livro em si”, desabafa.
No caso da Conrad, a aposta é na diversidade. A estratégia adotada para ampliar o número de leitores e o espaço para quadrinhos é apresentar a maior variedade possível, dos mais diferentes lugares. Coreanos, italianos, japoneses, franceses, canadenses e até malaios, tem espaço garantido. Rogério de Campos, da Conrad, cita alguns exemplos como o jornalismo em quadrinhos de Joe Sacco, a fantasia de Nausicaa [do cineasta Hayao Miyazaki], a vida de Buda por Osamu Tezuka, a biografia de Tina Modotti, de Angel De La Calle. “Esperamos com isso ajudar os produtores brasileiros a descobrir formas diferentes de pensar os quadrinhos e assim desenvolver coisas próprias, diferentes das cópias de super-heróis, por exemplo”, pontua Campos, que ainda acrescenta que a Conrad também está publicando diversos autores brasileiros.
Carlos Minuano