Cemig suspende temporariamente patrocínio à ópera O Guarani, considerando o momento arriscado demais para o investimento em cultura. Estatal mineira não é um caso isoladoPor Sílvio Crespo
No mês de julho, a notícia de redução em 18% da utilização da Lei Rouanet no primeiro semestre deste ano deixou preocupados os profissionais da cultura. Agora, as oscilações do câmbio, desfavorecendo a moeda nacional em relação ao dólar, têm sido mais um empecilho para os patrocinadores brasileiros. E, neste jogo, quem perde é a nossa cultura. A ópera O Guarani, de Carlos Gomes, por exemplo, acaba de perder um dos seus principais financiadores: a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais).
Sem condições
Com a alta do dólar, o Imposto de Renda das empresas muitas vezes acaba se reduzindo drasticamente. Isso porque muitas companhias têm dívidas na moeda americana. Consideradas despesas operacionais, essas dívidas aumentam significativamente com a desvalorização do real, e diminuem a base de cálculo do Imposto de Renda. Como a Lei Rouanet não permite que a empresa deduza mais que 4% do IR em financiamento cultural, muitos patrocinadores não têm mais condições de sustentar projetos culturais.
Estréia cancelada
A Cemig, por exemplo, paga em dólares a energia proveniente de Itaipu. Com a alta da moeda, o investimento em cultura se torna inviável. ?Não sabemos sequer quanto pagaremos de Imposto no final do ano; isso torna o patrocínio cultural um investimento arriscado?, diz Cecília Bhering, assistente de comunicação da empresa.
Entretanto, ?é bom esclarecer que a Cemig investe em cultura há 40 anos, muito antes das leis de incentivo?, explica Bhering. A Fundação Clóvis Salgado, que realiza O Guarani, já havia marcado a estréia do espetáculo para 20 de setembro, acreditando poder contar com os patrocinadores.
Espetáculos internacionais
Uma outra conseqüência das oscilações do câmbio para a cultura é a diminuição da presença de espetáculos internacionais no Brasil. O cachê dos artistas, as passagens e os custos de produção são normalmente atrelados ao dólar. A valorização da moeda americana aumenta, portanto, o custo dos ingressos para espetáculos estrangeiros e, conseqüentemente, diminui a freqüência do público. Com isso, a margem de lucro do produtor cai sensivelmente.
Lei Rouanet
Já no final do ano passado houve indícios de queda dos investimentos no setor cultural. Na lista das 20 empresas que mais investem por meio da Lei Rouanet, apenas cinco pertenciam ao setor privado. Em 2000, as estatais eram apenas nove. A Volkswagen, por exemplo, investiu no setor cultural em 2001 apenas 20% do total investido no ano anterior, segundo matéria publicada em 25 de julho no jornal Valor.
Copyright 2002. Cultura e Mercado. Todos os direitos reservados.