Secretário paulistano de Cultura fala também da verba suplementar à Lei Mendonça, que não deve ultrapassar R$ 6 milhões, metade do valor reivindicado por produtores; leia entrevistaPor Israel do Vale
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19/08/2003
Uma ?saia-justa? entre o secretário municipal de Cultura de São Paulo, Celso Frateschi, e a presidente do Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), Assunção Hernandes, pode ter ajudado a selar o primeiro gesto concreto em direção a uma melhor interlocução entre a classe cinematográfica paulista e a Prefeitura de São Paulo.
As queixas pelas dificuldades de aproximação de representantes do setor com o governo municipal de São Paulo inflamaram os debates do segundo dos três dias do Encontro de Entidades de Cinema do Estado de São Paulo, realizado em Ribeirão Preto entre sexta e domingo passados.
Horas depois, por obra do acaso, parte dos produtores e realizadores e o secretário encontrariam-se no bar Pinguim, cartão etílico-postal da cidade. O breve desentendimento levaria à aparição de Frateschi, no dia seguinte, à sede das Faculdades C.O.C, que sediaram o evento acolhido pelo Núcleo de Cinema de Ribeirão Preto.
O pomo da discórdia teria fundo político. O incômodo surgiu a partir da exibição de filmes financiados parcialmente por verba municipal nas sessões de cinema que o governador tem promovido no Palácio dos Bandeirantes. Nas últimas semanas, as sessões (que já foram feitas em anos passados, em outras gestões do governo estadual) projetaram na grande e confortável sala de cinema do Palácio os filmes ?O Prisioneiro da Grade de Ferro? e ?De Passagem?. A Prefeitura já alimentava planos de promover sessões equivalentes também, que só não teriam começado por dificuldades de agenda da prefeita.
Vencido o desconforto, o bom-senso prevaleceu. Frateschi defendeu uma mudança de paradigmas. ?A gente acredita que é necessária uma política para o cinema, que hoje se limita a pequenos aportes?, citando os R$ 3 milhões de edital para a produção de filmes anunciado recentemente ?o que, para ele, só realimenta a política do ?cala-boca?, que dura enquanto duram os recursos.
Segundo disse o secretário à plenário do Encontro, faltam ?ações mais efetivas, orgânicas e sistêmicas?, o que, imagina ele, deve se resolver com a evolução dos trabalhos da Comissão de Cinema formada para dar suporte às decisões do Conselho Municipal de Cultura. Quatorze das 17 entidades que compõem o CBC estavam representadas na reunião, ponto de origem de documento com propostas de uma política para o setor, que deve ser encaminhado ao secretário esta semana.
Leia abaixo entrevista exclusiva de Cultura e Mercado com o secretário, em que ele comenta a liberação da suplementação de R$ 6 milhões para a Lei Mendonça, na última sexta-feira, diz que o dinheiro para os projetos comemorativos dos 450 anos de São Paulo terá que sair das leis de incentivo, anuncia que estrutura a secretaria para atuar dentro da lógica do que o Governo Federal chama de Sistema Nacional de Cultura (que propõe ações em conjunto com as esferas municipal, estadual e federal do poder público) e insinua uma idéia de como isso poderia se dar no audiovisual paulistano.
Cultura e Mercado – Os R$ 6 milhões de reforço para o teto deste ano da Lei Mendonça, liberados na última sexta-feira, correspondem à metade do que os produtores achavam necessário, levando em conta a demanda existente. Existe possibilidade de haver nova suplementação ou acabou aí?
Celso Frateschi – Eu acho que acabou. O que a gente vai fazer é aquela ?raspa?. Tem muitos projetos que estão empacando recursos. Eu não sei ainda o montante disso. A gente está tentando conversar com os produtores (vai sair o projeto, não vai sair o projeto?), pra gente suspender essa reserva, para ajudar os produtores que estão esperando. Acho que a gente consegue um aporte um pouco maior. Mas do governo, este ano, a gente não tem mais condições.
C&M – Deve haver aumento do teto para o ano que vem?
CF – Está amarrada essa discussão. Eles se comprometeram também a rediscutir um pouco a lei, com a Câmara e tal, para poder dar um pouco mais de sentido. A ausência de quaquer critério é fatal pra lei. A sociedade não tem o menor controle de para onde vai o dinheiro público. E isso pecisa se estabelecer. Parace que existe uma concordância também nessa questão.
C&M – Existe tempo para isso? O orçamento deve ser definido até setembro, não?
CF – Você pode primeiro trabalhar com suplementação, vai ter um teto, não sei quanto o governo vai determinar de capacidade de renúncia esse ano. Mas em cima dessas discussões, o próprio recurso se você estabelecer critérios mais claros, é bem mais eficazmente utilizado. Hoje você tem um livo que custa R$ 1 milhão que é apovado porque é tecnicamente justificado, agora a pertinência desse livo para a cidade não é discutida. Acho que se a gente tiver critérios mais públicos e entrar nisso aí… A lei foi construída no sentido de a sociedade se proteger do estado e eu acho que a democracia agora está num momento em que a sociedade tem que incorporar o estado, perceber que o estado é um instrumento da sociedade e vice-versa.
C&M – E isso vai ser feito por intermédio do Conselho Municipal de Cultura?
CF – Do conselho. E aí necessariamente tem que se alterar a lei.
C&M – Outro assunto que gera ansiedades gerais são os eventos em torno dos 450 anos da cidade e São Paulo. A verba para projetos cm este perfil vai ter de sair da Lei Mendonça ou haverá dotação específica para isso?
CF – Alguns projetos são do goveno e governo está garantindo. Os projetos que a sociedade está trazendo para os 450 anos tem recursos vários. Ou financiamento puro e simples, ou via Lei Mendonça, via lei federal. As fontes sã várias. Mas não existe nada na lei de incentivo municipal que detemine ou em que possa ser determinado que os recursos tem que ser para os 450 anos.
C&M – Não existe nenhum esforço da Prefeitura para criar um orçamento específico para isso?
CF – Não. Para responder às demandas da sociedade, dos produtores, existem os mecanismos que existem.
C&M – O aval dado pela comissão dos 450 anos é só um selo ou pode significar aporte de verba?
CF – Não significa, mas pode significar. Se ele for incorporado a um projeto que a Prefeitura já tenha pode ser. Mas a Prefeitura está trabalhando com muito recurso extra-orçamentário para os 450 anos.
C&M – O sr. tem idéia de volume?
CF – Não tenho.
C&M – Qual é a prioridade da Prefeitura para a área cinematográfica? O que o sr. visualiza como uma política pública para o setor?
CF – A idéia que nos levou a criar a comissão foi envolver todos os setores, principalmente exibição e distribuição, que nunca são envolvidas. Os produtores pressionam, pressionam, solta-se uma graninha, fica todo mundo de boca calada mais um ano, vai assim por diante e a gente não resolve o problema. Então a idéia é propor uma política mais global para a área.
C&M – Dentro da perspectiva de um trabalho integrado entre as diferentes instâncias do poder público, como propõe o Governo Federal, o sr. defenderia que o braço municipal fosse o da exibição?
CF – Eu acho que sim, talvez sim. Mas é uma discussão em aberto.
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