“Existem outros mecanismos mais adequados”, disse o ministro, preocupado com a “extensão dos direitos exclusivos” para “proteger ‘investimentos substanciais'”29/04/2003

Por ocasião do dia internacional da propriedade intelectual, 26 de abril, o Ministro da Cultura, Gilberto Gil, divulgou nota à imprensa na qual se diz preocupado com a extensão dos direitos exclusivos a ?ativos que não são revestidos de atividade criadora?. Para ele, esses ativos ?procuram albergar-se sob o manto das legislações de propriedade intelectual?, apenas para?proteger ?investimentos substanciais?”.


Leia abaixo a íntegra da mensagem do ministro Gilberto Gil divulgada à imprensa.

Não poderia existir melhor momento para manifestar-me sobre a importância que têm hoje as questões relacionadas com os Direitos de Autor e Direitos Conexos, especialmente no que se refere à função social que este sistema de proteção deve imprimir à cultura nacional. Devemos recuperar a noção de que a propriedade intelectual é um poderoso instrumento de preservação e divulgação dos valores culturais nacionais.

Parece-me, assim, que hoje nos encontramos no meio de um processo fundamental para as legislações sobre propriedade intelectual face, especialmente, às transformações que o mundo está vivendo no campo das novas tecnologias, das comunicações e das relações internacionais no âmbito comercial, que buscam imprimir uma proteção nunca vista aos bens intelectuais que são objeto dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos.

Este processo, que em síntese procura recepcionar nos instrumentos internacionais multilaterais o impacto das novas tecnologias, sinaliza que devemos ficar atentos para as mudanças – nem sempre transparentes – de um direito de autor individual, consubstanciado na concepção jurídica latina ou continental, em direção a um novo direito de autor corporativo. Reafirmamos que, ao se apartar de sua gênese cultural, o direito de autor também se afasta do criador nacional como o mais importante beneficiário desse sistema.

A legislação hoje colocada à disposição da sociedade indica que o sujeito do direito autoral é o autor, definido pela Lei de Regência como sendo a pessoa física criadora de obra intelectual. Entretanto, face à possibilidade de transferência dos direitos a ele conferidos, estes, freqüentemente, são exercidos pelos produtores dos suportes físicos onde se encontram fixadas suas criações intelectuais. É fundamental, pois, que se busque verificar a quem efetivamente a legislação de propriedade intelectual protege, uma vez que mediante a cessão de direitos pouco resta aos autores, uma vez que raras são as vezes que possuem um mínimo poder de negociação, ainda mais quando inexiste na legislação autoral mecanismos positivos para a consecução de relações contratuais equilibradas.

A tendência internacional de enfatizar os aspectos das novas tecnologias e a importância econômica dos Direitos de Autor e Direitos Conexos para o conjunto da economia dos países em desenvolvimento têm gerado grandes polêmicas e precisam ser discutidas exaustivamente para que possamos tirar proveito do sistema de propriedade intelectual.

As propostas cada vez mais se direcionam para um reforço dos chamados direitos exclusivos. Estes, que inicialmente eram prerrogativa apenas dos autores, vêm sendo progressivamente estendidos aos titulares de direitos conexos, que têm hoje seus direitos praticamente igualados aos primeiros. Contudo, mais do que isso, o que nos preocupa é a extensão dos direitos exclusivos para ativos que não são revestidos de atividade criadora, que procuram albergar-se sob o manto das legislações de propriedade intelectual, quando, ao fim e cabo, o que se pretende é apenas proteger “investimentos substanciais”. Estamos seguros de que existem outros mecanismos mais adequados para este tipo de proteção, ao invés do ato de conferir direitos exclusivos pelo sistema da propriedade intelectual.

Finalmente, sabemos que cada vez mais a chamada época digital conduz a maiores e novas utilizações de obras literárias e artísticas. Não poderia deixar de me manifestar sobre este tema, enfatizando que o Ministério da Cultura com ele se preocupa e, especialmente, que tem o dever de propiciar o debate sobre o equilíbrio que deve existir na busca de maior acesso aos bens culturais pelo conjunto da sociedade e a observância desses direitos em território nacional, em benefício do criador nacional.

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