?O que era elitista está se tornando aristocrático?, diz documento, ao constatar ao mesmo tempo a proliferação das fundações e ?uma das piores crises? da história da produção independentePor Sílvio Crespo
23/07/2002
Há três anos tentando captar recursos para o espetáculo Liberdade, liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel, o produtor teatral Paulo Pélico escreveu um manifesto apontando a concentração dos investimentos em cultura nas grandes corporações e fundações, em detrimento da produção independente. O documento convida produtores a organizarem um ?movimento pela recuperação dos direitos da classe artística?.
?Fiquei surpreso com a notícia de que em 2001 a captação de recursos por meio das leis Rouanet e do Audiovisual bateu recorde, pois eu nunca vi tanta dificuldade para o pequeno produtor e tanto desemprego na classe artística?, afirma Pélico, que trabalha no setor há 14 anos. O manifesto, resultado de uma pesquisa feita pelo próprio produtor, atribui essa crise a algumas distorções na Lei Federal de Incentivo.
Exclusão do pequeno produtor
De acordo com o manifesto, o limite de dedução de apenas 4% do Imposto de Renda devido exclui do círculo de investidores em cultura a pequena e a média empresa. ?Apenas grandes grupos empresariais dispõem de impostos em volume suficiente para estabelecer uma política regular de Patrocínio Cultural?, diz o manifesto. Com isso, o pequeno produtor, que não tem condições de oferecer a exposição na mídia desejada pelas grandes empresas, também fica excluído do mercado.
Concorrência desigual
Outra crítica à Lei de Incentivo é a revogação da primazia do produtor independente no uso da lei. De acordo com Paulo Pélico, o texto original das Leis Rouanet e do Audiovisual reservava os mecanismos de incentivo ?única e exclusivamente à produção independente?. Hoje, segundo o produtor, qualquer emissora de rádio ou televisão? pode utilizar essas leis para captar recursos, ?abrindo uma concorrência desigual e desleal com o produtor independente?.
Espigões
A multiplicação dos institutos e fundações, sinal da concentração do investimento em cultura pelas grandes empresas, também pode ser explicada pela Lei de Incentivo, segundo o manifesto. Se originalmente essas entidades deveriam apresentar um currículo consistente de projetos de interesse social, antes de receber impostos dos grupos empresariais que as mantêm, agora elas podem, de acordo com Pélico, recebe-los a partir do dia seguinte à sua criação.
?De um lado, são construídos espigões com dinheiro público; de outro, temos uma das maiores crises da produção cultural independente?, diz Pélico.
O manifesto critica, ainda, a concessão de benefícios das leis federais de incentivo a projetos do Poder Público, contra os quais o produtor independente não consegue concorrer.
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