Projeto convida escritores a apresentarem seus livros em praças paulistanas, formando um espaço alternativo de discussão literáriaEntrevista a Sílvio Crespo
Edson Lima organiza, desde maio de 2000, o projeto ?O Autor na Praça?, em que escritores são convidados falar sobre seus livros nas feiras de arte das praças Benedito Calixto e Júlio Prestes, em São Paulo. Inácio de Loyola Brandão e Fernando Bonassi já participaram do evento. O Autor na Praça, que ainda não tem um patrocínio sólido e contínuo, é um exemplo de que um projeto cultural praticamente sem recursos financeiros pode conseguir se estabelecer no mercado e criar um público cativo.
Por que você optou pelo evento em praça pública? É mais fácil viabilizar a produção em locais públicos do que em livrarias, teatros etc?
O jornalista e escritor Mouzar Benedito, que freqüentava um espaço cultural que eu administrava junto com o poeta Fred Maia, dizia que faltava na feira da Benedito Calixto um evento literário. Como o Plínio Marcos [dramaturgo, escritor e autor de teatral] estava lançando um livro, conversamos com a editora e fizemos o lançamento na praça. A partir daí, constituímos o projeto de trazer freqüentemente um autor à praça. A praça pública já tem na história da humanidade o papel de espaço para manifestações artísticas.
A intenção é oferecer um espaço principalmente para autores que estão no mercado alternativo, ou seja, que de certa forma não estão inseridos nesse grande mercado. Não é uma concorrência com o mercado, mas uma opção de um novo espaço de contato direto do público com a literatura. Acredito que o mercado faz o seu papel, mas é preciso estimular a produção alternativa, que está, de certa forma, à margem, mas tem qualidade, conteúdo, proposta e público. Se hoje essa produção é alternativa e desconhecida, amanhã pode ser conhecido e resolvido.
Por que, na sua opinião, alguns artistas fazem um bom trabalho, têm um bom conteúdo, mas não conseguem se inserir no grande mercado?
Isso não acontece só nos dias de hoje. O Plínio Marcos enfrentou o mercado, na época, à sua maneira, entendendo que alguns textos acabam se tornando marginais, não pela qualidade ou linha ideológica, mas por não estarem inseridos na linguagem padrão da sociedade. O mercado, a sociedade constituída com seus padrões e normas, acaba tendo uma orientação para uma determinada linha. E o alternativo, às vezes, usa uma linguagem que extrapola essa linha.
É verdade que o mercado existe e é necessário, e a nossa convivência com ele é importantíssima. Mas não podemos esquecer a produção alternativa. Inclusive há grandes nomes que já passaram pelo projeto e estão inseridos no grande mercado, como Inácio de Loyola Brandão, Mouzar Benedito, Fernando Bonassi e outros tantos. Nomes conhecidos participam do projeto, mas não os nomes que o mercado acaba estabelecendo como importantes por causa de números comerciais.
De onde vêm os recursos financeiros para o Autor na Praça?
Quando o projeto começou tínhamos um apoio entre aspas. Era um apoio logístico de uma editora na qual eu trabalhava. Mas depois a editora não se interessou por continuar no projeto, considerando-o deficitário, e eu encontrei na Associação dos Amigos da Praça Benedito Calixto (constituída por moradores de pinheiros, colaboradores, expositores da feira) um apoio para manutenção. Essa parceria não traz recursos financeiros ao projeto, senão eventualmente. Quando eu percebi que o projeto tinha um potencial, eu deixei a editora e tenho me dedicado a ele há quase dois anos.
Financeiramente, o projeto ainda não tem um apoio. É uma administração autônoma, em que os recursos financeiros vêm dos próprios organizadores. Há também um percentual das vendas de livros que é repassado pelo autor ao projeto.
Você já buscou patrocínio em empresas, naqueles restaurantes em volta da praça…?
Os restaurantes Consulado Mineiro e Cantinho Português apóiam o projeto oferecendo um almoço aos autores convidados. Para divulgação do projeto, nós contamos com o apoio cultural do editor de arte Marcelo Max, da empresa de fotolitos Forma Três e da RWC Artes Gráficas, que resulta em 650 cartazes. Na feira da Benedito, há um trânsito de seis a oito mil pessoas por sábado. Entre elas, há jornalistas, atores, músicos, estudantes, produtores culturais… formadores de opinião, de uma maneira geral. Então, nós temos um público que, no meu modo de ver, pode interessar a muitas empresas que queiram agregar sua imagem a ele.
E quanto à sua relação com as editoras, elas não oferecem apoio ao projeto?
Algumas vezes a editora ajuda na divulgação através da sua assessoria de imprensa, ou financia faixas, mas são apoios pontuais. As editoras não dão um apoio contínuo ao projeto. Não é uma crítica; eu acho que as editoras fazem o seu papel. Mas desconhecem que seu papel poderia atingir uma coisa maior. A editora não pode ser simplesmente uma impressora de livros para despeja-los no mercado.
Agora está se abrindo a possibilidade de constituirmos um selo editorial chamado ?O Autor na Praça?. Eu chamo de ?selo? porque a proposta não é ser uma editora, mas uma parceria com os autores, sem pretensões comerciais, para realizar publicações alternativas.
O importante é entender que antes de se ter um produto e achar que ele é o melhor possível, é preciso saber, de fato, quem vai consumir esse produto. O mercado está disposto a tudo, seja àqueles que estão embalados, organizados, formatados para serem altamente comercializados, ou àqueles que não tem essa formatação, mas têm uma relação forte com a cultura do povo.
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