“O fato concreto é que o setor cultural efetivamente corre o sério risco de ter suas leis de incentivo estaduais comprometidas ou até eliminadas”
O tema apareceu com grande destaque nos jornais de São Paulo na semana passada e depois caiu num certo esquecimento. A reforma tributária está ainda em discussão. Como será sua versão final ainda não sabemos. O famoso estadista alemão Otto von Bismarck costumava dizer que “leis são como salsichas. O melhor é não ver como elas são feitas”. Apesar de concordarmos com a irônica sabedoria universal, na prática teremos todos que nos engajar para que se produza a melhor formulação possível. Precisamos ver o que está sendo feito. Teremos todos que salvar o setor cultural do equívoco em que ele se acha envolvido.

Como todos sabem, o ICMS é o principal imposto privativo dos Estados, responsável por mais de 80% das receitas correntes próprias de todos eles em nossa Federação.Nessa dimensão qualquer descuido com o ICMS pode ser fatal. Os Governadores ainda guardam na memória os resultados da Lei Kandir com a qual os Estados abriram mão da receita do tributo sobre os produtos industrializados e semi-elaborados confiando num ressarcimento financeiro por parte da União Federal que nunca foi feito na forma acordada.

Por essa e por outras é que os Estados concordam com tudo que não lhes retire a plena competência em relação aos seus tributos próprios, em especial sobre o ICMS. Por esse motivo, na Proposta de Reforma Tributária em seus artigos 90 a 93, que regulam as mudanças no ICMS, fundamentalmente a opção foi ganhar tempo para que os Estados não obstruíssem a Reforma e delegar para uma futura Lei Complementar o desenho constitucional do tributo. A encrenca é que o artigo 92 veda “a concessão ou prorrogação de isenções, reduções de base de cálculo, créditos presumidos ou quaisquer outros incentivos ou benefícios fiscais”. Com isso automaticamente todas as leis de incentivo fiscal estaduais serão proibidas. Numa primeira projeção cerca de R$ 166 milhões de renúncia fiscal serão retirados dos 16 Estados que possuem legislação de incentivos atrelada ao ICMS. Ora, como sabemos que as leis de incentivo federais por si só não asseguram a produção cultural, a questão é gravíssima.No caso do Estado de Minas Gerais é a legislação de incentivos à cultura é que tem possibilitado a atividade cultural. Nos últimos anos para que se tenha uma noção precisa, o Estado de Minas Gerais recebeu apenas 9% dos incentivos federais, assim entendidos como a Lei do Audiovisual e a Lei de Incentivos. Cerca de 86% dos recursos das leis federais ficaram no eixo Rio- São Paulo. Com isso fica evidente que foi a Lei de Incentivos do ICMS que assegurou a ação cultural em nosso Estado. Suprimi-la não será apenas um erro, será um crime. Diríamos até que isso não ocorrerá.

O setor cultural representa hoje um segmento econômico importante, gerando emprego e renda além de suas insubstituíveis funções de preservação da memória e da identidade nacionais. Portanto essa conquista é de toda sociedade brasileira e não poderá ser revogada por uma simples mudança legislativa. Preferimos crer que o que ocorreu foi apenas uma distração. Ao tentar vedar a guerra fiscal entre os Estados – o que efetivamente precisa ser feito – formulou-se uma regra geral sem atentar-se às suas outras conseqüências. Minas Gerais inscreve-se nesse debate. Convidamos o relator da matéria, o deputado Virgílio Guimarães do PT mineiro, que possui toda uma trajetória de credibilidade e de serviços prestados ao país, para participarmos de um amplo seminário sobre o assunto aqui em Minas Gerais. Temos a certeza de que juntos descobriremos a melhor forma de equilibrar os interesses da Reforma Tributária com os interesses de todo setor cultural do país. Essa será uma fundamental contribuição do Governo Aécio Neves para revisão do problema.


Luiz Roberto Nascimento Silva é Secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais.

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Luiz Roberto Nascimento Silva


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