José do Nascimento Jr, diretor do DEMU/IPHAN, analisa as realizações do governo federal no setor museológicoJosé do Nascimento Júnior é o Diretor DEMU (Departamento de Museus e Centros Culturais) do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Ele concedeu esta entrevista à Revista Museu durante o evento de inauguração das obras de modernização, do Museu Histórico Nacional, no Rio de Janeiro. O evento comemorativo se transformou num marco de realizações alusivo à Política Nacional de Museus, que foi lançada no mesmo local três anos antes.
O que significa para o senhor e para a museologia em geral estar no Museu Histórico Nacional, após 3 anos de trabalho, inaugurando o projeto de revitalização da instituição?
JN: Bem, para mim pessoalmente significou muito trabalho, muita dedicação e muito amor àquilo que a gente fez e propôs, além de compromissos, parcerias e amizades. Isso foi o mais importante de tudo e o que possibilitou a chegada a um resultado satisfatório em 2006, mas obviamente ainda tem muita coisa a ser feita. Nós asfaltamos um caminho, aumentando as condições dos museus brasileiros, o que leva a uma maior visitação, à elevação da auto-estima dos técnicos, seja nos museus a nível federal, estadual, municipal ou privado, entre outros aspectos, levando a um trabalho como esse que se apresenta hoje no Museu Histórico Nacional. Eles demonstram uma alta auto-estima, com o “gás” necessário para dar conta de um projeto de revitalização deste porte, sendo um símbolo para nós da ação que vem sendo feita não só aqui, mas em todo o país. Mas, conforme você citou no início da entrevista, em se tratando desse museu, ele acaba sendo um marco, já que a Política foi lançada aqui e o que nós prometemos, nós conseguimos cumprir.
No início do governo, o Ministro Gil reclamou bastante sobre a pouca verba dedicada à cultura. Como está a situação agora?
JN: A verba destinada à área da cultura em 2005 foi de 95 milhões de reais e nós esperamos ao menos manter esse patamar em 2006, sustentando assim o nível de investimento para que os museus não voltem a cair nos problemas existentes no início desse governo. Com esse mesmo nível de investimento, é possível modernizar outras estruturas, além de criar uma maior dinâmica nos museus através da programação de boas exposições, o incremento dos programas educativos, a boa conservação dos acervos, etc. É importante destacar que as parcerias têm sido fundamentais e, sobretudo, a própria política do Ministério da Cultura que colocou os museus em foco na instituição. Isso levou os municípios e estados a terem um maior interesse em desenvolver suas próprias políticas culturais, tendo seus museus inseridos como estruturas importantes nas políticas locais.
Qual foi o `norte` adotado para resolver o problema financeiro que se apresentava no início desse governo?
JN: Em primeiro lugar, ter uma política clara, ou seja, um conjunto de ações que mostrasse aos parceiros e a outras áreas de governo que existia uma consistência que indicava onde nós pretendíamos chegar. Isso foi essencial para que os investimentos chegassem, com base num trabalho de excelência e de qualidade que estava sendo apresentado e que pôde ser desenvolvido nesses 3 anos. Nós mostramos o trabalho, o Ministério da Cultura foi investindo ao longo desse período e os parceiros foram chegando aos poucos e puderam ver que nós tínhamos traçado um caminho, que inclusive não estava concentrado apenas nos grandes centros. Com isso, nós conseguimos solidificar essas parcerias, como é o caso da Caixa Econômica Federal, do BNDES, e conseguimos oferecer os frutos de uma ação cultural completa.
Como foram desenvolvidas as negociações com os patrocinadores ao longo destes 4 anos?
JN: No caso das entidades governamentais como a Caixa, o BNDES, a Petrobrás e o Banco do Nordeste, a responsabilidade pública dessas instituições cruza com os interesses do Ministério da Cultura, o que leva a um casamento feliz e conseqüente potencialização dos investimentos. Existiam pessoas dos dois lados imbuídas no mais alto interesse público. Os resultados acabaram por levar à renovação dos convênios com a Caixa, que tem uma visão empresarial de longo prazo e tem consciência da agregação da imagem da Caixa a projetos importantes. Os museus particularmente estão dando essa boa imagem às instituições financeiras e empresariais. Esse enfoque ainda é novo no nosso país. Então, além dessas empresas, nós esperamos que outros patrocinadores também invistam nos museus. Por isso, nós estamos buscando parcerias em todos os cantos.
Qual a preocupação com relação aos resultados da atual política?
JN: Após ser iniciado, todo processo, apesar de todos os percalços, chega a um rápido resultado. O duro é manter esse patamar de investimentos e qualidade, já que crescem as expectativas relativas às ações envolvidas. Não se pode cair na mesmice, tendo que estar sempre inovando, o que é o mais complexo que temos que fazer agora. Isso não só para a Museologia como para as políticas públicas em geral.
Em relação às políticas culturais, e por ser 2006 um ano eleitoral, quais são as expectativas que os profissionais podem ter com relação às ações desenvolvidas?
JN: Eu acho que é importante ressaltar que esse é um projeto de governo, nós estamos imbuídos em um perfil de ação que condiz com a gestão que se tem hoje no país. A exemplo disso, houve o lançamento do Museu da Maré, além do investimento no patrimônio público e da valorização dos técnicos dos museus. Obviamente que independe do resultado das eleições 2006, nós queremos que essa política seja uma política de Estado, que dê continuidade a este tipo de investimento, enfocando sobretudo uma relação democrática com as instituições e com a área museológica. Em 2003, ao chegarmos no governo, não existia nem essa política nem essas ações, mas nós esperamos que daqui pra frente essas ações permaneçam independente do governo, já que esta política é destinada às instituições museológicas e à população em geral, que tem nos museus uma referência de lazer, cultura, educação e tecnologia. Para nós, isso é o importante, ou seja, que esse marcos – construídos ao longo desses 4 anos – cresçam, mantendo o nível de qualidade e de interlocução com todos os museus do país. Nós vamos apresentar o que tivermos e aguardar o desfecho do processo eleitoral, além de dialogar acerca de propostas e críticas. Para mim, nós não fizemos um trabalho perfeito, faltando ainda coisas a serem realizadas, mas também mostramos que quando se tem vontade política, quando se quer, o poder público pode dar resposta. A máquina está disponível, desde que você aponte, priorize e aí ela funciona. O Museu Histórico Nacional é um exemplo de ação pública. Valorizar o que é público, é valorizar o que é de todos. Com isso, nós esperamos que as coisas continuem funcionando neste sentido, nós não privatizamos nenhum museu, não terceirizamos nenhum museu, nós valorizamos o patrimônio de uma maneira geral. Nós não fizemos nem mais nem menos do que a nossa obrigação do ponto-de-vista de gestão pública. Acho que se o governo terminasse agora, eu sairia satisfeito não só com o meu trabalho, mas eu tenho uma visão do que pode ser realizado mais pra frente. Foi um trabalho muito gratificante, muito estimulante ao longo desses quatro anos e o resultado está aí. Acredito que as pessoas possam julgar os resultados.
A Política Nacional de Museus está implantada. Qual é o tempo previsto para que o Sistema Nacional de Museus e o Instituto Brasileiro de Museus estejam funcionando?
JN: Nós temos naturalmente aquela ansiedade de que as coisas aconteçam rápido, mas eu acho que cada coisa está no seu tempo. Nós estamos estruturando isso ponto a ponto, e estamos construindo essa estrutura com solidez. O sistema de museus está avançando, estando em fase de adesões, temos o cadastro nacional de museus sendo iniciado e estamos em debates com o Ministério do Planejamento para que o sistema saia em breve. É um trabalho cotidiano e intenso, que nós esperamos que se firme para que o campo museológico e a população, de uma maneira geral, possam usufruir.
O MHN completou 84 anos este ano, e acabamos de saber que o recém inaugurado Museu da Maré teve mil visitantes em 10 dias de criação. O que isso simboliza para o senhor?
JN: Acho que são duas pontas de uma mesma questão. Para mim, o Museu da Maré significa esta dinamicidade possível em todos os museus e que as comunidades, ao contrário do que é dito, estão abertas ao tema da memória. É só uma questão de possibilitar o acesso. No caso do Museu Histórico Nacional, o trato que é dado à memória e à história do país faz com que uma revitalização deste porte o consolide como centro de referência nacional para todos os museus. Já o “caçula” dos museus, como é o caso do Museu da Maré, traz questões novas e revela essa dinamicidade. Essas duas ações acabam se encontrando exatamente na dinamicidade do campo museal brasileiro, com possibilidades a serem exploradas no campo da memória e no campo dos museus. Eu fico cada vez mais feliz em poder contribuir dentro da minha função para que essas coisas aconteçam e por contar com os dirigentes dessas instituições como parceiros importantes.
Numa frase, o que significou este dia para o senhor?
JN: É um dia de muita emoção e resultado de muita dedicação. É um recordar de tudo que nós passamos, incluindo as dificuldades e as alegrias. A sensação que eu tive ao ver o museu, além de poder compartilhar com os amigos um pouco dessa felicidade, foi maravilhosa. É como se minha filha estivesse nascendo de novo hoje.
Entrevista concedida para a Revista Museu (www.revistamuseu.com.br) e reproduzida com a autorização do veículo
César Ojeda