Se lembrarmos alguns dos melhores períodos da nossa história recente, a cultura foi um poderoso meio estimulador e de agregação dos brasileiros para desenvolver o paísCazuza cantava sabiamente que “ideologia eu queo uma para viver” e ainda completava, realisticamente, que nossos heróis estavam mortos”. Esta importante constatação do poeta atenta para uma crise de identidade de valores que ronda nosso referencial para um modo de vida e de viver. O vazio ideológico que nos acompanha desde o final dos anos 80 resultou em uma grave crise moral e de valores que abriu espaço para modelos de pensar muito distantes de nossas tradições históricas. A sociedade de consumo desvairado sustentada pela ideologia neoliberal por pouco não fez prevalecer o princípio “cada um por si e Deus contra todos”, lembrado por Paulo Nogueira Batista, citando Glauber Rocha, em recente artigo no jornal Folha de São Paulo.
No nosso viver diário, um fenômeno ocorreu que nos deu esperança e um referencial de valores indispensável para a construção de uma nova sociedade. A visibilidade que as organizações da sociedade civil passam a ter coloca novamente em evidência os mais nobres valores que norteiam a humanidade em busca de uma sociedade justa e que se constituem no mais importante pilar de sustentação do chamado Terceiro Setor.
Os princípios da Revoluação Franceswa de liberdade, igualdade e fraternidade são colocados em prática nas ações de milhares de organizações do terceiro setor que lutam por uma economia solidária, pela democracia plena e pelo exercício de cidadania. No terceiro setor brasileiro, Cultura e Recreação representam 16% das atividades, sendo superadas apenas por Educação e Pesquisa (34%) e Saúde (16%). Foi, porém, uma das áreas de atividade que apresentaram os maiores índices de crescimento, cerca de 03% entre 1991 e 1995.
Frente ao vazio ideológico que prevalece em nossa sociedade, esses números revelam que a area cultural com finalidade pública pode assumir uma posição estratégica fundamental para a disseminação de valores e princípios que são referencias para a construção de uma sociedade justa.
Para alguns, como Samuel Huntington, é a cultura de um povo que determina seu desenvolvimento. Se lembrarmos alguns dos melhores períodos da nossa história recente, a cultura foi um poderoso meio estimulador e de agregação dos brasileiros para desenvolver o país. O cinema novo, o teatro de protesto, e a bossa nova alimentaram nossas mentes, nos convencendo que um novo mundo é possível.
O programa de governo do PT insitutlado “A imaginação a serviço do Brasil” enfatiza o papel da cultura como política pública para o desenvolvimento e democracia. Em seu lançamento no dia 21 de outubro, Lula dizia que o programa deveria ser encarado como “uma metamorfose ambulante”, ou seja, que deveria ser aberto para que todos pudessem contribuir permanentemente para a sua melhoria. Que se abra espaço para que todos possamos fazer nossa parte na construção de uma nova agenda cultural.
Luiz Carlos Merege é professor titular, coordenador do Centro de Estudos do Terceiro Setor da Fundação Getúlio Vargas.
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Luiz Carlos Merege