Artistas, produtores e políticos mineiros reúnem-se com o deputado Virgílio Guimarães para defender a cultura frente à reforma tributária; conheça a proposta de emenda apresentada17/06/2003
Por Israel do Vale

Uma reunião na noite da última segunda-feira, em Belo Horizonte, selou o primeiro esboço concreto de reação de uma parcela do setor cultural aos efeitos devastadores da reforma fiscal sobre as leis estaduais de incentivo à Cultura, caso ela seja aprovada pelo Congresso como está.

O encontro serviu também como uma tentativa de aproximação com outra frente, na Bahia, que atua paralelamente na elaboração de emenda ao projeto do Executivo. O tom da conversa era de “gravidade e urgência”. O motivo principal: o prazo para apresentação de emendas, única maneira de reverter a situação, termina nesta quinta-feira, dia 19.

A reação tardia dos produtores e políticos favoráveis à manutenção das leis vem após um novo baque, com a perda de apoio do Conselho Nacional de Política Fazendária, o Confaz. A baixa deve-se à recusa de três secretários da Fazenda de assinar o conjunto de mudanças proposto pelo conselho em áreas variadas caso a exceção ao ICMS na área cultural fosse mantida.

O Confaz só defende, pública e institucionalmente, o que é consensual entre os 27 secretários da Fazenda do país. O secretário baiano e coordenador do conselho, Albérico Mascarenhas, não revelou os nomes ou Estados dos três secretários contrários à lei.

Mascarenhas disse apenas que o motivo deles é “filosófico” e que se deve a problemas de caixa de seus Estados, que impediriam qualquer perda de arrecadação. Segundo ele, os outros 24 secretários mantêm apoios individuais. As sugestões deles são a base da emenda baiana que será avaliada pela comissão especial.

Reunião
A “conjuração” mineira foi encabeçada pelo secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais, o ex-ministro da Cultura Luiz Roberto Nascimento Silva. Reuniu também a secretária municipal de Cultura da capital mineira, Celina Albano, e 14 entidades representativas do setor cultural mineiro.

O objetivo inicial do grupo era aproveitar a passagem por Belo Horizonte do deputado petista mineiro Virgílio Guimarães, relator da comissão especial da Câmara, e sensibilizá-lo para a importância da continuidade das leis. Sem elas, em números de hoje, um montante que pode chegar a R$ 166 milhões deixaria de irrigar a produção cultural do país.

A comissão especial é o último estágio antes de a reforma seguir para votação no Congresso. É ela quem acata ou não as emendas, que só são avaliadas com a assinatura de pelo menos 171 deputados. Se for aprovada da maneira como está, a reforma aniquila com as leis estaduais de incentivo, que seriam progressivamente extintas.

Segundo participantes da reunião, o deputado petista reiterou seu apoio à reforma, mas mostrou-se favorável a avaliar emenda sobre o assunto. Virgílio Guimarães teria deixado claro, contudo, que não é da sua alçada propor nada neste momento. Segundo ele, o caminho é o do corpo-a-corpo no Congresso.

Recado dado, a articulação mineira teve dois efeitos práticos. De um lado, a redação de uma nova versão de emenda, que taparia brechas deixadas na que vem sendo trabalhada pelo deputado pefelista baiano Luiz Carreira. (A proposta mineira teria sido elaborada de próprio punho pelo secretário Nascimento Silva, em conjunto com a secretária municipal belo-horizontina. Nascimento Silva é advogado de formação, com especialização na área tributária.)

De outro, a decisão dos participantes de enviar representante nesta terça-feira a Brasília, tanto para levantar assinaturas para que a emenda seja acatada como para iniciar o lobby para sua aprovação na Câmara e no Senado.

A previsão do governo é de que a reforma tributária seja votada até agosto _o que, considerado o recesso de julho do Congresso, deixaria pouco tempo para discussões e retoques. Mas a principal preocupação neste momento é regimental: com o curto prazo para que a emenda seja apresentada.

Em artigo que Cultura e Mercado publica nesta edição, o secretário mineiro afirma que “leis são como salsichas”, em defesa da idéia de que “é melhor não ver como são feitas”, usando frase atribuída ao estadista alemão Otto von Bismarck. Nascimento Silva aponta a inoperância das leis federais em Minas Gerais e diz que a eventual supressão das leis de incentivo à Cultura “não será apenas um erro, será um crime”.


Leia também:
O ICMS da Cultura


Leia abaixo a proposta de emenda defendida por produtores e políticos mineiros.

As seguintes entidades representativas do setor cultural e artístico de Minas Gerais:

Sindicato dos Produtores de Artes Cênicas de Minas Gerais;
Associação Movimento de Teatro de Grupo de Minas Gerais;
Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de Minas Gerais ? SATED/MG;
Associação Curta Minas;
Centro de Estudos Cinematográficos;
Associação Mineira de Cineastas;
Sindicato dos Escritores de Minas Gerais;
Fórum Mineiro do Audiovisual;
Associação Artística dos Músicos de Minas Gerais;
Abrape ? Associação Brasileira dos Promotores de Evento;
Instituto Humberto Mauro;
Associação Cultural do Vale do Aço;
Ordem dos Músicos do Brasil ? Seção de Minas Gerais;
AMAVI ? Associação Mineira de Audio e Video

reunidas em Assembléia no Teatro da Cidade em data de hoje, 16 de junho de 2003, diante da iminência de extinção das leis estaduais de incentivo à cultura, embutida na nova proposta de Reforma Tributária do Governo Federal, resolvem propor à Comissão Especial que examina a matéria, a emenda que se segue anexa.

Ressaltamos a importância da Reforma Tributária em tramitação no Congresso Nacional para o conjunto da sociedade brasileira e estamos certos da pertinência desta emenda, na medida em que não é interesse do Governo Federal, que a cultura seja prejudicada, quando não é objetivo nem causa de guerra fiscal.

EMENDA À CONSTITUIÇÃO NO TOCANTE A ALTERAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO, Nº 41/2003.

Dá nova redação aos artigos 155 e 92 das Disposições Transitórias.

Art. 155
VII ? Não será objeto de isenção, redução de base de cálculo, crédito presumido ou qualquer outro incentivo ou benefício fiscal ou financeiro que implique sua redução, exceto para atendimento ao disposto no Artigo 170, IX, hipótese na qual poderão ser aplicadas as restrições previstas nas alíneas “a” e “b” do inciso II, bem como as Leis de Incentivo à Cultura Estaduais, dentro do âmbito de competência de cada Estado.

Art. 92 das Disposições Transitórias
Fica vedada, a partir da promulgação presente emenda, a concessão ou prorrogação de isenções, reduções de base de cálculo, créditos presumidos ou quaisquer outros incentivos ou benefícios fiscais ou financeiros relativamente ao imposto de que trata o Art. 155, II, da Constituição, ressalvando, apenas, as Leis de Incentivo à Cultura Estaduais, dentro do âmbito da competência de cada Estado.

JUSTIFICATIVA

A Emenda Constitucional que altera o Sistema Tributário Nacional é uma iniciativa do Governo Luiz Inácio Lula da Silva que atende a reclamação antiga da sociedade brasileira.

Entre seus principais objetivos busca por fim a guerra fiscal entre as unidades da Federação. Como a própria Exposição de Motivos indica: ” a proposta de vedação de concessão de benefícios e incentivos fiscais ou financeiros, propiciará, especialmente, o fim da competição predatória entre os Estados e a melhoria da eficiência arrecadatória do ICMS”.

Entretanto, ao criar uma regra geral para atingir esse objetivo, acaba por extinguir todas as Leis Estaduais de Incentivo à Cultura. Essas leis permitem que as empresas que tenham débito de ICMS utilizem parte desses recursos para apoio a projetos culturais. Não se trata de isenção fiscal, parcial ou total, nem se constitui em instrumento de guerra fiscal na busca de investimentos econômicos.

Essas leis estaduais existem em quase todos Estados brasileiros e garantem o patrocínio de projetos que não são atendidos pelas leis federais de apoio à Cultura. Em muitos Estados essas leis é que asseguram a realização de efetiva ação cultural e o cumprimento do preceito constitucional de regionalização da produção cultural.

A extinção dessas leis estaduais, além do enorme prejuízo à atividade cultural como um todo, representará um impacto negativo na geração de emprego e renda na economia dos Estados.

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