Com a repercussão do editorial CULTURA NOTA FRIA e artigo de Lala Deheinzelin sobre o tema, surgiram mais manifestações de apoio ao MCB. Acompanhe as opiniões de Helena Sampaio, Claudia Cavalcanti e Jose Alberto Nemer

apenas poucos anos a maioria dos paulistanos que passava em frente ao Solar Fábio Prado, um prédio construído na década de 40, desconhecia que ali está instalado, desde 1972, o Museu da Casa Brasileira. A bela construção contrasta com uma Av. Faria Lima sem grandes atrativos (além, é claro, do Shopping Iguatemi, ali quase defrontechamativo não pela sua arquitetura, mas pelas tentações consumistas): a casa tem 6.000 m² de jardim com uma grande variedade de árvores brasileiras – ali, no seu quintal, um acervo vivo. O Museu abriga a Coleção Crespi Prado e expõe peças de mobiliário dos séculos 18 a 20. Há apenas poucos anos, era isso o Museu da Casa Brasileira.

Hoje popularmente conhecido como MCB, ele promove exposições que fazem parte do calendário cultural da cidade, como as peças agraciadas com o Prêmio de Design; além de exposições memoráveis, como a de design popular da Bahia (que em nada deixou a dever a autores premiados e revelou soluções antes despercebidas) ou a “Santos Dumont-designer”, um recorde de público, com ampla divulgação nacional, que ocupava seus interiores e parte do jardim, com demonstrações ao ar livre de maquetes do inventor (como este mesmo provavelmente faria).

apenas poucos anos o MCB promovia em seu hall domingueiras com música erudita, para um público que ocupava as suas cerca de 50 cadeiras. Era muito bom, mas erapouco. Bem, hoje os muitos lugares espalhados pelo pátio coberto e parte do jardim são objeto de disputa de apresentações gratuitas, sempre às 11 da manhã dos domingos, com curadores do quilate de Roberto Sion e Benjamin Taubkin. Quando a programação entra em recesso, os paulistanos sentem falta.

O crescimento do público visitante, aliás, é a prova de que o MCB é hoje um museu que faz parte da vida cultural da capital paulistana. A função dos museus é esta: chamar para si a população, formando-a culturalmente. Um museu vazio é apenas um museu. É isto que querem que volte a ser o nosso querido MCB?

Helena Sampaio e Claudia Cavalcanti,
coordenadora executiva e responsável pela comunicação do Artesanato Solidário/ArteSol, respectivamente.

O editorial CULTURA NOTA-FRIA levanta questões legais sobre cultura, mercado e administração, colocando em foco o caso Museu da Casa Brasileira. Mais do que comentar pontualmente o artigo, gostaria, antes de mais nada, de manifestar meu apoio incondicional à diretora Adélia Borges, repudiando toda e qualquer interpretação capciosa em relação à sua gestão e/ou à sua pessoa.

A sabedoria popular diz que “em casa que não tem pão, todos brigam e ninguém tem razão”. É o princípio da discórdia que floresce na miséria. O abismo existente hoje entre o Estado e a sociedade no Brasil acaba gerando monstros capazes de devorar indiscriminadamente quem estiver pelo caminho. É mais uma bala perdida, desta vez na administração cultural. Este tormento pelo qual passa a atual gestão do MCB é típico do preço que se paga pelos atos de heroísmo num ambiente de indigência e de abandono. É o heroísmo de querer tirar os órgãos públicos da letargia e da inoperância em que vivem com uma naturalidade cínica.

No Brasil, os problemas da cultura não são diferentes dos da educação, da saúde, da segurança. O Estado tem uma cegueira conveniente ou um olhar míope em relação a eles. Um exemplo, que está hoje nos jornais, é a redução da idade de responsabilidade criminal para fazer face à violência generalizada. As iniciativas governamentais não chegam nas questões nucleares, como o sistema judiciário e o aparelho policial (sem falar dos contextos mais amplos).

Um postulado junguiano reconhece que “não se pode mudar aquilo que não se aceita.” O que esperar de um Estado que perdeu o exercício da autocrítica?
Diante da incapacidade de se tocar no cerne das coisas, não vivenciamos os problemas da democracia (para tentar resolvê-los), mas somos vítimas enganadas de algumas de suas doenças. Na democratite brasileira, o Estado finge que delega mas, na verdade, abandona. Mantém de plantão as leis, entretanto, como um efeito âncora, impedindo, muitas vezes levianamente, que o barco daqueles que improvisam a sobrevivência com criatividade, siga o seu curso.

Talvez seja esta a saga maior deste país “em desenvolvimento”: não nos dão pão, mas pune-se quem inventa a brioche, ou seja, a entropia globalizada nos pegou de calças curtas.

Jose Alberto Nemer,
Artista plástico, doutor em Artes Plásticas pela Universidade de Paris. Ex-diretor de Cultura de Belo Horizonte e do Museu de Arte da Pampulha. É o gestor científico do Laboratório Piracema de Design.



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