Abundância de informação gera escassez de atenção. Herbert Simon, economista e ganhador de um Nobel, apresentou esse conceito em 1971. Mais de 40 anos depois, isso tornou-se ainda mais válido. Com a ascensão da internet nos últimos 15 anos, produzir conteúdo nunca foi tão fácil. Para o bem e para o mal, já que à medida em que somos inundados por novas informações, o resultado é que temos cada vez menos tempo para consumi-las.

Foto: ReproduçãoÉ nesse contexto que o storytelling desperta cada vez mais o interesse de profissionais que tenham desafios de comunicação pela frente, sejam executivos, publicitários, produtores culturais ou qualquer um que precise vender algo a algum público.

Uma história bem contada não só tem o poder de capturar a atenção do público, como é capaz de transmitir conhecimento, gerar significado e engajar o público em uma determina direção.

Nos dias 30 de janeiro a 2 de fevereiro, o Cultura e Mercado apresenta o curso Storytelling – A técnica que vem unindo a cultura ao mercado, e vice-versa, com Bruno Scartozzoni. Com mais de 10 anos de experiência, atendendo clientes como Nokia, Nestlé, Sony, AmBev, Sebrae e Caixa, ele foi um dos fundadores da Storytellers, primeira agência brasileira especializada em criar histórias para marcas. Hoje é consultor de comunicação e professor de storytelling e transmídia da ECA-USP e FIAP, além de colaborar para o Brasil Post e editar o blog Caldinas.

Em entrevista, Scartozzoni fala sobre conceito e práticas de storytelling e como artistas e produtores culturais podem fazer bom uso dele.

Cultura e Mercado – O que é storytelling e como esse termo passou a ser utilizado por quem trabalha com comunicação para marcas?
Bruno Scartozzoni – Storytelling, na tradução literal, seria “contação de histórias”. Na prática podemos traduzir storytelling como um conjunto de técnicas utilizadas por escritores, roteiristas e outros profissionais da indústria do entretenimento com o objetivo de capturar a atenção do público e transmitir mensagens.

Em outras palavras, storytelling não é algo novo. A novidade aqui são profissionais de comunicação e marketing tendo interesse em assimilar essas técnicas de forma mais estruturada, ou seja, tentando levar aquilo que a indústria do entretenimento já aplica faz tempo para campanhas publicitárias, construção de marcas, apresentações de projetos e todo tipo de tarefa que envolva o desafio de conquistar um determinado público.

Esse movimento recente decorre dos novos desafios impostos pela chegada da internet. Hoje qualquer público é naturalmente inundado por informações de todos os lados, vindas dos mais diversos canais. Nesse cenário faz-se necessário a utilização de histórias acaba sendo uma grande vantagem competitiva para quem disputa a atenção das pessoas.

CeM – Para artistas e muitos produtores culturais, a palavra ‘marketing’ ainda causa certa aversão. Qual a importância de se “virar essa chave”?
BS – A tradução de marketing para o português seria “mercadologia”, ou seja, tem a ver com conhecer seu mercado e encontrar a melhor forma de vender seu produto pra ele. Artistas tendem a olhar para isso como algo que pode afetar sua expressão individual e, portanto sua obra. Um exemplo: o artista prefere amarelo, mas descobre em pesquisas que o público prefere azul. Se ele mudar a cor, talvez venda mais, mas, por outro lado, está deixando de ser um artista com A maiúsculo.

O ponto é que o artista não precisa (e nem deve) se dobrar completamente ao marketing, mas pode usá-lo a seu favor. Vamos a outro exemplo. Hoje em dia fazer música é muito mais fácil do que 20, 30 anos atrás. A tecnologia permite não só com que seja infinitamente mais fácil gravar, como também seja muito mais fácil divulgar o trabalho ao público. O problema é que, se ficou mais fácil para um, ficou mais fácil para todos. Se antes a batalha do músico era entrar em uma gravadora, agora sua batalha é ser mais interessante para o público do que as outras bandas. Para isso é claro que a qualidade da música é muito importante, mas não vai fazer mal se ele souber usar as redes sociais para se promover, mostrando bastidores, contando sua própria história de um jeito cativante, abrindo canais para a participação do público etc. Isso é marketing.

CeM – Quais são os principais erros cometidos ao tentar trabalhar com storytelling?
BS – Toda história tem uma série de elementos em comum. De forma resumida, podemos dizer que uma história é um personagem enfrentando forças antagônicas para atingir um objetivo. Volta e meia encontrarmos tentativas de contar uma história sem que se tenha um personagem, forças antagônicas ou objetivos, ou seja, um storytelling “meia bomba”. O mais importante aqui é que, ao se contar uma história, estamos competindo com todas as outras. Em outras palavras, ou se conta uma história de verdade, ou é melhor nem contar.

CeM – E o que caracteriza os bons exemplos nesse tipo de ação?
BS – Os bons exemplos de storytelling corporativo são os que, além de utilizar os elementos corretamente, não demonstram medo de emocionar o público. Storytelling é uma ferramenta que passa, necessariamente, por emoções e sentimentos. Empresas que não se esquivam disso, mesmo sabendo dos riscos envolvidos, geralmente se dão bem. Já as que tentam contar histórias, mas sem emocionar muito, fracassam.

CeM – Por que os profissionais da área cultural deveriam saber mais sobre storytelling? De que maneira essa técnica pode ajudar na comunicação dos projetos culturais?
BS – Uma forma de encarar o storytelling para projetos culturais tem a ver com criação de contexto. Em um ambiente onde muita gente disputa uma quantidade limitada de atenção do público, dar contexto para o que se quer vender pode ser um diferencial poderoso. No caso de um escritor, por exemplo, é bastante comum que o público se envolva primeiro com sua história pessoal, e depois com sua obra. O mesmo para bandas, artistas plásticos etc. No final das contas, uma coisa ajuda a vender a outra. E vice-versa.

CeM – Você diz que sempre quis fazer versões do seu curso de storytelling em lugares diferentes, como uma sala de cinema, um teatro ou na sede de uma editora. Esses espaços são geradores de boas histórias? De que maneira a vivência nesses locais pode ajudar a comunicar os projetos desenvolvidos por eles?
BS – Acho que é muito mais pela inspiração que daria, tanto para os alunos quanto para o professor. Para quem já trabalha neles, a parte boa é que o contato com essas técnicas de contação de histórias talvez seja mais natural. Profissionais de cinema, teatro e literatura já sabem o que é o storytelling, só talvez não o usem para vender seus projetos.

CeM – Você é um heavy user do FB e está sempre contando histórias por lá. As mídias sociais são os melhores canais pra contar histórias hoje? Acredita que deve permanecer ainda por muito tempo? Isso também serve para as páginas de projetos e empresas?
BS – As mídias sociais são mídias novas e, por isso mesmo, em constante transformação. Talvez por essa falta de padrões ainda não possamos considerar como O MELHOR LUGAR para se contar uma história, mas certamente é uma opção válida, desafiadora e, em muitos casos, mais viável para quem não tem tanto poder de fogo para encarar uma TV, rádio etc. Esse tipo de mídia certamente veio para ficar. O impossível de prever é até quando durará as mídias vigentes, como Facebook, Twitter etc. É só pensarmos na força que o Orkut tinha, e em quão pouco tempo ele caiu.

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**Entrevista publicada orginalmente em 4 de agosto de 2015


Jornalista, foi diretora de conteúdo e editora do Cultura e Mercado de 2011 a 2016.

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