Px Silveira trata nesta edição da Tribuna do papel dos Pontos de Cultura na construção de uma política pública, e da relação entre as políticas discutidas na Teia e a nova Economia da Cultura que se desenha no país.Todo Ponto de Cultura é um ponto de exclamação da cultura. São pontos de reticências, jamais de conclusão. Cada Ponto representa de fato e de direito a redenção cultural de que falaram e falam tanto os tecnoculturocratas, inclusive os atuais.
Os Pontos de Cultura, de norte a sul do País, são mais de 600 pontos de interrogação em busca de uma pergunta que não esteja pronta. São muitas pontas que os Pontos têm. Mesmo com suas contradições e dificuldades de articulação, os Pontos querem que a cultura seja ouvida de baixo para cima.
Os Pontos são órfãos legítimos do berço esplêndido adotados por uma política transitória. Febem cultural. São testemunhos vibrantes da desconcentração de manifestações culturais, que sempre houve, sem que com isso ocorra uma necessária desconcentração dos equipamentos culturais no país, que nunca houve.
Os Pontos estão á frente da política, pois dela não dependem. Os Pontos são como o Brasil, que mesmo sem esse nome já era Brasil; eles já eram Pontos.
Pode-se falar de um descobrimento das caras e dos caras que o tem Brasil. Tardio ou novo, é o verdadeiro descobrimento de um país que vai se revelando para ele mesmo, e que sempre haverá descobrimentos.
Cabe aos Pontos não deixarem ser domesticados e tampouco deixar que este “descobrimento” seja traduzido em invasão e colonização.
O risco é grande. Como é grande o belo horizonte. Os Pontos de Cultura devem sempre ter as rédeas às mãos e fazer que dêem cá o muito que tomam lá.
A equação deve ser composta basicamente de, no mínimo, dois movimentos. O primeiro é o doar, que é o movimento da desconcentração dos equipamentos culturais cedidos pelos Pontos e institucionalizados, fazendo com que toda pequena sede passe a ser ramificação do Estado.
E chega a hora do segundo movimento, que é o receber, que se opera para que seja justificado o primeiro movimento, e que é a descentralização da gestão e do poder de tomada de decisão.
Empoderamento é uma palavra pomposa. Empoderamento cultural define uma situação merecida e devida à cultura que faz o Brasil. E é bom saber que empoderamento sem dinheiro é empoderamento sem poder, ilusão, enrolamento.
Estes dois pontos de que falamos, o da desconcentração de equipamentos e o da descentralização da gestão, já seriam suficientes para justificar o programa Cultura Viva, do Ministério da Cultura, que pretende chegar a 20 mil pontos até 2010, tecendo-os de um a um.
Este é, de longe e também de perto, o mais eficiente e abrangente programa jamais realizado por qualquer governo brasileiro na área da cultura, em todas as esferas.
O programa Cultura Viva é um talho do tamanho continental do País. E é assim que pouco a pouco vamos vendo nosso avesso e sendo descobertos para além da linha do litoral, que Cabral divisou, e para aquém da linha de Tordesilhas, que os Bandeirantes espicharam.
Ao contrário de outras revoluções, essa não tem um rosto, tem uma legião. Tampouco tem uma ideologia, tem múltiplas. Não há uma liderança, mas o kaos construtivo. Como predito pelo profeta Jorge Mautner, chovem ações convergentes sobre os caminhos de superações.
Sentimo-nos espectadores privilegiados dessa virada na história. Falar de Woodstock da Cultura é pouco, em que pese a comparação com um festival que na década de 60 plantou sementes que floresceram em todo o mundo.
Vemos por estes Pontos uma malha de investimento imaterial na inversão da lógica da gestão cultural, aqui explicitada nos estertores de uma política pública para a cultura (pois chega de política, queremos tão apenas cultura), e vemos que milhares de agentes da criação assim
constituídos passam por sua vez a investir discernidos e raivosos diretamente na raiz do problema.
E o problema no Brasil, todos sabemos, não é a criação cultural, que sempre vai bem, mas a difusão e a sustentabilidade dela.
O programa Cultura Viva, navegador desse novo Brasil, é um empurrão histórico que vai enfim potencializar o amálgama das raças de que falavam próceres intelectuais brasileiros e que hoje são ecoados Ponto a Ponto, sendo cada um deles uma sílaba desse tempo presente.
A Teia formada pelos Pontos de Cultura dá visibilidade ao País de um imenso laboratório, de uma imensa incubadora, em que, ainda que momentaneamente, os trajetos de ermos culturais se cruzam para formar o mapa da nação, que não mais será feita só de geografia ou números.
É o desencadeamento de uma reação que atinge em cheio a cadeia do desenvolvimento, limpando nossas mentes com uma noção renovada do que sejam ordem e progresso.
E assim falamos de um programa que tem vitalidade, abarcamento, criatividade, liberdade, resultados, simultaneidade, horizonte, energia e transformação; enfim, tudo que um governo de conteúdo e densidade gostaria de realizar, mas que não se vem por apenas usar uma
estrela na lapela, há que se ter a estrela na testa, como parece ser o caso do atual Ministro.
Px Silveira