Há anos que a gestão cultural no Brasil derrapa na mesma trilha, com idas e vindas, avanços e recuos. Derrapar nem seria tanto o problema, que o esforço de acertar é sempre bem visto. O problema é que não se sabe que trilha é essa.

linha de tremAs atualizações dos ministros Gilberto Gil, os esforços do Juca Ferreira, as reticências de Ana Buarque e o mergulho de Marta Suplicy, convenhamos, embrulharam 12 anos de “viva a cultura”, mas cujos principais legados foram antagonismos e vaidades.

Em outras palavras, estamos perdidos. Não nós aqui do lado de cá na praça pública, mas os do lado de lá, que ganham salários e mordomias ministeriais para supostamente fazer o trabalho de nos indicar as grandes linhas e fomentar a enorme diversidade que co-existe em nossa cultura.

Nota zero para Martha, deu Artur Xexéo na sua página na Revista O Globo, com o título “Bye Bye, Marta” (16/11). É com ele: “Agora me explica: a pessoa passa dois anos como ministra da Cultura e só consegue uma manchete de jornal quando pede demissão metendo o pau na politica econômica do governo? Triste fim de uma administração medíocre”.

Eu corroboro e acrescento, zero com louvor! Depois de um Gilberto Gil surpreendente (dizem que sua nomeação foi por sugestão do marketeiro Duda Mendonça ao Lula), que causou rupturas e conseguiu deixar seu ovo de serpente, chamado Juca Ferreira, até aí a cultura tinha um rumo e andou fresca de ideias (é desta fase o Programa Cultura Viva, dos Pontos de Cultura). Ao chegar a Dilma, sem azimutes e sem referências que valessem seu posto na seara cultural, ela atendeu a sugestões contrárias (o contraditório é muito bem-vindo, mas há de se justificar) e, perdida no purgatório petista, prestigiou a indicação da Ana de Hollanda por uma ala retro-agente, nomeando quem ela própria, a Dilma, não seguiu, deixando de garantir a Ana os poderes e a base que seriam imprescindíveis para sua gestão.

E de mulheres para mulheres, Dilma um belo dia não aguentou mais a pressão paulista para oferecer um cargo na Esplanada em troca de apoio a Haddad em São Paulo, e daí oPTou por trocar a Ana de Hollanda pela Marta Suplicy. E tem dado no que deu e no que dará, penso eu. Infelizmente a nossa presidente Dilma não manja nada de cultura. Sua gestão nesta área se pauta por deixar passar o tempo sem engrossar o assunto, o que para ela já seria uma vitória.

De planejamento e propostas ninguém quer falar. A paralisia da reformulação dos benefícios fiscais (Lei Rouanet), as prioridades invertidas nos investimentos diretos (Fundo de Cultura), os editais segmentados e etnocentrados, mais parecem um caso de esquizofrenia oficial, em que se aponta para lá e para cá, sem saber onde está o alvo.

Do Vale-Cultura, saudado como o grande projeto da década, recorro ao Artur Xexéo que é mais sabido que eu: “Marta deixa como legado a criação do Vale-Cultura, aquele instrumento que pode ser comparado à Conceição do samba-canção de Jair Amorim e Dunga, aquela que ninguém sabe, ninguém viu. Na propaganda oficial, “o potencial de investimento do Vale-Cultura nas cadeias produtivas dos setores culturais é de R$25 bilhões por ano”. Pois é, só se esqueceram de avisar às empresas (…). O Vale-Cultura é um blefe que vai cair nas mãos do próximo ministro”, afirma Xexéo.

Com mais essa, os estados ficam com suas respectivas gestões em alerta. O Sistema Nacional de Cultura tem sido nada mais que um punhado de boas intenções depositadas num hiato perdido no tempo. O chamado para sua adesão, que passa pela criação de estruturas administrativas semelhantes em todos os estados, soa mais como coerção do que como efetivação de uma política eficiente. Não se cansam de lembrar que sem o alinhamento ficaremos alijados dos repasses federais para a cultura. Soa como ameaça. A imposição do SNC, que o Ministério não assume e chama de sugestão, chega a ser uma ingerência nas gestões do estados confederados, e que está rapidamente se transformando em desnecessário engodo.

Estados, como o de Goiás que em 2012 transformou sua Agência de Cultura em Secretaria, se alinharam mas não viram avanços nas contrapartidas prometidas, e agora se libertam das expectativas federais para serem eles mesmos, finalmente, buscando avanços sem ficar à mercê de promessas que não dão em nada a não ser em dúvidas, imobilismo e insegurança.

Afinal, quando se quer ajudar, fomentar e participar com investimentos, o importante é cobrar resultados (transparência e eficiência nos recursos aplicados) e não o alinhamento com a mesma forma de atuação, o que pode ser interpretado como engessamento administrativo. E se a gestão federal não pode dar exemplo (tem 40 ministérios, Goiás vai ter apenas 10 secretarias), como fazer com que seja respeitada e seguida? Xexéo, tem toda razão. Bye Bye Marta. Alô Goiás!


author

Executivo do Instituto ArteCidadania e Coordenador do Porto das Artes, em Goiânia, é autor dos filmes “Nove minutos de eternidade”, “Bernardo Élis Fleury de Campos Curado, escritor” e “Amianto, I lobby you”, entre outros.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *