2011 – Gestão Ana de Hollanda e Lei 12.485 (lei da TV paga)

Quase no apagar das luzes de 2010, ano em que a Lei Rouanet, o cinema brasileiro e o Ecad bateram recordes, Ana de Hollanda foi anunciada como a nova ministra da Cultura do Brasil. Em 2011, o MinC completava 26 anos de existência, e Ana assumia a pasta com inúmeros problemas de gestão, como convênios não pagos, editais lançados sem o devido respaldo orçamentário e, para completar, uma redução considerável no orçamento.

Em janeiro, decreto que estabelecia a cota de tela nos cinemas era publicado no Diário Oficial da União e a Petrobras ultrapassava a marca de 500 longas-metragens patrocinados.

Ainda no começo do ano, o Ecad lançava um sistema de captação e identificação automática dos fonogramas tocados nas rádios brasileiras, enquanto o streaming grátis se apresentava como o novo “inimigo” do mercado fonográfico. E o debate sobre a reforma da Lei dos Direitos Autorais seguia, com o MinC publicando em seu portal o texto entregue à Casa Civil em dezembro, com o objetivo de ampliar o debate para subsidiar a elaboração da versão final.

Em abril, mês em que foi instalada a Frente Parlamentar Mista de Apoio à Cultura, a ministra foi ao Senado apresentar as prioridades de sua gestão: Procultura, Vale Cultura e a modernização da Lei de Direitos Autorais. Ao mesmo tempo, o Brasil aparecia, pela primeira vez, no ranking dos museus e exposições mais visitados do mundo

Em julho, enquanto a Funarte anunciava R$ 100 milhões em fomento, atritos entre a gestão do MinC e congressistas atrasavam os principais projetos legislativos do setor. Na sequência, servidores do MinC entraram em greve. Em setembro, a presidente Dilma Rousseff sancionou a Lei 12.485, chamada lei da TV por assinatura, que criou novas regras para o mercado de TV paga, acabou com as limitações às teles e empresas de capital estrangeiro no mercado e estabeleceu um novo marco regulatório para o setor. E o MinC apresentava o Plano da Secretaria da Economia Criativa

Já em outubro, MinC e Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior anunciavam parceria estratégica no audiovisual, enquanto o secretário de Fomento e Incentivo à Cultura, Henilton Menezes, previa que o ProCultura só entraria em vigor, na melhor das hipóteses, em 2013

Em novembro, a Câmara dos Deputados aprovava, em primeiro turno de votação, proposta de emenda à Constituição que concedia imunidade tributária a CDs e DVDs com produção musical brasileira – conhecida como PEC da Música.

Em dezembro, a Lei Rouanet completou 20 anos, com R$ 9,1 bilhões investidos na cultura. E MinC e Ministro da Educação assinaram um acordo de cooperação interministerial que previa investir R$ 80 milhões em ações culturais nas escolas.

Como destaque deste ano, trazemos a entrevista exclusiva feita por Leonardo Brant com a então ministra Ana de Hollanda.

 

Ana de Hollanda: “A melhor resposta que tenho é mostrar serviço” 

Por Leonardo Brant

Publicado originalmente em 10/05/2011

Meses conturbados para a nova Ministra da Cultura Ana de Hollanda. Fizemos essa entrevista por telefone na quinta-feira passada (5/5) em meio a um turbilhão de acusações pessoais e uma campanha aberta para tirá-la da Esplanada. Ela fez um balanço do governo até aqui, falou de sua relação com  Dilma e explicou como tenta driblar a crise que assombra o MinC.

Leonardo Brant – Como foram esses quatro meses à frente do Ministério da Cultura?

Ana de Hollanda – Estamos trabalhando junto com secretários e presidentes de vinculadas na organização do ministério que desejamos, um ministério de ação, voltado ao cidadão e ao centro da cultura, que é o cidadão criador. Fizemos um amplo balanço dos projetos, programas, seus encadeamentos e potencialidades. Isso foi feito logo no primeiro mês de gestão. Já havíamos sentido a necessidade de promover algumas mudan ças nas secretarias. Já havíamos convidado a Marta Porto (Cidadania e Diversidade) e a Cláudia Leitão (Economia Criativa). De cara percebemos o sombreamento entre diversas atividades do Ministério. Quando entrei na Funarte, ha oito anos, já tínhamos essa preocupação de eliminar o sombreamento, mas na prática ele voltava. Pensamos em criar uma nova estrutura conciliando secretarias temáticas com secretarias transversais. O mais importante é permitir a integração das ações. Em várias ações elas estão trabalhando de forma integrada. Esses meses foram de organização, da questão administrativa e financeira. Fizemos um balanço do que nós encontramos e como iríamos lidar com as questões urgentes e prioritárias, já que tínhamos que liberar verbas e regularizar pagamentos atrasados, e ao mesmo tempo lidar com tudo isso de forma organizada, com uma metodologia de trabalho que nos ajudasse a reconhecer os problemas e ao mesmo t empo dar soluções rápidas. Um processo normal de início de governo.

LB – E a relação com o governo Dilma?

AH – A presidenta Dilma teve uma preocupação de aproximar e estimular a integração dos ministério do seu governo, tanto pela situação político-econômica atual, como também pela maneira como a presidenta enxerga a gestão pública em seu governo. Passamos a procurar programas conjuntos com vários ministérios, sobretudo o da Educação, Secretaria da Mulher, Sepir. Já criamos grupos de trabalho para atuar nessas áreas. Foi um período denso e de muito trabalho, para montar uma nova estrutura ministerial e desenvolver diretrizes, de forma organizada e integrada.

LB – Qual a principal marca da sua gestão até aqui?

AH – Não tenho dúvidas em apontar o trabalho com o cidadão como elemento central no Ministério.  O cidadão é o foco de atenção da cultura. Aquele que cria, produz e também o cidadão que precisa de acesso e precisa consumir mais cultura. Isso é algo que perpassa todas as secretarias do MinC. O Audiovisual, o Livro e Leitura, enfim todos estão focados na questão da cidadania e do trabalho com o cidadão. O ponto de avanço, que talvez diferencie um pouco o trabalho desta gestão em relação à anterior, é o foco na criação. A questão da diversidade cultural passa a ser vista não somente como o reconhecimento da nossa rica produção cultural, mas também pelo estímulo à criação.

LB – A criação da Secretaria de Economia da Cultura tem a ver com isso?

AH – Sim, a secretaria de economia criativa veio muito nesse sentido. Como trabalhar com a nossa rica diversidade desenvolvendo talentos, gerando riquezas, sem gerar uma dependência e uma insegurança em relação aos mecanismos de financiamento. A secretária Claudia Leitão está desenvolvendo um sistema de informações que nos ajudará a mapear as nossas potencialidades econômicas, criar um olhar sensível sobre as áreas de desenvolvimento e as cadeias produtivas. Daí em diante vamos pensar e agir na sustentabilidade desse sistema, criando clusters, arranjos produtivos, e trabalhando com agências fomentadores para pensar a distribuição dos recursos em atividades encadeadas e colaborativas, para que o Ministério não se cristalize como um balcão de financiamento de projetos e possa pensar no desenvolvimento local como um todo, gerando sustentabilidade, baseada sobretudo na emancipação dos agentes criadores locais. Precisamos ter um desenho claro sobre o quanto a cultura representa no mundo econômico, para avançar com as políticas, conquistar mais prestígio com a sociedade e com o próprio governo, já que existe por trás da questão econômica algo muito maior e mais potente que é o valor simbólico da nossa produção.

LB – Podemos apontar a gestão pública como um ponto positivo do Novo MinC, do ponto de vista interno, governamental, e Cidadania e Criação, com elementos externos, de diálogo com a sociedade?

AH – Acho que sim. Você, desse jeito, sintetiza muito bem aquilo que estamos fazendo. Há algo mais a ressaltar. Existem vários programas, várias frentes interministeriais em que a cultura tem um papel estratégico, de destaque: na visão geral do Planalto, a cultura vai trabalhar com a linguagem do cidadão. Por exemplo, o Fórum de Direitos e da Cidadania é um dos quatro grandes eixos do governo da Presidenta Dilma. Este fórum, coordenado pela Secretaria Geral da Presidência da República, já contava com a subcoordenação da Secretaria de Direitos Humanos, da Secretaria da Mulher e da Secretaria da Promoção da Igualdade Racial. No início dos trabalhos, o Planalto constatou a necessidade de incluir o Ministério da Cultura na subcoordenação deste eixo, que é fundamental ao desenvolvimento cidadão do país,  ao considerar sua capacidade de trabalhar valores simbólicos de autoestima e cidadania. Estamos conseguindo inserir a pauta da cultura nos grandes programas governamentais, daí a decisão da presidenta de entregar ao MinC a coordenação das 800 Praças do  PAC, que é um programa de vários ministérios. O mesmo aconteceu em relação à questão da Copa do Mundo, na qual fui chamada para coordenar ações planejadas para uma presença maior dos elementos culturais nesse grande evento de 2014.

LB – Como o governo está enxergando a crise enfrentada pelo Ministério da Cultura?

AH – Em primeiro lugar, o Planalto não enxerga como uma crise, mas, sim, como uma campanha orquestrada para fragilizar o MInC e o governo Dilma. Uma tática muito usada durante a campanha. Por isso mesmo, conto com o apoio e a solidariedade da presidenta e estamos enfrentando essa questão junto com o gabinete, com a equipe mais próxima da presidenta.

LB – O quanto isso atrapalha a sua gestão?

AH – Trato essa campanha como um elemento externo ao Ministério. A ordem aqui dentro é trabalhar. Priorizar a resolução dos problemas. Encontrar soluções para os cidadãos. Realinhar a política cultural segundo os novos desafios do governo Dilma. Já estamos regularizando os pagamentos atrasados de 2010 dos pontos de cultura, mais cultura, dos editais,  preparando novas ações, priorizando as propostas com o Congresso, como o apoio aos projetos do Procultura,  Sistema Nacional de Cultura e  Vale-Cultura, além de estarmos preparando o Projeto de Lei do Direito Autoral para o Legislativo. Trabalhamos muito para tornar o projeto mais abrangente e democrático. É claro que enxergo bem uma campanha difamatória para desqualificar e desestabilizar nosso trabalho,  que acaba nos dificultando um pouco, pois poderíamos estar 100% concentrados numa pauta propositiva. Mas a melhor resposta que tenho é mostrar serviço.

Redação

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