Desenvolvimento e diversidade - Cultura e Mercado

Desenvolvimento e diversidade

“A diversidade é, por assim dizer, a mola-mestra de um desenvolvimento que se pretende sustentável, e, em parceria com a ética, que se apreende com o convívio social, torna qualquer passo um passo que deixa marcas, pegadas pesadas de pés que não passaram ali por engano, mas que procuram o caminho certo.”

Desenvolvimento sustentável é o discurso de ordem na maioria do mundo civilizado e até mesmo no setor privado. Mas para ser sustentável deve vir carregado do máximo possível de alternativas positivas de futuro. Em pleno início do século XXI, ainda nos deparamos com o dilema: o que implica exatamente essa formulação? Até que ponto pode-se desenvolver uma sociedade sem afetar a consistência desse desenvolvimento?

A economia criativa, a arte de escancarar as portas do porvir buscando soluções em novas tecnologias para o progresso desenvolvimentista amparado em estratégias éticas e solidárias, começa a engatinhar e ganhar ares adolescentes. Trata-se de uma saída importante dentro da atual conjuntura. Oportunidades se abrem, o mundo respira mais aliviado em alguns setores.

Não obstante, permanece o paradoxo. Crescer com responsabilidade parece ter a mesma conotação de atravessar uma rua de mão única, olhando para os dois lados, no caso, infinitos lados. Acredita-se piamente na tendência do fluxo, mas do lado oposto pode surgir um veículo. Então, paremos para pensar: “tender a” não é certeza, apenas probabilidade. Vivemos anos de incerteza. As utopias se desmancharam, a iconografia desmoronou e não podemos retomar de onde paramos, pois simplesmente nunca paramos! Contudo, o capital se sente seguro por ter supostamente derrotado o seu rival.

O socialismo prático se esfacelou e hoje possui dois vieses principais: o respeito à diversidade (em todos os campos) e à ética social. Temos de pensar mais na frente. Se queremos um desenvolvimento com alicerces capazes de acomodar um edifício em pleno mangue, devemos erigir perspectivas, construir com a argila da existência humana um projeto desenvolvimentista singular para cada povo, uma tradução de sustentabilidade própria a cada idioma, raça ou credo.

A cultura, no sentido mais formal do termo, traz esse poder à baila. Ela conduz como um maestro a imensa ruptura de um mundo polarizado a um mundo semi-livre. A liberdade, afinal, é também algo relativo.

Um homem está livre, como diria Marx, quando se encontra consciente de si e do devir, quando encontra a sua própria imagem nos objetos e instituições que ele criou. Quando não se aliena da realidade, mas é sujeito ativo na transformação da história. Enfim, quando escreve sua própria narrativa.

Assim, produzir e estimular a diversidade é, antes de mais nada, dar voz ao homem que tem algo para dizer. Mesmo que o que ele venha a dizer não combine com meus interesses. Enquanto aparentemente eu estou lá na frente, há uma parcela significativa do todo social que deseja estar comigo, mas que é calada pelos ruídos recorrentes da máquina social e sua visão “tecnologicamente correta”.

Enquanto lá se dança ao som do tecno-music aqui, o mesmo conteúdo é expressado ao som do maracatu, dos batuques e reinados. Qual a distância entre eles? Toda e nenhuma. A distância é apenas em termos de mediação. A primeira é ouvida, a segunda é “folclorizada”, o que é o mesmo de ser mitigada no seu potencial, de ser desconectada com sua realidade, é o mesmo que permiti-la tocar baixinho para não acordar os vizinhos.

É preciso reconhecer humanidade em todos os ritmos, em todas as formulações, em todos os universos. É mister que o homem se faça presente em cada nova tecnologia que alcança a sociedade, pois, como o próprio nome diz, numa sociedade há sócios, parceiros, o crescimento de um dignifica o conjunto.

Assim, um desenvolvimento que tolha culturas, que limite os batuques, que distancie, por vírgulas, o sujeito do seu verbo e, conseqüentemente, do seu predicado, não pode ser sustentável por muito tempo, uma vez que deixou lá para trás uma raiz, e até os nomes têm raízes.

A diversidade é, por assim dizer, a mola-mestra de um desenvolvimento que se pretende sustentável, e, em parceria com a ética, que se apreende com o convívio social, torna qualquer passo um passo que deixa marcas, pegadas pesadas de pés que não passaram ali por engano, mas que procuram o caminho certo.

Assim, o desenvolvimento sustentável é mais do que criar “formas de vida”, é dar vazão às “técnicas de vida já existentes”. A tecnologia tem que ceder na direção e no sentido não apenas de uma melhor qualidade de vida para alguns, mas uma maior quantidade de vida para todos.

Há muitas vidas, acreditamos que uma geração ressurge nas suas subseqüentes. Importa que selecionemos hoje uma gama infinita de escolhas para que as gerações vindouras possuam um leque ainda mais extenso de alternativas positivas de futuro.

“O essencial é invisível aos olhos”, as essências- pensa-se – estão sempre no destino, e por isso os olhos estão sempre perdidos procurando os meios. Talvez o essencial esteja num olhar mais cuidadoso sobre nós mesmos.

Marcos André Carvalho Lins

Acessar o conteúdo