A imagem do Brasil no exterior é parte de uma cultura carente de expressões mais racionais e articuladas
A globalização parece ter tomado o Brasil de assalto. Processo que se desencadeia no final do século XX, a “mundialização” e integração entre economias e culturas diversas parece ganhar vulto e prosperar no início desse século. O Mercosul e o Mercado Comum Europeu que o digam.
Se por um lado o Brasil lucra com divisas e encontra respaldo para uma política arrojada frente aos vizinhos mais sofridos, há, por outro, um forte viés de dominação cultural proveniente dos países mais ricos. Sem dúvida, a cooperação de mão única dita as regras do livre trânsito cultural entre metrópoles e colônias, para usarmos termos antigos, mas que não se perderam no tempo como poderíamos imaginar.
Os principais diferenciais do Brasil exaltados no mundo inteiro continuam sendo: carnaval, futebol e prostituição.
Tais atributos parecem, entretanto, figurarem como parte de uma cultura carente de expressões mais racionais e articuladas. No setor audiovisual, por exemplo, o padrão norte-americano é hegemônico. Não obstante, há um grande potencial interno para as nossas novelas, gênero pouco atrativo fora das fronteiras latinas. O que se deve questionar é a reprodução na nossa filmografia de formatos, conteúdos e significados originalmente concebidos para culturas alienígenas. O que parece é que estamos sempre desejando o Oscar de uma Academia que não é nossa!!
Se observarmos com atenção os nossos últimos sucessos cinematográficos, vamos concluir que as comédias românticas, com motes já manjados, dispararam na frente em números e presença na bilheteria e salas do circuito comercial. Será que, para o brasileiro, um filme de um elenco televisivo do seu país tem o mesmo peso de um filme com Sandra Bullock ou Hugh Grant?
Resposta: o brasileiro médio acomodou-se com o que podemos chamar de cultura de legendas. E cabe aqui a palavra em dois sentidos: o público é atraído não só pelos seres legendários como pelo formato de circuitão, ou seja , aquele cinema mastigado, de apelo fácil e com dinâmica fiel aos ditames hollywoodianos. As nossas novelas ganharam apenas uma sala comercial e mantiveram os conteúdos da tv, acrescentando a isso tudo uma estrutura empresarial que vê na reprodução e imitação de fórmulas consagradas a maneira de abrir um espaço dentro de um mercado ao qual deveria um mínimo de deferência, dadas as peculiaridades verde-amarelas.
“O brasileiro gosta de se ver na tela”. Trata-se de uma realidade ou de mais um mito? Já escutei alguém proclamar : “eu gostaria de ser pobre de novela”. Ora, as duas colocações simplesmente não fecham uma com a outra. Apenas para citar um exemplo: uma das maiores bilheterias dos últimos tempos no cinema nacional segue a métrica já tão esgotada de comédia romântica que chega às raias do absurdo de sugerir o esquema de troca de corpos entre um casal. Não. Nada contra um enredo mágico ou surrealista, se este não fosse um filme brasileiro estrelado pelo que de melhor o país tem de performistas.
Perguntamos: quantos filmes americanos já defenderam tal temática, de modo mais e, às vezes, menos sutil, porém com os mesmos artifícios e armadilhas? Inúmeros. Poderíamos enumerar milhares. Pai que troca de lugar com filho, mãe que troca de lugar com filha. Por algum motivo o que nos vêm à cabeça é Tom Hanks em “Quero ser grande” e Jenifer Garner em “De repente trinta”. Não são exemplos fiéis, mas o leitor saberá eleger um, ou muitos, por conta própria.
Um aspecto precisa ser frisado: onde, em que ponto perderam-se os nossos próprios recursos de entretenimento? Será que nos faltam significados audazes e vanguardistas? Será que se Maomé não vai a Hollywood, a Academia vem a Maomé?
Às vezes pensamos que nem mesmo um parque temático com o dobro da estrutura física e da criatividade da Disneylândia subtrairia o prazer do brasileiro de ir até Orlando visitar o Mickey. Ao nosso ver, a turma da Mônica é bem mais interessante.
Por fim, devemos lembrar que há vida inteligente no setor audiovisual nacional. Contudo, estes se contentam com prêmios, no lugar de ganhos com ingressos. Felizmente, não desistem fácil, embora muitas vezes tenham de se submeter às regras do mercado. Como, aliás, bons mercadores de ilusões que são.
Discordamos de quem vë na tela um espelho. Preferimos a comparação com uma astronave, onde embarcamos todos rumo às terras do tio Sam e esquecemos, por breves instantes, quem realmente somos.
Marcos André Carvalho Lins