Passados quase vinte anos nos quais assistimos o discurso de mais e mais recursos para a cultura via Lei Rouanet, presenciamos um festival de fracassos e chegamos à conclusão de que, na prática, essa lei não atende à cultura brasileira, mas sim à falsificação exótica até mesmo para o capitalismo cultural.

Sabemos todos que, para que continuem captando dinheiro público com fartura e irresponsabilidade, eles caem no apelo barato de buscar frases carregadas de clichês sempre adornados por acusações obscurantistas de nazismo, fascismo, stalinismo, na tentativa de provocar sensações fortes.

O fato é que, por falta de argumentos para justificar tanta lambança e roubos, a cultura brasileira viveu nas mãos do empreendedorismo de captação viciado e dependente da Lei Rouanet.

O debate sobre cultura no Brasil anda pela hora da morte, chegando perto do inferno com cacoetes detestáveis. A isso alguns ainda chamam de eficiência. Ora, há um retrocesso na essência do pensamento provocado pelo assunto de financiamento eterno, como se a cultura tivesse que, por excelência, viver desse “bicho” nacional que é a Lei Rouanet. Isso só funciona, para alguns que fazem da captação de recursos carreira e indústria de compadrio, o que não tem qualquer valor para a cultura brasileira, ao contrário, joga a cultura que tem uma função social fundamental para o país, numa condição dramaticamente inferiorizada.

Os captadores que ficam nessa gritaria, parecem mais sacerdotes ambulantes a caça de dinheiro. Eles pensam enganar a quem? Seus processos discursivos não escondem a ganância. Uma usina universal de fumaça não consegue mais esconder a barbaridade que criou um ciclo antieconômico na cultura brasileira. Eles ainda têm a petulância de, não satisfeitos em falar em “mercado cultural” em seus sermões, propõem, com a maior cara de pau uma polifonia industrial da cultura como a grande “sagração da primavera”. Piada, não?

Ora, isso é ridículo! Além de não ter nenhuma grandeza social e nem valor ético, coincide com uma sorumbática forma de promover cultura no Brasil. Tudo soa falso nessa escala exótica que não esconde sua sede de dinheiro público farto e contínuo. Eles são deficientes em qualquer forma de pensamento cultural, e ainda dizem ter força para organizar a cultura nacional! Tudo isso não passa de um rebuliço mentiroso e repugnante.

O que mais assusta não é simplesmente querer demonizar um Ministro como  sistematicamente acontece aqui nesta tribuna, como foi com Juca Ferreira, o pior é passar a idéia de que todos nós da cultura somos abestalhados e fomos hipnotizados pela tortura psicológica de um nazo-ministro. Ora, quanto tempo será necessário para sairmos dessa baixaria? Quando a crítica é feita nessas proporções, não tem nenhum valor, ao contrário, mostra que a transmissão virulenta tenta esconder um volume traiçoeiro de fracassos para manter essa similistronca chamada Lei Rouanet. Eles querem estabelecer, na base do grito, uma idéia normativa de adotar esta lei como valor imperativo, eficaz para qualquer circunstância da cultura brasileira. Ora, não precisa ser gênio para saber que esse discurso não defende a cultura, o que existe é uma luta para manter um significativo privilégio de arrecadar milhões e milhões de recursos públicos sem ter que explicar nada à sociedade. Isso é uma deformação ritualizada por um discurso vazio, uma pregação que utiliza a magia do medo para sentenciar o Estado e que interessa somente a quem fez da captação de recursos uma prática profissional de submundo. Isso tem que ser repudiado, porque esse indecoroso discurso captador defende a comodidade, a covardia e a pretensão. Isso é uma falsificação evolutiva que reflete as características de um comercio de leis de incentivo, jamais de arte.

A cultura brasileira não é para a sociedade o cocô do cavalo do bandido, ao contrário, a sociedade brasileira sabe o que tem valor em nossas manifestações. O que se vê é que cada vez mais sociedade cria couraças críticas contra quem utiliza critérios sofismáticos para manter a mão no bolso do cidadão comum.

A sociedade é crítica o suficiente para perceber o que é um critério legítimo para se valorizar a cultura brasileira e o que é socialmente primitivo, bruto e, na grande maioria das vezes, tosco, como um processo de um roubo mecanizado com ares de fomento científico que deixou a imensa maioria de artistas brasileiros em estado de anorexia.
Enfim, vamos tentar facilitar o debate e transpor o pensamento e o sentimento contido na alma da cultura brasileira para o que é recomendável dentro de uma arena livre, mas, sobretudo responsável na linha do debate. Ninguém suporta mais esse esquema formal e obrigatório de falar mal do Ministro da Cultura para continuar executando, através da Lei Rouanet, um enorme desperdício de vultosas verbas públicas que passam pelas mãos orquestradas daqueles que têm na cabeça o cocô do cavalo do bandido como solução para a cultura brasileira, mas que também têm uma forma própria e brilhante de se fazerem líderes de uma patota que centrifuga, através da sórdida política corporativa, os recursos extraídos do suor da população brasileira.


Bandolinista, compositor e pesquisador.

7Comentários

  • gil lopes, 5 de janeiro de 2011 @ 11:15 Reply

    Grande Carlos, a simulação de um discurso pretensamente revolucionário não procede e se me permite a comparação, a pretexto de jogar a água suja fora, joga o bebê junto. Não existe essa facilidade na obtenção de milionários recursos, onde está isso? E afinal do que se trata esse festival de fracassos? A questão é o que nos impõe o fracasso e em que ambiente cultural os produtos e as manifestações genuínas estão trafegando, ai sim podemos falar em fracassos. Um exemplo: a principal cronista e crítica das artes cênicas do único jornal carioca passou o ano inteiro falando das maravilhas advindas dos musicais estrangeiros montados no Brasil (com subsídio estatal) e do bem que isso tem feito aos artistas nativos. Pois bem, na sua avaliação anual ela nos fala de uma nova dramaturgia. Fez crítica dos musicais sem a menor cerimônia, mas nos diz agora que não entende de música, que se sente em dificuldade para avaliá-la. O sujeito é um bandido a vida toda, na hora de prestar contas, se faz de bonzinho… que ambiente é esse? O que queremos com isso?
    Faltam milhões e milhões para a arte e a cultura do Brasil, faltam critérios, não seremos nada nem vamos celebrar coisa alguma apenas extraindo petróleo para exportação, como muitos querem, não seremos nada se formos apenas os que extraem, somos muito mais e temos História, o drama dessa epopéia é o tema da nossa cultura e é a ela que temos que nos referir e celebrar.
    Em resumo, mais critério nas análises, mais recursos para a cultura, multiplicação de captadores e empreendedores para a cultura, mais leis de fomento, sem o que não construiremos o país que merecemos.
    E lógico, para fazer mais com menos, evidentemente não podemos continuar subsidiando o conteúdo cultural estrangeiro com os recursos do Estado, já basta o câmbio, e ao contrário da maledicência e do que os mal intencionados pretendem sugerir , isso não quer dizer que o conteúdo estrangeiro não deva circular livremente nem contar com os financiamentos tradicionais, apenas o Estado deve ter seus critérios específicos, e cuidar bem deles.
    Bombardeada insistentemente pela prática da política anti cultural vigente, a sociedade tem seus meios críticos debilitados, o ambiente é francamente favorável a uma eliminação das suas capacidades críticas atingindo inclusive suas estruturas democráticas, portanto vamos devagar…a água suja, mas cuidado com o bebê.
    E antes que eu me esqueça, o que faz nossa derrota cultural flagorosa e contundente é a desigualdade da sua presença frente a potência do conteúdo estrangeiro dentro do Brasil. O que devemos é finalmente engendrar nossa resposta…e depois sair pelo mundo…ou não.

  • Odilon Lino, 6 de janeiro de 2011 @ 12:34 Reply

    Muito bom Gil.
    O Carlos Henrique deveria ter sido mais explícito naquilo que o indigna tanto. Caso contrário continuaremos sem entender exatamente a questão do "captador de recursos".

  • Pablo Marins, 8 de janeiro de 2011 @ 11:03 Reply

    Nos últimos anos, houve um debate muito intenso sobre cultura e políticas culturais no Brasil. Avançamos muito em diversas questões e ficaram explícitos os absurdos e o fracasso da nossa Lei Rouanet.
    Tornou-se muito difícil defender essa lei, quando os seguintes argumentos contra ela foram colocados em pauta:
    – Privatização da cultura: como defender uma lei que permite que empresas privadas utilize do dinheiro público para financiar projetos selecionados por ela mesma? Ou seja, permitir que empresas privadas “tomem” dinheiro público para investir em marketing empresarial e pagar seus gastos com “responsabilidade social”…
    – Uma vez que todo esse dinheiro público foi colocado nas mãos do setor privado, o caos se instalou. Em busca da grana surgiram os “atravessadores”, figuras que se especializaram em captar esse dinheiro. Predominaram até então termos empresariais, como “gestão”. A burocracia virou regra e a depedência desses “atravessadores” tornou-se quase imprescindível, além de insuportável.
    – Por conta de uma, das inúmeras “falhas” dessa lei, projetos de cunho social são financiados sistematicamente com dinheiro público que deveria ser destinado para a cultura. Pois, como a lei permite, os empresários passaram então a gastar o dinheiro público da cultura com projetos de “responsabilidade social” (pra quem acredita nisso, claro) visando receber o selo iso 9000, por exemplo.
    Esses são alguns de tantos outros argumentos contra a Lei Rouanet, que levaram aqueles que não querem ou não conseguem entrar nesse universo burocrático, fracassado, estúpido e sujo a reivindicarem mudanças drásticas na política cultural, elegendo o Fundo Nacional da Cultura como uma possível solução. Vemos assim a saída do ex-minitro Juca Ferreira com muita preocupação, pois, ele e sua equipe estavam convencidos de que essas mudanças eram necessárias e urgentes. Queremos muito acreditar que a atual minitra irá caminhar contra a Lei Rouanet e todos os podres poderes que estão dispostos a brigarem por ela… ficou meio difícil de acreditar nisso, mas continuaremos brigando por essas mudanças na nossa política cultural.

  • cristiano lins, 8 de janeiro de 2011 @ 19:39 Reply

    NA PRATICA O CAPTADOR É MAIS UM BATALHADOR PARA VIABILIZAR A NOSSA CULTURA, ACHO QUE O ÚNICO PROBLEMA NESSA QUESTÃO É A QUANTIDADE DE PROJETO APROVADO DE CUNHO UNICAMENTE SOCIAL QUANDO ESTA LEI FOI CRIADA PARA O DESENVOLVIMENTO CULTURAL DAS NOSSAS REGIÕES, MAS A DEMAGOGIA DOS NOSSOS POLÍTICOS NO A FIM DE VER SEUS FAMILIARES TESTAS DE FERRO APROVANDO PROJETOS DISFARÇADOS DE CULTURAL PARA FAZER POLÍTICA.

  • antonio gouveia jr, 10 de janeiro de 2011 @ 10:36 Reply

    CARO,
    exitem em todos os seguimentos da vida humana para a sobrevivência, os que são bravos, fortes e batalhadores, e os que apenas estão aqui de passagem e estes só querem a coisa fácil..!!

    a cultura ou o mercado da cultura, tem que ser profissional, ético, com qualidade, tem que ter competência para produzir cultura e consequentemente tem que ter bons projetos para viabilizar a captação dos recursos para sua viabilização.

    quem não tem competência para captar não pode estar neste seguimento!! vá fazer outra coisa mais fácil !!!

  • gil lopes, 10 de janeiro de 2011 @ 13:00 Reply

    Prezados, não vamos perder o foco importante do tema, no caso, a lei Rouanet. Observo a necessidade de ajustá-la, de reformá-la no sentido de atender verdadeiramente a uma política de fomento da cultura nacional e que o subsídio seja dado integral e exclusivamente a este conteúdo. Muitos acham, está vigente e prevalece que a lei deve atender também ao conteúdo estrangeiro. O resultado está aí.
    Por outro lado, as decorrências da execução da lei na sociedade me parecem benvindas. A intermediação não atrapalha nada, ao contrário, é necessária. Temos é que acabar com essa mania de acusar qualquer prática de antiética, temos que nos reacostumar com o ambiente republicano e democrático, com a integridade dos agentes sociais, de suas representações. Acabar com essa história que todo mundo é bandido, que político não presta, essas besteiras que são entulhos no nosso processo. Temos que avançar punindo desvios e ponto. Confiar mais no processo e nas instituições e melhorar o ambiente.

  • Naldão.artes, 15 de janeiro de 2011 @ 16:04 Reply

    Eu queria ver o Carlos explicar como a cultura do Brasil deveria prosseguir de forma justa, igualitária e acessiva para todos os brasileiro. Eu acho que toda crítica é válida se hover uma expressão de solução, e não só colocando para baixo, se o médico só falar o tamanho do problema e não falar o diagnóstico ele é um péssimo médico,

    O que eu vejo, é que nas regiões do norte e nordeste quase não se ver nem se ouve falar da lei Rounet, porquê?
    Se o bôlo é pra todos as está faltando fatias pra alguns extremos da mesa, está faltando conhecer para atender cada canto do brasil.

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