Com a chegada de um novo ano, o British Council resolveu também renovar os ares. O escritório de integração entre Brasil e Reino Unido anunciou alterações no seu corpo diretivo tão logo 2012 deu as caras. Lucimara Letelier foi escolhida a nova diretora assistente de artes, convocada para auxiliar Luiz Coradazzi, atual diretor, na coordenação do núcleo.
Há 13 anos trabalhando no ramo da cultura, a executiva já atuou junto a organizações como o Guggenheim Museum de Nova Iorque, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro e a Bienal de Artes de São Paulo. Além disso, é fundadora da Artefoco, uma consultoria que cuida da estruturação, coaching e planejamento de organizações culturais no Brasil.
Baseada no Rio de Janeiro, onde está localizado um dos quatro escritórios do British Council no país, Lucimara ficará responsável por promover o intercâmbio de programações de ambos os países, incentivar empreendedores criativos e estimular a formação de lideranças.
Em entrevista ao Cultura e Mercado, ela fala sobre suas expectativas à frente do cargo, suas experiências ná área e os projetos do British Council para o setor cultural brasileiro.
Cultura e Mercado: Quais são suas expectativas ao assumir o cargo de diretora assistente de artes do British Council?
Lucimara Letelier: As expectativas são as melhores. Os objetivos do British Council na área de artes convergem com minha visão e trabalho neste setor no Brasil, pelos quais acreditamos que toda ação artístico-cultural deve deixar um legado institucional aos parceiros envolvidos, sejam eles organizações sem fins lucrativos, instituições privadas, órgãos do governo, artistas ou produtores culturais. De tal forma que prevaleça o princípio da mutualidade de benefícios para as partes envolvidas como capacitação dos gestores, alavancagem de novos projetos, impacto econômico nos países envolvidos, intercâmbio de experiências e estímulo a inovação e fomento de novas práticas que estimulem a criação de políticas públicas.
Pretendo aplicar nas relações de parceria do British Council a minha experiência em gestão cultural e desenvolvimento institucional realizado antes em instituições privadas/públicas como museus, teatros, orquestras e organizações sociais.
O trabalho no setor de artes no British Council é realizado por uma equipe de profissionais baseados nos escritórios de Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Brasília. Meu cargo tem uma relevância específica para o Rio de Janeiro, onde vamos alavancar as iniciativas público-privadas nas artes e na cultura estreitando as relações entre Brasil e Reino Unido com intercâmbio de programações de ambos os países, incentivo a empreendedores criativos e estímulo a formação de lideranças.
O British Council reconhece o vigor do momento atual no Rio de Janeiro com as Olimpíadas, a Copa do Mundo e outras iniciativas, e seu potencial impacto econômico, social e cultural. Além de já fazermos parte desta grande rede de intercâmbio de especialistas envolvidos com as Olimpíadas Culturais em Londres, iremos fortalecer cada vez mais os laços entre os museus, centros culturais, teatros, salas de concerto do Rio de Janeiro com suas organizações-pares na Inglaterra, na Escócia, em país de Gales e Irlanda do Norte. Desta forma esperamos abrir uma porta de acesso para que a programação artística brasileira de excelência possa ser apresentada no Reino Unido e vice versa, sempre com oficinas de capacitação, debates, seminários, máster classes e eventual co-criação em projetos específicos. E também vislumbramos apoiar o Rio com oportunidades de multidisciplinaridade entre os programas nos quais atuamos: Artes, Esportes, Educação e Língua Inglesa. Apesar do Rio de Janeiro ser a área prioritária de minha atuação, também irei atuar em iniciativas em outros estados brasileiros, junto com o Diretor de Artes no Brasil.
CeM: Quais são os planos do British Council para 2012 e como vocês planejam fortalecer o intercâmbio entre o Brasil e o Reino Unido?
Lucimara: O Bristish Council tem um programa inovador para área de Artes a ser desenvolvido especificamente no Brasil, de 2012 a 2016, que certamente trará ótimas novidades para o público, os produtores, artistas e instituições culturais brasileiras.
Com curadoria de Jude Kelly (diretora artística do Southbank Centre em Londres) e Graham Sheffield (ex-diretor artístico do Barbican, de 1995 a 2010, e atual diretor global de Artes do British Council), o programa incentiva o intercâmbio de experiências entre Brasil e Reino Unido, promovendo o desenvolvimento de capacidades e novas habilidades no setor cultural com compromisso de permanência, legado e mutualidade de benefícios para ambos os países.
As perspectivas são de resultados de longo prazo, com abrangência geográfica em todo Brasil. Já temos tido ótima receptividade pelas organizações culturais brasileiras, com várias ações já em curso no Rio de Janeiro, São Paulo, Recife e Minas Gerais. Iremos realizar, sempre em parceria, projetos culturais com excelência artística que incentivem e fortaleçam as melhores práticas de gestão, produção e desenvolvimento criativo englobando: Parceria contínua entre “instituições pares” do Brasil e do Reino Unido, como museus, teatros, orquestras, centros culturais, companhias de dança com intercâmbio de programação, mas também fortalecimento de suas capacidades administrativas; Colaboração entre artistas jovens e/ou emergentes; Ações voltadas a públicos especiais com programação, incentivo a novas atitudes e fóruns de debate; Diálogo entre empreendedores criativos em moda, Design, Mídia e Produção editorial; Engajamento cultural de comunidades excluídas e minorias.
Em Economia Criativa, daremos continuidade às iniciativas em curso no Brasil, como o Prêmio Jovem Empreendedor Criativo e apoios a seminários e congressos. Mas, sobretudo, queremos criar um fluxo constante de colaboração que ajude o Brasil a encontrar seu próprio modelo de fomento nesta área, mas que possa dar aos gestores locais as informações e acesso as pessoas e instituições-chave no Reino Unido com vasta e reconhecida experiência no tema. Este trabalho deve ser realizado junto com consultores locais, Ministério da Cultura, instituições privadas e secretarias estaduais e municipais.
CeM: Qual a importância do setor de economia criativa na política cultural do British Council?
Lucimara: O British Council é um parceiro de longa data do SESI-SP, nossas atividades se complementam em diversas áreas e em Economia Criativa, não poderia ser diferente. Trazer a reconhecida especialista em Economia Criativa, Anamaria Wills para ministrar a palestra “Cidades Criativas”, fez parte da nossa estratégia de estimular o debate, a conscientização e capacitação sobre temas ligados ao setor.
A Economia Criativa é parte integrante da nossa política cultural global. O Reino Unido é referência em políticas públicas para economia criativa e tem vasta experiência nas atividades que unem artes/cultura e negócios, capaz de impulsionar e manter os artistas, além de contribuir amplamente para a geração de riqueza na economia dos países. O British Council é parceiro dos profissionais de indústrias criativas ao ajudar os empreendedores a produzir um setor criativo sustentável através do desenvolvimento profissional e de uma rede de contatos em áreas como música, design, moda e mídia.
O Young Creative Entrepreneur Award (Prêmio Jovem Empreendedor Criativo) vai além do mero reconhecimento das realizações desses empreendedores, proporcionando-lhes uma plataforma para iniciar um diálogo internacional. O objetivo do prêmio é recompensar os empreendedores criativos estabelecidos no Brasil por sua contribuição em seus respectivos setores. Em 2012, pretendemos ainda lançar um programa de Liderança Cultural que visará dar suporte à nova geração de líderes culturais com atuação de destaque em economia criativa.
CeM: Você tem uma longa experiência na área de cultura. Quais, em sua opinião, foram as principais mudanças pelas quais o setor passou durante esse período?
Lucimara: Em 13 anos de atuação no setor cultural, progredimos na profissionalização das instituições e dos profissionais que atuam com artes e cultura. Os 20 anos de Lei Rouanet trouxeram avanços em diversas dimensões e retrocessos em outras. O patrocínio empresarial evoluiu a passos largos e as relações entre empresas e organizações/produtores amadureceram bastante com processos mais institucionais e transparentes. Mas não houve fomento de outras fontes de recursos como pessoa física, fundações e ainda não temos uma política pública com ações concretas de incentivo a exportação de programação nacional e com formação dos gestores e financiamento a áreas artísticas menos “atraentes”, que não sustentáveis via iniciativa privada.
Há uma clara expansão da percepção de quem atua no setor cultural a cerca de suas potencialidades, oportunidades de transversalidade temática e reconhecimento do imenso impacto sobre o desenvolvimento social e econômico de um país. E isto atrai novas fontes de recurso, consolida compromissos dos gestores e impulsiona mudanças em políticas públicas. Isto é perceptível com o aumento da relevância da economia criativa (com a criação desta e também da secretaria de Diversidade Cultural no Ministério da Cultura), maior troca entre setor cultural e as práticas do terceiro setor e, sobretudo o fortalecimento institucional das organizações que passam novamente a valorizar o público, seus interesses, e com isto renovam as fontes de receita própria (bilheteria, programas de sócios, lojas, crowdfunding, etc) para sustentabilidade de seus museus, teatros e orquestras.
A globalização também teve um impacto grande na produção artístico-cultural do país, apesar das barreiras ainda existentes (cultura, língua, burocracias, modus operandis…). A visibilidade para arte brasileira nos mercados internacionais é crescente e não mais limitada à produção artística diretamente, mas expandida ao intercâmbio entre áreas de sustentação da atividade artística como arquitetura, advocacia, captação de recursos, administração em geral, como resultado de iniciativas privadas e de cooperação multilaterais internacionais.
Há uma renovação gradual dos quadros administrativos em instituições brasileiras com profissionais cada vez mais especializados provenientes de cursos universitários de formação em Administração cultural/artística, cuja oferta cresceu no Brasil todo e também por profissionais que se especializaram fora do Brasil e conheceram modelos europeus e americanos e hoje impulsionam mudanças no Brasil e o intercâmbio internacional. Antes, na minha atuação como professora e consultora em gestão de artes, os conceitos de gestão e marketing específicos para cultura eram desconhecidos ou bem pouco acolhidos, o que já caminhou muito na realidade atual.
Vejo com otimismo as mudanças e um futuro mais promissor para o setor artístico cultural brasileiro. Em um contexto econômico estável, podemos desenvolver o que já temos de melhor, descartar o que já não agrega valor e adaptar as melhores práticas de outros países. O setor artístico-cultural americano teve sua sustentabilidade bastante focada na iniciativa privada (ampla participação de pessoas físicas), e o europeu, na esfera pública. Agora, estão aprendendo a mesclar, introduzir novas práticas de um para o outro, criando modelos híbridos com novas soluções para velhos ou novos problemas. O Brasil tem a oportunidade de se juntar a esta grande rede de intercâmbio para ensinar, aprender e criar o novo, juntos. E nós, do British Council, atuaremos como facilitadores deste processo.