Mais um capítulo da “novela” do Cine Belas Artes foi encerrado na última sexta-feira (18/3), após a última sessão do número 2423 da rua da Consolação, em São Paulo. Enquanto o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental (Conpresp) não decide se o prédio será tombado ou não, muita gente – entre eles o sócio-proprietário André Sturm, que pretende manter o cinema no endereço – espera, de mãos atadas.

A agonia do tradicional cinema paulistano, que funcionou no mesmo endereço por 68 anos, está inserida em uma crise maior: a do cinema de rua. É o que informa reportagem do site da revista Veja, publicada neste domingo (20/3). Assolado pela concorrência dos shopping centers, com sua promessa de segurança e comodidade, e dos multiplex, com sua grandiosidade impressa no número de salas, nas poltronas e nos quitutes, as salas de exibição com porta para a calçada vivem um momento difícil. “O cinema de rua é um negócio em extinção”, diz Ricardo Difini, presidente da Federação Nacional Das Empresas Exibidoras Cinematográficas (Feneec).

A Agência Nacional do Cinema (Ancine) ainda não tem números de 2010, mas dispõe de dados que comprovam a involução do circuito de rua no país. Nas três capitais com maior número de cinemas – as pouco mais de 2 mil salas de exibição brasileiras estão concentradas em 8% dos municípios do país –, o decréscimo é nítido.

De 2008 para 2009, Belo Horizonte fechou 19 salas de rua (de 74 para 55), enquanto ganhou quatro em shoppings centers (de 132 para 136). São Paulo, sede do Belas Artes, fechou 67 salas na rua (202 para 135) e perdeu apenas três em shoppings (de 598 para 595), variação próxima à estabilidade. E o Rio de Janeiro, que chegou a perder dez salas em shoppings centers (214 para 204) entre os anos de 2008 e 2009, viu cair quase pela metade o número de cinemas de rua: de 92 para 50.

De acordo com o crítico Pedro Bucci, a crise do cinema de rua data de meados dos anos 1980. E, além do advento do shopping e dos multiplex, ela pode ser explicada pelo crescimento da produção em todo o mundo. “Antigamente, havia poucos diretores, e a Europa respondia por boa parte da produção, especialmente a de filmes de arte. Hoje, há uma produção maior disputando um espaço que não cresce no mesmo ritmo. A distribuição não dá conta da produção.”

O modelo de negócios dos cinemas de rua, mais focados em longas de arte, também apresenta fragilidade do ponto de vista financeiro – ainda mais quando se considera a programação dos multiplex, feita basicamente de blockbusters. “Fica difícil sustentar um cinema na rua desse modo. Principalmente quando um multiplex coloca algum filme de arte entre os seus blockbusters e acaba atraindo parte do público da rua”, diz Bucci.

O próprio Belas Artes não era exemplo do mais rentável dos negócios. Mas, em parte graças à divulgação que recebeu durante a sua luta para sobreviver, vinha se mantendo sem patrocinador há cerca de um ano, de acordo com seu sócio-proprietário André Sturm. “Tínhamos um público entre 25 mil e 28 mil espectadores por mês, e com um pouco mais apenas, 30 mil, teríamos garantida uma operação sempre no azul. O patrocinador era importante porque trazia essa garantia”, conta o cinéfilo, que já havia encontrado um novo patrocinador para o seu projeto.

A entrada de uma nova empresa na história, no entanto, não impediu que o Belas Artes fechasse as portas nesta semana. A questão, avalia Sturm, é que o dono do imóvel que sediava o cinema viu que poderia ganhar mais com uma loja de departamentos no local. “Uma loja de departamento fatura mais por metro quadrado”, afirma.

O processo de tombamento deve ter um resultado em abril. Se tombado, o imóvel não poderá ser usado para certas atividades – como uma loja de departamentos. E é aí, aposta Sturm, que o proprietário cederá e voltar a alugar o espaço para o cinema. Caso não reaja o espaço, o Belas Artes pode voltar. O patrocinador estaria inclusive interessado em acompanhar o cinema em sua mudança de endereço, segundo Sturm, que garante não desistir de reabrir o negócio.

*Com informações do site da Veja


Jornalista, foi diretora de conteúdo e editora do Cultura e Mercado de 2011 a 2016.

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