Ao financeiro, social e ambiental soma-se o cultural como central para a sustentabilidade de empresas que hoje já emitem seu balanço fiscal anual usando o já consagrado conceito de triple bottom line.
Tenho defendido, nos últimos anos, que as modalidades de envolvimento empresarial com a produção cultural vão muito além da filantropia, do marketing cultural com ou sem leis de incentivo, da responsabilidade corporativa. O que se observa, nas empresas de ponta do mundo inteiro, é a percepção de que o que é bom para a cultura, para a sociedade e para o ambiente é bom também para a empresa – e repercute não somente em sua imagem, mas diretamente em seu volume de vendas, em seus custos internos e, em última instância, em seus resultados financeiros.
Quimera? Longe disso! Com vocês: cultura – o quarto pilar da sustentabilidade. Já que é o quarto, comecemos pelos três que o precederam e que formam o que se convencionou chamar de triple bottom line. Primeiro, o financeiro. A primeira linha (ou top line) dos relatórios financeiros apresenta o faturamento da empresa. Depois de deduzidas as despesas e afins, chega-se aos lucros ou prejuízos, que são portanto apresentados na última linha dos relatórios (daí bottom line). De uma classificação puramente financeira, a análise venceu fronteiras. Primeiro, foi reconhecido que o desenvolvimento econômico não se sustenta sem o desenvolvimento social. Uma empresa não pode prosperar alheia a seu ambiente, já que é este que lhe fornece não só consumidores, como também funcionários, fornecedores, distribuidores e assim por diante. De um primeiro bottom line, passamos a ter dois: o financeiro e o social. Depois disso, nossa visão foi ampliada, incorporando o ambiental. É ele, afinal, quem alardeia o conceito de sustentabilidade hoje consagrado, definido no Relatório Brundtland de 1987 como o que “atende às necessidades da geração presente, sem comprometer a capacidade das futuras gerações de atender às suas próprias necessidades”.
Financeiro, social e ambiental. Hoje, algumas das empresas mais valiosas do mundo, dos mais variados setores e tamanhos, emitem seu balanço fiscal anual usando o já consagrado conceito de triple bottom line.
A evolução para a inclusão da cultura nessa equação chegou às livrarias em 2001, quando o australiano Jon Hawkes lançou The Fourth Pillar of Sustainability – Culture’s essential role in public planning (“Quarto Pilar da Sustentabilidade – o Papel essencial da cultura no planejamento público”, sem tradução para o português). Essencialmente, o autor defendia a importância primordial da cultura na gestão pública e seu valor inestimável para avaliar o passado e planejar o futuro.
De lá para cá, o tema tomou corpo. Em setembro de 2002, foi o cerne do discurso do então Presidente francês Jacques Chirac durante o Fórum Mundial do Desenvolvimento Sustentável, em Johannesburg. Integrando a mesa-redonda Biodiversidade, Diversidade Cultural e Ética, em um período de discussões candentes sobre a Convenção pela Diversidade Cultural, ele afirmou: “A diversidade cultural (…) deve ser reconhecida como o quarto pilar do desenvolvimento sustentável (…) ao lado da economia, do meio ambiente e da preocupação social.” O debate não parou por aí e foi até mesmo pauta da reunião dos PEID – Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, nas Ilhas Maurício, em janeiro de 2005.
A onda propagou-se às empresas privadas, encontrando eco e apoio nos Índices Dow Jones de Sustentabilidade. Criados em 1999, eles mapeiam o desempenho financeiro de mais de 300 empresas que se norteiam pela sustentabilidade, em 34 países. No Brasil, seu correspondente mais próximo é o Índice de Sustentabilidade Empresarial da BOVESPA.
Por fim, vale ressaltar que o reconhecimento da cultura como quarto pilar da sustentabilidade ganhou também o campo do urbanismo. Um dos precursores do conceito de cidades criativas no mundo, o inglês Charles Landry, defende que a contribuição que a cultura aporta às cidades e comunidades reflete-se em sua vitalidade, na qualidade de participação cultural, na construção do diálogo entre seus habitantes e na promoção da diversidade, constituindo lugares onde as pessoas querem morar, trabalhar e passear.
Cultura e sustentabilidade – dois aliados fundamentais, baseados em algo que temos de defender diariamente, sem esmorecer: a ética presente em tudo o que fazemos e vemos.
Ana Carla Fonseca Reis
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