“Aprofundar a democracia requer a participação cidadã em nível elevado. Reconhecer as novas complexidades sociais e culturais é condição primeira para estabelecer novas institucionalidades e, portanto, a política cultural precisa assumir seu papel determinante, ou seja, protagonizar uma nova cidadania, em condições objetivas já presentes.”

Fabio Maciel é advogado formado pela USP, mestre em filosofia do direito e do Estado, professor, autor e ex-editor jurídico da Editora Saraiva. Atuou como produtor cultural, sendo co-fundador da Coordenadoria de Ruas e Espaços Sociais – CORES. Membro atuante do Instituto Pensarte desde a sua fundação, Maciel é candidato a vereador de São Paulo pelo PCdoB.

Na última quinta-feira, o advogado participou do debate promovido pelo Pensarte e Cultura e Mercado com o tema Política Cultural e Cultura Política e nos concedeu a seguinte entrevista:
 
Leonardo Brant – Como a política cultural pode atuar no fortalecimento da cidadania e da democracia?

Fabio Maciel – Política cultural e cultura política estão, como é sabido, essencialmente relacionadas. Considerando-se política cultural um conceito, pode-se dizer, numa relação dialética, que ela é determinada pela cultura política. Mas é, também, determinante da cultura política, de acordo com o posicionamento político dos agentes culturais, respeitadas a pluralidade política e diversidade cultural. Quando se fala em fortalecimento da cidadania e da democracia, isso só será possível se houver o co-protagonismo dos agentes culturais. Aprofundar a democracia requer a participação cidadã em nível elevado. Reconhecer as novas complexidades sociais e culturais é condição primeira para estabelecer novas institucionalidades e, portanto, a política cultural precisa assumir seu papel determinante, ou seja, protagonizar uma nova cidadania, em condições objetivas já presentes.

LBA consolidação de um Sistema Nacional de Cultura, que defina melhor os papéis da federação, dos estados e dos municípios, favoreceria o envolvimento do cidadão com as questões ligadas à
cultura?

FM – Certamente. A Constituição de 1988 abriga, nos preceitos fundamentais, a cultura brasileira, formada e em formação, criada e em criação. Falta, no entanto, definição clara das responsabilidades e respectivas alçadas de municípios, estados e federação. É preciso dizer que não se trata de enquadrar, engessar, a cultura em nenhum modelo. Nada disso. Os poderes públicos devem garantir a livre expressão e ampla difusão cultural. Os meios devem estar à disposição da cidadania brasileira no país inteiro e no mundo.

LBVivemos uma crise de participação política? O sistema representativo caducou? Qual a saída para uma efetiva contribuição do cidadão, sobretudo nas questões ligadas ao bairro e à cidade?

FM – As ruas evidenciam o afastamento de muitas cidadãs e cidadãos da política. A própria política é responsável por isso. Vejam que um tema como o da reforma política está fora do debate das eleições municipais. É inaceitável, pois é justamente no município que está a base da política democrática. Essa cultura política está apartada da realidade. A democracia representativa precisa ser requalificada com instrumentos auxiliares de democracia direta, pois a participação cidadã é fundamental para o aprofundamento democrático. Nessa relação interativa de representantes e representados é que está uma das respostas para o problema. A internet é um meio já disponível para a criação dos parlamentos virtuais.  É a política feita com interatividade, não com passividade.

LB – Nos últimos anos, as redes socioculturais têm surgido como instâncias de diálogo e construção coletiva de políticas públicas. Seu caráter caótico e difuso, no entanto, deixa-nos em dúvida sobre sua eficácia como instrumento de participação. Como estabelecer diálogo entre essas redes e os sistemas já consolidados?

FM – As redes, pode-se dizer, têm, sim, caracteres caóticos e difusos. A contradição dialógica não é, contudo, apenas negativa. É reveladora de um contexto político e cultural.  Aliás, nesses contextos, incluídos os “já consolidados”, estão as bases para as novas relações e políticas públicas que estabeleçam os novos instrumentos de participação cidadã. É, sem dúvida, a dialética complexa sendo explorada nos limites do indivíduo e do coletivo:  o espaço político democrático, em movimento e desenvolvimento.

LB – Como transformar as expressões culturais presentes na sociedade brasileira em programas culturais que gerem renda e emprego?

FM – Uma política cultural deve ter por objetivo a interação entre cultura, educação e esporte, preocupada essencialmente com a dignificação de todos os seres humanos. É nesse processo que será possível transformar as expressões culturais em projetos que gerem várias formas de atividades profissionais, já que a a cultura não prescinde jamais do elemento humano.


Pesquisador cultural e empreendedor criativo. Criador do Cultura e Mercado e fundador do Cemec, é presidente do Instituto Pensarte. Autor dos livros O Poder da Cultura (Peirópolis, 2009) e Mercado Cultural (Escrituras, 2001), entre outros: www.brant.com.br

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