Disfarçado como “Nova Lei Roaunet” chega em versão oficial o Procultura, projeto que revoga o maior instrumento de financiamento à cultura. Assinado pelo presidente, será entregue ao Congresso em breve. A surpresa que se confirmou, e sequer foi colocada em consulta pública, é a exclusão dos 100% para projetos de natureza cultural. A indústria e os projetos comerciais continuarão gozando do benefício, através do Ficart, o que contraria todo o discurso pela diversidade, utilizado em defesa da lei até agora.
O Projeto de Lei que substitui a Lei Rouanet (Lei nº 8.313/1991) entra na pauta do Congresso Nacional no retorno do recesso parlamentar, em fevereiro. Quarta-feira, 27 de janeiro, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, encaminhou à Câmara dos Deputados o texto que, se aprovado, esvaziará o mecenato a projetos culturais.
O Ministério da Cultura distribuiu um release de imprensa “vendendo” a ideia de que a lei tornará a “cultura mais abrangente e dinâmica”. A peça de propaganda disfarçada de jornalismo diz ainda que os “objetivos centrais são ampliar os recursos da área e, ao mesmo tempo, diversificar os mecanismos de financiamento de forma a desenvolver uma verdadeira Economia da Cultura no Brasil.”
Talvez esteja se referindo ao fato de que o governo propõe cortar os 100% para projetos de cunho cultural, mantendo apenas para o Ficart – Fundo de Investimento em Cultura e Arte, que financiará projetos comerciais. Isso significa que, além do audiovisual, que já conta com uma lei que beneficia o investidor com 100% de desconto no Imposto de Renda, sem contar a possível participação nos lucros, os projetos culturais terão um novo concorrente, o show business.
O MinC apresenta a renovação do Fundo Nacional de Cultura (FNC) como grande novidade. O que o Procultura faz, no entanto, é dividir o que já existia em vários fundos setoriais. Entre outras coisas bizarras, cria o setor do “Acesso e Diversidade”. Ou seja, acesso será considerado setor econômico e não uma questão inerente à atividade cultural. O mesmo se aplica para o termo diversidade, que já foi utilizado para tudo no novo vocabulário do MinC.
Outro ponto alardeado pelo órgão é o “estabelecimento de critérios objetivos e transparentes para a avaliação das iniciativas que buscam recursos”. No entanto, o que o texto da lei traz é uma série de princípios, diretrizes e valores que qualquer projeto precisa ter. Os projetos serão avaliados por critérios como “expressão da diversidade cultural brasileira (vai saber o significado disso); contribuição à pesquisa e reflexão; e promoção da excelência e da qualidade”, entre outras pérolas.
A propaganda diz, ainda, que a nova lei transformará o Fundo Nacional de Cultura (FNC) “no mecanismo central de financiamento ao setor, criando formas mais modernas de fomento a projetos”. Como não há qualquer garantia de fontes de recurso para o Fundo, a tal centralidade só pode ser garantida com o esvaziamento do mecenato, já em pleno vapor.
“Garante-se, assim, que os recursos cheguem diretamente aos proponentes, sem intermediários e com maior participação da sociedade, por meio da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), que dará origem a comissões setoriais”, promete o MinC. Mas quem garante?
O projeto obriga os estados a distribuir 50% dos recursos do Fundo aos municípios, mas desobriga a federação de distribuir qualquer percentual aos estados.
O que o release não conta é que o projeto, entre outras surpresas e pegadinhas que vamos revelando durante o processo de discussão do Procultura no Congresso, é que o Procultura institui, em seu artigo 66, o Programa Prêmio Teatro Brasileiro, para fomentar: I – núcleos artísticos teatrais com trabalho continuado; II – produção de espetáculos teatrais; e III – circulação de espetáculos ou atividades teatrais.
Imagino que seja uma espécie de Lei de Fomento ao Teatro, só que em âmbito nacional. Trata-se de uma bem sucedida experiência da cidade de São Paulo, replicada de forma estapafúrdia, sem contexto e regulamentação no Procultura, apenas para atender aos movimentos teatrais como contrapartida ao apoio concedido durante o período de consulta pública, exigindo o fim da Lei Rouanet.
Um bom gancho para todas as outras áreas que ficaram de fora do acordo brigarem por prêmios e concessões. É hora de fazer barulho!
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