Ao propor a ocupação da Sala Funarte Guiomar Novaes, em São Paulo, com alguns dos principais expoentes da nova música brasileira, criamos mais do que um festival (Cidade Sonora) com 28 shows, criamos uma cidade.

Para inventar essa cidade, foram necessárias 28 vozes mergulhadas nas intensidades de seu tempo e atentas às linguagens que encontram à sua volta. Imaginamos uma Cidade Sonora independente, colaborativa, criadora, transformada. Imaginamos uma música sem gêneros, feita de encontros, vinda de muitos lugares. O que é uma Cidade Sonora senão o que essas 28 vozes estão fazendo e dizendo?

Ao propor uma cidade, o que estamos propondo é menos um mapeamento da cena musical brasileira e mais uma cartografia. A cartografia, diferente do mapa, é um desenho subjetivo, sentimental, sensível, que se move à medida que nos movimentamos. Uma cartografia que acompanha a formação de mundos.

Onde circula a nova música brasileira? Os artistas que estão produzindo hoje, como produzem, como divulgam, como distribuem? É possível constatar que a indústria cultural não conduz mais esse processo. Na cena musical em que vivemos, o artista empodera-se de sua produção, está mais livre para construir sua trajetória e, consequentemente, uma relação mais ética com seu público. Ética porque se estrutura organicamente, em relações vivas com um público cada vez mais singular. Resumindo: a nova música brasileira tem cada vez mais autonomia.

No caso da produção, os custos para gravação foram reduzidos de maneira drástica nas últimas décadas, por conta do desenvolvimento tecnológico que ampliou vertiginosamente o número de pequenas gravadoras, já que é possível captar, mixar e reproduzir usando computadores pessoais.

No âmbito da divulgação e distribuição, a internet permite hoje uma alta circulação para a música independente. O público não consome em rede apenas por estar conectado, mas também porque encontra ali a identificação que não encontra na produção musical da indústria cultural. Atitude de quem vive e produz como cada um de nós. Os nós desta rede. Forma-se um território cultural comum em detrimento da trajetória individual artística. Propaga-se uma noção de contaminação.

Todos os artistas da Cidade Sonora têm página na internet, onde disponibilizam suas músicas para ouvir e, muitos deles, também para baixar gratuitamente. Numa nova lógica comercial, a nova música brasileira investe no espalhamento para o encontro de redes onde é redistribuída em progressões geométricas não quantificáveis.

Nova música brasileira não diz respeito à jovialidade dos artistas, mas, principalmente, a uma proposta musical inventiva para o futuro da música, arrojada desde a composição até a maneira de chegar ao público.

A nova música brasileira é digital, é em rede, é viral, não é mainstream, é cosmopolita, aponta para o futuro, é investigativa, é propositiva, é baseada em relações afetivas, tem memória musical e é naturalmente transnacional.

*Esse texto abre o livro Cidade Sonora, parte do projeto citado, que será lançando no dia 14 de setembro de 2012. Saiba mais aqui.


contributor

Projeto de Belma Ikeda, Daniel Lima, Élida Lima e Eugênio Lima, contemplado pelo Edital de Ocupação da Sala Funarte Guiomar Novaes 2012.

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